Capítulo 294: Companheirismo Incômodo (3/4)
Pensando bem, ele costumava culpar os outros no passado.
Claro, ele jamais ousaria dizer que era perfeito e que nunca cometeu erros. Afinal, era inegável que perder a própria mãe em um acidente aos cinco anos, antes mesmo de ter consciência de sua identidade, era algo terrível. Não seria estranho que alguém se trancasse no próprio quarto por anos.
No entanto…
“O motivo pelo qual não saí do meu quarto por dez anos foi porque eu não suportava as pequenas tragédias.”
Dos dez aos quinze anos, Airen Farreira acreditava que todos o olhavam com desprezo e sussurravam insultos pelas costas. O Nobre Preguiçoso. O vagabundo de Farreira. Como um vento frio e cruel, essas palavras o atingiam, forçando-o a se encolher ainda mais em seu próprio buraco e em seu mundo dos sonhos, esperando que tudo um dia parasse.
Mas, é claro, isso nunca aconteceu. No começo, Airen não percebia. Mesmo quando o homem de sua vida passada lhe deu uma espada e o despertou de seu profundo sono pela primeira vez em muito tempo, o vento cruel continuou soprando.
As pessoas ainda não olhavam para ele com gentileza. Isso persistiu até que ele entrou na Academia de Esgrima Krono, ou até que as seis famílias do sul realizaram uma reunião. Foi então que Airen percebeu que o vento não cessaria e que não havia nada que ele pudesse fazer a respeito. Em vez disso, precisava se lembrar de algo importante.
“Em vez de me preocupar com o que está ao meu redor e que não posso mudar, preciso me tornar forte o suficiente para suportar tais dificuldades”, pensou.
Foi provavelmente nesse momento que o verdadeiro esforço de Airen Farreira começou. Para mudar de alguém que se deixava abalar até pelas menores dificuldades e se enterrava em um buraco, ele endireitou as costas e ergueu o olhar. Treinou e praticou sua esgrima com ainda mais dedicação, não apenas para perseguir a sombra do homem de seus sonhos, mas para se tornar um homem melhor por si mesmo.
Então, um vento ainda mais severo começou a atacá-lo. Mas tudo bem. A partir daquele momento, Airen começou a aprender a viver contra o vento.
“Não foi fácil”, refletiu.
O evento nas Montanhas Alhaad. O encontro fatídico com Ignet Crecensia. As inúmeras perguntas sobre ele e sua espada. Nada disso foi fácil. No entanto, Airen não desistiu.
Para ser honesto, ele não teve tantas dificuldades quanto antes. Sem perceber, passou a estar cercado por pessoas tão confiáveis quanto, não, ainda mais confiáveis que o homem de seu sonho. Lulu, que lhe ensinou os milagres da mente. Khubaru, que lhe ensinou os fundamentos da Arte dos Cinco. Judith, com sua paixão ardente. Brett Lloyd, com sua paciência como um rio. Illia, sua amada. Muitos outros entraram em sua vida e lhe ensinaram novas lições. Ele aprendeu sobre amor e confiança.
De fato, a vida não era feita apenas de desafios. Ela também oferecia os nutrientes que o faziam crescer mais forte. Para Airen Farreira, que agora se erguia como uma árvore robusta, os desafios do presente não eram nada.
— Eu diria que sou bastante grato — disse ele.
— O quê…? — murmurou Jarin, confusa com o comentário enigmático de Aron.
Mas a história dele não era difícil de compreender. Ela conseguia simpatizar com seus pensamentos e sentimentos de maneira natural, como se ele estivesse se comunicando não com palavras, mas com algo mais instintivo.
Ainda assim, ela não conseguia entender de onde vinha essa gratidão. Felizmente, sua curiosidade logo foi satisfeita.
— Todos cuidaram de mim com genuína preocupação — explicou ele.
— Isso é o suficiente para me ajudar a enfrentar os desafios que estamos encarando agora — disse Airen, fechando os olhos serenamente.
Ele não estava brincando. O que Jarin acabara de lhe dizer significava muito para ele. Não apenas era uma expressão de sua boa vontade, mas também lhe trouxe outra lembrança.
“Parece que amadureci bastante comparado ao que fui antes”, pensou Airen, sorrindo suavemente.
Se fosse quem era no passado, não teria sido capaz de suportar o que estava acontecendo agora. Quando tinha menos de quinze anos, simplesmente dormia para fugir das zombarias e críticas. Depois dos quinze, confiava apenas na espada de aço que o homem de sua vida passada lhe mostrou. De qualquer forma, ele estava fugindo.
Agora, porém, era diferente. Pequenos desafios não o abalavam mais. Pelo contrário, a boa vontade dos outros nutria seu crescimento e o tornava mais forte. De fato, embora os desafios de antes e de agora fossem diferentes, ele havia mudado.
— Ah, me desculpe por fechar os olhos no meio da conversa. Só estava refletindo sobre algo… — Airen se desculpou.
— De qualquer forma, estou bem, de verdade. Além disso, vamos sair da Floresta Tamoe em alguns dias. Depois disso, as coisas não serão tão perigosas, então…
— Por que você esconde sua identidade? — perguntou Jarin.
— Bem, acho que você não escondeu. Você revelou desde o início, mas nós não ouvimos — murmurou Jarin, finalmente percebendo quem era o jovem à sua frente.
“Já achei estranho”, pensou.
Mesmo sendo diligente em suas responsabilidades e respeitoso com os outros, o jovem não parecia servil, mas confiante. No início, Jarin achou que tudo isso era uma farsa, considerando-o um impostor desprezível.
Agora, porém, ela conseguia enxergar. Mesmo sem ver a espada dourada, símbolo do jovem herói, ou a Aura da Espada, prova de um mestre espadachim, ela podia afirmar com certeza quem ele era.
— Airen Farreira — murmurou.
— Há um motivo para manter sua identidade em segredo? — perguntou.
— Um…
Airen olhou para trás com um sorriso sem graça.
Para ser sincero, ele tinha um motivo, embora simples. Queria viajar em paz, observar como o continente havia mudado durante sua ausência e ver como as pessoas estavam.
“Bem, acho que acabei me concentrando mais em mim do que no continente…”, pensou.
Mas isso não foi algo ruim. Pelo contrário, ele diria que foi algo bom. Sentiu-se mais confiante do que nunca quando enfrentou o velho dos Inquisidores antes de sua jornada.
— Airen? Ou devo dizer Lorde Airen? — chamou Jarin.
— Não, por favor, não faça isso — murmurou Airen.
— Então me diga. Por que escondeu sua identidade?
— Bem, é que… acabei perdendo a oportunidade de falar. Além disso, queria viajar em paz.
— Entendo. Bem, isso faz bastante sentido. Deve ser difícil ser famoso.
— Haha…
— Mas não seria melhor contar a todos agora, com tudo o que está acontecendo?
— Hm… acho que não.
Após um momento de hesitação, Airen balançou a cabeça.
Jarin insistiu para que ele dissesse a verdade.
— Não seria constrangedor revelar agora? — ele perguntou.
— Eu também ficaria envergonhada de admitir depois de tanto tempo.
“Ele é mais simples do que pensei”, refletiu Jarin com um sorriso antes de voltar para seu lugar. Sentia-se melhor.
Cinco dias se passaram.
Felizmente, nenhum outro ataque aconteceu. As pessoas deixaram a Floresta Tamoe alegres e agradeceram à Guilda Wise. Embora não tivesse ocorrido uma batalha, a guilda desempenhou um papel fundamental em garantir a segurança do grupo. Só isso já era um grande feito.
— Ufa, finalmente acabou.
— Pois é. Vamos tirar uma semana de descanso quando chegarmos à cidade.
— Sim. Acho que devemos nos separar do grupo atual.
Ethan e Giovanni começaram a discutir seus planos.
Com exceção dos que tinham outro destino, a maioria dos viajantes que seguiam para o Reino Sagrado viajaria com Gael Wise. Ethan e seu grupo, no entanto, não tinham motivos para acompanhá-los. Embora estivessem fisicamente bem, estavam à beira do colapso mental. Precisavam descansar e se recuperar.
“Mas talvez fosse melhor partir logo em vez de prolongar a pausa”, pensou Ethan enquanto observava discretamente o ambiente. Afinal, não estavam exatamente em boa situação, especialmente Aron.
Talvez por causa dos rumores distorcidos, a maioria agora o olhava com desprezo. Embora ninguém tivesse coragem de confrontá-lo, zombavam dele abertamente. Ethan não conseguia imaginar o quanto o jovem devia estar sofrendo.
Felizmente, Jarin, que antes não simpatizava com Aron, parecia agora se importar com ele.
Ethan olhou para o humano, a elfa e o anão que conversavam tranquilamente e suspirou.
— Socorro! — alguém gritou.
— O que está acontecendo?
— Precisamos da ajuda da Guilda Wise! Há um demônio!
Dois homens, claramente soldados derrotados, aproximaram-se a cavalo em grande velocidade.
Todos franziram a testa ao ouvir a notícia. Pelo que disseram, um dos grupos a caminho do Reino Sagrado foi emboscado, e a maioria foi levada para o covil do demônio.
— O que devemos fazer?
— Ah…
As pessoas se entreolharam.
Normalmente, não hesitariam. No entanto, a maioria ali eram apenas aventureiros ou mercenários motivados por dinheiro; nenhum deles se atreveria a enfrentar não apenas uma criatura demoníaca, mas um verdadeiro demônio. Naturalmente, todos voltaram os olhos para o líder da Guilda Wise.
Gael Wise avançou calmamente. Com um sorriso sereno, perguntou:
— Sabemos o tamanho das forças do demônio?
A voz, que transmitia tranquilidade, também transparecia confiança. E, claro, havia razão para isso. A Guilda Wise era poderosa o suficiente para enfrentar até um reino inteiro. Com um mestre e cinco especialistas, não havia motivo para temer um demônio. Assim, Brodie Sharper e a força de elite da guilda ouviram o relato com calma.
No entanto, quanto mais os soldados falavam, mais grave se tornava a expressão dos membros da guilda.
“Isso…”
“Isso não se trata de apenas um demônio. Pode haver vários ou…”
“Pode haver um diabo!”
Mas não havia escolha.
O grupo emboscado não era inexperiente. Entre eles, havia quatro especialistas. No entanto, não apenas foram aniquilados, como alguns foram levados. Isso indicava que o demônio não estava sozinho.
A opinião de Gael Wise também mudou. Normalmente, ele teria avançado sem hesitar. Afinal, como poderiam os participantes de um evento destinado a trazer esperança ao continente ignorar a desgraça alheia? Além disso, algumas das vítimas sequestradas eram elfas.
Se um diabo estivesse envolvido, porém, a situação era completamente diferente. Diabos eram inimigos difíceis até mesmo para um mestre espadachim e um grande sacerdote, quanto mais para um mero especialista.
“Não há o que fazer. Temos que deixar os cavaleiros sagrados de Arvilius lidarem com isso…”, pensou Gael Wise, prestes a falar.
Foi então que um jovem avançou pela multidão e se aproximou dos soldados.
— O que há com esse cara?
— Lorde Wise está prestes a falar…
— Por que ele está se metendo? Quem ele pensa que é?
— Ele realmente acredita que é Airen?
— Pfft, talvez!
— Ele deve estar louco!
As pessoas não o olhavam com simpatia nem o incentivavam. Algumas haviam sido influenciadas pelos rumores, outras se escondiam atrás do poder da Guilda Wise. Alguns apenas queriam descarregar sua frustração em alguém conveniente. Outros preferiam ficar calados. Para o grupo ali, Aron era apenas isso.
Mas nem todos concordavam.
Jarin, por exemplo, correu atrás do jovem e perguntou baixinho:
— Você vai contar a verdade?
— Sim — respondeu ele.
— Pensei que quisesse manter isso em segredo.
— Mas não ficariam mais tranquilos se soubessem a verdade?
A conversa estranha e a calma misteriosa fizeram muitos franzirem a testa. Alguns mais impacientes chegaram a murmurar palavrões.
Swoosh!
Uma espada dourada surgiu do nada.
Woooosh!
Então, uma deslumbrante Aura da Espada floresceu de seu interior. Sua luz, em vez de ofuscante, parecia aquecer e acalmar os corações.
— Me digam onde eles estão — disse Airen.
— Hã…? — os soldados hesitaram.
— Se me disserem onde estão, irei imediatamente.
— Ah… ali… — gaguejaram os soldados, apontando na direção.
Aron, não, Airen, assentiu.
Lançando um breve olhar a Jarin, ele se virou e declarou:
— Airen Farreira, graduado da 27ª turma da Academia de Esgrima Krono, fará o seu melhor.
Clang!
A espada dourada rasgou o solo.
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