Capítulo 51: A Luz Divina do Deus Sol
“Por que vocês estão me observando?” Charles fez a pergunta a Kord, que estava sentado do outro lado da mesa. Atrás de Kord, os cultistas da Ordem da Luz Divina permaneciam em fila, imóveis como estátuas.
“Não é apenas você,” Kord respondeu, ajustando os pequenos óculos redondos. “Nós monitoramos todos que buscam a Terra da Luz. É um sinal de que essas pessoas estão sendo convocadas pelo Deus Sol.”
Charles mal conseguia conter um comentário sarcástico ao ouvir as palavras do fraudulento religioso diante dele.
“Sr. Charles, imploro sinceramente que você se junte a nós. É pela vontade e graça Dele que você sobreviveu às suas aventuras anteriores. Nestas águas sombrias, indivíduos abençoados como você são raros,” Kord continuou.
Charles soltou uma risada e acenou com a mão em desdém. “Vamos deixar o impossível de lado por agora. Tenho uma pergunta para você, um suposto crente do Deus Sol.”
Kord fez um gesto com a mão esquerda aberta. “Pergunte.”
“Você deve conhecer as Caixas de Espelhos em Sottom, não é?”
“Claro. Alguns capitães de nossa fé até me pediram para ajudá-los a adquirir algumas.”
Charles inclinou-se para frente, estudando a expressão do velho. “Você não acha que a luz nas Caixas de Espelhos se assemelha muito à luz do seu Deus Sol?”
Kord bateu a mão na mesa e soltou uma risada suave. Seu rosto ancião transbordava confiança.
“Capitão Charles, você talvez não entenda por não ter se juntado à nossa Ordem. Nossos textos sagrados detalham tudo sobre o Deus Sol. A luz divina do Deus Sol manifesta-se em um espectro de cores — sete cores, para ser exato. Ela acalma o coração e também fornece calor. A luz na Caixa de Espelhos tem apenas uma cor e é ofuscante demais. Não há comparação possível.”
“Você tem tanta certeza?” Charles inclinou-se ainda mais, estreitando os olhos.
“Capitão Charles, admiramos sua intenção de buscar o brilho do Deus Sol. Porém, sua falta de entendimento, levando a equívocos, reflete apenas ignorância. Como Acólito Sagrado da Ordem da Luz Divina, sou muito mais conhecedor do Deus Sol do que você. Se Sua luz divina aparecesse diante de mim, eu certamente a reconheceria.”
Charles irrompeu em gargalhadas, algo raro desde que chegara a este mundo subterrâneo. “Obrigado pela piada. Faz tempo que não ria tanto.”
Um traço de fúria surgiu no rosto de Kord. Ele se levantou, aparentemente querendo partir, mas após um momento, sentou-se novamente.
“Sr. Charles, sei que resiste à ideia de se juntar à nossa Ordem. Tudo bem, podemos começar com uma colaboração. Você já demonstrou seu talento como capitão de exploração. Posso fornecer as coordenadas da ilha com maior chance de abrigar a Escada Divina. Nossa Ordem cobrirá todas as despesas da expedição.”
Se fosse o Charles de antes, ele teria concordado sem hesitar. Apesar de ser usado como peão, a recompensa era lucrativa. Porém, agora que encontrara uma pista de volta à superfície, ele jamais aceitaria a proposta.
Olhando para o velho, Charles calculou seu próximo passo. O caminho para a superfície estava sob controle do “Rei”. Sua tripulação era insuficiente, e ele precisava de aliados. O homem diante dele poderia ajudar.
“Sr. Charles, o que acha?”
“E se eu dissesse que já tenho pistas para a Terra da Luz?”
Irritação surgiu no rosto de Kord. “Capitão Charles, se insiste em falar de temas irrelevantes, isso mostra falta de sinceridade.”
“Qual é o critério para determinar a luz divina? Um espectro de cores, correto?” Charles estalou os dedos, e um grupo de ratos arrastou uma Caixa de Espelhos para dentro da sala.
Ele abriu a caixa apenas um pouco e posicionou um prisma sobre a abertura. Uma luz arco-íris refratou-se no rosto estupefato de Kord.
“Ah, sete cores. Pronto.” Charles colocou o prisma na mão de Kord.
Segurando o prisma, Kord parecia incrédulo. Ele testou o prisma contra a Caixa de Espelhos, e cada tentativa só aumentava seu espanto até que a luz solar na caixa se esgotou.
O efeito do prisma era algo que até uma criança aprenderia em tempos posteriores. Porém, neste Mar Subterrâneo, onde não havia luz solar para experimentos, ninguém sabia que a luz solar era composta de várias cores.
“Charles, o que… o que é isso?” Kord perguntou, agitado e com um traço de euforia. Era como se tivesse descoberto algo proibido.
Vendo Kord perplexo, Charles aproveitou o momento. Ele levantou-se.
“A luz na Caixa de Espelhos é a luz divina do seu Deus Sol. O ‘Rei’ de Sottom sabe a localização da Terra da Luz. Se o fizermos entregar a carta náutica, encontraremos o caminho!”
Charles e Kord discutiram por um longo tempo, mas, ao final, Kord não deu uma resposta clara e partiu cabisbaixo.
A Ordem da Luz Divina tinha muitos seguidores no Mar Subterrâneo. Charles queria que Kord espalhasse a notícia para todos os crentes, atraindo-os a Sottom. Nem o “Rei” lidaria com tantos.
O que um pirata poderoso faria contra cultistas destemidos?
Três dias depois, Kord voltou à porta de Charles. Com expressão amarga, disse: “Desculpe, Capitão. O telegrama do Arcebispo chegou. Eles acham a informação absurda.”
Charles recostou-se na cadeira e suspirou. Palavras sozinhas não convenceriam uma organização tão grande. Ele precisaria de outro plano.
Após um silêncio, Charles olhou para Kord. “E você? Acredita?”
“Eu…” A hesitação de Kord era evidente. Ele entendia o ceticismo do Arcebispo. Um estranho alegando que o que buscavam há séculos estava ali era difícil de crer.
Porém, o espectro de cores o perturbava. E se Charles estivesse certo?
“De que adianta eu acreditar? O Arcebispo no Mar do Norte não enviará Guerreiros Sagrados. Nossas poucas centenas não derrotarão o ‘Rei’.”
“Não precisamos derrotá-lo.” As palavras de Charles surpreenderam Kord.
Charles não continuou, mas gesticulou para os cultistas saírem.
“Todos, saiam e vigiem a porta. Ninguém se aproxima,” Kord ordenou.
Com a sala vazia, Charles prosseguiu: “Nosso objetivo não é tomar Sottom. Só precisamos descobrir a origem da luz das Caixas de Espelhos. Se conseguirmos a carta náutica, evitamos confronto direto.”
“Você tem um plano?” Kord perguntou, voz trêmula.
“O ‘Rei’ vive no palácio no centro de Sottom . A carta deve estar lá. Se você distrair ele e os guardas, eu infiltro. Não preciso roubar a carta — basta uma olhada. Sem confronto.”
Kord não concordou imediatamente. Disse que precisava refletir.
Dias se passaram sem resposta. Charles começava a se desapontar.
Se o plano falhasse, ele voltaria a ser um capitão de exploração, ocupando ilhas, tornando-se governador, e expandindo poder para forçar o “Rei” a revelar a Terra da Luz.
Mas isso levaria tempo demais — talvez mais do que ele teria de vida.
“Capitão! O velho cultista voltou! Trouxe um homem alto desta vez!”
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