Índice de Capítulo

    Já fazia um tempo desde que Vulcanus, o ferreiro, havia se reencontrado com Airen Farreira. No entanto, ainda vivia todos os dias em desespero.

    Quando fechava os olhos, ainda podia ver aquela espada. Bem, na verdade, conseguia vê-la mesmo de olhos abertos: a espada incrivelmente magnífica que superava sua décima espada de Vulcanus, que ele havia forjado com tanto orgulho.

    “Aquilo… aquilo foi algo que um deus dos ferreiros teria criado”, pensou o anão.

    A espada larga ainda era tão resistente quanto a que Airen segurara pela primeira vez. Só isso já a tornava comparável a artefatos míticos. No entanto, a elegante grande espada dourada que apareceu diante de Vulcanus superava em muito sua antiga glória. Desde a nitidez do fio, o equilíbrio e a durabilidade até a beleza do punho e os detalhes, a espada era impecável. O anão não precisava nem olhar de perto para saber. Seus olhos ardiam como se fossem consumidos pelo fogo antes de perder a consciência.

    — Estou acabado… — murmurou o anão melancolicamente ao relembrar o momento pela centésima vez antes de tomar um gole de sua bebida.

    Ele simplesmente não conseguia evitar, não que beber resolvesse seus problemas. Estava acabado. A espada larga que ele jamais poderia superar apareceu diante dele.

    Sentindo um desespero que nunca experimentara em toda a sua vida, o anão virou mais um gole de uísque forte.

    Já havia terminado três garrafas quando ouviu uma voz.

    — Posso entrar, senhor? — perguntou uma voz gentil e suave, mas firme.

    Era Airen Farreira. Vulcanus ficou longe de se sentir animado ao vê-lo, ainda carregando a vergonha de ter declarado com tanto orgulho sua vitória sob a ilusão de ser o maior ferreiro da história.

    “Perdão, Lorde Vulcanus! Se disser isso, eu o perdoarei e aceitarei você como o dono da décima espada de Vulcanus.”

    — Aaaargh! Aaaargh! — gemeu o anão ao reviver o momento traumático, puxando os próprios cabelos.

    A garrafa de uísque caiu no chão com um clang, mas Vulcanus não se importou. Em vez disso, começou a se debater ao lado da garrafa como se estivesse em transe.

    No entanto, Airen permaneceu calmo, como se já esperasse algo assim ao vir ou como se isso não o incomodasse em absoluto. Caminhando em direção ao anão, nem devagar nem depressa, segurou a mão do ferreiro e canalizou sua aura.

    Woosh!

    No caminho da Casa Lindsay para a propriedade Farreira, Airen teve uma nova epifania sobre auras.

    “Preciso manifestar minha aura apenas para ameaçar meus inimigos?”

    “De forma alguma”, concluiu.

    Na maioria das vezes, as auras eram usadas de maneira agressiva, seja para intimidar o inimigo ou invocar uma Aura da Espada. No entanto, a própria aura não era inerentemente prejudicial. Pelo contrário, quando pensava na aura interna, percebia que o efeito era o oposto. A aura o acalmava, reacendia sua paixão ou lhe dava coragem para enfrentar ameaças externas. Sendo assim…

    “E se eu puder manifestar esse tipo de aura benéfica para ajudar outra pessoa?”

    “Talvez eu possa criar mudanças para o bem.”

    Airen tinha certeza. Na verdade, já havia feito isso antes. Impediu Greyson de se tornar um demônio na Terra da Provação e dissipou as trevas que tomavam a mente de Illia Lindsay. Até mesmo quando enfrentou o diabo bufão dentro da barreira, sua aura ajudou a encher os membros da equipe expedicionária de esperança, como um farol.

    “Se algo mudou… é que antes eu confiava apenas no instinto.”

    Mas agora, Airen havia alcançado um novo patamar em seu domínio da espada e manipulação de aura, bem como em sua força mental. Seu conhecimento e experiência criaram uma nova disciplina que refinou seu instinto. Usando a Arte dos Cinco, Airen refinou a energia do fogo e acrescentou os fundamentos da manifestação junto à energia da água.

    A aura finalmente começou a se infiltrar no corpo de Vulcanus, preenchendo-o com calor, paz, conforto e outras energias positivas.

    Vulcanus sentiu a mudança. Ainda atordoado pelo efeito do álcool, ergueu os olhos com uma expressão confusa. Embora ainda parecesse abatido, um brilho retornava a seu olhar.

    Ao perceber essa transformação, Airen então usou feitiçaria, manifestando sua determinação e fé interior de forma quase palpável.

    Swoosh!

    Os olhos de Vulcanus se arregalaram. Apesar de sua aparência, possuía sentidos aguçados e um instinto inigualável. Afinal, foi graças a eles que escolheu Airen como campeão sem sequer observar seus movimentos dois anos atrás. Ele viu que o jovem tinha um coração de aço.

    Então… o que aconteceu com ele agora?

    — Que absurdo… — murmurou o ferreiro anão, sentindo claramente uma vontade maior e mais nobre do que a que sentira dois anos atrás.

    Era como se pudesse tocá-la. Sua coragem foi reacendida. Uma imensa inspiração deu a Vulcanus uma nova esperança.

    Talvez agora ele pudesse fazê-lo. Se pudesse permanecer ao lado de Airen Farreira, que havia crescido além do que ele poderia imaginar, talvez pudesse criar uma espada magnífica. Talvez nunca rivalizasse a espada dourada de Airen, mas certamente superaria sua décima peça.

    — Por favor, permita-me permanecer nesta terra… — pediu o ferreiro anão respeitosamente, após se levantar e sacudir a poeira.

    — Claro — respondeu Airen suavemente, com um sorriso.


    — Aff, Airen… O que você fez? Como conseguiu convencer essas pessoas, digo, esses mestres artesãos, a ficar? — perguntou Kiril.

    — De fato! É incrível, jovem mestre! O barão ficará tão feliz ao saber disso! — acrescentou Marcus.

    — Hã? Por quê? — perguntou Airen.

    — Que lorde não daria as boas-vindas aos maiores artesãos do continente em suas terras? A propriedade Farreira se desenvolverá significativamente. Imagine… você conseguiu isso assim que voltou para casa. Sua piedade filial é inigualável!

    Airen observou Lulu, que parecia atordoada com o desenrolar repentino da situação, e Kiril e Marcus, que o parabenizavam com alegria.

    Para ser honesto, sentia-se mais como Lulu do que como Kiril ou Marcus. Afinal, ele não fizera isso pelo bem da propriedade Farreira ou de seus pais.

    “Eu só não queria deixar Vulcanus sozinho…”

    Claro, não se sentia ofendido de forma alguma. Por mais confuso que estivesse, ainda se sentia bem. No entanto, uma palavra de Marcus o pegou de surpresa: piedade filial. A expressão reverberou na mente de Airen.

    “Pensando bem, entre todas as pessoas, eu fui quem mais negligenciou meus pais…”, refletiu.

    Após sua conversa com Phillip, começou a se concentrar mais naqueles de quem gostava, sentindo-se culpado por tê-los deixado para trás por seus ideais abstratos, apesar de ter recebido tanto apoio e amor.

    Se havia alguém que negligenciara mais do que todos, era sua família, especialmente seus pais. Imaginar que ele só havia ferido aqueles que o apoiaram por mais tempo…

    “Não, isso é desnecessário”, pensou Airen, balançando a cabeça. Embora não pudesse mudar o fato de ter passado dez anos confinado em seu quarto, causando grande aflição aos pais, remoer o passado não alteraria nada. Assim como não poderia permitir que o futuro o controlasse, também não poderia permanecer preso ao passado. Ele não podia esquecer seu antigo eu como um nobre preguiçoso problemático, mas precisava focar no presente em vez de se lamentar pelo que passou.

    — Marcus — chamou, reunindo seus pensamentos.

    — Sim, jovem mestre — respondeu Marcus.

    — Que tipo de presente você acha que agradaria mais meus pais?

    — Perdão? Achei que já tivesse preparado seus presentes.

    — Bem, estou apenas preocupado. Kiril e eu pensamos muito sobre isso… mas e se eles não gostarem?

    — Você foi quem esteve ao lado de meus pais por mais tempo, então gostaria de saber se tem alguma ideia melhor.

    — Jovem mestre… acho que você não precisa se preocupar.

    — Hã?

    — O que quero dizer é que você já tem o maior presente que eles poderiam desejar — disse Marcus seriamente.

    Airen olhou para ele, curioso. Preparara um vinho refinado para seu pai e um frasco de perfume para sua mãe. Embora tivesse conseguido presentes decentes, não achava que fossem dignos de tal elogio. Foi então que ouviu um alvoroço.

    Airen e Kiril trocaram olhares antes de se moverem rapidamente.

    Spoof.

    Whoosh!

    Utilizando aura e feitiçaria, os irmãos se deslocaram velozmente e chegaram diante do Barão e da Baronesa Farreira no exato momento em que entravam acompanhados pelos cavaleiros.

    Harun Farreira ergueu os olhos, surpreso. Amelia Farreira também levantou o olhar, mas então sorriu docemente. Atrás deles estavam os cavaleiros, incluindo Sir Orlin Jukran.

    “Há mais pessoas que não reconheço”, pensou Airen.

    Ao perceber que estivera fora de casa por muito tempo e tomado por uma mistura de alegria e arrependimento, Airen Farreira se curvou profundamente.

    — Estou de volta, mãe, pai — disse, com a voz embargada.

    O silêncio caiu. Ninguém ousou dizer nada ou sequer se mover. Mas isso não era apenas porque os pais estavam finalmente se reunindo com seu filho após dois anos.

    Por trás daquele momento glorioso estava a sombra que atormentara os Farreira por tanto tempo. Assim, essa redenção emocionou a todos os presentes.

    — Oh, vamos entrar. Você deve estar cansado da viagem, e eu tenho muitas histórias para contar. Gostaria de ouvir sobre vocês também. Além disso, trouxe alguns presentes. Hm… não sei se vão gostar, mas… — começou Airen, atropelando as palavras.

    Estava tão nervoso quanto sempre, mas não conseguia evitar. Afinal, suas emoções estavam completamente à flor da pele.

    Felizmente, os Farreira não se incomodaram nem um pouco com o jeito atrapalhado do filho.

    Claro…

    — Airen — chamou Harun.

    — Sim, pai — respondeu Airen.

    — Ouvi dizer que você se tornou um mestre espadachim.

    — Poderia nos demonstrar?

    Bem, todo pai quer ver o melhor de seu filho.

    As palavras de Harun fizeram Airen ter uma súbita realização.

    “O maior presente… sou eu”, pensou, recordando o que Marcus dissera mais cedo.

    De fato. Assim como havia causado dor aos pais por tanto tempo, agora podia lhes trazer alegria melhor do que qualquer outra pessoa. O fato de ter crescido tanto era um presente em si.

    Finalmente compreendendo isso, o nobre preguiçoso, não, Airen Farreira, o orgulho da Casa Farreira — abaixou a cabeça.

    — Como desejar — disse, invocando sua grande espada dourada.

    A energia dourada disparou para o alto. Era uma Aura da Espada perfeita.

    Os cavaleiros arregalaram os olhos ao verem pela primeira vez a espada de um mestre espadachim.

    — Oh…

    — Hã, oh!

    — Uau…

    Todos, desde os cavaleiros que haviam se juntado recentemente à Casa Farreira até aqueles que conheciam Airen desde quando ele ainda era um especialista, e até mesmo Sir Orlin Jukran, que servira ao lado de Harun por tanto tempo, ficaram sem palavras. Quer conhecessem Airen ou não, todos assistiram, maravilhados, enquanto sua Aura da Espada se erguia rumo ao céu.

    No entanto, os olhares de Harun e Amelia Farreira estavam voltados para outro lugar.

    Lágrimas caíram dos olhos de Airen enquanto o casal olhava com orgulho para seu filho, o que mais importava para eles, em vez de para a Aura da Espada, símbolo da grandiosidade de um mestre espadachim.

    — Estou de volta — repetiu ele.

    A notícia do jovem herói e mestre espadachim, que redimiu seu nome após anos sendo chamado de nobre preguiçoso, abalou o Reino Heyle e as seis grandes famílias.

    Um pequeno gesto, um grande impacto.

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