Capítulo 1: Um Deslize Que Levará A Ruína
Não sei quanto tempo se passou. Afinal, preciso mesmo saber?
Uma sala escura em um lugar escondido. Minha única companhia era uma pequena goteira que caía de tempos em tempos no salão.
Grande era a cela em que estava, junto com as correntes que me prendiam. Tijolos rachados por toda a prisão, mas seus guardas sempre bem armados.
Podia contar muitos, entretanto poucos passavam por minha sessão. Eram vozes diferentes… toda a vez.
Minha raiva não poderia ser descrita, entretanto minha tristeza já havia chegado às estrelas. Não queria acreditar, mesmo tendo se passado tanto tempo desde sua morte.
Não queria aceitar, mesmo todo aquele público me vaiando e pedindo pela minha morte. Eu sou um monstro?
Queria poder ter feito mais.
Sempre fui uma inútil desde que cheguei aqui nesse mundo. Tudo por um simples motivo que me dava esperanças de continuar aqui: recuperar minhas memórias.
Mas não é como se eu pudesse ir para outro lugar.
Eu odeio tudo.
Ele, aquela maldita entidade, tudo é culpa dele.
Um sonho curto e raso, mais semelhante a pesadelos, me seguiam durante a noite. Se é que eu posso chamar algo de noite.
A cela tampada de todos os lados me impedia de sentir a luz do sol ou saber quando a lua estava no céu. Sem contar com os dias em que era vendada, sem poder saber exatamente onde estava.
Uma prisão que sempre se modificava para mim, trocando-me de celas em celas. De alguma forma, eu era especial; causava medo, esse pode ser o único motivo.
Escutava passos em minha direção. Uma silhueta familiar se aproximava, deixando-me com mais temor.
Sabia quem era.
Ele parou em frente à fechadura, colocando a chave e girando. Automaticamente, a grade recolheu-se para o lado. Consigo, ele carregava uma bandeja de comida.
Uma máscara que cobria metade de seu rosto. Mas tinha uma única coisa que não cobria… seu sorriso.
Samira tinha essa mesma expressão em nosso último encontro. E ver essa mesma feição todos os dias.
Estava parcialmente acordada, perdida em pensamentos de ódio. Mesmo que os tentasse impedir de entrar em minha mente, era quase que inevitável.
Todo esse lugar poderia ruir em instantes, mas eles mantinham todo cuidado possível contra minhas quatro bençãos: A Condessa do Conhecimento, Hefesto, Fantasia e Psyche, que, de alguma forma, souberam dessa informação e projetaram uma cela apenas para mim.
Vasculhando minhas memórias, percebi que meu erro foi confiar demais; confiar em Samira, principalmente.
Mas…
Descobri algo nesse meio tempo. Algo melhor.
[Domínio do Vento]
[Controlar algo como o vento nunca esteve tão perto quanto antes. Agora, você pode modificar o ar em seu favor, utilizando o quanto desejar. Mas nem tudo é um campo florido. Durante seu uso, o ar que respira é cortado.]
Era estranho.
Nunca vi algo como esse em minha tela de status até hoje. Então… por que ela estava lá? Moldar também era outro que não tinha conhecimento. Mais coisas estavam acontecendo e eu ficava cada vez mais confusa.
O cara mascarado logo jogou a bandeja com desleixo no chão, mostrando ser um prato de comida: batatas e pão. Logo, se movimentou para perto da goteira, pegando o balde que tanto acumulava água nela.
Ele andou lentamente até mim, tacando o balde no meu rosto em seguida. Seu movimento brusco me fez acordar totalmente.
Um banho gelado, se é que poderia chamar isso de banho. Minha mente se esvaiu por segundos antes de retomar a consciência.
Ainda tentava discernir o que estava acontecendo, se era dia ou se era noite.
— Acorda, vagabunda — disse com um tom sarcástico. — Comida servida, trabalho cumprido. Agora vê se não estraga nada como da última vez.
Já não tinha voz há muito tempo.
Decidi apenas aceitar meu destino, esperando o momento certo que pudesse acabar com tudo isso.
Sua voz ecoava em meus ouvidos, uma voz que não ousaria esquecer.
Afrouxou as correntes, permitindo-me movimentar meu único braço. Sua ação me indicava que poderia começar a comer.
Mas… eu não queria.
Meu apetite tinha se perdido apenas por ser ele que estava na sala. Tinham outros menos cruéis.
O que aconteceu?
Por que não vieram outros?
Ele não…
— Ei, por que não tá comendo? — perguntou, se aproximando de mim. — Hein? Não vai responder? Sua █████.
Aquele pão estava estragado, era visível o mofo nele. Colocar minhas mãos para comer aquilo com certeza não era uma boa ideia.
Eu não queria, e não iria.
Ele pegou minha cabeça, jogando-a com força contra a bandeja. Acabei esmagando ainda mais aquela comida, por mais podre que ela fosse.
A dor incessante subia.
O formigamento de minha bochecha crescia exponencialmente.
Mas tudo que pude fazer foi gemer de dor.
Algo rotineiro.
Lágrimas caíam sobre aquele pão, enquanto tentava com todas as minhas forças não estragar ainda mais a batata, que parecia a coisa mais comestível dentre esses dois.
Pensei que esse inferno iria durar mais, porém um sino alto começou a tocar. Um padrão óbvio, que nunca tinha escutado em todo meu tempo naquele local.
Três batidas e pausa, três batidas e… pausa.
O mascarado se assustou com o sinal, ajeitando suas roupas.
— Que droga, é uma Fratura? — Arrumou sua gravata. — Você teve sorte hoje, █████████.
Ele virou-se, andando até o local onde iria apertar minhas correntes de novo.
Mas… esse foi seu pior erro.
[Domínio do Ar está se ativando…]
Em uma rajada de ventos, o joguei contra a alavanca que se estendia na parede. Seu corpo logo foi atravessado pelo objeto.
Não espirrou sangue de seu corpo, afinal, aquela alavanca ainda tapava todo o estrago que fez.
Se estava acontecendo uma fratura, havia menos chances ainda deles notarem minha presença. Pelo menos, era esse meu pensamento.
Tinha certeza de que estava morto, afinal, após alguns segundos, ele ainda não tinha se movido. Um corpo jogado e preso a uma alavanca.
Pensa… pensa…
Se ele continuasse fazendo essa pressão, logo as correntes seriam puxadas novamente.
[Hefesto pede perdão por sua inutilidade em todo esse tempo.]
Ah…
Hefesto era o fogo, a forja e o metal.
Mas o fogo poderia ajudar nessa situação?
— Está tudo bem… desde que consiga me ajudar aqui. — Minha voz saiu após tanto tempo.
Sentia estranheza ao escutar ela, como se não combinasse comigo. Minha mente não reconhecia algo que fazia parte de mim.
[Ele responde que sim.]
[Chamas da Criação está se ativando…]
Pequenas chamas foram criadas nas correntes de meu pulso. Se intensificaram e cresceram ainda mais. Estava quente, era possível perceber apenas de sentir o calor ao longe.
— Já ouvi esse nome antes. — Estava rouca, minha voz falhava.
Tinha sede e fome.
Após um tempo, as correntes foram imediatamente soltas com as chamas criadas. O metal derretido caiu ao chão, causando pequenos barulhos na cela.
O corpo fez força o suficiente para ativar a alavanca novamente, puxando as correntes para cima. Mas, como estavam sem nada as segurando, apenas se retraíram como um chicote, causando um breve estalo.
Batia nas minhas roupas, limpando um pouco de poeira que nelas tinha.
Levantei-me com dificuldade; minhas pernas não tinham força devido à energia. Então, arrastei o máximo que podia até o corpo do guarda morto.
Há muito tempo, eu provavelmente acharia isso abominável. Matar pessoas é abominável e não deve ser feito. Porém, eu não considerava nem um pouco essa coisa na minha frente como um humano.
Ele era um demônio na terra.
Me abaixei em seu corpo, buscando alguma chave que pudesse abrir a cela. Até que… a encontrei.
Apenas na minha mente, pulei de alegria.
— Quem é a vagabunda agora? — falei.
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