Capítulo 35: Bêbada? Jamais!
— Bolos… Hehehehehe… Bolos de chocolate… — Seven murmurava enquanto dormia. Olhos entreabertos enquanto babava pela boca.
Continuava em sonhos profundos há horas, mas nunca era cansativo ver ela dessa forma. Um jeito bobo e engraçado.
Espero que, dessa forma, ela possa esquecer o sofrimento que passou.
O pássaro voou para cabeceira da cama, inclinando seu corpo para Seven.
— Que foi, amigo? Você gostou dela também? — disse. Sentia meu peito aquecer diante a aquilo.
O sol da tarde entrava no quarto, e seria nesse horário em que Karina voltaria para casa. Como será que foi?
Estou muito curiosa para conhecer essa sua amiga.
A baba de Seven caiu na cama, e esse foi o primeiro indício de que eu deveria limpar aquilo.
Dei uma leve risada de sua situação um tanto quanto constrangedora. E, com a minha mão, peguei um pano próximo.
— Aqui, babona — disse, enquanto enxugava sua boca e a cama.
Estava tranquilo.
Gostava disso.
Não existia tantas coisas para atrapalhar uma vida normal.
Quero continuar dessa forma.
Era ruim demais desejar isso?
Seven está ligada a tantas coisas que desconhece, e eu estou conectada a tantas coisas perigosas… Será que é possível viver uma vida normal assim?
É…
Um desejo.
Um desejo que estava se sobressaindo ao meu objetivo.
Mordi os lábios, tentando causar uma dor maior do que a sentida em meu coração. Sentimentos são confusos e nunca tentei alinhar eles ao meu caminho, mas dessa vez era diferente, muito diferente.
— Ah… eu estou tremendo — falei.
O pano caiu na cama, sua leveza fazendo-o percorrer o caminho de forma lenta. Levei minha mão ao peito, colocando-a em cima do lugar onde deveria residir meu coração.
— Hmmmm… Gaia…? — perguntou Seven, acordando de seu profundo sonho com bolos. Coçou seus olhos, tentando achar a mim. — Cadê você… Gaia…?
Sua consciência ainda estava desligada, mas era entendível levando em conta o tanto que dormiu.
— Estou aqui, Seven — respondi, entrelaçando os dedos de nossas mãos. — Não se preocupe.
Gargalhei.
Então, a primeira coisa que ela pensa quando acorda sou eu? Devo acreditar que esse sentimento é mútuo agora.
Seven encostou na cabeceira. O pássaro logo percebeu o perigo, voando um pouco para o lado.
— Gaia… é você?
Talvez sua visão ainda não tivesse focado, ou talvez estivesse tão cansada para ainda não me reconhecer.
— Sou eu sim, Seven.
— Hehehe… Eu comi bastante.
— É, eu sei que você comeu bastante.
Ela soltou minha mão, colocando-a em sua barriga, acariciando em círculos.
Tinha alguma coisa naquele chocolate? É muito estranho esse seu modo de agir.
— Ahn? Cadê Karina…? Hic!
Soluço?
— Seven… Você está bem?
— Bem? Eu tô… Hic! Bem demais! — Antes mesmo que pudesse fazer algo, Seven se jogou contra mim, me abraçando.
Naquele instante, nem pude sentir vergonha ou nada parecido, era um comportamento estranho e não condizente com o momento. Ao se apoiar em mim, pude sentir um cheiro forte e inconfundível.
— Álcool? Você bebeu, Seven? — perguntei, incrédula pela situação. Mas não havia nenhuma garrafa naquela mesa, então o que poderia ter feito isso?
— Gaia, eu ti amu! Hic! — Me apertou em seu abraço. — Ti amu tanto que passaria o resto de minha vida com vucê!
Mantinha um sorriso bobo em sua cara.
Ela falava de forma lenta, quase não saindo de sua boca. Nada fazia sentido, o normal para alguém nesse estado.
— S-Seven! Você não está nada bem, então, por favor, me largue! Vou lhe ajudar a passar por esse estado.
Assim que disse isso, ela usou toda a sua força para me jogar ao chão.
Bati a cabeça no piso de madeira, mas com minha resistência, não doeu tanto.
— G-Gaia… vusê… Hic!… Me odeia? — Lágrimas começaram a cair em minha roupa. Seven, naquele momento, tentava limpá-las com toda a sua força.
— Não, eu não odeio! Só… fique um pouco mais calma!
— Hehehe… Hic! Vusê naum me odeia, então… Hehehe… — Outra mudança de humor brusca.
— Seven, você está bêbada. Melhor descansar um pouco mais!
— Bêbaaada? Naum! Tô naum! — respondeu Seven, levantando. Um jeito desequilibrado, quase caindo ao chão. — Hehehe… Que legal! O chaum tá se moveendo.
O pássaro voou da cabeceira até o guarda-roupa. Que droga! O que ele está fazendo?
Cadê Karina nessas horas? Bem que ela poderia chegar agora!
Seven cambaleava no mesmo lugar, fechando seus olhos. E, em segundos, Seven foi em direção ao chão.
Ainda estava deitada no mesmo lugar, então, acabei servindo de travesseiro para amortecer sua queda.
— Dormiu…? — falei, vendo Seven se ajeitar em meu busto. Havia fechado os olhos e começou a roncar naquele instante.
Pensei estar segura agora. Tudo havia se acalmado em instantes.
O quarto, antes inundado por caos, estava mais quieto. A ave me olhava confusa, grunhindo para nós duas.
— Oi, amigo… — murmurei, arfando em cansaço. — Eu tenho que te dar um nome.
O pássaro voou até a janela.
— Ah… Já vai embora? — disse com um tom entristecido.
Não posso prendê-lo para sempre. Então, é justo que vá embora.
Espero que um dia ele volte.
Levantei a mão, balançando-a em despedida.
E então, a ave voou para longe.
— Hehehehehe… Eu ti amu mesmo Gaia!
Em um pulo, Seven havia acordado de seu curto sonho. Seu rosto vermelho e olhos caídos demonstravam o quanto estava bêbada naquele instante.
Escondi meu rosto com a mão.
Ela está… tão fofa desse jeito!
Se controle, Gaia, se controle!
Fazer algo com uma pessoa bêbada é o pior dos crimes! Isso não pode acontecer e nem vou deixar isso acontecer!
Levantei-a, colocando sentada ao chão em minha frente. Estava quente, tentando evitar ao máximo o contato visual.
Seven não está bem nesse momento, tenho que ajudar ela.
— Vosê… não mi ama? Hic! — Continuou Seven, fazendo biquinho.
Ela estava emburrada?
— Pfft! Que fofa! — disse. Palavras que, na verdade, deveria ter pensado.
Estava constrangida após falar isso.
Meu coração batia rápido.
Será que… ela desgostou?
Seven estava em silêncio, e eu me recusava a olhar para sua cara. Vai que… ela comece a me odiar do nada? Não! Não quero isso!
Abri meu olho, enxergando Seven por uma pequena fresta que havia se formado.
— Gaia… vosê… me acha fooofa? Hic! — perguntou Seven, escondendo os lábios com seus cabelos. Ela estava mais vermelha, evitando olhar pra mim.
— Mamãe! Papai! Tão aí? — Uma voz interrompeu esse momento. Karina havia chegado, batendo na porta com toda a força.
Me senti aliviada por isso ter acontecido.
Foi o momento perfeito.
Não sei o que aconteceria caso ela não tivesse impedido.
— A p-porta está aberta, Karina! Venha rápido, sua mãe está passando por uns probleminhas aqui — disse.
No mesmo instante, Karina entrou com tudo no quarto.
— Mamãe? O que aconteceu com ela? Fala agora! — disse, olhando para todos os lados.
Karina era um pouco superprotetora também. Essas duas são iguaizinhas.
Comecei a rir de sua cara.
— Ela está bêbada — admiti.
Karina olhou para ela, chocada pelo seu estado no momento. Em sua mão, carregava uma grande sacola, que deixou cair ao chão após alguns instantes.
Será que ela tá brava?
Ver sua mãe bêbada pode ser meio chocante… Principalmente, nesse estado humilhante.
Mas, quebrando minhas expectativas, Karina apenas riu dela.
— Eu não esperava que a mamãe fosse dessas!

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