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    29 de março de 2024, sexta-feira.

    A noite seguia num ritmo animado em Tóquio, naquela área onde haviam vários barzinhos, karaokês e restaurantes. Era conhecido como “Praça Divertida” e rodeado por árvores floridas que se alinhavam ao longo do entorno, se estendendo pelas ruas e avenidas. As pétalas, como se fossem flocos cor-de-rosa, se desprendiam de vez em quando, especialmente quando o vento soprava, flutuando no ar antes de tocar o chão. 

    O clima era leve, agradável, com uma brisa suave dançando por entre o ambiente e espalhando o delicado aroma perfumado das cerejeiras. O tempo estava limpo, sem nuvens no céu e as estrelas, embora estivessem lá, dificilmente eram vistas, graças a quantidade absurda de luzes artificiais que se destacavam naquela cidade. Mesmo em locais mais afastados, a quantidade de luminosidade era espantosa. 

    Mesmo a lua, dependendo da hora e do ângulo que estivesse, era quase impossível de ver, já que a cidade era preenchida por enormes prédios. Apesar de estar em fase minguante, parecia quase cheia — e mesmo difícil de ver, ainda podia ser contemplada de alguns lugares, principalmente mais altos. 

    A música animada preenchia o ambiente, mas não chegava a ser estrondosa, que se misturava discretamente ao meio de risadas, conversas e barulho de copos brindando. O local escolhido tinha um charme acolhedor, com luzes amarelas presas no teto, refletindo halos no piso polido e nas mesas brilhosas. Haviam adegas, com inúmeras e variadas bebidas, que ficavam, em sua maioria, atrás de balcões escuros e bem posicionados. 

    Alguns bartenders atendiam ao longo do espaço, preparando drinks na hora e na frente dos clientes. Enquanto uns ficavam fixos no atendimento perto dos expositores de bebidas, outros serviam diretamente nas mesas, fazendo a confecção ali — uma forma divertida de prender a atenção da clientela.

    Victor e Aki chegaram de mãos dadas, alguns minutos atrasados. Entraram, caminhando, procurando pelos amigos, quando perceberam um braço erguido sinalizando: Era a Sayuri. 

    — Ela é sempre tão animada… — Aki comentou, lembrando-se da quase exata mesma cena de alguns dias atrás. — Vamos.

    Ao se aproximarem, notaram a quantidade de pessoas. Yumi e Sayuri levantaram e cumprimentaram Aki com um abraço, deixando ela envergonhada. Foi quando ela percebeu que as amigas já estavam, pelo menos, começando a ficar bêbadas. 

    Victor cumprimentou também, quando Helsing levantou: — Esses são o Haruto e Naiga. São amigos de longa data. — Ele os apresentou. — E esse são o Victor e a Aki, que estávamos comentando agora pouco. 

    — “Comentando agora pouco”? — Victor perguntou. 

    — Nem chegamos e já estavam falando mal pelas costas? — Aki brincou. Eles riram. 

    — E esses são: Ren e Yuto. Essas são: Sakura, Haruka e Aya. — Sayuri apresentou. — Fazemos isso de vez em quando, mas somente agora conseguimos nos aproximar o suficiente para te chamar também. A Aki já conhece eles, não é?

    — Sim, da outra vez eu os conheci. — Aki comentou. — E que bom que o Victor está com nós agora. 

    Victor sorriu discretamente, enquanto começou a olhar as opções do cardápio. O casal fez o pedido a uma das garçonetes que se aproximou. 

    Durante a conversa, descobriram que Ren e Aya trabalhavam num dos escritórios de advocacia e contabilidade que a Elegance Affairs era parceira. Também descobriu que os dois amigos de Helsing trabalhavam no escritório terceirizado de Marketing da empresa de eventos. Os outros três, Sakura, Haruka e Yuto, mexiam em outras áreas, mas eram amigos da Sayuri. 

    Victor sentiu-se levemente deslocado, sabendo que todos ali já se conheciam de certa forma — menos ele. Mas, agora, ele tinha um novo objetivo: tentar expandir o ciclo social. Depois de começar a namorar com Aki, sentiu que deveria fazer isso, tanto para mostrar para si mesmo o seu desenvolvimento, quanto para abrir novas possíveis oportunidades. 

    “Eu preciso mostrar meu crescimento…” — Ele pensava. 

    Até que estava indo bem, conseguindo acompanhar a conversa e manter o clima saudável. Foi quando recebeu uma ligação inesperada de Matheus. Graças ao barulho, e também à falta de privacidade, decidiu sair um pouco para atendê-lo, após avisar sua namorada. 

    — Oi, você é muito bonita! — Yuto elogiou, aproximando-se de Aki, aparentemente despretensioso. A conversa estava agitada e não perceberam a investida dele. 

    — Eh… bem, obrigada. — Aki respondeu, desviando o olhar, procurando ajuda de Sayuri, que estava muito distraída com os outros. 

    — Você não quer sair da mesa e dar uma volta comigo? — Propôs, com um sorriso confiante.

    — N – Não, obrigada. Estou esperando meu… namorado voltar. — Ela hesitou por um momento antes de falar. 

    — Namorado? Aquele cara que saiu? Da última vez você disse que estava solteira… Bem que eu vi que vocês eram bem próximos. Mas você não está tentando só me enganar, né? Essa é uma desculpa esfarrapada que as mulheres geralmente dão. — Yuto se aproximou um pouco demais, naquele enorme banco compartilhado, quando terminou a frase: — Você não está nem usando um anel, quer que eu acredite nisso? Você é uma gracinha… — Quando estava prestes a segurar a mão de Aki, ou abraçá-la, ou qualquer outro tipo de avanço, sentiu um peso no seu ombro. 

    Quando olhou, viu o olhar frio e enfurecido de Victor, de cima para baixo. A mão do brasileiro agarrada, como se estivessem soldadas, no ombro do japonês. Yuto sentiu um frio na espinha, de forma instintiva, contudo, talvez pelo efeito do álcool, não se intimidou:

    — Qual o problema? — Falou com desdém, ainda olhando de baixo para cima. 

    — Eu acho que ela te disse que está acompanhada. Você está sendo muito rude… — Victor respondeu, com a voz baixa, querendo evitar uma confusão. Os outros não haviam percebido a situação. Apesar do volume, o tom era ameaçador o suficiente. 

    — Não enche… eu só queria dar uns beijo nessa boca linda dela… hahaha… — Yuto gargalhou, como se fosse algum tipo de piada. 

    Victor semicerrou os olhos e o punho, enquanto contraiu unilateralmente um dos cantos da boca. Seu desprezo e raiva estavam prestes a explodir. Mas, viu, de soslaio, os olhos preocupados de Aki o encarando. 

    Foi nesse instante — no meio da tensão silenciosa, do ar comprimido e da ira que já beirava o colapso — que Victor desviou os olhos para Aki.

    Os olhos dela, tão doces e sinceros, agora tremiam de medo e inquietação. Eram como dois lagos transparentes agitados por uma pedra jogada com força. Não havia lágrimas, mas havia algo mais forte: um pedido mudo. Um suplicante “não faça isso” ou uma dúvida “o que você vai fazer?!”, que gritou mais alto que qualquer palavra dita.

    Victor sentiu o tempo desacelerar. Todo o barulho ao redor pareceu se dissolver, como se apenas eles dois existissem naquele instante suspenso. A raiva em seu peito se contorceu, mas recuou — não por falta de vontade, mas por Aki.

    Respirou fundo, e, em vez do soco que seu punho ansiava por descarregar, afrouxou lentamente a mão sobre o ombro de Yuto, ainda mantendo o olhar duro e frio como aço.

    — Você vai levantar dessa mesa, pedir desculpas e seguir seu caminho. Se insistir… vai se arrepender. E não vai ser depois. Vai ser agora. — Sua voz estava baixa, firme, como o silêncio que antecede um trovão.

    O sorriso idiota de Yuto murchou, hesitante. Ele tentou parecer valente, pensou em retrucar, mas o olhar de Victor era o tipo de olhar que um homem só consegue sustentar se for insensato ou suicida. Ele bufou algo inaudível, se levantou meio cambaleante e foi em direção a um dos balcões.

    — Tá tudo bem aí? — Helsing perguntou, finalmente percebendo que algo estranho tinha acontecido.

    Victor forçou um sorriso breve, virando-se calmamente para o grupo:

    — Tudo certo. Só um pequeno mal-entendido. Já está resolvido.

    Sentou-se ao lado de Aki, que ainda mantinha a expressão assustada. Sem dizer uma palavra, deslizou sua mão por baixo da mesa e entrelaçou os dedos com os dela. O toque era firme, reconfortante.

    Aki suspirou aliviada e recostou-se levemente nele, o corpo relaxando pouco a pouco.

    — Vamos sair daqui? — Yumi sugeriu, notando que o clima havia mudado. — Que tal o karaokê privativo? É só subir as escadas e ser feliz!

    — Ótima ideia! — Helsing concordou, animado. — Cantar vai melhorar o humor de todo mundo. E a Sayuri fica hilária tentando cantar em inglês!

    — Ei! — Sayuri protestou, rindo. — Não fala isso, eu sou ótima com o inglês! Maybe… sometimes!

    O grupo riu, quebrando de vez o clima tenso. Eles se levantaram, se preparando para continuar a noite de um jeito mais leve, caminhando em direção às escadas que levavam ao andar superior.

    Mas, enquanto saíam, Victor lançou um último olhar para Yuto, ainda encostado no balcão, tentando disfarçar o constrangimento. O aviso estava dado.

    Sayuri, enquanto andavam, gritou por Yuto, o chamando para subirem as escadas, mas ele recusou com a cabeça, sinalizando estar passando mal — o que era mentira, porém, não se atreveu a se aproximar do grupo com Victor por perto. Seu corpo ainda tremia como aquele olhar que ele encarou momentos atrás. 

    — Isso vai ser uma tragédia — murmurou Victor, olhando desconfiado para o microfone, como se ele fosse uma bomba prestes a explodir.

    — Vai ser divertido! — retrucou Aki, puxando-o pela mão com empolgação. — Promete que vai cantar comigo?

    Victor bufou, rendido. — Se você prometer que não vão querer nos expulsar depois disso. — Ela riu. 

    Sayuri, por sua vez, já estava com o catálogo nas mãos, decidindo entre um clássico dos anos 80 e uma abertura de anime dramática. Yumi e Kazuya discutiam qual dos dois faria o dueto de “My Heart Will Go On”, enquanto Helsing, com uma garrafa de cerveja na mão, já ensaiava passos de dança com uma confiança absolutamente injustificada.

    — Eu nasci pra isso! — declarou ele, girando no próprio eixo e quase derrubando uma das mesas.

    — Você nasceu pra causar processo — murmurou Kazuya, afastando o copo da beirada da mesa por precaução.

    Após algumas músicas, algumas desafinadas, outras fora do ritmo, finalmente, o microfone foi para Aki e Victor. Eles subiram no mini palco, com olhares atentos de todos os lados. A música começou: uma balada romântica dos anos 90 que, claramente, nenhum dos dois sabia cantar direito. Mas eles se esforçaram — Victor mais preocupado em não desafinar que em acompanhar a letra, enquanto Aki ria tanto que mal conseguia pronunciar as palavras.

    — Palmas para o casal! — anunciou Helsing, batendo palmas com exagero. — Nunca vi tanta coragem reunida em cima de um palco.

    — Nem eu — disse Sayuri, secando uma lágrima de tanto rir. — Coragem ou falta de vergonha?

    Victor e Aki estavam rindo dos comentários, embora envergonhados com a performance. Apesar de tudo, houve momentos piores. Ren e Aya cantaram juntos e foi um completo desastre. Sayuri e Yumi, já sob efeito de álcool, pareciam duas gralhas esganiçadas — pelo menos foi assim que Kazuya definiu.

    E assim, a noite seguiu, com momentos hilários e inesquecíveis para os envolvidos. Victor percebeu algumas coisas naquela noite, como: Ele conseguiria, novamente, ter um ciclo de amizades maior; e que ele precisava comprar um anel para a Aki. 

    Embora pensasse que, o fato de Yuto querer dizer que um anel serve para definir limites, quando a própria pessoa já o fez, dizia mais sobre o caráter dele do que sobre a necessidade real. Contudo, um anel… era uma ideia boa. Provavelmente Aki iria adorar o presente, além de ser algo mais oficial. 

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