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    Estava conhecendo mais faces dela, e eu adorava isso. Uma sensação de felicidade genuína corria por minhas veias.

    Agradecia por ter encontrado uma roupa apropriada, antes de entrarmos no evento.

    Havia vestido um pequeno conjunto de roupas com cores escuras, e que incrivelmente combina com as roupas de Gaia. Minha consciência ficava feliz por isso, mas não sabia o por que.

    Andávamos lado a lado em meio a uma multidão, que, naquela escura noite, iluminava o local apenas com a presença delas. Logo, todos pararam e apenas observaram as sirenes tocando, indicando o início do festival.

    Fogos de artifício explodiram nos céus, com cores tão lindas que hipnotizavam o grande público. Lanternas que voavam eram jogadas por um pequeno grupo de pessoas, ascendendo o grande céu de Azaleia.

    A grande cidade, que sempre foi rodeada de mortes, se unia em três dias e três noites para celebrar e homenagear aqueles que já se foram. Um gesto lindo e anual, 

    Podia ficar horas falando e falando sobre esse evento, e mesmo assim não seria o suficiente para explicar as raízes que ele tinha nessa pequena cultura. E tive certeza de que se eu fosse ficar aqui por um tempo, o mínimo que deveria ter era o conhecimento básico.

    Marchas aconteciam em outras ruas da cidade, e as músicas tocadas pelas bandas demonstravam o quão cheia de personalidade a localização era. Os feirantes aproveitavam os três dias para, não vender, mas sim doar suas mercadorias como uma forma de respeito.

    Todos tinham consciência desse evento, não existia como haver uma maldade naquele local, apenas pessoas tentando sobreviver mais um dia na terra.

    E quando olhei para ela, pude perceber que compartilhamos o mesmo sentimento. Gaia demonstrava um sorriso quase imperceptível em seu rosto, mas seus olhos não poderiam negar o que sentia. 

    — Sabe, nessa multidão de gente… que tal segurar minha mão?— Antes que percebesse, ela já estava me encarando quando me fez essa pergunta.

    Gaia já havia feito essa ação comigo antes, mas de alguma forma sentia que dessa vez era diferente. 

    Ela estava claramente envergonhada ao falar aquilo, e eu muito mais que ela. Mas para não a deixar no vácuo, agarrei sua mão que havia estendido.

    Não falei nada, apenas respondi com meu gesto, que foi muito bem recebido por ela. Não sabia que sentimentos novos eram esses que estava sentindo, mas o que quer que seja, era algo que não queria deixar se esvair. 

    Ela me protegia de toda aquela multidão, impedindo qualquer pessoa de esbarrar em algum de nós. 

    Andamos muito mais do que imaginamos, mas naquela noite, apenas estava começando. O cansaço logo bateu, o calor de todos os fogos de lamparinas e uma multidão de gente, apenas me fazia suar. 

    — Ah! Será que não tem nada para me refrescar aqui? — Sentei em um banquinho que tinha perto. 

    Gaia por outro lado, ao invés de sentar ao meu lado, se agachou em minha frente. Um movimento inesperado, e relativamente constrangedor.

    — Você quer que eu vá buscar algo? — perguntou.

    Nem ao menos consegui responder essa sua pergunta direito. Tudo que passava em minha mente, era essa posição que Gaia estava. 

    Fiquei encarando por alguns segundos, até cair na real.

    — Ah… ah! P-pode ser! — disse.

    — Irei buscar, então. — Gaia se levantou, preparando-se para ir atrás de algo gelado.

    Ela estava quase sumindo entre a multidão, quando eu segurei a sua blusa.

    — Para onde você vai?

    — Buscar algo gelado… não era pra fazer isso?

    O constrangimento era muito.

    — Mas…

    As palavras apenas não saiam de minha boca.

    E mesmo sem falar muita coisa, Gaia parece ter entendido o que queria falar. 

    Ela pegou minha mão novamente e, escondendo o rosto, andou comigo através do festival.

    Chegamos em uma pequena barraquinha que havia e, surpreendentemente, não havia uma fila enorme como as outras.

    Uma senhora de idade estava administrando o local, e junto com ela, seu neto que sentava no banco atrás do balcão. 

    Viemos aqui justamente pelo o que vendia; escrito na plaquinha ao lado “Sorvete”. 

    Gaia logo pediu um da mistura gelada.

    — A-aqui, qual s-sabor — disse a senhora, com a voz tremida e rouca. 

    Ela abriu a caixa da mesa, revelando variedades de cores, cada uma indicando um sabor diferente. 

    Para facilitar a compreensão, a atendente já havia deixado plaquinhas indicando o nome dos sorvetes. Nomes esses que não conseguia ler, pois estavam longe das palavras que estudei.

    — Você vai querer qual? — murmurou Gaia.

    — Eu não sei…! Não consigo ler essas palavras — sussurrei de volta.

    — Eles não te ensinaram a ler não?

    — Não aprendi essas palavras, Gaia! 

    Ela olhou novamente os nomes dos sorvetes, e parece ter percebido o problema. 

    — É um dialeto de Lírio… Desculpe, faz sentido que não saiba — Gaia ficou meio cabisbaixa.

    — Aproveita e pede um saboroso então, já que consegue ler.

    — Eu vou querer um desse e… um desse — disse Gaia, apontando para os sabores azul e branco.

    Dois? Mas Gaia não comia nada, ela é uma marionete…

    — A-aqui. — disse a Senhorinha, entregando os dois sorvetes em pequenos copinhos.

    Gaia pegou, e logo fez gestos como se perguntasse qual eu queria.

    — Esse aqui. — Eu apontei para o branco, porque havia algumas pitadas de chocolate por cima.

    Gaia então me deu o potinho, colocando uma pequena colher em cima do sorvete. 

    — Tem algo que está incomodando… — Assim que disse isso, Gaia logo se desesperou.

    — O que? Talvez alguém esteja lhe machucando? Talvez não goste desse sorvete? Posso resolver qualquer coisa.

    — Não, não é isso.

    — Então o que é? 

    — Você. Por que comprou dois sorvetes? Nunca a vi comer.

    — Ah… é claro. Meio que […] E também […] Mas daí […] — Ela começou a usar termos técnicos até demais, tantos que meu cérebro não teve a capacidade de acompanhar o seu raciocínio.

    — Desculpe, desculpe. Você pode falar em uma versão mais simplificada, por favor?

    — Ah, tudo bem. Devido a alguns eventos, tive que trocar de corpo. E esse aqui especialmente, precisa de alguns nutrientes para funcionar.

    Então ela teria que comer agora? Haha! Bem feito. Agora não ficarei sozinha comendo que nem uma fera, terei Gaia para me acompanhar nessa jornada.

    Deixando as brincadeiras de lado, algo martelou na minha cabeça imediatamente. O que faria Gaia ter trocado de corpo? Sinceramente, a curiosidade do que aconteceu nesses dois meses era alta, mas não vou ser inconveniente de perguntar diretamente.

    — Que foi? — disse Gaia. — A sua expressão…

    Ah! Talvez eu tivesse deixado transparecer um pouco do que estava pensando.

    — Não, nada! Vamos seguir para onde agora?

    — Ah, ok então.

    Dessa vez, fui eu quem segurou a mão dela. Um movimento com certeza inesperado para ela, mas não pude virar para trás e conseguir ver sua reação.

    De repente, tambores começaram a chamar toda a atenção do local. Então muitas pessoas se aproximaram da origem deles, a fonte do parque.

    Era alto, alto o suficiente para me incomodar.

    — Estamos começando agora… O evento principal da noite! — gritou um apresentador.

    Havia lido em algum lugar que, em todos os dias de evento, um acontecimento especial era narrado. Os livros me disseram que o do ano passado, foi encenado uma obra de ação. 

    Gaia tampou meus ouvidos, como se tivesse percebido o meu desconforto a esses sons repetitivos. 

    Acabei tirando suas mãos.

    — Relaxa, tenho que aguentar pelo menos essa noite. Todos aqui estão aproveitando — disse.

    — Olha, Seven, não se esforce muito então — respondeu.

    E os tambores continuaram.

    Um grande evento está acontecendo, e dessa forma, que esse povo tinha entretenimento.

    — É uma obra de romance dessa vez?

    — Será? Aí eu tô tão animada! 

    Ouvia murmúrios das pessoas ali perto.

    — Você… quer ir lá? — disse Gaia, coçando a sua bochecha.

    Eu não havia falado nada sobre estar ou não interessada em ver. Então a única possibilidade seria…

    — Se você quer assistir, é só falar. Eu vou com você.

    — N-não é bem assim, tá!

    Estava feliz com esse pequeno momento.


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