Capítulo 422: Reunião (3/3)
História Paralela – 10 Reunião
Até poucos anos atrás, os campos de treinamento de Eratria eram tomados por gritos energéticos e gemidos de dor. A guerra civil que assolava o Reino de Makan já durava mais de cinquenta anos. Primeiro, os príncipes disputaram o trono; depois, a facção dos parentes maternos iniciou uma rebelião. E quando parecia que tudo havia terminado, as sete grandes famílias nobres se levantaram em revolta…
Mas agora, as coisas eram diferentes, tudo graças à grande heroína, a Rainha Ignet Meyers. Alguns sussurravam que ela era uma traidora, alegando que certamente venderia o país ao Reino Sagrado de Arvilius… mas Hans, um guarda, não via dessa forma.
“Colocar fim naquela maldita guerra civil já é uma conquista absurda por si só. Sim, com certeza é…”
Orgulho como cidadão de Makan? Independência? Tais coisas não serviam para nada. Provavelmente teria apoiado Ignet com tudo se ela tentasse fundir Makan e Arvilius. Claro, a sábia e sensata rainha, de origens plebeias, jamais demonstrou essa intenção. Ele não entendia muito de política, mas era essa a impressão que tinha.
De qualquer forma, graças à tão aguardada era de paz, os campos de treinamento de Eratria estavam quietos na maior parte do tempo. Os soldados mal faziam mais do que patrulhar, e ultimamente quase não havia bandidos nas ruas. Tudo isso levou a uma queda no treinamento.
Mas hoje não. Uma voz poderosa preenchia o espaço, que era duas vezes maior que os campos de outras regiões.
— Haaaaaah!
Hans, o guarda, observava o garoto de quatorze anos participando da Produção de Cavaleiros 21. Chamou os colegas para montar a escala de vigilância, mas não foi só isso. Tendo encontrado uma rara fonte de entretenimento, começaram a apostar quanto tempo o garoto duraria.
— Eu aposto em três horas.
— Uma hora. Três horas é demais.
— Também fico com uma hora. Depois de uma volta, ele vai perceber. Vai pensar: ‘Ah, não tem como eu conseguir isso’. Aí vai desistir.
— Leva uma hora pra perceber isso? Eu aposto em trinta minutos.
— Então pra quê fazer escala? Vai acabar logo mesmo, não é?
— Haha, por isso escolhi o último turno!
— Droga… pelo menos quero ganhar alguma grana.
Os soldados riram. Até então, seus dias eram monótonos. Observar os jovens participantes da seleção fora divertido no início, mas, ao perceberem que tudo era manipulado, perderam o interesse. Aquele garoto provavelmente era só mais uma criança pobre sem apoio nenhum.
“Mas, tirando a pena, pelo menos dá pra apostar.”
“Uma hora. Aguenta pelo menos uma hora!”
“Ah droga, talvez eu devesse ter apostado em três horas…?”
Ninguém achava que o garoto conseguiria, ou sequer resistiria até o fim. Era algo que nem três homens feitos conseguiriam cumprir com facilidade, quem dirá um garoto de apenas quatorze anos.
“Bem… ele realmente parece ter um motivo desesperado pra fazer isso.”
Mas o que isso importava para eles? Os soldados continuavam com as apostas, fazendo piadas de vez em quando, enquanto cumpriam sua função de vigia.
Enquanto isso, centímetro por centímetro, Kron empurrava a caixa com esforço.
Kron permanecia em pé sob o céu escurecido pela noite.
“Isso é…”
Sua boca tinha um gosto amargo. Cada músculo doía como se gritasse de agonia. Sua expressão, tomada pelo desespero, estava voltada para o chão enquanto ele se apoiava na caixa.
“Isso… não vai dar…”
Já haviam se passado seis horas. Nesse tempo, Kron completou duas voltas. Para um garoto de quatorze anos, era algo notável. Qualquer outra pessoa teria desistido antes mesmo de completar metade de uma volta, ou sequer começado.
Mas agora, ele havia chegado ao limite. Não era uma questão de fadiga. Era difícil, sim, mas não a ponto de impedir que se movesse. Era doloroso, sem dúvida, mas só duraria um dia. Não havia como alguém que treinou na Academia de Esgrima Krono não aguentar isso.
O problema era a ausência de esperança.
Kron baixou a cabeça e pensou: “Faltam oito voltas…”
Duas voltas em seis horas… Matematicamente, ele precisaria de quase mais um dia inteiro para completar dez voltas. Precisava de mais tempo. E, considerando seu estado exausto, talvez nem o dobro disso fosse suficiente.
Kron fechou os olhos com força. A ideia de desistir lhe passou pela cabeça, algo natural. Mas foi só um breve lapso de determinação.
Levantou o rosto. Limpou as mãos e aceitou um gole d’água oferecido por um soldado. Também deu uma mordida no pão para forrar o estômago. Kron respirou fundo e empurrou de novo. A caixa deslizou com um rangido desagradável.
“Nunca.”
A caixa avançava pelo trajeto que ele já havia percorrido duas vezes.
“Eu não posso desistir.”
E continuou.
Produção de Cavaleiros 21. Kron sabia melhor do que ninguém o quanto essa oportunidade era um sonho. Tendo vivido por um tempo no excelente ambiente da Academia de Esgrima Krono, ele entendia ainda mais.
Desde muito pequeno, corria de um lado para o outro tentando aprender esgrima. Tornar-se discípulo de um cavaleiro era um sonho inalcançável, o máximo que conseguia era observar mercenários treinando ou imitar histórias de mendigos que diziam ter sido grandes espadachins no passado. A qualidade do ensino era o único problema?
Não. O garoto não tinha dinheiro nem tempo.
Para sobreviver sob a opressão cruel do diretor do orfanato, teve que aprender os caminhos sombrios do mundo desde os oito anos. Após a morte do diretor, as coisas melhoraram um pouco, mas mesmo assim, precisava dormir três horas a menos e trabalhar o dobro dos outros para conseguir tempo para treinar com a espada.
“Preciso provar meu esforço?”
Explicações não bastavam para demonstrar esforço. Apenas os resultados podiam provar o caminho que trilhou. Os avaliadores não conheciam o ambiente onde Kron cultivou seus sonhos. Nascidos nobres, jamais entenderiam que apenas poder se dedicar à esgrima já era, por si só, uma bênção.
Por isso, ele tinha que conseguir. Tinha que mostrar. Tinha que provar com resultados.
“Eu absolutamente não posso desistir!”
Um grito feroz explodiu — Kaaaaaah!
Alguém poderia franzir o cenho com aquele barulho atravessando a noite, mas nenhum soldado reclamou. Nem mesmo os nobres. O examinador de bigode e o careca haviam voltado para casa após encerrar o expediente, mas pararam involuntariamente ao ver o esforço desesperado do Candidato 1001.
O examinador careca engoliu em seco e perguntou a um soldado:
— Há quanto tempo… ele está nisso?
— Seis horas… senhor.
— Gasp!
— Hmm.
O examinador de bigode também expressou surpresa. Ao lado dele, estava a examinadora encapuzada, que não saíra de seu lugar desde o início do teste. Mantinha a mesma expressão neutra de sempre.
— Posso me sentar aqui?
— A-ah, claro! Senhorita.
Ela se sentou na cadeira ao lado do soldado.
O examinador de bigode perguntou:
— Hm… a senhorita… vai continuar assistindo?
Ela não respondeu.
— Hm… Bem, então… Vamos indo. Cuide-se.
Deixando a examinadora silenciosa para trás, os dois examinadores se afastaram com expressões insatisfeitas. Claro, não podiam fazer nada além de murmurar reclamações que ela não podia ouvir. Mas mesmo enquanto rosnavam baixinho, o Candidato 1001 não saía de suas mentes.
“Não tem como continuar até de manhã.”
“Ele já parecia no limite. Deve desmaiar de exaustão em duas horas.”
Esses foram os últimos pensamentos dos dois antes de dormirem. Mas estavam completamente enganados.
— Haa. Haa.
Mesmo na manhã seguinte e até depois do almoço, Kron não parou. Sangue escorria de sua boca. Urina molhava suas calças. Não era por economia de tempo, o garoto, levado ao extremo, não pensava em nada além de avançar.
— Haa, haa! Cof, guuuh!
Não sabia quanto tempo faltava. Não sabia a distância restante. Apenas empurrava e empurrava. Esquecendo de tudo, Kron seguia sua árdua jornada como se mover aquela caixa fosse a missão de sua vida.
Mais uma vez. E de novo. Não desperdiçaria um único minuto ou segundo até o fim.
E assim, chegou ao ponto marcado pela espada do examinador de bigode. O décimo e último destino. Um destino alcançado após vinte e quatro horas e vinte e sete minutos.
— A-a-acabou…
Thud.
Ninguém conseguia dizer uma palavra. Os dois examinadores não eram pessoas boas, mas não eram cruéis o bastante para acordar o garoto desmaiado só para dizer que ele foi reprovado. Na verdade, refletiram seriamente sobre o resultado.
Deveriam mesmo reprovar esse garoto? Esse menino mostrou mais perseverança, paixão e esforço do que qualquer uma das crianças que eles aprovaram por dinheiro… Seria justo falhar com ele só por ser órfão?
Mas não tiveram muito tempo para decidir.
A examinadora que o observava em silêncio durante todo o teste se aproximou de Kron.
— Ah!
— O-o que…?
Ela o ergueu e desapareceu num instante. Era resultado de uma força física incrível, mas aos olhos de todos, aquilo parecia feitiçaria.
E assim terminou o teste final realizado na região de Eratria, deixando para trás apenas um sentimento inquietante. Eles haviam testemunhado a luta de um garoto que ninguém esperava, com exceção da única pessoa que acreditou nele sem hesitação.
Quando Kron abriu os olhos e viu o teto desconhecido, seu primeiro pensamento foi de que havia falhado. Ele não sabia por quê, apenas sabia. O garoto frustrado lutava desesperadamente contra o impulso de gritar. Cada uma de suas ações impensadas poderia envergonhar as pessoas preciosas para ele. Era uma lição que aprendera na Academia de Esgrima Krono.
Em vez disso, Kron virou a cabeça para o lado. Viu a mulher que não havia dito uma única palavra durante o teste. A examinadora tinha cabelos ruivos e possuía a vitalidade juvenil de alguém na casa dos vinte, mas com a elegância madura de meia-idade. Ainda assim, era impossível adivinhar sua idade…
Ao olhá-la, o garoto sentiu uma estranha sensação de saudade. Era um sentimento que nunca experimentara, nem mesmo pela mãe que o abandonara.
— Fui reprovado?
— Sim — respondeu a mulher, brevemente. — E o que pretende fazer agora?
— O que mais posso fazer? Tenho que continuar treinando — respondeu Kron.
Se o objetivo do garoto fosse se tornar um cavaleiro de Makan, talvez tivesse se desanimado naquele momento, mas não era o caso. Seu objetivo era proteger as pessoas preciosas para ele. Era para isso que buscava força.
Ele não desistiria. Jamais seria quebrado.
Kron, assentindo com firmeza, completou com uma frase carregada de determinação:
— Ainda é cedo demais pra desistir. Isso nem pode ser considerado esforço de verdade ainda. Acho que só poderei dizer que tentei de verdade quando tiver uns setenta anos… Não acha?
— Você não mudou nesse aspecto, não é?
— O quê? Já nos conhecemos antes? — perguntou Kron.
A mulher ruiva sorriu. Não havia necessidade de tocar no passado.
Olhando adiante, para a história que construiriam juntos, Judith disse:
— Sei que é repentino… mas gostaria de se tornar meu filho adotivo?
Algum tempo depois, a história de Brett e Judith Lloyd adotando um filho se espalhou por todo o continente.
Dez anos depois, uma atmosfera sombria começou a emanar de outro Reino Demoníaco, distante do reino humano…
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.