Capítulo 23: Bebê Chorão!
Karina havia chegado meio triste de sua saída, uma reação totalmente diferente da que eu imaginava. Por que sua raiva havia se transformado em melancolia?
Ela se deitou na cama, abraçando o travesseiro. Daquela forma, parecia ser só mais uma adolescente iludida. Peguei as roupas que ela havia me dado, indo em direção ao banheiro que tinha no cômodo.
Quando peguei para ver… não tinha uma camisa, apenas uma jaqueta e uma calça. Fiquei frustrada, pois tudo que eu queria naquele momento era uma camisa diferente.
É, vou me virar com o que tem, mesmo que eu odeie camisas sem manga.
Olhava para as cicatrizes que se encontravam em todo o meu corpo… Antes eu sentia um pouco de vergonha delas, mas agora eu sinto orgulho.
Terminei de vestir as roupas que havia me dado, jogando fora as que estavam sujas. Eu ainda vou dar uma bronca em Gaia por ter feito isso.
Fui até ela.
— Pensou no que eu te falei? — perguntei. Sentei-me ao seu lado da cama, puxando seu rosto em minha direção.
— Ah… Pensei — Colocou a mão em seu queixo. — Eu já escutei sobre esse tipo de lenda, seus registros são mais antigos do que parece.
Abriu um portal ao seu lado, tirando seu caderno de anotações. Era igualzinho ao que lembrava, indicando que ela nunca mudou em todo esse tempo.
Começou a folhear as páginas.
— Encontrou algo? — Me aproximei, olhando o que estava lendo.
Fechou sua caderneta, frustrada com as informações descobertas.
— Não… nada que eu tenha escrito — Olhou em meus olhos, pegando um lenço logo após. — Você tá suja aqui.
Limpou minha bochecha.
— Ah! Nem tinha percebido. — Fiquei envergonhada com a situação. — Muito obrigada mesmo.
— Não tem de quê — respondeu, abrindo seu largo sorriso afiado. Sentia muita falta dele mesmo. Chegou mais perto da minha bochecha, beijando-a.
Fiquei mais envergonhada com a situação. Gaia não parava de ser tão amorosa e eu não deixava de ser tão receptiva com suas brincadeiras. O sentimento de saudade era imenso, não poderia ser desfeito com tão pouco tempo assim.
Coloquei minha mão em seu pescoço, a trazendo mais para perto. Nossos olhos se encontraram em meio a um tempo lento, com a brisa entrando pela janela, esfriando o local.
Gaia hesitava em falar, enquanto eu não achava necessário ela dizer qualquer coisa naquele momento. Estávamos tão perto…
— Acho que é melhor não… — Gaia colocou a mão em minha boca. — A cama já quase quebrou há instantes atrás. Vão reclamar disso — murmurou, enquanto evitava contato visual.
Ela tava certa quanto a isso…
— O que vocês tão fazendo? — Karina havia se aproximado em instantes, separando-me de Gaia com seus braços. — De novo com essas brincadeiras?
Ela realmente tinha ciúmes de Gaia… Como eu posso resolver isso? Não parecia gostar nem um pouco da ideia de seu pai ter sido apresentado tão bruscamente.
Mas o que eu poderia fazer? Ela só tinha que aceitar essa nova realidade!
— Não são brincadeiras, Karina. São demonstrações de afeto… — Tirei seu braço de minha frente, dando um abraço em Gaia.
Estalou a língua.
Seu rosto estava prestes a chorar.
— Mamãe… — Sentou-se ao nosso lado. — Meu coração tá doendo.
O que?
Soltei Gaia e, imediatamente, chequei a condição física de Karina.
— Sente algo mais, Karina? Talvez complicações para respirar? — perguntei, quase aos prantos. — O que aconteceu quando você saiu?
Karina caiu sobre Gaia, enquanto me puxava pelo braço. Em um movimento ainda mais inesperado, Karina nos abraçou, chorando logo após.
Uma coisa que eu nunca esperaria ver ela fazendo… Karina cair em lágrimas é um pesadelo ainda mais inalcançável.
Não conseguia explicar para nós o motivo de seu choro, que ia aumentando a cada segundo. Ela estava séria sobre aquilo, não era um teatro.
Passaram mil coisas em minha cabeça sobre o que poderia ter acontecido, mas nenhuma delas parecia se encaixar. Um caso não resolvido.
Gaia me olhava surpresa, talvez estivesse pensando sobre o fato de Karina chorar enquanto a abraçava também. Seus olhos se arregalaram diante daquela situação.
— Eu… acho que fiz uma amiga — falou Karina. — Eu fiz uma amiga…
Então foi isso? Mas não é um choro de felicidade…
Não parava por um segundo. As roupas de Gaia começaram a ficar encharcadas com suas lágrimas.
Peguei em seu rosto.
— Karina! O que aconteceu? — perguntei. Se alguém a machucou, eu juro que vou destruir a vida do sujeito!
Ela limpou suas lágrimas, demonstrando um sorriso entristecido. Hesitava em falar a situação por completo, mas era possível entender que a haviam machucado.
Mas como? Karina é tão forte…
Ah…
Forte fisicamente, fraca na mente.
Uma chave foi acionada em minha cabeça, deixando-me ainda mais irritada com quem quer que seja esse indivíduo. Ele enganou minha filha e a fez chorar? Não!
Isso não pode acontecer!
— Mamãe! — Suas lágrimas não a deixavam concluir sua frase. — Eu fiz uma amiga muito… legal.
— Você já falou isso, filha! — A puxei para mais perto, deitando-a em meu ombro.
Ela continuou a chorar.
— Ela era muito legal mesmo… Legal. — A partir daquele ponto, pude discernir que Karina não conseguia demonstrar seus sentimentos muito bem.
Era visível.
— E o que mais, filha?
— Ela fez meu coração doer… — disse Karina. As lágrimas escorriam cada vez mais em meu corpo, molhando a roupa nova que tinha acabado de ganhar. Naquele ponto, não poderia perdoar essa pessoa de jeito nenhum.
— Qual era o nome da sua amiguinha, filha? Consegue contar para a mamãe? — disse.
— O nome dela era… Kaori! Eu me lembro disso, ela era muito legal… — Frases repetidas sem parar. Karina já não tinha mais forças para chorar, mas continuava chorando. — Mas meu coração dói muito… eu não quero que ele fique assim.
Karina continuou a chorar pelo resto da tarde, sem parar um único segundo. Suas palavras sem sentido e frases repetidas não a deixaram na mão por todo esse tempo. Minha raiva por essa tal de Kaori só aumentava!
Gaia deitava Karina em suas coxas, fazendo carinhos em sua cabeça. Agora, de noite, ela estava mais calma, parando com seu choro.
A comida estava chegando e, pelo que havia pedido, seria carne até não aguentar mais.
— Se acalmou agora? — perguntou Gaia. Parecia ter aceitado muito fácil o fato de ela ser sua filha, mas não a julgo tanto assim.
— E-eu acho que sim… Obrigada, pai — disse Karina.
Sua ação, mais uma vez, surpreendeu a mim e a Gaia.
Olhei para ela e, sem falar nada, conseguimos manter uma conversa a partir de expressões.
“Ela te chamou de pai?”
“Chamou… chamou?”
“Fique feliz com isso. Estão evoluindo!”
“O que eu faço? O que eu faço!? Eu nunca tive uma filha!”
Pelo menos foi assim que imaginei a conversa.
Escutei batidas na porta.
— De nada, minha… filha — respondeu Gaia, hesitando.
— Comida chegou! — gritou um homem. Era o mesmo recepcionista que tinha vindo mais cedo reclamar do barulho.
Bem… foi muito constrangedor.
Abri a porta, sem olhar muito para a cara dele. Estava muito envergonhada só de lembrar o que tinha acontecido.
Bandejas de ferro, das quais trouxe todas para dentro em um piscar de olhos. O cara se impressionou, mas logo saiu sem ligar muito, talvez seja muito comum para ele ver tantas bençãos quanto essa.
— A comida chegou! — gritei, enquanto colocava as bandejas na mesa do quarto.
Karina se alegrou no mesmo instante, limpando as últimas lágrimas de seu rosto.
Minha mente não deixava de pensar em uma única coisa: isso era um… jantar em família?
Um sorriso apareceu em minha face, era involuntário. Gaia respondeu ao meu ato, repetindo ele. Quase como um vírus do sorriso, Karina demonstrou seus dentes separados.
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