Índice de Capítulo

    — Ouvi dizer que você tinha grandes objetivos de trabalhar pelo mundo — disse Phillip.

    — Como? — perguntou Airen.

    — Meu filho me contou.

    — Ah…

    Eles haviam caminhado por cerca de dez minutos quando Phillip Lloyd finalmente falou.

    Airen não sabia o que dizer. Para ser honesto, sentiu-se um pouco envergonhado. Embora não tivesse vergonha de seus objetivos, temia como poderia soar para alguém como Phillip.

    No entanto, logo afastou suas dúvidas e assentiu com sinceridade.

    — Sim, foi por isso que peguei minha espada — disse Airen.

    — Esplêndido — respondeu Phillip com um aceno.

    Ele caminhou em silêncio por um tempo, com Airen seguindo atrás. Logo, encontraram-se em uma rua fora do castelo. Justo quando Airen se perguntava se Phillip tinha algo em mente, ele voltou a falar.

    — Também tive sonhos semelhantes quando era jovem, embora os meus não fossem tão grandiosos quanto os seus. Queria governar uma terra justa, onde todos pudessem viver em paz. Hoje em dia, as pessoas ririam de um sonho assim, mas naquela época, muitos compartilhavam desse sentimento. Lembro-me de como nos reuníamos para beber e conversar sobre essas coisas — disse Phillip.

    “Deve ter sido difícil para eles”, pensou Airen. No entanto, por mais sincero que fosse o clima da conversa, ele não ousou dizer isso em voz alta. Apenas continuou ouvindo em silêncio enquanto Phillip prosseguia.

    — Quando meu filho disse que você tinha muitas perguntas para mim, pensei bastante sobre o que deveria dizer a um jovem tão esplêndido quanto você… O que eu deveria lhe mostrar? Não conseguia pensar em nada. Mas, enquanto passei o dia com você hoje, descobri…

    — O que você…? — começou Airen.

    — Vamos andar mais um pouco. Há uma rua que quero lhe mostrar.

    Com isso, Phillip voltou a se calar, deixando Airen apenas segui-lo em silêncio.

    A mente de Airen disparou. O que Phillip queria lhe mostrar? Ele queria exibir a beleza da cidade? Talvez um grande hospital? Ou alguma outra atração que Airen não havia notado? Ele estava ansioso para descobrir. Apressou o passo. Phillip também acelerou.

    No entanto, o que Airen viu a seguir contrariou completamente suas expectativas.

    — Este lugar é… — murmurou.

    — Um cortiço — disse Phillip.

    — Este é o lugar do qual menos me orgulho. Quero fazer algo a respeito, mas não sei o quê.

    — Que tal darmos uma volta? Ah, se algo acontecer, deixo minha segurança em suas mãos. Não tenho talento para lutar, sabe.

    — Sim, senhor… — respondeu Airen, desconfortável, enquanto caminhava pela escuridão.

    Ele sabia que becos sujos e perigosos existiam mesmo nas propriedades mais bem governadas. Apenas nunca havia visto um antes. No entanto, não esperava encontrar um lugar assim na propriedade Lloyd, talvez porque a achasse tão encantadora.

    A realidade o atingiu como uma rocha ao sentir o cheiro de lixo e vômito. As paredes estavam rachadas e desmoronando. Pessoas os encaravam dos cantos…

    Felizmente, nada aconteceu. Phillip e Airen saíram dos cortiços ilesos, embora Airen se sentisse muito mais sombrio.

    Ele olhou para Phillip, perguntando-se por que o lorde se deu ao trabalho de lhe mostrar aquele lugar.

    — Quando jovem, eu era muito apaixonado. Meus pais faleceram quando eu ainda era pequeno. Ainda assim, eu estava confiante. Para falar a verdade, estava até um pouco animado para testar meus conhecimentos da academia real como um jovem cheio de sorte… — disse Phillip.

    — No início, não foi tão difícil. Reduzir os impostos e combater o crime fez maravilhas pelo povo. Às vezes, ia para a cama pensando que talvez me tornasse o maior lorde do continente. Se consegui fazer tanto em apenas três anos, o que poderia alcançar em dez? Mas…

    — …Conforme envelheci, percebi que a vida não era tão simples.

    As últimas palavras de Phillip soaram amargas até mesmo para Airen, que não conhecia sua história por completo. Quando Phillip reduziu os impostos para seu povo, os lordes vizinhos começaram a pressioná-lo. Quando então ofereceu ajuda a seus vizinhos, encontrou problemas com o duque, dono das maiores fazendas do reino, que temia que suas ações prejudicassem seus lucros.

    A política não foi seu único problema. Governar não era tão simples quanto o que aprendera na academia. Se resolvia um problema, outros três surgiam. Os desafios nunca terminavam.

    Phillip trabalhava o dia inteiro por sua propriedade, pensando no governo mesmo enquanto comia ou caminhava pelo jardim. Passava noites sem dormir. Para Phillip, descansar não era uma opção enquanto todas as questões não fossem resolvidas.

    — Trinta anos passaram assim — disse Phillip.

    — Minha propriedade ainda tem muitos problemas, cheia de questões ocultas sob a superfície.

    — Airen — chamou Phillip.

    — Sim, senhor — respondeu Airen.

    — Não o trouxe aqui para lhe dizer que meu trabalho ou seus sonhos não valem nada.

    — Então…?

    — Quis lhe dizer que sonhos como os nossos são difíceis de alcançar. Por isso, você não pode se obrigar a trabalhar sem parar.

    — Não é verdade? Deixando meus próprios objetivos de lado, seu sonho é grandioso e nobre, algo que talvez você nunca consiga realizar, mesmo dedicando sua vida inteira a ele. Um indivíduo não pode fazer isso sozinho. Um sonho assim não pode ser concretizado em apenas uma geração. São necessárias gerações de pessoas trabalhando juntas. Agora, pense no que você está fazendo.

    — Você vive cada dia como se o mundo fosse acabar caso não resolva tudo imediatamente. Estou aqui para lhe dizer que não vale a pena colocar esforço assim — disse Phillip.

    — Não vale? — repetiu Airen.

    — Não, não vale. Isso não é se esforçar, é reclamar. Como mais poderíamos descrever quando alguém tenta carregar sozinho um fardo que milhares de pessoas juntas não conseguiram resolver, enquanto se lamenta que não está funcionando?

    — Não me entenda mal, Airen. Não estou dizendo que seus esforços foram em vão. Pelo contrário, quero dizer que você precisa dar mais tempo às coisas. Ah, e não tente me dizer que tem sido paciente. Sei disso mesmo sem ter passado muito tempo com você. Você não descansa de verdade há muito tempo, não é?

    — Tenho tentado relaxar ultimamente…

    — Não minta. Bem, suponho que não seja exatamente uma mentira. Mas, na minha opinião, você não está descansando. Sentar-se, olhar para o céu ou deitar-se na cama não é tudo o que há para descansar. Sabe por quê?

    — …Mesmo quando tentava descansar, sua mente estava perdida em seus objetivos.

    As últimas palavras de Phillip silenciaram imediatamente todas as objeções de Airen.

    Eles caminharam em silêncio pela praça bem cuidada e pelas ruas limpas, voltando ao castelo.

    — Você tem dormido bem, Airen? — perguntou Phillip.

    — Perdão? — perguntou Airen.

    — Porque não parece. Quando eu era jovem, não dormia muito bem. Ia para a cama tão ansioso e preocupado que acordava de manhã sentindo-me doente e pesado…

    — Pode parecer tolice eu, um homem de meia-idade que não se exercita mais do que meia hora por dia, me preocupar com um jovem mestre espadachim, mas você parece exausto.

    Phillip sorriu. Seus olhos continuavam afiados como sempre. No entanto, seu sorriso era caloroso e compassivo ao observar Airen.

    — Não quero me gabar, mas cuido muito bem dos quartos de hóspedes. Então espero que tenha uma boa noite de sono em uma cama luxuosa hoje — disse.

    — Acha que pode me prometer isso?

    — Vou tentar… — respondeu Airen.

    — Haha, acho que você se esforça demais, Airen. Ainda assim, aceitarei sua resposta — disse Phillip, rindo alto pela primeira vez enquanto caminhava.

    Airen hesitou antes de segui-lo. Ainda não estava em paz. As palavras de Phillip continuavam em sua mente. De certa forma, não eram diferentes das de Ian ou das lições que aprendera com o bufão na barreira sombria. Mas, por algum motivo, dessa vez atingiram-no de forma diferente.

    “Me pergunto o por quê?”, pensou Airen, quando viu alguém balançando a espada ferozmente no campo de treinamento.

    Era Brett. Mas ele não parecia seu eu habitual, golpeando sua lâmina de maneira descuidada, como se estivesse irritado com algo.

    Phillip observou em silêncio antes de se aproximar lentamente do filho.

    — O que está fazendo no meio da noite? — perguntou.

    — Estou cortando a solidão — respondeu Brett.

    — Por favor, entenda. Meu filho não tem sido o mesmo desde que começou a namorar — resmungou Phillip.

    Ele deveria estar feliz pelo fato de seu filho mais velho ter encontrado alguém especial. Infelizmente, ver Brett agindo como um tolo não trazia nenhum conforto ao pai.

    Apesar das queixas de Phillip, Brett continuou balançando sua espada. Airen apenas balançou a cabeça.

    Ao retornar para seu quarto, tomou banho e se deitou. Como Phillip se gabava, a cama era realmente muito confortável. Para ser justo, ele já sabia disso. Afinal, estava na propriedade Lloyd havia mais de uma semana.

    Airen percebeu que nunca havia dormido direito durante esse tempo. Nunca dormira mais de duas ou três horas antes de acordar. Finalmente entendeu por que as palavras de Phillip o atingiram tão profundamente.

    — Vamos dormir — murmurou Airen, fechando os olhos lentamente.

    Logo, adormeceu.

    Naquela noite, teve um sonho.

    Um pequeno gesto, um grande impacto.

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