— Eu estou finalmente de volta, Seven. — Sua aparência havia mudado desde então, mas ainda era possível identificar aquela que esteve do meu lado um dia.

    — Suas roupas… — Ela não usava mais aquele cordão, assim como o seu grande casaco preto por cima dos ombros. No local dessas coisas, foi substituído por um longo cachecol.

    — Aconteceram algumas coisas. — Evitou meu olhar.

    Ela não queria falar sobre aquilo, então eu não iria forçar ela a desembuchar.

    Seu aperto era forte, me segurava como se fosse a coisa mais valiosa do mundo. E então, olhando para as minhas feridas disse: — Não se importe comigo, do contrário, olhe para você… 

    A sua hesitação era clara, não conseguia formar uma única frase enquanto estava me olhando.

    — Aloou! Eu ainda estou aqui, sabiam? — disse Daiane.

    Por um segundo esqueci da situação em que estávamos. Deveríamos sair dali o mais rápido possível, pois de acordo com Daiane, quando um monumento como esse era finalizado, a torre voltava ao seu normal em poucas horas.

    Um ciclo vicioso, sem torres adicionais e sem torres a menos. Simplesmente voltando e voltando às mesmas situações perigosas, onde caso não façam nada sobre a estrutura ela iria se romper em uma média de cinco anos.

    Gaia me colocou ao chão com cuidado, tendo certeza de que eu pisaria no solo antes de me largar. Mas, mesmo assim, ela não deixou de soltar minha mão.

    — E você, hein? Eu não sabia que ela estava se envolvendo com umazinha por aí — disse, me colocando para trás dela.

    Que ambiente perigoso.

    Acabei dando a ideia de apenas sairmos daquele local, pois não era a melhor hora para uma conversa ou discussão.

    Então, Daiane logo veio com uma grande carruagem com quatro assentos dentro dela. E demorou um tempo para eu perceber que era a mesma que estava na porta da igreja.

    Peguei algumas coisas que haviam no chão e…

    — A lança dele. Será melhor que os familiares tenham alguma recordação.

    Uma morte brutal e sem nenhuma chance de salvação. Mesmo que tenha saído vitoriosa, não foi com minhas próprias mãos… Suponho que eu deva parar de pensar nisso, esses pensamentos só vão me atrasar.

    Cheguei por último no transporte, e vi as duas sentadas dos lados opostos do veículo. O cocheiro logo me mandou entrar, e sem que ao menos percebesse, fui puxada pelo braço para o lado de Gaia.

    Não foi mal intencionado da parte dela, pois quando olhei para seu rosto, a sua expressão demonstrava um sentimento diferente de ódio.

    Daiane olhou para mim do banco da frente como se eu fosse uma presa perto de um predador, e pelo jeito que agia, demonstrava que queria dizer alguma coisa.

    Mas antes que pudesse apresentar as duas, logo uma briga emergia dentro do veículo envolvendo elas.

    ― Tsk, saia ― disse Gaia de forma agressiva.

    ― Essa é a minha carruagem…? Eu não vou sair de algo que é meu ― respondeu Daiane, de mesmo tom.

    Eu não queria que chegasse a esse ponto, não imaginei que uma hora elas iriam se encontrar… e principalmente em uma péssima situação como essa.

    A baderna dessas duas ecoava mais alto que o troar dos cavalos na carruagem. Era insuportável todo o barulho que causava, e o motivo disso tudo parece ter sido nada mais e nada menos do que eu.

    E, mesmo não tomando totalmente o líquido misterioso que foi me dado, meu corpo parecia estar ficando melhor das feridas.

    ― O que tinha naquele frasco? ― perguntei, olhando para a ferida de minha mão cicatrizar.

    ― É, o que tinha naquele frasco, hein? ― Gaia seguiu os meus questionamentos. 

    — Poção de cura. É comum de se ter por aqui.

    Gaia chegou mais perto de meu ouvido, tampando a boca dela lateralmente com sua mão. E murmurando disse: — Eu não confiaria nela.

    Confesso que apenas ri com o seu aviso. 

    Daiane não é tão perigosa assim para me dar um veneno, apenas perguntei por curiosidade. Mas Gaia deve ter levado isso como um argumento válido para seu lado.

    Felicidade, esse é o melhor sentimento para descrever o que estava sentindo com a volta dela, o meu coração não demonstrava nada mais além disso. Mesmo ferida, mesmo sem ter você ao meu lado, mesmo encarcerada em um local indesejado… a sua companhia era tudo o que eu necessitava.

    Tínhamos muitas para botar em dia, mas sem pressa para falarmos os seus motivos, pois tudo que eu quero é aproveitar esse breve momento. 

    ― Seven! Você ainda não me explicou quem é essazinha aí  ― disse Daiane, apontando para Gaia que estava ao meu lado da carruagem.

    ― Ah, Gaia é u– 

    ― Sou amiga dela. ― Ela me cortou, não deixando terminar a minha frase.

    Suas palavras estavam corretas, mas de certa forma fizeram eu sentir uma pontada em meu coração. Senti que queria interromper, e iria, mas não consegui por covardia.

    ― Você tem certeza disso, Seven? Meu pai não me contou nada sobre uma amiga sua. ― Ela se ajeitava no seu assento.

    ― Ela também não me falou de uma pirralha como você ― disse Gaia, revirando seus olhos.

    ― Por favor, dá para calar a boca? Eu perguntei para Seven.

    ― Ok… ta bom. ― Virou-se para a janela.

    Ela parecia triste e apressada com as suas respostas.

    ― Vamos por partes… quem é ela, Seven?

    ― Ela é só uma amiga mesmo. Não nos víamos a muito tempo, então é bom reencontrá-la. 

    Daiane suspirou, essas palavras devem ter sido o suficiente para acreditar na minha história.

    E pelo resto da viagem de volta à Azaleia, ela não parou por um segundo de perguntar sobre Gaia.


    A carruagem parou à frente da igreja, e as duas logo saíram na minha frente. Demorei um pouco para me ajeitar, arrumar o que sobrou da viagem até a torre.

    Era triste fazer isso.

    Saí da carruagem, me deparando com Daiane ainda lá, e ao me observar ela estendeu sua mão para mim. Gaia estava mais ao fundo, nas escadarias.

    Olhando para o gesto de Daiane, não pude recusar, afinal é um ato de compaixão. Aceitei sua mão e ela me ajudou a descer, degrau por degrau.

    Assim que terminei de descer, Gaia virou seu rosto e subiu as escadas antes de chegarmos até ela.

    — Ela está bem?

    — Está animada por ter voltado, apenas isso. Deixe-me conversar com ela um pouco.

    Após subirmos toda a escadaria, Daiane se despediu, indo para seu escritório cuidar de alguns assuntos. Então, logo acompanhei Gaia até os dormitórios da igreja, onde estava meu quarto.

    — Então é aqui que você vem dormindo. — Ela coçou a sua cabeça, bagunçando seu cabelo totalmente. — Me desc–

    — Vamos, entre! Quero te mostrar algumas coisas — disse.


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