Capítulo 8 (VIII) — Lagartos.
Ela analisou tudo aquilo, surpresa por nunca ter visto um anel como aquele — ela gostava do anel de Kael e de Mila, dourados e representando uma tradição que Pearl entendia.
A chama na ponta dos dedos ainda iluminava seu caminho.
Subiu um degrau, dois, três, sobre aquele chão de pedra. A sala inteira era feita de pedras, que, como pedregulhos, se encaixavam perfeitamente, sem nenhuma falha visível. Pearl se aproximou o suficiente para estender a mão e tentar pegar o anel com cuidado.
No instante em que seus dedos chegaram perto do acessório, ele se moveu, encaixando-se automaticamente em seu dedo indicador. A força do impacto a lançou para trás, fazendo-a bater contra a parede. Pearl gemeu de dor e, cambaleante, levantou-se apoiando-se na parede.
Enxergando pouco devido à chama ter apagado novamente, Pearl notou que, de alguma forma, a sala não era completamente escura.
O anel, grande à primeira vista, começou a se modificar, ajustando-se perfeitamente ao seu dedo, como se tivesse vontade própria.
Como? Como isso é possível?
Pearl sentia-se estranha; era como se o anel estivesse se fundindo a ela. Sua mão começou a arder, tremer, queimar, e, logo em seguida, esfriar, até ficar tão gelada quanto o gelo.
O que é que eu estou sentindo?
Ela apertava a mão com o anel, tentando ignorar a dor. Mas a sensação era insuportável, algo além de tudo que já havia experimentado.
A sala começou a girar lentamente, enquanto as pedras rangiam com força, movendo-se de lugar. Feixes de luz surgiam entre as frestas das pedras que caiam e se quebravam em formatos perfeitos, flutuando para se encaixarem novamente. Algo maior estava se formando, mas Pearl não conseguia entender nada disso.
O som ensurdecedor das pedras em movimento dominava o ambiente. Era como se elas tivessem vida própria, movendo-se com uma intenção que escapava à compreensão. Alguém comum nunca poderia construir algo assim, pensou Pearl. Apenas magia explicaria aquele lugar — as placas, o alçapão, o anel — tudo parecia interligado por sistemas mágicos intricados.
De repente, a dor em sua mão cessou.
O chão sob seus pés tremeu, e as paredes giraram ainda mais rápido, mudando a configuração da sala. Ela mal podia respirar entre o barulho e a confusão. Então, com um estrondo ensurdecedor, o teto se abriu.
A estrutura parecia viva, ascendendo lentamente enquanto se transformava em um círculo perfeito de pedra. As árvores ao redor desapareceram como se nunca tivessem existido, deixando para trás apenas aquele vasto círculo, agora comparável a um pequeno lago, exposto sob o céu aberto.
— Eu… pre… ciso sair… — sussurrou Pearl, apavorada. Sua perna latejava de dor, mal a sustentando. Qualquer movimento brusco parecia capaz de agravar sua condição, e ela sabia disso. Estava presa entre a urgência de fugir e a incapacidade de se mover com segurança.
O ferimento havia feito com que ela perdesse muito sangue. Sua perna estava completamente vermelha, quase escondendo o tom claro de sua pele. Suas roupas, outrora limpas e brancas, agora estavam sujas e manchadas de sangue. A saia, que tocava a região ferida, havia grudado no machucado. Ofegante e suando frio, Pearl lutava para manter o controle sobre o próprio corpo.
Mesmo assim, começou a correr, embora de forma lenta e mancando, determinada a escapar daquele círculo de pedra. Mas, no exato momento em que estava prestes a cruzar o limite, um pilar de pedra emergiu do chão com brutalidade, erguendo-se como uma barreira intransponível diante dela.
— Ahhh! — gritou Pearl, caindo no chão devido ao susto.
Antes que pudesse se levantar, mais pilares começaram a subir em sequência, um após o outro. Assustada, Pearl rastejou para trás, retornando involuntariamente ao centro do círculo.
Os pilares eram o triplo do tamanho de Pearl. Eram quadrados, como gigantescos paralelepípedos posicionados verticalmente, e estavam cobertos por inscrições que se estendiam de cima a baixo. Apesar de diferentes das encontradas no alçapão, essas escrituras estavam marcadas de forma semelhante. Logo, o primeiro pilar erguido começou a brilhar, preenchido por uma energia misteriosa, como se fosse um condutor de uma força antiga.
As inscrições pareciam idênticas entre si, mas Pearl tinha a sensação de que havia algo mais, algo que escapava à sua compreensão. Só podia deduzir que aquilo era mais um dos muitos usos da magia.
Ela observava, aterrorizada, enquanto o pilar ativo começava a materializar lentamente o corpo de uma criatura. Era grande, um pouco menor que um urso. A formação do animal começou pela cabeça, estendendo-se rapidamente até a ponta da cauda, quase como se fosse instantânea.
— Isso não pode estar acontecendo… — sussurrou, paralisada, os olhos fixos na criatura que tomava forma.
A criatura caiu no chão completamente formada. Seu corpo se assemelhava a uma lagartixa gigante, com escamas negras como o breu da noite. Os olhos eram dois globos amarelos incandescentes, com a íris vertical, como os de um crocodilo, e suas garras eram enormes, do tamanho de uma colher de madeira. Seus dentes, muitos deles, ficavam apontados para fora da boca quando ele a fechou.
O lagarto avançou, mas Pearl parou ao ver as inscrições em sua pele.
Não é só um lagarto gigante… pensou, o medo crescendo em seu peito.
O lagarto saltou, e o mundo pareceu desacelerar. Pearl viu as garras descendo como lâminas curvas; cada detalhe delas brilhava. No último instante, ela se atirou para o lado, sentindo o ar ser cortado onde estivera momentos antes. Quando caiu no chão, seus joelhos rasparam o piso áspero, e sua coxa doía ainda mais.
Antes que pudesse se levantar, ouviu o som seco de pedra contra pedra. Outro pilar brilhou, e as escrituras pulsavam como um coração.
Pearl mal teve tempo de se virar quando a segunda criatura caiu pesadamente no chão, fazendo o círculo tremer. Agora eram dois.
— Não, não, não! — gritou Pearl, correndo, mancando, na direção oposta enquanto os dois a perseguiam ferozmente. Quando tentou sair do círculo, bateu contra uma barreira invisível que a impediu de escapar.
Ela olhou para trás e viu um dos lagartos saltando em sua direção novamente. Com reflexos rápidos, Pearl conseguiu desviar mais uma vez, jogando-se por baixo entre eles; ambos se chocaram contra a barreira invisível.
Mãe, me ajuda, por favor!!
Eu não aguento mais…
Desesperada, Pearl estava sem opções. Lembrou-se da bola de fogo que Nya havia ensinado, enquanto corria na direção oposta aos lagartos. Para sua surpresa, o anel brilhou e reagiu de acordo com as vontades de Pearl, formando uma enorme bola de fogo na palma de sua mão. Sem pensar duas vezes, ela lançou o ataque. A bola de fogo se expandiu e se comprimiu antes de acertar os lagartos em cheio.
O impacto foi devastador; as placas de pedra que formavam o círculo começaram a sentir os efeitos da bola de fogo. Não só as placas, como também as escamas dos lagartos começaram a derreter violentamente. Mas, mesmo queimados e mais lentos, eles ainda avançavam, agora mais furiosos do que nunca — eles perceberam o perigo que Pearl representava.
Quando os dois lagartos saltaram para atacá-la ao mesmo tempo, Pearl rapidamente conjurou outra bola de fogo com a ajuda do anel e a lançou contra eles quase que imediatamente. O impacto foi tão forte que os lançou para longe, espalhando pedaços dos corpos das criaturas. O sangue das criaturas manchou a pele de Pearl, que agora estava caída no chão, ofegante e apavorada. O sangue era um vermelho estranho, claro, feio.
De repente, outro pilar começou a invocar uma nova criatura.
— Não… Não de novo… — murmurou Pearl, sentindo seu corpo paralisado pelo medo.
Em meio ao terror, ela ouviu uma voz em sua mente, calma, essa voz era a representação do seu símbolo de proteção.
— Pearl, lembre-se sempre das coisas que eu te ensino quando caçamos — dizia Kael, com sua voz firme e encorajadora.
— Papai? Por que isso agora? — perguntou Pearl, em sua memória, mais nova e confusa.
— Um dia você pode estar numa situação que não queira estar. E isso nem sempre é ruim. O ruim vai ser você não conseguir superar a situação.
— Como eu me livro da situação? — perguntou Pearl, mais velha, a si mesma, enquanto as palavras do pai ecoavam em sua mente.
— Lembre-se, Pearl: você tem que manter a calma e agir. Não importa o que aconteça, nunca se perca no medo. — Kael sorria em sua lembrança. — A Yuki pode até parecer mais com sua mãe, mas você, você tem o coração corajoso igual ao dela.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.