Capítulo 5 (V) — Arco.
Assim que entrou em casa, encontrou Yuki dando um pulo alto quase chegando ao teto.
— Pearl!? Você demorou demais! A mamãe disse que a gente vai sair agora! — anunciou Yuki, pulando animada ao redor da irmã.
— Para onde a gente vai? — perguntou Pearl, enquanto tirava o casaco e sacudia a neve acumulada.
Mila apareceu da cozinha, carregando uma mochila simples nas costas e com um sorriso tranquilo no rosto.
— Vamos para a floresta buscar ervas medicinais. O calor afetou nossos estoques, e precisamos repor antes que o frio volte. Vocês duas vão me ajudar — Ajustando a mochila.
— Te ajudar, mãe? — Yuki perguntou, com os olhos brilhando.
— Buscar ervas medicinais não parece ser tão legal… — disse Pearl, meio sem graça. No entanto, sabia que qualquer momento fora da vila ao lado da mãe era especial.
— Pearl! Quase esqueci, come um pouco antes de sair, para você não desmaiar lá fora.
— Viu, mãe! Vou comer rapidinho Yuki, pra você não ficar enchendo o saco
— Ainda bem que você sabe.
Após Pearl terminar de comer, elas deixaram o vilarejo em direção à floresta Vamne, ainda distante, parecia um mar de verde escuro no horizonte. Ambas caminhavam ao lado de Mila.
— Mamãe, você explorava florestas muito maiores do que essa, não é? — Yuki perguntou, olhando para o lado.
— Sim, antes de vocês nascerem, eu ia bem mais longe.
— Você tinha medo? — continuou Yuki, curiosa.
— O medo é normal nessas situações, mas o importante é como lidamos com ele. Com coragem, cuidado e pessoas em quem confiamos, o medo não nos impede de seguir em frente.
Pearl observou a mãe em silêncio. Sentia que aquelas palavras tinham um significado para Mila.
— Vocês são tão novas, na idade de vocês, eu já tinha que saber usar magia básica — disse Mila, caminhando em direção a uma árvore próxima.
— Venham logo, venham aqui! — chamou ela, com um sorriso, fazendo com que Pearl e Yuki se aproximassem.
Mila pegou uma pequena faquinha e fez um corte leve na árvore.
— Por que você fez isso, mãe? — perguntou Pearl, olhando com curiosidade.
— Espere um pouco, só um pouco.
Então, de repente, a casca começou a se reconstituir. A cicatriz no tronco se fechou, em segundos, não havia mais vestígios do corte.
— Uau! Como você fez isso, mãe? — exclamou Yuki, impressionada com o que acabara de ver.
— Não fui eu que fiz, Yuki. O mundo é assim — respondeu Mila com calma, olhando para as filhas. — Tudo é conectado, a energia flui por tudo. As árvores crescem muito mais rápido hoje, antigamente, a energia não corria assim na natureza.
Yuki, curiosa, decidiu repetir a ação da mãe.
Pearl, ainda com o olhar atento, se aproximou um pouco mais da árvore
— E o que fez o mundo mudar?
— A pessoa que controlava a energia da natureza no nosso mundo morreu e voltou aos céus — explicou Mila.
— Quem, mãe? Quem morreu? — perguntou Yuki, chegando mais perto da mãe.
— A deusa Pan Glórienn
.
— Uma deusa? O que você quer dizer com isso? — perguntou Pearl.
— As orações que fazemos são para nos proteger de todo mal.
— Ah, as orações! Na verdade, eu achava uma besteira — disse Yuki.
— Não diga isso. A deusa à qual oramos no dia do aniversário de vocês é muito gentil e bondosa.
— Eu acredito, mãe. Afinal, nunca aconteceu nada de ruim com a gente, né?”
Enquanto elas conversavam, Pearl ficou meio confusa com essa história. Por mais que orasse todos os anos, nunca se sentiu recompensada, e, por isso, sempre esteve com um pé atrás em relação às orações por ajuda — pelo menos, era isso que significava para ela.
— Essa ideia da Pan Glórienn
não está certa para mim, mãe. Eu não consigo acreditar que alguém consiga me ajudar sem estar aqui comigo.
— Muito bem, Pearl. Ore quando precisar.
Pearl ficou pensativa, ainda mais com a resposta da mãe.
Voltaram a descer, e a neve ficava mais fina a cada passo. Na borda da floresta, Mila parou e abriu a mochila. Tirou uma cesta e um par de luvas para cada uma.
— Vamos nos dividir. Eu vou procurar ervas perto do riacho. Yuki, fique aqui e procure folhas de visco. Pearl, vá um pouco mais para dentro da floresta e busque galhos secos de pinheiro com resina.
— Por que eu fico sozinha? — reclamou Yuki, cruzando os braços.
— Porque você não para quieta.
Pearl riu discretamente.
Pearl caminhava entre as árvores, observando o chão coberto de neve. Enquanto recolhia os galhos resinosos, sua mente vagava. Pensava em como sua mãe era tão confiante e forte, mas, ao mesmo tempo, parecia esconder segredos.
De repente, ouviu um estalo distante. Ela parou e olhou ao redor, o coração acelerado. Nada. Apenas o som do vento nas árvores.
— Deve ser só um animal — murmurou, tentando se acalmar e voltar ao trabalho.
Enquanto continuava seu caminho, Pearl notou algo estranho no chão, parcialmente escondido pela neve. Era algo como um alçapão, disfarçado e quase imperceptível, coberto por neve. Ajoelhou-se e tentou abrir, mas o peso ou o mecanismo estava além de sua força.
— Droga! — exclamou, frustrada, enquanto puxava em vão.
Ela se levantou, respirando fundo, e olhou ao redor, ainda intrigada.
— O que será que é isso? Acho que vou voltar aqui depois.
Com cuidado, cobriu o alçapão com folhas e galhos, certificando-se de que ficaria escondido antes de seguir seu caminho, já planejando como e quando descobriria o que havia ali.
Pearl andava em direção ao local do encontro alguns minutos depois de pegar o que a mãe havia instruído fazer; quando ouviu um grito.
Yuki?
Pearl começou a correr em direção ao ponto de encontro e viu Yuki cercada por cinco grandes lobos das neves. Morrendo de medo, Yuki caiu no chão.
— Mamãe! — começou a chorar. Aos olhos de Pearl e dos lobos, Yuki simplesmente desapareceu, sem deixar nenhum rastro.
Pearl, que estava paralisada com a situação, pulou e ficou em uma das árvores.
Eu não pude fazer nada pela Yuki. O que aconteceu com ela?
Os lobos começaram a farejar e a perceber a direção na qual Yuki estava. Porém, Mila apareceu logo em seguida com o arco que havia dado a Yuki.
— Vou enviá-los de volta à região de vocês. — Apontou o arco, sem nenhuma flecha, na direção dos lobos.
Os cinco lobos avançaram na direção de Mila e tentaram atacá-la, mas ela sutilmente desapareceu e reapareceu atrás de todos eles, um pouco distante.
Pearl, nesse momento, viu a boca dela se mover, mas não conseguiu escutar o que estava dizendo. Foi então que Mila puxou de uma vez a corda e atirou, sem dar reação aos lobos, que foram lançados a alturas no céu, sumindo totalmente da visão de Pearl.
Ela colocou a mão acima dos olhos.
— E lá se vão os cachorrinhos brancos. Pode descer daí, Pearl.
Como ela me viu? Enquanto pensava sobre isso, Pearl desceu da árvore e foi até a mãe.
— Vamos pegar nossas coisas e subir. Vou ali acalmar a Yuki. Na verdade, você pode pegar nossas coisas? Vou carregá-la até lá em cima.
Pearl concordou com a cabeça e ficou ainda mais reflexiva.
O que ela fez com aqueles lobos? Ou melhor, como ela fez? A mamãe é tão forte assim? Então são esses os segredos que a mamãe escondia enquanto ficava em casa todos esses anos?
Elas subiram, e Pearl não conversou pelo resto do dia. Apenas ficou dentro do seu quarto, refletindo sobre o que havia acontecido.
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