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    Karina havia me buscado e levado até lá embaixo. Com o suporte preso a mim, o transformou em uma cadeira para que eu pudesse igualar as alturas.

    — Você parece jovem — apontei para o mais velho. Coloquei minha mão sobre o queixo, fingindo que era uma grande detetive. — Deixa eu adivinhar… vocês são irmãos?

    A pequena ficou surpresa. Seus cabelos eram esbeltos e arrumados em um corte nobre. Roupas caríssimas e carregava um colar de pedras no pescoço. 

    Não sei como ela não caiu com tanto peso, para falar a verdade.

    — Como você sabia disso, moça? — perguntou, colocando as mãos sobre a bochecha em admiração. Seus olhos brilharam.

    — É que eu sou a melhor detetive do mundo, daí eu consigo deduzir as coisas facilmente assim — disse, com um tom de sarcasmo.

    Karina se limpava com um pano atrás de mim. Pedaço de tecido que ficou encharcado de sangue em segundos. Karina amassou e jogou para longe, rasgando um pedaço de sua calça e voltando a limpar seu corpo.

    Essa menina é muito estranha…

    Os irmãos olhavam a mesma coisa que eu: Karina e seu comportamento estranho. E o mais engraçado disso, nós tivemos a mesma reação.

    Um silêncio constrangedor pairou no ar, deixando o clima que já estava ruim, pior ainda.

    — Espero que não liguem tanto assim para ela — falei, balançando a mão em negação.

    A menina mais nova brilhou ainda mais os olhos quando olhou para Karina, enquanto o mais velho impedia que a mais nova fosse correndo até ela.

    — Desculpe por todo esse alvoroço… agradeço mesmo por ter salvado a gente dessa enrascada — disse, se curvando. Um sinal de respeito que não esperaria de uma pessoa com essas roupas tão… caras. — Me chamo Tristan, e essa aqui é minha irmãzinha Rae.

    Sorri em resposta. Queria deixar uma boa impressão para os irmãos.

    Se no futuro nos encontrarmos, assim posso pedir favores por termos salvado eles.

    — Prazer, Tristan. Me chamo Seven, e essa aqui é minha irmã chamada Karina. Estávamos viajando e acabamos vendo vocês sendo assaltados por ladrões e pedi para que ela intervisse. Fico feliz que estejam bem.

    Karina havia se limpado por completo, chegando mais perto de mim e criando rodas em minha cadeira. Seu rosto demonstrava tristeza, como se o que acabei de falar fosse o maior dos pecados.

    Espero que ela perceba que sou muito nova para ter uma criança dessa idade. A vida tem que ter um sentido, e isso especificamente não tem.

    Coloquei minha mão em seu rosto.

    — Salvamos eles já… melhor irmos embora, não? — perguntou Karina, apressada. — Esses caras nem deram pro gasto — disse, fazendo beicinho.

    É… ela realmente não gostou nenhum pouco de ser chamada de irmã.

    — Não precisamos ter pressa — respondi, enquanto fazia carinho em seu rosto.

    — Você d-disse Karina? Aquela b-brutamonte a-assassina? — vociferou Tristan, desesperado. Ele estava visivelmente abalado. Arfava, perdendo a força do braço que segurava a irmã, na qual correu de imediato até a Karina.

    Ela tinha fama, então? Ah! Isso complica as coisas!

    Ah, não! E agora?!

    — Meu nome é Carina, se escreve com c — completou Karina, omitindo a verdade.

    Tristan logo foi se acalmando. Um medo muito evidente havia sido mostrado naquele momento.

    Tomarei cuidado para não cutucar nessa ferida.

    — É que meus pais foram mortos por ela… Desde então, vivo com meus tios. Só sobrou eu e Rae daquela fatídica noite — disse Tristan, com uma expressão triste. — Bem… deixe essas coisas de lado! Venha, Rae. Não a incomode.

    Foi até sua irmã, a pegando no colo.

    Não sabia esboçar nenhuma reação a isso. Sei que Karina havia sido uma assassina esses anos, isso é óbvio com base em seu combate. Porém, conhecer os sobreviventes de seu ataque era demais…

    Precisaria de explicações vindo dela, imediatamente.

    — Sinto muito pelo que aconteceu — disse Karina. Um ato que me causou bastante surpresa.

    Ela estava sentindo pena? Os pais dele não foram mortos por ela?

    — Meus pêsames mesmo, Tristan — falei.

    Estava confuso, muito confuso. Todas as teorias que havia feito em minha cabeça haviam sido desfeitas em segundos. Então, qual era a resposta certa?

    — Não, não! Isso aconteceu há muito tempo já. Tinha uns 11 anos naquela época, era muito novo. — Dava tapinhas nas costas de sua irmã, como se a colocasse para dormir enquanto falava com a gente. — É… Como forma de agradecimento, que tal eu dar uma carona para vocês?

    — Estão indo para onde? Ficaria feliz se nossas rotas fossem as mesmas — disse.

    — Chamabrava. 

    — C-Chamabrava? — perguntei, incrédula. É óbvio que não teríamos sorte. Karina segurou com mais força os apoios da cadeira de rodas, indicando para darmos o fora dali. — Não iremos para Chamabrava, estávamos indo para o lado contrário dela.

    — Sério? Por que é esse o caminho que dá direto com a cidade. Estamos muito próximos das planícies que rondam Chamabrava. 

    Olhei para Karina, desacreditada com seu senso de direção. Sabia que não poderíamos confiar em métodos tão chulos quanto sentir o vento.

    — Foi apenas um erro de caminho. Sabe nos dizer como chegamos em Aguaforte?

    — Aguaforte? Hm… É para… lá — apontou com o dedo. — Nessa direção.

    Um lado diferente do qual Karina havia apontado, assim como esperei que fosse.

    — Oh, muito obrigada mesmo por essa informação! Queria me despedir agora, porém tem algo que me incomoda — disse, logo após apontei para a carruagem. — Vocês vão conseguir chegar até lá em segurança?

    — Até queria dizer que sim… mas é muito provável que não. Porém, estamos perto! Só torcer para os bandidos já estarem longe. — Sorriu. — Além do mais, eu sei dar uma de cocheiro!

    — Eu… entendo. Vamos nos despedir aqui, Tristan. Temos caminhos diferentes a serem seguidos.

    — Igualmente, senhorita Seven! Agora, se me permitir, irei me retirar. Desejo muita boa sorte em sua jornada com sua irmã! — Andou até a carruagem, se despedindo com a mão.

    — Ele me chamou de senhorita? — perguntei para Karina, rindo de leve. 

    — Pelo visto, agora a senhora é uma nobre das boas, mamãe — respondeu Karina. Da qual parou de rir assim que lembrou de algo. Talvez do acontecimento que envolveu os pais de Tristan e Rae. — Mamãe, a senhora me escutaria se eu me explicasse? Sinto que isso tenha te incomodado bastante.

    — Claro que eu escuto… mas não agora. Olha para eles — disse.

    A carruagem havia começado a andar. 

    Agradeceria pelos cavalos não terem ido embora com a confusão, pelo menos eles não teriam tanto problema assim.

    — O que tem eles?

    — Vamos seguir esses irmãos, garantir que eles cheguem às planícies de Chamabrava de forma segura.

    — Ah! — Bateu palmas. — Você é uma gênia, mamãe! Eu gosto dessa ideia.

    Karina lentamente transformou a cadeira de rodas no suporte que era antes, colocando em suas costas. Ela saltou e saltou pelos montinhos, até que chegasse nas árvores.

    Fez um pequeno alongamento, iniciando todas as manobras.

    Estava em suas costas de novo, só que agora, me sentia mais acostumada com tantos giros que ela dava.

    A carruagem havia tomado distância, o que deu tempo o suficiente para Karina pegar impulso. Ela começou a saltar e saltar entre os galhos.

    Se prendendo em alguns, girando em outros. Aquilo estava realmente divertido.

    Não perdemos o foco principal: proteger os irmãos até as planícies. Porém… um pouco de diversão não faz mal, né?

    Demorou bastante tempo até chegarmos à última árvore que compusera a floresta. Olhamos de longe para a carruagem, que ficava cada vez menor com o tempo.

    Em um ponto ainda mais distante, vimos o que poderia ser chamado de Chamabrava. Uma grande cidade murada. Estava mais tranquila agora.

    Karina me pôs em suas costas de novo e iniciou os saltos em uma direção contrária.


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