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    “Como ela chegou aqui…?”

    Gael Wise não pensou muito quando Jarin veio encontrá-lo no subterrâneo. Ela era filha do chefe da tribo Karani, mas ele havia cortado laços com eles há muito tempo. Agora, havia várias maneiras de lidar com a situação, mas ele decidiu que a subjugaria primeiro e tomaria seu tempo para decidir o que fazer, assim, não precisaria recorrer a medidas drásticas.

    É claro que estava curioso sobre o motivo de ela ter vindo até aqui procurá-lo, mas, no momento, concluir seu trabalho era uma prioridade maior. “Posso perguntar depois”, disse a si mesmo.

    No entanto, essa linha de pensamento se dissipou no instante em que uma terceira pessoa apareceu.

    “Airen Farreira!”

    Os olhos de Gael se arregalaram. Era Airen Farreira, o jovem herói de Heyle, o homem que empunhava uma espada dourada com a mesma facilidade com que seguraria um galho. Alguém com quem Gael não podia se dar ao luxo de se tornar inimigo, pelo contrário, precisava tê-lo ao seu lado para garantir seu próprio futuro. Na verdade, desde que a identidade do mestre espadachim havia sido revelada, Gael vinha pensando profundamente em como poderia construir uma relação amistosa com ele.

    Mas nada disso importava agora. Pois uma raiva sutil emanava do corpo de Airen, sua expressão tão rígida quanto pedra, o completo oposto de seu eu habitual, sempre amigável.

    No instante em que Gael viu isso, a realização o atingiu. “Ele sabe!”

    Não fazia ideia de quanto o jovem mestre espadachim havia descoberto, mas parecia que ele tinha uma noção geral. Isso não era bom. Considerando a influência da Guilda Wise e sua própria posição social, Gael estava certo de que não se meteria em grandes problemas…

    Mas esse pensamento não durou muito.

    Quando percebeu que Airen estava avançando em sua direção sem hesitar, Gael gaguejou em pânico e perplexidade.

    — Espere…

    Pow!

    — Ugh!

    “Ele… ele realmente me atacou? A mim, Gael Wise?”

    Esse foi o último pensamento de Gael antes de perder a consciência. Ele caiu pateticamente no chão, sem ninguém para amparar sua queda. Nenhum subordinado sequer se aproximou para verificar seu estado.

    Os dois homens que estavam atrás de Jarin pareciam inquietos.

    “O que fazemos agora?”

    “Devemos fugir? Não, não podemos…”

    Antes, quando estavam apenas com Jarin, tinham se sentido arrogantes e confiantes. E, claro, tinham razões para isso, eram espadachins no nível especialista, capazes de eliminar instantaneamente mercenários de classificação prata sem esforço algum.

    Mas poder é algo relativo. E agora, não podiam deixar de se sentir pequenos na presença de um dos apenas duzentos mestres espadachins do continente.

    Um silêncio tenso pairava no ar, tão pesado quanto a escuridão ao redor. Os espadachins especialistas não ousavam pronunciar uma única palavra, tampouco cogitavam fugir. Tudo o que podiam fazer era continuar respirando, em silêncio.

    Nem mesmo Jarin conseguia se mover. Fúria e ódio fervilhavam dentro dela, prestes a explodir como um vulcão. Mas, acima de tudo, ela sentia algo ainda maior vindo desse jovem espadachim loiro.

    “Como…?”

    Airen Farreira fitou Gael Wise caído. Francamente, ele não havia acreditado quando ouviu sobre isso de Jarin. A reputação do homem era simplesmente boa demais. Até mesmo durante os dez anos em que viveu como o Nobre Preguiçoso, Airen ouvira histórias sobre ele. O filantropo que lutava pelos pobres e educava os desfavorecidos. O homem cuja influência positiva ajudara incontáveis pessoas por todo o continente.

    Mas no momento em que Airen chegou a este lugar, ele pôde sentir. A malícia. A escuridão imunda e interminável que exalava tão fortemente para além dessas paredes que era impossível não perceber. Ele não tinha a intenção de rastrear essa presença maligna, havia apenas seguido os rastros da escuridão que esse meio-elfo lançava.

    “Eu sequer poderia chamá-lo de meio-elfo?”

    Ele fechou os olhos e recordou seu passado. Já havia visto algo semelhante antes.

    Iphrain Slick. O desprezível mago idoso que ostentava imenso poder e status, mas que não possuía um pingo de respeito pelos outros. E não era só isso. Ele deixou o Reino Heyle arquitetando vingança, abrigando em seu coração uma malícia muito mais terrível do que ele mesmo podia imaginar.

    Airen não sabia exatamente que tipo de magia Iphrain Slick havia usado naquela época, mas tinha certeza de que sua família teria sido completamente devastada caso o feitiço tivesse sido concluído.

    Terminada sua lembrança, Airen abriu os olhos e absorveu os detalhes do subterrâneo escuro, o aroma floral intenso e a energia sinistra que se fundia a ele. Os dois especialistas que haviam compactuado com esse plano maligno. E, por fim, o meio-elfo que havia orquestrado tudo.

    Não, ele não era nem um elfo, nem um humano… Ele era mais parecido com um demônio.

    “O que devo fazer com ele?”, ponderou Airen com um suspiro. Quando se tratava de demônios, criaturas demoníacas ou seres perversos, não havia o que pensar. Ele podia simplesmente matá-los, sem que houvesse qualquer consequência. Seu único receio era se um dia se deparasse com um demônio poderoso demais para ser vencido.

    Mas qual era o melhor curso de ação para uma situação como esta? Para pessoas como Iphrain Slick, um humano com o coração de um demônio? Ou como Gael Wise, o meio-elfo que era tido como um promotor da paz entre humanos e elfos, apenas para ser descoberto explorando-os da pior maneira possível? Essas pessoas ainda eram membros da sociedade e não podiam ser punidas da maneira que ele quisesse. Isso não se tratava de ele estar qualificado ou não para julgá-los.

    “Se eu punir Gael Wise aqui, isso pode causar problemas diplomáticos, conflitos entre tribos, agitação social…”

    Isso tornava sua decisão ainda mais difícil. Era como na época das Montanhas Alhaad. Sabendo que se arrependeria de qualquer caminho que tomasse, sua mente se via atormentada por um dilema sem resposta. Ele refletiu e ponderou, em agonia.

    Seu coração estava mais pesado do que quando enfrentou o diabo. Airen avançou pela escuridão infinita, segurando apenas uma única espada. Mas a espada dourada, que em qualquer outro momento brilharia intensamente… não era mais luminosa do que uma tocha comum.

    Foi então que…

    — Lorde Gael, está tudo bem? — Três homens surgiram no subterrâneo, tendo ouvido a comoção.

    Eram homens incomuns. Seus espíritos eram muito mais poderosos do que os dois de antes, o que significava que eram pelo menos no nível de especialista ou superior. Mas esse não era o ponto mais importante, o velho à frente do grupo não era ninguém menos que o mestre espadachim Brodie Sharper.

    Com sua chegada, os rostos dos dois especialistas se iluminaram em alívio, enquanto a expressão de Jarin rapidamente se obscureceu.

    “Droga, eu devia ter saído antes!”

    Não era que ela subestimasse a habilidade de Airen Farreira. Quem seria tolo o bastante para menosprezar um mestre espadachim? O problema era que a situação mudava quando o oponente era outro mestre espadachim, especialmente um que conquistou esse título há mais de duas décadas.

    Os olhos de Jarin passaram rapidamente entre Airen Farreira e Brodie Sharper, e logo seu rosto caiu. “Por mais que eu tente imaginar… simplesmente não vejo Airen vencendo quando ele é mestre há menos de cinco anos…”

    Não que ela não tivesse visto sua força. Estava lá quando aconteceu, ainda que tardiamente. Airen não apenas derrotou os demônios, ele purificou toda a terra com sua misteriosa energia dourada. Um espetáculo tão impressionante que ela jamais esqueceria.

    Mas mesmo especialistas podiam derrotar um demônio. Um mestre espadachim era um adversário completamente diferente. Além disso, Brodie Sharper tinha mais quatro homens ao seu lado. E, aparentemente, ele também sabia disso, pois, apesar de ter esculpido uma expressão de preocupação, seus olhos brilhavam com confiança.

    — Lorde Airen Farreira, pare agora.

    Airen não respondeu.

    — Parece que houve um mal-entendido. Acalme-se e não se preocupe. Se puder parar aqui, podemos conversar. Seja razoável…

    Brodie realmente queria dizer isso. Capturar Airen vivo talvez fosse difícil, mas ele estava certo de que venceria a luta. Afinal, tinha anos de vantagem em experiência. O único fator incômodo era o status e a reputação de Airen Farreira.

    “Se nos virarmos contra a Casa Lindsay, a Casa Lloyd e a Academia de Esgrima Krono, não sairemos ilesos…”

    Ele preferia resolver a questão pacificamente. Isso era um fato.

    Mas havia algo que Brodie Sharper não sabia, ele não conhecia a verdadeira habilidade de Airen Farreira. Chegando tarde demais, ele não havia testemunhado como Airen não apenas destruiu o diabo, não um simples diabo, mas um verdadeiro ser maligno, como também obliterou o feitiço póstumo da criatura. Nem em seus sonhos mais selvagens ele teria imaginado algo assim.

    Sem aviso, Airen ergueu repentinamente o braço esquerdo, assustando a todos.

    Ignorando suas reações, ele fechou o punho com força, fazendo com que toda a energia floral no ambiente girasse como um redemoinho antes de ser sugada para sua mão.

    SWOOOOSH.

    A respiração de Brodie Sharper ficou presa na garganta, seus olhos se arregalaram. Ele não conseguia compreender. “Isso é esgrima… ou feitiçaria?”

    Uma coisa era certa, ele não podia simplesmente ficar parado. Cerrando os dentes, puxou sua espada favorita da bainha.

    Nesse instante, Airen, que havia estado olhando para o vazio, voltou seu olhar para Brodie.

    Whoosh!

    — Mph! — Brodie grunhiu, dando dois passos para trás. Ele não podia acreditar. Como Airen o fez recuar com apenas um olhar?

    Mas, infelizmente, isso não era um sonho, nem uma ilusão. O olhar de Airen Farreira ainda queimava com a ferocidade do ferro em brasa, empurrando-o para longe.

    Whoosh!

    Enquanto isso, o fenômeno misterioso continuava. O aroma doce das ervas foi sugado para sua mão, junto com a energia negra que continha, a malícia imunda, comparável aos desejos destrutivos de um diabo. Cada vestígio dela foi absorvido e comprimido em uma esfera na mão de Airen, um aglomerado de energia tão desagradável que fez qualquer um que olhasse franzir a testa.

    Whirrrr.

    O herói loiro levou a esfera até seu colar, o colar dos cinco elementos encontrado no tesouro de Drukali. Ele ainda não podia liberar todo o seu potencial, mas conseguia ao menos usá-lo parcialmente, graças aos esforços conjuntos da feiticeira Lulu e do elementalista Gorha.

    Por fim, o poder dos cinco elementos se revelou: fogo, água, terra, metal e madeira. Um novo espaço, uma nova dimensão criada pelos componentes básicos deste mundo.

    Selando o mal dentro dela, Airen voltou-se para os membros da guilda mercante e percebeu que Brodie Sharper agora investia contra ele.

    Pat-pat-pat-pat-pat.

    Isso não abalou Airen. Ele ergueu a mão direita em resposta, sem interromper o processo de selamento. Uma espada dourada materializou-se em sua mão, brilhando o suficiente para iluminar todo o ambiente. Era uma Aura da Espada de poder avassalador, expandindo-se em questão de instantes, exalando uma energia incrivelmente densa e imponente.

    Airen balançou essa espada e arrastou-a pelo chão, bem onde Brodie Sharper estava prestes a pisar.

    Krrrrr.

    O velho espadachim deslizou para uma parada brusca, quase tombando para frente. Recuperou o equilíbrio e ficou ali, encarando a rachadura no chão por um longo tempo…

    Então, ele não tentou mais atacar.

    No momento em que Jarin, que observava tudo, abriu a boca para falar…

    — Você não está planejando matar todos aqui, está? — uma voz interrompeu.

    Era Gael Wise. Ele havia recobrado a consciência.

    Quando Airen se virou para encará-lo, Gael sustentou seu olhar sem vacilar. Seu rosto estava distorcido em dor, sua respiração era áspera e irregular, mas seus olhos ardiam com uma determinação inquebrantável.

    Lançando um olhar duro ao jovem herói, ele disse suavemente:

    — Se sou culpado, aceitarei de bom grado minha punição no Reino Sagrado. Afinal, qualquer um que não seja um elfo ou de Arvilius é proibido de punir um elfo.

    Airen não respondeu.

    Gael continuou:

    — Você não ousaria ir contra essa regra e fazer o que bem ente…

    — Muito bem. — Airen balançou a espada.

    Swish. Clang! Crrrrack!

    No instante seguinte, todas as espadas dos outros homens se estilhaçaram, incluindo a de Brodie Sharper.

    O rosto de Gael se contorceu em uma careta amarga enquanto Airen acrescentava:

    — Você ficará comigo até chegar lá.

    Um pequeno gesto, um grande impacto.

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