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    Fazia vinte dias desde o duelo entre Airen Farreira e Brett Lloyd. Era final de verão, o calor ainda persistia, mas cerca de cem aprendizes preliminares treinavam esgrima mais intensamente do que nunca.

    Claro, havia razões para isso. Ser liberado do chato treinamento físico para começar a aprender esgrima foi um grande fator, e a divisão de classes também adicionou mais combustível ao fogo. No entanto, o motivo fundamental era a habilidade dos instrutores.

    — Você está colocando muita pressão no ombro ao conectar cada movimento. Fique atento e corrija isso!

    — Esteja ciente do seu entorno!

    — Pense sempre na distância entre você e o oponente. Você precisa de tempo para decidir o que fazer, e apenas a distância permitirá isso.

    — Sua mão e corpo, pés e passos! Um bom movimento surge quando todos eles trabalham eficientemente em uníssono.

    Os instrutores não eram apenas habilidosos em esgrima. Todos eles, incluindo o Instrutor Ahmed, eram especializados em ensinar. Com sua longa experiência na profissão, haviam criado um currículo eficaz que não ignorava os fundamentos e, ao mesmo tempo, era flexível em relação às regras de ensino.

    Seus olhares aguçados sempre observavam os movimentos dos aprendizes, não falhando em perceber os ajustes e ensinamentos necessários para cada um. As lições eram tão boas que quase faziam todos os aprendizes pensar que os instrutores nasceram assim.

    “O cavaleiro que me ensinou em casa era um homem renomado, mas…”

    “Eles estão em outro nível.”

    “Agora entendo por que a Academia de Esgrima Krono é tão famosa.”

    Se os instrutores eram veteranos no ensino, os aprendizes preliminares eram veteranos em serem ensinados. Pode parecer um jogo de palavras, mas é um fato. Eles já haviam sido ensinados por muitos professores.

    E, como veteranos, sabiam que conhecer os instrutores da Academia de Esgrima Krono era um evento transformador, o que os tornava ainda mais determinados.

    Eles se concentravam em aprender o máximo possível nas aulas e usavam a noite para revisar o que haviam aprendido com os colegas ou sozinhos. Parecia que os cem jovens mais diligentes do continente haviam se reunido ali. Mas havia uma pessoa que todos consideravam estar acima de todos.

    — Ele é persistente. Tenho que admitir isso.

    — Sim… ele é definitivamente o mais intenso.

    Alguns aprendizes olhavam admirados para Airen Farreira, que balançava sua espada em silêncio em um canto do salão de treinamento. ‘Incrível’ não era o suficiente para descrever seu esforço. Dizer que ele era estranho parecia impreciso. A palavra que melhor o descreveria era ‘assustador’.

    Não havia mudança em suas emoções ou ações, enquanto ele treinava todos os dias sem expressão, como um boneco em uma peça de teatro. Os aprendizes sentiam uma pressão desconhecida ao observá-lo.

    “Ainda assim, não há como ele conseguir uma boa nota no exame final.”

    “Ele não tem tempo suficiente. Não pode alcançar os outros em poucos meses… Não é possível.”

    Mas essa pressão não tinha um efeito significativo neles. Mesmo que o garoto tivesse se destacado em um aspecto, ainda era um novato. Uma semana com Rune Tarhall não foi um tempo de magia. Foi mais um teste para ver se ele tinha o que era necessário para permanecer na academia. O Nobre Preguiçoso sabia disso muito bem.

    “Nada mudou.”

    Ele era o mesmo de quando entrou na academia. Embora estivesse atrás, não estava desesperado. Por isso, ainda conseguia treinar esgrima.

    — Oh? Você está começando a parecer um espadachim de verdade. Quer umas lições da sua irmã mais velha? — uma voz perguntou.

    — Estou bem. Só um momen… — disse Airen.

    — O quê? Você acabou de me rejeitar? Como ousa, você, da classe C. Eu, Judith, uma das mais bem classificadas até na classe A, estou generosamente tentando te dar uma lição, e você ousa me negar? — disse Judith em um tom teatral. Mas Airen parecia estar perdido em seus pensamentos, então ela ficou um pouco envergonhada.

    — Hã? Hã? Hmm? Ei, ei, ei! Fala comigo por um segundo! Qual é! Não estou tentando te incomodar. Só queria te ensinar. Seu equilíbrio estava ruim quando você fechou a distância agora há pouco…

    Nada havia mudado, exceto Judith, que se desculpou com Airen e parou de ser hostil com ele. Ela começou a visitá-lo de vez em quando desde então.

    O garoto abaixou a espada e olhou à distância. Uma garota de cabelos prateados estava treinando com uma expressão fria. Ele a observava, sabendo que suas habilidades de esgrima eram muito mais avançadas que as dele. Mas ele não sentia inveja dela, nem mesmo a admirava.

    — O que… Por que você parou? Ficou cansado porque eu estava falando ao seu lado? — Judith perguntou.

    — Não, não é nada. Pode me explicar mais sobre o que acabou de dizer? — Airen balançou a cabeça e se virou de volta para Judith. E quando pegou a espada novamente, estava como antes.

    Mais um dia na Academia de Esgrima Krono havia terminado.


    Um mês havia se passado desde o exame intermediário. Os aprendizes preliminares agora estavam muito mais próximos uns dos outros. Era comum vê-los em grupos durante as refeições e no tempo pessoal após as aulas. Isso representava uma mudança considerável na atmosfera; antes, havia apenas uma rivalidade tensa entre eles.

    Isso se devia ao fato de o currículo da academia ter mudado o foco do treinamento físico para o treinamento de esgrima. A espada era um tipo de arma, e uma arma era uma ferramenta usada para lutar contra um inimigo. Então, como método de uso dessa ferramenta, a esgrima naturalmente exigia um oponente para treinar. Assim, muitos aprendizes passavam o tempo após o jantar duelando com colegas de habilidades semelhantes. Os instrutores também incentivavam isso, desde que fosse feito sob a orientação dos assistentes, pois a experiência de luta real era tão essencial quanto o treinamento sozinho.

    — Ei! Duela comigo! — Judith gritou.

    — Tudo bem…

    Até Airen Farreira, que costumava ficar sozinho nos primeiros dias da academia, havia encontrado uma parceira em Judith, então não era surpresa que quase todos os aprendizes também tivessem encontrado o seu.

    Mas apenas uma pessoa, Illia Lindsay, continuava a treinar sozinha. Isso porque ela era muito diferente dos outros aprendizes na academia.

    — Ouvi dizer que a esgrima da família Lindsay é incrível.

    — Sim. Dizem que os Lindsay estão entre os dez melhores do continente, assim como a Academia de Esgrima Krono.

    — O quê? Então por que ela veio para cá?

    — Droga! Que inveja. Se ao menos eu tivesse nascido na família Lindsay…

    Primeiramente, ela nasceu diferente. Sua família estava no topo de inúmeras famílias e academias de esgrima prestigiadas e excepcionais. Passou sua juventude com o melhor apoio e os melhores professores, considerado o ambiente ideal para treinar esgrima. No entanto, sua família não era o único motivo de suas habilidades excepcionais.

    — Incrível… Esse movimento foi impecável — elogiou o Instrutor Ahmed, reconhecendo seus talentos extraordinários.

    — Obrigada, senhor — disse Illia.

    — Ela está… em uma liga própria. — Até mesmo os aprendizes da classe A tinham que reconhecer suas habilidades.

    E essa era outra diferença em relação aos outros aprendizes. Por mais talentosos que fossem, eles eram insignificantes em comparação com a garota de cabelos prateados, considerada a melhor da história até mesmo em sua família.

    Mas havia uma diferença mais significativa entre Illia e os aprendizes comuns. Ela não estava visando se tornar uma aprendiz formal da Academia de Esgrima Krono. Ninguém, pelo menos entre os aprendizes preliminares, sabia disso, mas havia um ar que se podia sentir em relação a ela, mesmo que não fosse dito. Os aprendizes sentiam-se estranhos com o modo como Illia agia, como se houvesse um muro entre eles. E isso se transformava em um sentimento desconfortável.

    Era por isso que ninguém mais tentava fazer amizade com ela. Alguns aprendizes que queriam se aproveitar da fama da família Lindsay no início, assim como alguns dos seguidores de Brett, mudaram e frequentemente a insultavam.

    — Ela vai treinar em segredo de novo?

    — Provavelmente. Ela não mostraria a esgrima secreta da família para camponeses como nós, não é?

    — Por que ela veio para cá, então?

    — Verdade? Talvez ela tenha vindo só para se sentir superior a nós.

    — Que arrogante.

    — Pois é.

    Após o jantar, alguns aprendizes observavam e zombavam de Illia Lindsay enquanto ela se dirigia a uma das pequenas salas de treinamento, enquanto a maioria se dirigia ao Grande Salão de Treinamento. A garota de cabelos prateados os ouviu, mas não era a primeira vez que ouvia as pessoas falando pelas suas costas. Graças aos seus sentidos aguçados e habilidades físicas altamente desenvolvidas, ela percebia os insultos sussurrados ao seu redor. Ela também sabia que aqueles que agora a insultavam, tentaram ser amigáveis antes.

    “Não é algo para se irritar.”

    Ela entendia que essa era a natureza das pessoas. Elas não sabiam nada sobre seu passado, presente ou futuro, mas ainda assim esperavam algo dela e acabavam desapontadas. Portanto, não havia motivo para se sentir magoada por elas.

    A única coisa que podia fazer era aproveitar seu dia ao máximo, como fez ontem, e terminar em primeiro lugar no exame final, assim como fez no exame intermediário.

    “Isso é tudo o que preciso fazer.” Illia Lindsay suspirou com o pensamento, então segurou uma espada de madeira. Estava prestes a praticar a esgrima da família Lindsay na pequena sala de treinamento, onde não havia outros aprendizes ou instrutores assistentes presentes.

    Então, ouviu passos sobre folhas caídas e estreitou os olhos. A única verdade sobre os insultos era que ela odiava que os outros a observassem treinando. Com tanto espaço disponível na academia, ela não queria praticar esgrima com pessoas por perto.

    Por isso, ela liberou sua aura em direção à pessoa que se aproximava. Assim como o Instrutor Ahmed havia feito no primeiro dia da academia, Illia Lindsay estava liberando sua força, que tinha pressão suficiente para deter seu oponente. Era impressionante que uma garota de doze anos conseguisse liberar esse tipo de energia, que, embora não tivesse força física, era o bastante para abalar a mente de alguém.

    Mas a pessoa não parou, e a garota franziu o cenho.

    Ela intensificou sua aura e a focou no aprendiz que se aproximava. E essa era uma habilidade excepcional, algo que Ahmed, Karaka ou até mesmo o diretor, Ian, ficariam surpresos em testemunhar.

    Mas, mesmo assim, não deteve a pessoa. Illia Lindsay eventualmente teve que recolher sua aura quando o aprendiz chegou até ela. Na verdade, ela sabia que não o pararia com essa habilidade. Como sabia? Era óbvio demais para ser perguntado. Qualquer um entre os cem aprendizes responderia que seria impossível abalar a mente dele. Tal era a determinação daquele garoto.

    — O que você quer?

    Illia perguntou com seu olhar habitualmente inexpressivo. Estava ainda mais fria, sem perceber. E Airen Farreira, em vez de responder, tirou algo do bolso e entregou para ela.

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