Ela virou para mim, abrindo os seus olhos vermelhos. Não parecia ter demonstrado nenhuma expressão, se mantendo calma até o momento. 

    ― Estava curiosa… e também por alguns outros motivos.

    ― … ― Ela apenas tinha voltado ao seu posto, sem que me respondesse.

    Não liguei muito para o que ela tinha feito, apenas aproveitei a situação e olhei ao meu redor. Era idêntico, em uma escala maior, mas idêntico a outra igreja. 

    O quadro de trabalhos que na outra cidade estava vazio, nessa estava cheio, e isso era uma oportunidade clara de ganhar algum dinheiro, ou de me aventurar mais nesse mundo.

    Novamente a flor estava presente, estando acima do quadro, dos vitrais e no próprio altar no centro. A estampa do carpete era de pétalas, as portas tinham referência a flores. Isso não me parecia uma igreja qualquer.

    ― Se for para ficar perambulando por aqui, por favor saia. Mas caso contrário, se você veio checar a sua janela, apenas diga logo.

    ― É eu vim fazer isso mesmo! ― disse, sem pensar direito no que estava fazendo.

    ― Então venha. ― Ela saiu de sua posição, dando espaço para subir ao altar.

    Estava diante da mesma situação, mas mesmo hesitante, coloquei minha mão no altar.


    [Lvl. 1 → Lvl. 5] 


    [Todas as estatísticas subiram em 10.]


    [Alerta!]


    [SISTEMA INCOMPATÍVEL COM O USUÁRIO.]


    [COMPLEXO SE SOBREPÕE SOBRE O SISTEMA DE RESIDENTES.]

    Por que isso está acontecendo agora? Já havia colocado minha mão no altar antes. Várias telas de alerta apareceram à minha volta, e sem entender retirei minha mão do altar, o que não fez elas desaparecem.

    Olhei para os lados, tentando ver se alguém havia notado o que acabara de acontecer.

    ― Ei! Isso tá errado, não tá não? ― disse.

    ― “E quando uma calamidade ameaçar a terra novamente, os herois cairão do céu para proteger o mundo da devastação”.

    ― Que? Do que você tá falando? 

    Ela havia deixado de ficar relaxada de um momento para o outro. Sua posição agora refletia alguém de nobreza.

    ― Devo imaginar que deve ter ficado confusa ao cair do espaço, não é mesmo? Relaxe, está tudo bem agora. 


    Era um déjà vu completamente. Estava no escritório de outra pessoa de alto escalão dessa igreja, mas dessa vez havia um guarda na sala juntamente a ela, da qual não sabia seu nome.

    Estava nervosa por não conseguir entender nada do que falava, e ainda piorou com a grande espada que o guarda tinha. 

    ― Por que você me trouxe pa-

    ― Lótus, esse é o nome dessa igreja, se era isso que iria perguntar. Que sorte a nossa termos encontrado um heroi aqui, agora podemos pedir o auxílio providenciado pela capital. 

    ― Não foi isso que queria saber, eu queria saber por que diabos eu est-

    ― Meu nome é Daiane, a Santa de Lótus. Caso for isso que você queria perguntar.

    Ela não parava de me interromper, estava me irritando tudo isso.

    ― Dá pra parar de me interromper? ― disse.

    Ela me olhou com um olhar assustado, como se ninguém nunca tivesse questionando esse seu modo. O guarda ao seu lado imediatamente colocou a mão sobre sua espada.

    ― Ninguém… ninguém nunca falou assim comigo! ― Sua personalidade mudou bastante de um minuto para cá, realmente era uma ótima atriz.

    ― Só por favor, fale o que você quer de mim. 

    ― Eu vou perdoar a sua insolência contra mim, mas só dessa vez! Um heroi em nosso estado faria os números decolarem.

    Heroi..? Sabia o que significava, mas não existiam apenas cinco já mortos? Suas palavras entravam por um lado do ouvido e saiam pelo outro.

    ― Eu não sei do que você está falando.

    ― Herois! O oráculo! Vocês deveriam ter esse conhecimento, não? Pelo menos o que os panfletos da capital diziam que vocês cairiam sabendo de tudo.

    ― Explique tudo, lentamente se possível. Estou sob condições especiais, da qual não tenho totalmente as minhas memórias ― disse, enquanto pegava o café na mesa. Mas estava tão quente que queimei a ponta do meu dedo.

    ― Tsk~ Vocês são realmente muito inúteis ― resmungou.

    ― Ok, já deu. Estou indo embora, não tenho tempo para essa baboseira.

    Levantei-me imediatamente, indo até a porta com o guarda ao lado. Estava puxando a maçaneta para ir embora, mas por outro lado o segurança não havia gostado de minha saída, pois impediu minha ultrapassagem com seu braço.

    ― Espera! Estava só brincando, sabe como é né. Sente novamente, vou explicar tudo certinho como você queira.

    Realmente ia fazer de tudo para ficar ali, mas ao contrário de Klaus, ela não era tão intimidadora assim. Sentei novamente para escutar as baboseiras saindo de sua boca.

    ― Então, o sistema de residentes considera você fora dele, e isso só significa uma coisa: você é um heroi. O oráculo havia dado essa profecia a mais ou menos três anos, e de lá para cá viemos esperando eles caírem do céu. ― Suas explicações eram dadas enquanto ela andava sobre o cômodo, me deixando confusa para onde deveria olhar.

    ― E o que impede disso estar errado? ― perguntei.

    ― Nada! Mas a chance de termos um escolhido aqui pode significar que as Torres estão cada vez mais perto de causar uma ruptura maior do que a gente poderia pensar.

    ― Torres? O que seriam elas?

    ― Ah… então você não sabe isso também, tsk ― Assim que escutei seu estalo de língua, me levantei. ― Oh não, não! Desculpe de novo. As torres são estruturas que habitam em locais isolados, elas estão aqui desde os primórdios e dentro delas habitam o que chamamos de Viajantes. 

    ― Elabore. ― Finalmente estava obtendo as respostas que queria, estava me sentindo satisfeita.

    ― Bom, os viajantes são seres de outros mundos que vem para cá sem motivos aparentes além de destruição. Dentro das torres são encontrados alguns itens valiosos, por isso as profissões de caçadores se popularizaram. Normalmente são divididos em categorias e espécies aqui mesmo nas igrejas locais. Também são envolvidos em um fenômeno que chamamos de fratura.

    ― Agora me explique mais sobre as fraturas. ― Tentei pegar o café novamente, e dessa vez ele estava frio o suficiente para meus dedos não queimarem.

    ― Quando uma torre é superlotada de viajantes, eles tendem a sair de seu habitat, vagando por quilômetros para chegar a alguma cidade ou buscar comida.

    Tudo havia se esclarecido em minha mente. Agora o pior dos problemas não era a minha falta de informações, mas sim eu ser considerada uma salvadora.

    Me levantei, agora para ir embora. Já havia dado o meu tempo no local e não queria mais me envolver nesses assuntos. Mesmo que tenha explicado tudo e faça sentido, ainda sim não confiava em todas as informações dadas.

    Ouvia sons de passos extremamente fortes, correndo pelo salão até chegar à porta do escritório de Daiane. 

    ― Daiane! Você está aí? ― Era a voz de Jorge.

    Ela saiu rapidamente até a porta, como se estivesse envergonhada, então a fechou logo após. Jorge realmente era um cara que conhecia todo mundo, simplesmente uma máquina de socialização.

    Estavam conversando, ou melhor discutindo sobre algo. Cheguei mais perto da porta, e acabei pegando a conversa pela metade.

    ― Mas pai! Ela pode salvar o norte com o dinheiro da capital!

    ― Quando você saiu da nossa casa eu nunca questionei suas decisões, mas agora é diferente.

    ― Ela ainda está sem suas memórias, um tempo aqui e ensinaremos tudo a ela para ser um heroi!

    ― Espera, Seven está sem memórias? ― perguntou Jorge.

    É… uma situação delicada. Nunca havia falado para Jorge sobre o que havia acontecido comigo, então deve ter sido um choque para ele. Abri a porta, dando de cara com eles dois discutindo. 

    ― Então talvez eu seja a única salvação? ― Isso é muito peso para mim, não gostava dessa ser a única opção que tinha.

    ― Olha, Seven, é uma escolha sua. Você não precisa ficar aqui exatamente ― disse Jorge, se aproximando.

    ― Não… eu fico. É melhor do que ficar apenas a suas custas, Jorge. 

    Ele parecia entender a minha situação, mesmo que não dissesse tudo, sobre Gaia, sobre minha condição.

    ― Posso? ― Ele abriu seus braços, da qual acenei como resposta. 

    Ele me abraçou, tentando me reconfortar. Se eu tivesse um objetivo tão claro de vida, com certeza ser uma pessoa igual a ele estava em meus planos. Uma pessoa que entende os sentimentos dos outros sem ao menos precisar falar sobre eles, uma pessoa que cuida dos outros por puro carinho.


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