Capítulo 4: Esse Dia Não Pode Piorar!
— Não — respondi, sem hesitar, mas minha voz estava quebradiça. — Eu não choro.
Pelo menos, não mais.
Limpei o meu rosto, escondendo-me da vergonha que acabara de passar.
— Mas… Não existe nenhum mal em chorar, sabia? É normal para o ser humano — respondeu uma voz serena que poderia encantar qualquer um. — Pode chorar se quiser.
O banheiro estava vazio. Aquele local era um dos menos visitados em toda a faculdade, já que existia um muito melhor dentro dos prédios. A partir desse ponto, era possível interligar algumas coisas simples: a falta de gente, pouca higiene, sem câmeras ou vigias lá fora…
Era uma coisa ou outra. Sempre seria bullying ou…
Ah!
Preciso mesmo dizer?
— Veio tirar sarro da minha cara. Entendi suas intenções — terminei de limpar meu rosto, olhando para ela. — Por que não caí fora? Por acaso os rumores não chegaram ao seu ouvido ainda?
Ela paralisou, seus olhos tremendo um pouco.
Ah… Ela ainda não havia ouvido todos os rumores, então.
— Me surpreende que você pense isso de mim — murmurou. — Nem ao menos nós nos apresentamos direito… Me chamo Daiane! E você deve ser Scarlett, não é?
Estalou os dedos logo após, como se tudo fosse um grande show de televisão. Bem infantil…
— Você pintou seus cabelos por acaso? Essa cor branca não é normal de se ver por aqui. — Me aproximei de seu rosto. — Até mesmo usa lentes… Você é o que chamam de otaku?
Seu rosto entrou em chamas, indicando que havia acertado em cheio na ferida.
— E-ei, o que você quer dizer com isso!? — indagou, as bochechas enchendo de ar. — Meus cabelos e olhos são naturais! Entendeu? São N-A-T-U-R-A-I-S. Naturais, ok?
É… eu tinha enfiado uma faca nessa ferida. Pra todo esse alvoroço, não podia ser qualquer assunto para ela.
— Você também é bem baixa. Por acaso tem estatura pra lidar com gente maior que tu? — disse, fechando a cara. Daiane logo deu alguns passos pra trás. — Imaginei que fosse esse o caso.
Coloquei o resto de minhas coisas na bolsa, ajeitando a mandíbula e passando pela garota. Aquele dia já estava estranho, mas o evento mais bizarro teria sido esse. Por que diabos ela faria isso?
Quando estava chegando perto da porta, senti uma puxada de braço violenta.
— Hmnmmmm! — resmungava. — Você não vai fugir, Scarlett!
Sem tanto esforço, puxei meu braço de suas mãos, levando-a ao chão pelo impulso.
— Você é idiota por acaso? Não vê que suas ações estão longes de serem amigáveis? Lembre-se de que está conversando com uma…
Mordi o lábio, tentando evitar que terminasse a trágica frase. Um conjunto de palavras que me fizeram perder noites e pagar uma bolada para aquele psicólogo maldito.
Sinto até hoje que fui roubada de forma brutal, mas… Dane-se! Sem remoer o passado agora.
— Você não é uma assassina… — respondeu Daiane. — Acredito na sua inocência! Assim como o júri determinou que não existia nenhum envolvimento seu naquelas mortes.
O júri? Ela pesquisou o caso!? Mas que diabos!
Essa garota só me dava mais medo a cada segundo.
— E o que você ganha com isso? Vai querer… Pfft! Quer que eu a proteja pela minha inocência?
A felicidade, que antes havia mostrado, se esvaiu em segundos, dando espaço para uma expressão mais que séria. E, de repente, parecia que todo o ambiente tivesse sido silenciado.
Minha voz não saía, e nem mesmo ela tentava falar algo. Era deveras desconfortável, e só piorava!
— D-disse algo de errado? — Após um instante, minha voz decidiu sair, mesmo que ainda gaguejasse. — Olha…
— Então, você quer saber o meu objetivo? Hehehe… — Um sorriso muito assustador surgiu em seu rosto.
E, no impulso, dei um leve tapa em seu rosto! Foi puro reflexo, juro!
— Não m-me assuste assim! — gritei.
— Isso doeu! Cê é bem forte, hein?! É perfeita para a organização secreta… Hehehe…
Organização secreta? Que tipo de brincadeira era essa?
— Tava tirando sarro de mim no final de tudo. Você é bem brincalhona, admito — falei, ajeitando a bolsa em minha cintura, virando-me para o prédio principal. — Peço para que não fale comigo, Daiane. Nunca a vi nessa instituição e espero nunca mais a ver de novo.
Andei na direção do prédio sem olhar pra trás.
— Alunos! — gritou o professor, chamando a atenção de toda a classe. — Peço para que me deem um segundo de fala.
Assim que disse isso, toda a sala se calou, e o professor teve seu espaço.
— Tch… O que será agora? — murmurei.
Estava na parte de trás da sala, um local reservado pra mim, já que ninguém sequer pensava em pôr o seu pé naquela parte.
— Estamos recebendo uma aluna nova!
Que!? Essa sala já está muito avançada, o que diabos uma nova aluna estaria fazendo por esses cantos? Isso… Isso é quase como uma trapaça!
As pessoas pareciam agitadas com a notícia. Não era qualquer uma que ousaria cursar física, ainda mais a área quântica! Tinha de ser o maior dos masoquistas para querer ter essas aulas, ainda mais na faculdade mais prestigiada do país.
O professor sinalizou para a aluna entrar, e a porta se abriu junto de seus gestos.
— Não… Não…! — sussurrava a cada passo da aluna nova, como se me trouxessem memórias de guerra. — Não pode ser!
Eram cabelos prateados, vestidos por presilhas e outros acessórios, junto de roupas um pouco chamativas. Minha cabeça doeu no mesmo instante! Como diabos ela estaria vindo para a mesma sala que a minha?
— Oi, amigos! — disse, animada o suficiente para contagiar toda a sala. — Me chamo Daiane e vou ser a nova companheira de sala! Gosto de teorias da conspiração, gatos, física, livros e… Uh…
— Não precisa fazer uma apresentação tão complexa… Era apenas para dizer seu nome, Daiane — avisou o professor, tocando em seu ombro.
— Isso é muito chato. Como podem seguir algo tão tedioso assim? — respondeu, revirando os olhos. — Deveriam deixar as pessoas fazerem o que querem.
Ela era muito tagarela. Tava com uma vontade imensa de deitar aquela garota na porrada! Me segurava muito, mas muito.
O professor ficou envergonhado por suas falas. Coçou sua cabeça, olhando para a sala.
— Pode ir escolher seu lugar, Daiane.
Era quase como se quisesse se livrar daquele assunto o mais rápido possível, mas…
Ainda emburrada, Daiane soprou algo no ouvido do professor, que logo fez uma cara aterrorizada, negando seu pedido que eu não havia escutado.
Por que disso tudo? Deve ser algo bem ruim mesmo.
Daiane negou a resposta do professor, balançando sua cabeça em aprovação.
— Vou fazer isso, sim. Está vazio, não é?
Logo, deixou o palco principal, indo em direção às carteiras.
Passou pelo grupinho mais à frente…
Depois, pelo grupo mais intermediário…
E, por fim, chegou na mesma fileira que estava. A última fileira.
Comecei a suar frio.
— Perdeu algo aqui? — perguntei, olhando para sua cara. — Você deveria sentar ali na frente. Tem um espaço vazio lá.
Daiane apenas deu um sorriso cínico, como se anunciasse a sua vitória.
Naquele momento, percebi o quão ferrada estava.
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