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    Era de manhã cedo, antes do nascer do sol. O servo de Airen Farreira estava ocupado, pois precisava acordar mais cedo que seu mestre. Ele bocejou enquanto se lavava rapidamente e se vestia. Em seguida, pegou o café da manhã simples que havia solicitado no dia anterior e o levou ao quarto do jovem mestre.

    Knock, knock.

    — Meu senhor, posso entrar?

    — Sim, entre — respondeu uma voz atrás da porta.

    Ao entrar no quarto, ele viu Airen Farreira quase terminado com seus preparativos.

    “Não achei que isso fosse durar mais de um dia”, ele pensou.

    Já era o terceiro dia que Airen acordava cedo. Alguns poderiam achar estranho dar tanta importância a isso, mas, para o servo, já era o suficiente para se surpreender. O Lorde Airen nunca havia acordado cedo nos últimos dez anos.

    “E isso não é tudo. Ele treinou por quatro dias seguidos.” O servo terminou seus pensamentos e ofereceu a comida educadamente.

    — Aqui está seu café da manhã, meu senhor.

    — Obrigado — respondeu Airen.

    Airen devorou rapidamente um sanduíche, engolindo-o sem demora, e tomou um gole de leite. Em seguida, comeu outro sanduíche e bebeu mais um gole. Assim, terminou seu café da manhã.

    Isso era mais uma mudança em comparação ao passado. Airen costumava comer refeições muito leves, quando não as pulava completamente. Mal se movia naquela época, então não havia necessidade de comida. Mas agora não era mais assim.

    “Devo comer bem para treinar mais tarde”, ele refletiu com um aceno de cabeça.

    O sonho misterioso ainda o assombrava. Ele teve que adotar a esgrima enquanto o sonho continuava. Não havia como resistir. Ele tentou forçar o sono, mas não conseguiu. Nem sequer conseguiu ficar na cama após sua tentativa fracassada de dormir. Além disso, treinar com sua espada não era tão ruim. Era difícil, mas era…

    “Gratificante, eu diria?” A dor muscular voltava assim que ele empunhava uma espada, e ele sentia uma dor ainda mais forte por todo o corpo ao final de cada sessão. No entanto, não se sentia mal por isso. Parecia que havia encontrado um refúgio naqueles treinos, substituindo o sono que ele tanto evitava.

    — Meu senhor, vai treinar hoje também?

    A voz preocupada do servo tirou Airen de seus pensamentos. Ele parecia preocupado, mas Airen ignorou sua preocupação e assentiu.

    — Sim.

    — Entendido, meu senhor.

    Airen saiu do quarto, e o servo o seguiu de perto. As criadas que limpavam os corredores os viram passar e começaram a cochichar umas com as outras.

    — Uau, ele vai de novo.

    — Isso é surpreendente. Quem diria?

    E não eram só as criadas que comentavam sobre Airen. Servos que acordavam cedo para trabalhar, guardas em patrulha e soldados treinando no salão sussurravam sobre o Nobre Preguiçoso.

    — O jovem mestre está aqui de novo. Já é o terceiro ou o quarto dia?

    — Será que ele superou sua preguiça? Espero que sim.

    — Bah. Eu não acredito. As pessoas não mudam! Se ele fosse mudar, teria feito isso antes.

    — Certo, é verdade.

    A maioria deles parecia incrédula, e Airen sabia disso. Ele não os ouvia dizer isso, mas via em seus rostos. Podia ser preguiçoso, mas não era tolo.

    No entanto, Airen entendia por que eles não acreditavam. Ele não estava com raiva deles por isso. Não tinha o direito de estar, mesmo que quisesse. Ele havia negligenciado seu dever como nobre por dez anos.

    Airen Farreira pegou a espada de madeira comum do suporte e se preparou em silêncio.

    — Hmm. — Ele respirou fundo e começou a se concentrar.

    Fechou os olhos e pensou em um certo homem. O homem do sonho mantinha o foco durante todo treino, sem se distrair. Nem chuva, neve, conversas de crianças ou mesmo uma tempestade o incomodavam. A atenção indesejada que cercava Airen não era nada comparada a isso.

    — Haa… — Airen soltou um suspiro.

    Esse pensamento o ajudou. Após respirar fundo mais uma vez, Airen levantou sua espada silenciosamente e, em seguida, a golpeou com força. Swish! Era um corte reto, de cima para baixo.

    O Nobre Preguiçoso começou seu dia entre os olhares curiosos.


    — Uau, ele está treinando de novo.

    — Pois é, eu sei, certo?

    Dois guardas e um novo recruta, que haviam terminado a patrulha matinal, entraram no salão de treino. No entanto, não vieram para praticar. Eles não eram preguiçosos, mas também não eram exatamente diligentes. Estavam ali apenas para assistir ao famoso Nobre Preguiçoso praticar esgrima.

    Eles tinham apostado em quanto tempo o Nobre Preguiçoso manteria seu treinamento, e hoje era o dia em que prometeram conferir. Tendo trabalhado para a família por muito tempo, não tinham a intenção de desrespeitar o jovem mestre. Mas a situação era excitante demais para simplesmente ignorar, era puro entretenimento para eles.

    Contudo, o jogo não saiu como o guarda veterano esperava.

    — Não pensei que ele fosse treinar por quatro dias seguidos — disse o guarda mais experiente.

    — Eu te disse que o filho do Visconde Gairon mexeu com ele. Ouvi dizer que ridicularizou o lorde Airen de forma indireta, mas foi humilhante o suficiente — comentou o guarda narigudo ao lado.

    — E por que não me contou isso?!

    — Por que eu contaria? Informação é poder. Além disso, todo mundo já sabia — respondeu o guarda narigudo, pegando o dinheiro do veterano e murmurando: — Ele vai tentar manter isso por pelo menos uma semana, heh.

    — Ugh… — O guarda veterano ficou deprimido.

    Entretanto, o novo recruta não prestava muita atenção aos mais velhos. Ele estava focado no lorde Airen. Não tinha dinheiro para apostas ou jogos, mas queria apenas ver de perto um homem famoso. É claro, não planejava ficar olhando por muito tempo. Era desrespeitoso observar por tanto tempo o treinamento de um nobre. Mas esses pensamentos logo desapareceram quando ele se concentrou no treinamento do Nobre Preguiçoso.

    “Ele… não estava desperdiçando tempo.” Diferente do que o recruta esperava, Airen Farreira treinava diligentemente com sua espada. Fazia apenas quatro dias, o que poderia ser considerado pouco, mas o recruta sabia que muitas pessoas não conseguiam treinar por mais de três dias seguidos.

    Isso era comum para a maioria das pessoas. Mesmo com motivação e planos, muitos desistiam do treinamento. A maioria preferia dormir bem hoje a cumprir o plano de ontem. Mesmo aqueles que se levantavam para treinar não duravam muito. Era necessário suportar a dor do treino, que enfraquecia a vontade de continuar. E a dor muscular que surgia no dia seguinte não ajudava em nada.

    Foi exatamente o que aconteceu com o novo recruta. Ele se lembrou do primeiro dia de treino, quando chorou e fugiu, evitando os treinos pelos quatro dias seguintes.

    Mas… o lorde Airen nunca mostrou essa fraqueza. Ele nunca havia se exercitado na vida, e ainda assim fazia como se treinasse há muito tempo.

    O recruta não conseguia entendê-lo. A esgrima do Nobre Preguiçoso era medíocre. Ele não tinha força para empunhar uma espada pesada e logo ficava sem fôlego. Parecia mais fraco que qualquer homem comum, quem dirá nobres de sua idade que treinaram desde cedo. Mas a determinação de Airen para praticar sua esgrima não era algo que pudesse ser ignorado. Era surpreendente.

    “Não. Olhe nos olhos dele. É muito mais que…”

    O recruta interrompeu seus pensamentos ao perceber que o ambiente ao seu redor mudara. Então, notou que o guarda veterano estava tocando seu ombro.

    — Ei, o que está fazendo, senhor…

    Ele não conseguiu terminar a frase ao se congelar diante do que viu. Imediatamente ficou em posição de sentido, com os ombros para baixo. Os outros guardas também estavam no mesmo estado.
    Roar! Um rugido imponente, mas adoravelmente pequeno, ecoou pelo salão. O grifo, um lendário animal vermelho, sobrevoava a todos. E, em seu topo, estava a feiticeira, a futura herdeira de Farreira e meia-irmã do Nobre Preguiçoso, Kiril Farreira.

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