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    08 de abril de 2024, segunda-feira.

    O som das ondas quebrando na areia chegava aos ouvidos como uma música suave e constante, misturada ao murmúrio distante das conversas e ao riso das crianças brincando na beira d’água. A praia não estava muito cheia, nem vazia. 

    A brisa salgada acariciava os cabelos longos e negros de Aki, fazendo alguns fios se soltarem e dançarem no ar. Ela caminhava com empolgação, prestes a experimentar aquela sensação nos pés que a muito não sentia. Parou alguns passos antes de chegar ao mar, deixando os olhos se perderem no horizonte. A imensidão azul se estendia diante dela, unindo céu e mar num único tom profundo, salpicado pelo brilho prateado do sol refletindo na superfície ondulante.

    Não era a primeira vez que Aki via o mar. No Japão, tinha ido poucas vezes à praia, e, desde então, sua vida havia tomado um rumo tão diferente que aquele cenário parecia pertencer a outra existência. Vivendo em Tóquio, fazia parecer uma coisa muito distante. Mesmo que tivesse oportunidades de ir à praia, não era algo que ela pensava em fazer. 

    A verdade é que ela havia se esquecido de como era… de como aquele infinito azul fazia o coração se aquietar e, ao mesmo tempo, despertar. Sentiu um frio percorrer sua espinha e hesitou quando viu uma onda maior quebrar bem diante dela. Ela recusou um passo, colocando o antebraço à frente do corpo com a palma aberta, instintivamente. 

    Victor olhou com um sorriso bobo. 

    — Está tudo bem?

    — Sim. — Ela respondeu prontamente. — Só um pouco de medo… eu não sei nadar e o mar parece tão… poderoso, tão forte. — Murmurou quase inaudível, como se suas palavras pudessem ser levadas pelo vento. 

    — Não precisa ficar assim… — Victor segurou a sua mão, firme. — Eu não vou deixar você se afogar e, não vamos passar da parte rasa. Vamos?

    Aki mordeu o lábio inferior involuntariamente e confirmou. Eles deram alguns passos juntos, quando a espuma finalmente tocou os pés da japonesa. A água, inicialmente gelada, fez Aki dar um pequeno pulo e soltar um “Eiii!” estridente, mas logo se acostumou à temperatura, passo a passo. 

    Mas, como um estalo, ela se lembrou de algo: 

    — Victor! Esquecemos de passar o filtro solar! — Exclamou, como se fosse um absurdo completo. 

    Ela ainda se lembrava nitidamente da última vez que esteve na praia e ficou com insolação, com umas queimaduras que ardiam ao menor toque, até mesmo da água do chuveiro, fora a sensação de tontura e dor de cabeça. Foi alertada de, sempre que fosse ficar exposta ao sol de forma intensa, deveria usar o protetor — e havia esquecido. 

    Victor olhou para ela e arqueou a sobrancelha: — É verdade… vamos voltar? 

    O casal retornou até o guarda-sol onde estavam e pegou seus pertences em um quiosque à beira-mar que dispunha de serviço de guarda-volumes. Pegando a mochila que trouxeram, Victor sentou numa das espreguiçadeiras e retirou o protetor solar da bolsa. 

    — Você vai passar em mim? — Aki perguntou, baixinho, sua voz saindo quase engasgada, enquanto desviava o olhar. “Não tem nada a ver, ele é meu namorado… meu namorado, ah!” — Pensou, tentando se acalmar. 

    Victor percebeu seu rosto levemente avermelhado e soltou um leve riso abafado. 

    — Claro que eu vou. — Ele se levantou e foi até a outra espreguiçadeira, enquanto Aki gesticulava, deixando os ombros e a nuca mais à mostra, depois de segurar o próprio cabelo. 

    Sem pensar muito, o rapaz começou a espalhar o creme pela pele da garota. O toque de sua mão, firme, tentando garantir que iria cobrir cada área exposta. 

    Agora, Victor percebeu que a luz do sol acentuava o contraste delicado entre sua pele clara e o azul vibrante do biquíni. Se perdeu em alguns pensamentos momentaneamente, mas logo se recuperou. 

    — Assim está bom? — Perguntou, logo após acabar de espalhar o filtro solar.

    — Está sim. — Respondeu, sentindo felicidade e hesitação. — Eu vou passar no meu rosto. 

    Então, Victor, numa tentativa de brincar, aproveitando o momento, enquanto ela estava de costas e falou isso, ele pegou um pouco do creme e quando ela se virou, ele passou, usando a ponta do dedo indicador, um pouco na testa dela. 

    O susto foi grande, seu coração disparou e ela deu um pequeno salto para trás, se desequilibrando e caindo. Mas Victor, agilmente, conseguiu segurá-la, apoiando uma das mãos em suas costas, até ela recuperar o equilíbrio. 

    — Você está bem? — Sua preocupação era visível. 

    — Estou… Só me assustei… YAIM! — Ela respondeu, dando um toque com o indicador na testa dele. — Seu castigo… 

    — Outra travessura como consequência? — Perguntou, de forma descontraída, enquanto disponibilizava a mão para ela se apoiar e levantar. 

    — Não pensei em outra… por enquanto… — Respondeu, com falso desdém, segurando a sua mão e se levantando. 

    Agora, em pé, Victor aproveitou para passar o creme no rosto dela. Apesar de sentir um pouco de timidez, não hesitou quando ele pediu. Quando acabou, depositou um beijo rápido no topo da cabeça dela, aproveitando que ela estava de olhos fechados. 

    — Victor… Tem gente olhando… — Protestou, tímida. Ele sorriu.

    — Desculpa, não resisti… — Provocou. 

    Agora, aproveitando que tinham que esperar antes de entrar no mar, foram tomar água de côco naquele mesmo quiosque. Victor pediu dois côcos e eles tomaram usando canudinho, enquanto aguardavam alguns minutos. 

    — Promete que não vai me soltar, em! — Aki falou, um pouco mais alto do que queria, quando a água tocou seus pés e adentravam o mar. 

    — Eu prometo! Vamos! Vai ser divertido! — Victor praticamente puxava ela, enquanto dava pequenos saltos, já sentindo o marido quase nos joelhos. 

    Quando a água bateu na cintura de Aki, eles pararam. Aki olhou em volta e a imensidão azul era assustadora e reconfortante ao mesmo tempo. Trazia uma sensação de paz, mas demonstrava sua imponência. A maresia trazia uma nostalgia, de certa forma, de quando ia à praia com seus pais e irmãos. 

    Foi quando avistaram uma onda vindo e Victor segurou ela com mais firmeza, a abraçando. A onda passou por eles e Aki se assustou um pouco. 

    — Ufa! Achei que fosse quebrar em cima da gente! — Exclamou, aliviada, tirando uma porção de cabelos que caíram no seu rosto, enquanto Victor ria.

    — Se fosse o caso, teríamos beijado a areia. — Respondeu, olhando em volta. — Estamos seguros… — Enquanto falava…

    SPLASH!

    Victor sentiu o gosto saldado da água dentro da sua boca, quando Aki jogou um “mão d’água” no seu rosto. 

    Ele olhou para ela, surpreso: — Você não estava com medo agora? — Seu tom de ironia não ficou nada disfarçado. 

    — É seu castigo! Você soltou minha mão! — Aki fez bico e virou-se de costas para ele. 

    Foi aí que ele percebeu que realmente havia feito isso e riu. Mas, de relance, percebeu uma onda relativamente grande se formando pouco atrás, vindo na direção deles. 

    Victor abraçou Aki de costas: — Prende a respiração… — Tentou não assustá-la, porém, seu tom denunciou a urgência. 

    Rapidamente, ela tapou o nariz usando a mão, sentindo o abraço quente de Victor, quando um impacto os atingiram e eles foram arremessados, submersos. 

    Quando ela abriu o olho, estava na areia da praia, de bumbum no chão, sentada. Victor estava do seu lado e de barriga pra baixo, rindo. 

    — Caramba, foi um belo “caldo”… — Comentou, entre uma tossida e uma risada. 

    — Quase tive um ataque cardíaco. Que susto… — Então, ela o ajudou a se levantar. — E você soltou minha mão! — Reclamou. 

    — Mas eu te protegi, eu juro… — Contestou, num tom de brincadeira. — Segundo round? — Propôs.

    E assim, os voltaram para a água, enquanto brincavam de jogar água e aproveitavam aquela sensação gostosa que somente uma praia poderia dar. 

    Passado um tempo, ainda ficaram sentados na areia, apreciando a brisa fresca que vinha do mar e observando o movimento de turistas e cariocas pelo calçadão. Um vendedor ambulante se aproximou, com um isopor pendurado no ombro, oferecendo picolés gelados. Victor olhou para Aki e ergueu uma sobrancelha, como quem perguntava sem palavras se ela queria.

    — Hum… sim, quero um. — disse ela, sorrindo.

    Pouco depois, estavam os dois ali, saboreando cada um o seu picolé. O de Aki era de chocolate, o de Victor de limão. Entre uma lambida e outra, trocavam pequenos comentários sobre a temperatura, o sabor e até sobre como o vento parecia combinar perfeitamente com aquele momento simples.

    Victor ainda ofereceu para Aki experimentar o seu picolé, fazendo ela sentir vergonha, mexendo numa mecha do cabelo, involuntariamente, antes de responder que sim. Se aproximou e mordeu um pedaço, saboreando e dizendo que estava muito gostoso. Em seguida retribuiu a pergunta. 

    Victor também aceitou. Após essa troca de sabores, ela comentou que ele fazia essas coisas parecerem tão normais. Que ela tinha vergonha de certas coisas assim. Ele sorriu e explicou que não via problema, afinal, estavam namorando e já tinham feito algo parecido antes. 

    Dessa forma, ela lembrou-se de quando experimentaram coisas um do outro em momentos anteriores. Ela acabou sorrindo e dizendo que não tinha problema, só que ela tinha vergonha. Victor então, aproveitou o momento dela olhando para o outro lado e deu um beijo na bochecha dela.

    — Assim eu vou morrer de vergonha… — Protestou, enroscando o dedo indicador numa mecha de cabelo, desviando o olhar. — Não é ruim… só vergonha… — Tentou explicar. 

    Victor se desculpou e disse que não resistiu, que ela estava muito linda e não pôde evitar, num tom leve para descontrair. Ficaram conversando mais um pouco ali.

    Quando terminaram, se levantaram e começaram a caminhar pelo calçadão, lado a lado, de mãos dadas. Aki demonstrava claramente a felicidade de estar no Brasil, com ele. Seus olhos brilhavam enquanto ela olhava para as barracas de artesanato, as apresentações de músicos de rua e as famílias espalhadas pelas mesas dos quiosques.

    Embora fosse segunda-feira, o movimento praiano ainda era relativamente alto.

    — É tão… agitado aqui. — comentou, virando-se para Victor com um sorriso. — Lembra Tóquio, de certa forma, mas sem os prédios imensos. 

    — Aqui é assim mesmo, sempre movimentado. E é uma vibe boa, né? 

    Ela concordou.

    Victor percebeu alguns burburinhos com olhares para eles. Seu coração acelerou, ligeiramente. Tentando não pensar nisso, aproveitaram para tirar várias fotos juntos. Victor fez questão de registrar Aki com o mar ao fundo, o sol realçando seus cabelos negros, e também selfies divertidas, onde os dois apareciam sorrindo, com a praia de Copacabana ao fundo. Aki também tirou algumas fotos de Victor, tentando capturar o jeito mais natural possível, o que gerou risadas dele ao ver as poses improvisadas que ela pedia.

    Após um bom tempo andando, resolveram voltar para o hotel. O entardecer já pintava o céu com tons de laranja e rosa, e a brisa mostrava que a noite se aproximava. Aki estava com o rosto mais vermelho que o normal. 

    — Você está bem? — Victor perguntou, enquanto caminhavam de volta. 

    — Estou… Só um pouco de dor de cabeça e enjôo. — Respondeu, com uma voz quase preguiçosa. 

    — É verdade, quase não nos hidratamos durante o dia todo. E, mesmo passando o protetor, você parece um pouco mais… bronzeada? — Victor tentou explicar, ao perceber a pele dele um pouco mais vermelha na região dos bustos. 

    Ela encolheu os ombros ligeiramente, envergonhada. 

    — Vamos para o hotel. Acho que não chega a ser uma insolação, mas é melhor nos cuidarmos.

    Chegando ao quarto, Victor foi direto para o banho, enquanto Aki organizava algumas coisas das sacolas que haviam trazido da feirinha. Quando ele saiu, já vestido, ela pegou suas roupas e entrou no banheiro, fechando a porta atrás de si.

    Enquanto ela se banhava, Victor aproveitou para descer até a recepção e pedir algo para comerem no quarto. O cheiro de sal do mar e o vento da praia haviam aberto o apetite, e ele queria que fosse algo prático para que pudessem aproveitar a noite sem precisar sair novamente. Escolheu dois pratos leves e uma jarra de suco natural, e subiu de volta, depois de passar na farmácia do hotel e comprar uma pomada pós-sol e um remédio para enjôo, além de soro para se hidratar.

    No caminho pelo corredor, ficou pensando no quanto aquele dia tinha sido especial, de forma simples. Apenas a praia, o mar e Aki, mas, para ele, tinha um valor enorme. Cada momento ao lado dela parecia ficar gravado na memória de um jeito diferente. Talvez porque, de alguma forma, ele sentia que estava construindo algo sólido com ela. Algo que desejava durar para sempre. 

    Quando chegou à porta do quarto, sacou o cartão magnético e abriu a porta, apenas o suficiente para passar. Entrou e, instintivamente, fechou-a atrás de si, ainda de costas para o interior do cômodo. Começou a tirar o celular do bolso, pronto para conferir o horário estimado da entrega da comida.

    Ao olhar para a cama, viu Aki dormindo profundamente. Estava muito calor lá fora e o ar-condicionado desligado, por causa que ela havia acabado de sair do banho. Seus cabelos ainda pareciam úmidos. Victor deixou um sorriso se formar nos seus lábios. 

    “Ela deve estar cansada, por causa da viagem. Também estou exausto…” — pensou. 

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