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    Me sentei novamente na cama com estampas de coelho. De alguma forma, o diário tinha uma espécie de tranca? Nunca tinha visto nada parecido.

    — Feita de ferro, então… — Transformei aquele metal da fechadura em um bloco separado, permitindo minha entrada no conteúdo do caderno.

    Só que acabei me distraindo um pouco com essa brincadeira de controlar metais… Foram alguns minutos até perceber que estava perdendo tempo. Aquele montinho de ferro tinha conseguido encontrar sua forma final: um pequeno coelho. 

    Coloquei a figura para o lado.

    — Ok. Agora está tudo certo para encontrar algo sobre meu passado! — disse entusiasmada. — Mas… e se esse não for meu quarto? Podem ser apenas pistas falsas sobre minhas memórias.

    Foi uma mudança repentina de ideia, mas que fazia total sentido. Não era possível ter certeza de que aquilo ia me levar ao que esqueci e nem mesmo se tudo aquilo tinha um propósito.

    E se isso tudo for apenas uma criação da minha cabeça?

    Abri o livro.

    — Páginas em… branco?

    Não!

    Isso não pode estar certo.

    — Não… não pode estar em branco.

    Virei o restante das páginas sem desespero. Até que quase no final do diário, um pingo de esperança surgiu; haviam páginas com algo escrito.

    Suspirei em alívio.

    “Dia 19/██/████”

    — Quem censura a data assim? É estranho…

    Passei a mão sobre aquela tinta.

    Uma tinta velha num papel velho, não poderia ter combinação melhor. Mas, a caneta que riscou a data era nova. Meu dedo sujou um pouco de tinta; o que confirmou minha teoria.

    Isso só significava que esses riscos surgiram a muito pouco tempo antes de eu chegar. 

    Mas quem?

    Pensei em levantar e ir procurar essa pessoa, porém nada adiantaria essa busca. Ela estaria longe se fosse esperta. Então, apenas continuei.

    “Hoje eu fui para a escolinha e conheci alguns amigos bem legais. Meu primeiro dia de aula não podia ser melhor…”

    Puff… Que fofo. 

    “A pessoa que mais melhorou esse dia foi ██████████. Papai acabou falando sobre eu não ter muitos amigos… eu não entendo ele. Mas, se eu puder ser amiga dela, eu vou deixar ele orgulhoso! Eu acredito nisso.”

    Mais uma vez, algo estava borrado. 

    De qualquer forma, sinto cheiro de alguma coisa muito errada com esse diário. É realmente eu? Não sinto que escreveria algo como isso; mesmo quando criança.

    Se bem que eu nem conheço eu mesma quando criança…

    Essa confusão toda está fazendo minha cabeça doer!

    Vamos só continuar lendo.

    — Devo admitir que essa escolha de adesivos apenas de coelhos é muito perturbadora. Eu era o quê? Uma obcecada por esses dentuços? — Olhei para o final da página. — Ué… tá rasgada. 

    Virei a página, sem me importar muito com isso.

    “Dia 21/██/████”

    Aquela folha mostrou mais uma vez a rotina diária dessa criança desconhecida. Novamente, uma narração simples. 

    Ela foi até a escola e conversou com sua mais nova amiga que não tinha nome. Estranho, por sinal. Mas podia supor que era a mesma que estava borrada anteriormente.

    Mas… nesse dia foi diferente. Ela conheceu um garoto.

    “Eu não gostei de como ele olhou para mim.”

    Sentimentos ruins surgiram assim que terminei de ler essa frase. Eram como um alerta enviado pelo meu coração para evitar qualquer coisa que o envolvesse. Mas, ainda sentia a curiosidade vinda de meu cérebro, contradizendo totalmente o que sentia. 

    Ela ainda teve sua amiga para quem contar naquele dia; isso pelo menos acalmou um pouco meu coração. 

    Passei a página.

    Esse ciclo durou por algumas páginas, seguindo dia após dia dessa pessoa que podia chamar de “eu” escrevendo sua rotina escolar. Falar com sua amiga, fazer seus deveres e… reclamar desse garoto com o nome também borrado. 

    Um diário que demonstrava toda uma trajetória de vida. Era possível perceber o amadurecimento através da escrita e do jeito que descrevia as coisas.

    Ela tinha passado por um longo tempo de aprendizado, que durou meses ou até anos. O diário nunca especificou datas corretas, então era tudo que podia supor.

    Até que…

    “É TUDO MINHA CULPA. É TUDO MINHA CULPA. É TUDO MINHA CULPA. É TUDO MINHA CULPA […]”

    Taquei imediatamente o diário para longe.

    Uma página inteira escrita apenas com a mesma frase assombrou imediatamente a minha mente. Esperava que não fosse apenas isso, mas estava errada logo quando peguei novamente o livro pelas pontas do meu dedo.

    Foram escritas com raiva. O papel estava infestado de rasuras.

    Não tinha data como as outras páginas.

    É… definitivamente esse diário não sou eu. Onde já se viu Seven, a mais sã, com raiva? Nunca cheguei nesse estado.

    Esse momento de pensamentos foi interrompido por um barulho de porta se abrindo vindo do andar abaixo. Me espantei, pensando em quem poderia estar junto comigo nessa casa.

    Escondi o diário num bolso interior do meu casaco e andei silenciosamente até a porta, encostando meu ouvido nela.

    Passos desesperados.

    Puxei a porta, tentando manter o máximo de silêncio possível. E, quando finalmente estava aberta, pude presenciar um fenômeno não muito agradável para meus olhos: os degraus pareciam maiores.

    Não podia ficar pior.

    Desci degrau por degrau, chegando a um cômodo novo. Era uma sala com tapete no centro, apenas isso.

    Mas, tinha duas entradas para dois cômodos totalmente diferentes, o que trouxe ainda mais meu instinto curioso à tona.

    Quando finalmente coloquei meu pé no próximo degrau, pude escutar uma voz feminina, mas embaçada…? Não soube explicar exatamente o sentimento que aquilo me trouxe. Apenas sabia que era a voz de uma mulher.

    — É, é… Sim… — Ela estava falando com alguém. — Não! Eu nunca iria fazer algo assim com ela. 

    Até que apareceu em minha visão.

    Um rosto borrado seguido por roupas formais que não se encaixavam em nada com o que já tinha visto em minha vida. Mantinha a mão perto de sua orelha direita sem baixar por nenhum momento.

    Ela tinha algum problema envolvendo isso? Não sei… não dá para tirar conclusões precipitadas com isso.

    Logo após, ela colocou finalmente sua mão para baixo e se aproximou das escadas. Foi uma ação repentina para mim, afinal, não tive tempo nenhum para correr e me esconder.

    Ela chegou, olhou para mim e, surpreendentemente… passou reto? Essa moça tinha passado por dentro de mim? Como assim?

    Tentando entender o que tinha acontecido, cheguei mais perto dela, que se mantinha estática na frente do quarto.

    A porta tinha se fechado. Uma série de acontecimentos estranhos estava acontecendo, não deixando eu processar nem por um segundo.

    Suspirou antes de bater na porta.

    — Filha! Está acordada? — Deu três toques.

    Não houve resposta.

    É claro que não houve, o quarto estava vazio.

    — Ei… esse quarto não tem ninguém — disse.

    Também não obtive sua resposta… Que anticlimático. 

    Ela não me escutava. Meio que já esperava isso, mas tudo bem.

    — Filha! Por favor, acorda! — gritou.

    Ela começou a chorar em meio a seu rosto irreconhecível. Tive essa informação pois lágrimas caíam na madeira.

    Pude sentir sua tristeza… seu fardo e dores. Não a conhecia, mas sentia totalmente o contrário disso. 

    Ela perdeu a força de suas pernas, caindo no chão em frente a porta. 

    — Filha… — murmurava.

    Soluços em meio a lágrimas.


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