Capítulo 302: A Resolução do Herói (4/5)
A ‘língua antiga’ referia-se aos idiomas dos reinos ancestrais que pereceram há mil anos ou às línguas de pequenas tribos que desapareceram há pelo menos quatrocentos anos. Já não era falada pelo povo moderno do continente.
“Que intrigante.”
O Rei Sagrado também tinha um profundo interesse nesse assunto. Para compreender plenamente as palavras de Deus, que existia desde o princípio dos tempos, era necessário um estudo constante. Mesmo agora, inúmeros teólogos trabalhavam incansavelmente para interpretar textos antigos, então as ações de Gia não eram surpreendentes, mas sim esperadas.
“Embora a Rainha de Runetel não esteja interessada apenas no valor acadêmico dos textos antigos…”
Entre os escritos ancestrais, havia alguns particularmente especiais, textos tão enigmáticos que nem mesmo os maiores estudiosos, apesar de seu vasto conhecimento histórico, conseguiam compreendê-los completamente.
Essas eram letras impregnadas com um poder único, compreendidas apenas por aqueles que possuíam as qualificações de um mago, aqueles que podiam sentir, compreender e manipular a magia.
“Os magos chamavam isso de língua dracônica, enquanto os feiticeiros se referiam a ela como palavras espirituais. Com base na reação de Gia, parecia que um verdadeiro exemplar havia aparecido. O fato de o cálice começar a brilhar naturalmente ao toque era uma prova disso.”
O Rei Sagrado soltou uma risada silenciosa. Ele queria rir alto, mas sabia que isso só atrairia o olhar gélido da mulher de temperamento difícil. Além disso, não queria interrompê-la. A concentração de Gia Runetel era verdadeiramente extraordinária. Seus olhos estavam frios e serenos, como se tivesse esquecido tudo, tempo, lugar e qualquer outra coisa, exceto pelas letras antigas gravadas no cálice.
Uma hora se passou.
Depois, duas.
Ainda assim, a Rainha de Runetel permaneceu em silêncio. O Rei Sagrado não conseguiu mais esperar. Com um rosto cheio de curiosidade ansiosa, finalmente perguntou:
— Encontrou alguma coisa?
— …Não.
— Não?
— Certo. Se tivesse que dizer algo… É um objeto e uma escrita muito mais antigos do que qualquer coisa que eu tenha em minha coleção. Pode até ser…
Gia Runetel fez uma pausa, incapaz de conter sua empolgação, e continuou com a voz trêmula:
— …Pode não ser apenas uma suposta língua dracônica, mas a verdadeira língua dracônica.
Ela virou a cabeça bruscamente. Seus olhos brilhavam intensamente enquanto encarava o Rei Sagrado. O fervor em seu olhar era mais ardente do que o próprio sol.
— Velho, você precisa me vender isso. Você já tem dinheiro de sobra para gastar. Quanto vai custar? Diga seu preço.
Seu desejo era inconfundível. Sua sede de conhecimento era palpável. Era o tipo de paixão capaz de contagiar qualquer um que testemunhasse. No entanto, o Rei Sagrado permaneceu calmo. Depois de um momento de silêncio, ele respondeu com a mesma expressão astuta de qualquer membro experiente da Guilda Wise.
— Faça uma oferta.
— Hah, estou exausto — Airen Farreira murmurou baixinho, deitado na cama de seu quarto designado. Não era surpresa. Embora os outros pudessem achar que ele parecia calmo, a verdade era que estivera incrivelmente tenso. E não era por causa do Rei Sagrado em si. O verdadeiro desafio que precisava superar era outra pessoa.
“Ignet Crecensia.”
Enquanto a imagem de seu objetivo como espadachim surgia em sua mente, Airen fechou os olhos. Ele ainda se lembrava vividamente do que aconteceu um ano atrás. A figura dela, irradiando uma aura tão intensa e avassaladora, como um sol em chamas que não podia ser tocado, não importava o quanto tentasse. Era por isso que queria superá-la. Se não pudesse puxá-la para baixo, então ele próprio se elevaria ainda mais.
“Claro, também não posso ignorar os outros.”
Brett Lloyd, a quem não via há algum tempo, devia ter crescido muito além do que imaginava. O mesmo valia para Judith, a quem não encontrava havia mais de dois anos. As chamas que ela exibia eram, em alguns aspectos, ainda mais puras do que as de Ignet. A altura que poderia alcançar ao queimar tudo em seu caminho era algo que ele não conseguia compreender.
E além deles, inúmeros outros oponentes fortes estavam participando do torneio. Alguns talvez não fizessem jus à sua reputação, mas a maioria superaria as expectativas. Há um ditado que diz: ‘Um guerreiro sempre esconde um terço de sua força.’ E havia uma razão para isso.
“Se quero vencer, não posso continuar assim. Preciso me tornar mais forte.”
Com essa resolução, Airen abriu os olhos e se levantou. Ele estava pronto para transformar sua determinação em ação, mas, naquele momento, uma voz veio do lado de fora da porta.
— Lorde Airen Farreira, alguém veio vê-lo.
— …Alguém veio me ver?
— Sim, estão esperando no salão de treinamento… Gostaria que eu o guiasse?
Naquele instante, outro pensamento passou pela mente de Airen.
“Illia! Ela já chegou?”
Um dos motivos pelos quais viera ao Reino Sagrado de Arvilius, além de participar do Torneio dos Heróis, era reencontrar Illia Lindsay, sua amada. Se sua amada estava esperando por ele, como poderia não correr para encontrá-la? A emoção tomou conta de Airen, que abriu a porta de um só golpe.
— Me leve até lá — ordenou.
O guia se assustou com seu movimento repentino, mas Airen não se importou.
— Rápido, por favor.
Após uma breve pausa, o guia logo se recompôs e respondeu:
— Sim, imediatamente.
Em seguida, começou a andar a um ritmo mais acelerado do que o habitual.
Ainda assim, não era rápido o suficiente para o gosto de Airen, mas não havia sentido em apressá-lo mais. Então, ele apenas seguiu de perto. Logo, depois de saírem do edifício e caminharem por um tempo, o salão de treinamento surgiu diante de sua vista. No centro, havia uma pessoa. Airen Farreira permaneceu em silêncio.
Cabelos prateados esvoaçando ao vento. Uma figura forte e imponente. Alguém demonstrava um poder misterioso, controlando o vento ao seu redor enquanto balançava sua espada. Era o orgulho do Reino Adan.
Não era Illia… Era Joshua Lindsay.
Joshua se virou e saudou Airen com uma voz alta e animada.
— Que bom vê-lo, Airen Farreira!
Airen não respondeu.
— Por que não está dizendo nada? Estava esperando outra pessoa? Minha filha, talvez?
O silêncio preencheu o ar.
— Pelo seu rosto, parece que acertei. Que pena. Illia está no meio de um treinamento importante. Você não poderá vê-la por pelo menos duas semanas. Espero que entenda.
— Eu… entendo.
— Você não parece entender. Mas que estranho. Ver essa expressão em seu rosto me deixa bem satisfeito. Hahaha!
Joshua Lindsay brandiu sua espada. Sua energia estava alta, como se estivesse se divertindo como nunca. Isso apenas aprofundou a frustração de Airen. Invocando sua Aura da Espada com um movimento afiado, ele falou:
— Seria pedir demais um combate de treino?
— Um combate? Mas é claro. Mas tem certeza de que quer apenas um treino? Seus olhos estão afiados demais para isso ser apenas um treino. Esse não é o tipo de olhar que um homem deveria dar ao pai de sua amada…
— Aqui vou eu!
Airen o cortou abruptamente. Sem desperdiçar mais nenhuma palavra, avançou contra o chefe da família Lindsay com uma expressão feroz, algo que ninguém jamais vira nele antes. Mas Joshua não se incomodou.
— Hahaha!
Na verdade, aquilo o deixou ainda mais animado. Ele caiu na gargalhada, e logo seu jogo de espada, muito semelhante ao de Illia Lindsay, estava em plena exibição. Isso só irritou ainda mais Airen, mas não havia nada que pudesse fazer. Tudo o que podia fazer era despejar sua frustração e decepção em sua lâmina.
— Haha! Hahaha, hahahaha…
As risadas de Joshua Lindsay ecoavam incessantemente, superando até mesmo o estrondo explosivo do choque de suas espadas. Enquanto trocavam golpes, Airen apenas cerrava os dentes em frustração silenciosa.
— Parece que você ficou enferrujado. É porque não teve combates sérios ultimamente?
— Talvez.
Diante da admissão honesta de Airen, Joshua assentiu. Embora sua crítica fosse severa, na verdade ele estava bastante surpreso com o crescimento do jovem. Airen havia evoluído imensamente desde seu último encontro alguns meses atrás. Como ambos sabiam disso, não havia necessidade de mencioná-lo. Na verdade, esse combate de treino não tinha sido fácil nem mesmo para Joshua, o chefe da família Lindsay.
E é por isso que era ainda mais frustrante. O problema não era o crescimento de Airen. Joshua estava apontando outra questão completamente diferente, a falta de nitidez em seu combate real.
“Seus reflexos estavam um pouco lentos, e sua esgrima parecia ligeiramente imprecisa.”
Airen também considerou seriamente essa crítica. Aumentar suas reservas de aura e refinar seu controle sobre ela eram objetivos de longo prazo que não podiam ser alcançados do dia para a noite. No entanto, recuperar sua intensidade e concentração, especialmente em batalhas reais, era relativamente fácil. Se se envolvesse em uma série de combates intensos e realistas, seu corpo e seus sentidos naturalmente despertariam, e sua visão se aguçaria. Na realidade, não era um problema tão grande. Mas o problema era que ele não tinha um parceiro de treino ideal.
— Não posso ajudá-lo. Não posso treinar alguém que está competindo contra minha filha.
Airen fitou Joshua em silêncio.
— Fui um pouco duro demais? Bem, para colocar de maneira mais suave… Não tenho tempo. Como eu disse, estou totalmente focado no treinamento de Illia. Este é um momento crucial para ela.
Airen assentiu e disse:
— Eu entendo.
Como poderia exigir mais quando um pai estava dedicando todos os seus esforços ao crescimento de sua filha? Ele não era alguém insensível o suficiente para fazer um pedido tão irracional.
“Mas ainda preciso de um parceiro de treino.”
Ele ouvira que tanto Brett Lloyd quanto Judith já haviam chegado ao Reino Sagrado. No entanto, assim como Illia, ambos estavam imersos em seus treinamentos pessoais. Poderiam se encontrar e conversar, mas pedir que interrompessem seu progresso para ajudá-lo parecia algo demais.
“Será que o Mestre Ian, Kun ou Karakhum já chegaram? Se sim, treinar com eles seria o ideal…”
Vários pensamentos correram pela mente de Airen, e Joshua, percebendo sua inquietação, olhou para ele com compreensão. Mas havia também uma mulher de trinta e poucos anos, sentada ao lado de Joshua, que observava Airen em silêncio com uma expressão enigmática.
Só então Airen e Joshua notaram sua presença. Surpresos com sua súbita aparição, ambos assumiram uma postura defensiva.
— Não tenho negócios com vocês.
A mulher falou suavemente. Airen, assim como Joshua, imediatamente ficou tenso, reconhecendo a presença formidável que antes havia ignorado. Seus olhos se arregalaram de surpresa, e sua mão instintivamente se moveu para sua espada larga, pronto para invocá-la a qualquer momento. Mas ela não parecia nem um pouco preocupada com aqueles espadachins. Com a mesma expressão calma, continuou falando.
— Não importa como eu olhe, você não é a pessoa certa.
Sem esperar por uma resposta de Airen, ela continuou.
— Não acredito que você compreenda o valor desse objeto. Provavelmente não o adquiriu por conta própria. Deve ter sido entregue a você por outra pessoa.
“Ou talvez tenha simplesmente tido a sorte de encontrá-lo.”
Ela murmurou para si mesma antes que Joshua fizesse a pergunta óbvia com cautela:
— Quem é você?
A resposta veio imediatamente.
— Runetel.
O choque nos rostos dos dois espadachins se aprofundou.
Runetel era o nome do reino mais poderoso depois de Arvilius e também o nome de uma das três famílias mágicas mais prestigiadas do continente. E havia apenas uma pessoa em todo o continente que podia usar o nome ‘Runetel’ como se fosse seu próprio.
Gia Runetel, a Rainha de todos os magos.
Até mesmo Joshua Lindsay, que normalmente mantinha a calma e compostura, sentiu sua garganta secar diante de sua presença.
— Fale.
A voz da Rainha ecoou.
— Conte-me em detalhes como chegou a possuir esse objeto, sem omitir nada.
Seu tom era calmo, sem qualquer força mágica ou pressão. Ainda assim, Airen sentiu um peso imenso, semelhante ao que experimentara ao enfrentar os três maiores espadachins pela primeira vez. A única diferença era que Gia Runetel não estava sendo coercitiva, ela estava propondo um acordo.
— Se fizer isso, concederei um desejo seu. Claro, deve estar dentro dos limites do que posso oferecer. No entanto, esses limites são muito mais amplos do que você pode imaginar.
Então, a Rainha instigou Airen:
— Agora, fale.
Percebendo que a atmosfera não estava tão tensa quanto poderia estar, Joshua recuou um passo, dando espaço para Airen. Embora fosse um gesto de consideração, paradoxalmente, apenas intensificou a pressão sobre ele. Uma gota de suor escorreu por sua testa sem que percebesse. Respirando fundo, Airen encontrou o olhar de Gia Runetel.
Então, finalmente, começou a falar.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.