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    Foi-nos fornecida uma cabana separada a mando da santa. Pelo visto, os guardas receberam uma carta mais cedo sobre mim. Perguntei-me o que exatamente tinha nela, e o que a Santa Samira estava tramando.

    Demorou duas horas para que essa tal cabana ficasse pronta. Aquela noite era quente comparada às outras, mas isso era quase como condenar-nos ao puro frio eterno.

    Essas roupas não suportavam tão bem o frio. Seu propósito é apenas para bailes, percebi imediatamente quando trisquei em seu pano.

    Com capacidade para duas pessoas, assim como solicitei. Ester não quis vir com a gente, falou algo sobre atrapalhar nossa noite e que deveria ficar ali do lado de Jorge.

    No final de tudo, não recebi nenhuma notícia da Santa, assim como nenhuma carta direcionada a mim vinda dela. Não é que isso me incomodasse muito, mas ainda assim, é estranho que ela tenha informado coisas como essas aos guardas.

    Uma espécie de privilégio diante das outras pessoas. Essa ideia me incomodava. 

    Estávamos em frente à cabana, quando Gaia me puxou para dentro. Pequena e confortável, apenas tinha uma cama e uma mesa.

    Um guarda chegou mais perto.

    — Olá? — disse, abrindo os lençóis da contenda.

    Gaia se virou para ele, com um rosto zangado.

    Facilmente imaginava ela com veias saltando para fora de sua pele, se assim tivesse.

    — Como ele ousa… — resmungou baixo. — Pode falar, guarda. — Logo após, cumprimentou calmamente.

    — A janta já está quase sendo servida.

    — Você veio só para falar isso? — Gaia não tinha nenhum filtro em sua língua.

    — É claro que não. — Começou a vasculhar em seu bolso apropriadamente armadurado. De dentro dele, retirou uma carta com detalhes dourados. Naquele envelope, o brasão chique com um pequeno e detalhado desenho de cruz se mostrou presente. — Aqui. Uma carta para Seven. 

    Gaia estendeu a mão, esperando que o envelope fosse entregue a ela.

    — Desculpe, acho que ocorreu um engano. A carta é para Seven — disse o guarda.

    Gaia cerrou os punhos.

    — Seu… — murmurou.

    Coloquei minha mão em sua frente, impedindo que tentasse qualquer coisa contra o guerreiro. Andei até ele e peguei a carta de sua mão. 

    Parecia ser leal ao seu trabalho. Tanto que, quando tirei a carta de sua mão, desapareceu imediatamente para longe da barraca. Não se despediu nem nada. 

    Uma atitude rude de sua parte, mas não me importei muito.

    Coloquei a carta em cima da mesa do quarto, indo diretamente até Gaia logo após. 

    — Não vai abrir a carta? — perguntou Gaia.

    — Deixa para depois. Não tenho tanta pressa assim — respondi. — E…

    Inclinei minha cabeça para a única cama no quarto. 

    Apenas esse meu gesto foi o suficiente para instaurar um clima desconfortável. Não sabia o que falar naquela situação.

    Nós já dormimos juntas antes, mas não sei exatamente se seria a mesma coisa logo após aquilo ter acontecido…

    Só de lembrar, meu coração começa a acelerar.

    Gaia não falava nada, mas mantinha uma expressão cínica em seu rosto. Ela queria provocar mais de minha cara, era óbvio.

    Apertei meu peito, pensando no quão perigosa aquela noite poderia ser. Já estava me arrependendo de ter pedido uma cabana para dois.

    Peguei um pano que estava repousando numa cadeira, molhei-o num balde de água que tinha no local. Logo após, limpei o restante do batom que repousava em meu rosto.

    O pano branco logo ficou manchado de roxo. 

    Cogitei tomar algum banho, mas em uma cabana tão aberta assim seria perigoso. O maior perigo não seria o resfriado que poderia pegar, e sim a pessoa que iria dormir comigo.

    Gaia olhou para mim, limpando o restante do batom de seus lábios com a mão.

    Ela sentou na cama, batendo duas vezes ao seu lado, como se me convidasse para sentar também. 

    Segui sua proposta, apoiando minha cabeça em seu ombro direito.

    Meu coração pulsava rapidamente, sentia como se ele fosse sair pela minha boca. Sentimentos que nunca tinham chegado a esse pico.

    — …Gostei… — murmurei.

    Gaia riu.

    — Não esperava que essa fosse ser sua reação. — Sua risada doce tomou conta da sala. — Aquela sua expressão meio que mostrou isso mesmo.

    — Foi doce.

    — Nunca fiz nada assim na minha vida.

    — É… pelo visto, eu também não.

    — Você… quer que eu… — Ela não terminou sua frase, mas deu exatamente para entender suas intenções.

    — Com moderação.

    — Entendo… — Gaia olhou para o horizonte. — Sabe.

    — Hm? 

    — Só estava aqui pensando um pouco sobre tudo isso. Sobre meus sentimentos — disse Gaia.

    Retirei minha cabeça de seu ombro, olhando diretamente para seus olhos.

    — Você mudou de ideia? — perguntei.

    — Que? Não! Óbvio que não.

    — Ah… O que houve, então?

    — Só que… meu coração de alguma forma está mais decidido agora. — Hesitou. — Seven… eu sinto que te amo. Você aceitaria… sair comigo?

    Que?

    Assim, de repente?

    — Não já estávamos namorando? — perguntei.

    — Espera! Como assim?

    — Meio que perguntei o que você achava da minha confissão naquele dia, além de você ter dito que aceitava minha confissão. Não foi suficiente para perceber a situação? Você é uma boba mesmo.

    Gaia bateu em sua testa.

    — É verdade… Me desculpa por ter sido tão idiota assim.

    — Tudo bem pra mim. Essa sua parte mais lerda é seu charme — respondi.

    Gaia apoiou sua cabeça em meu ombro. O jogo tinha virado. 

    — Não vai responder…? — disse com um tom de voz fino, puxando a manga de meu braço.

    Foi fofo.

    Era como um cachorrinho pedindo atenção. Ou melhor, um coelho.

    — Responder o que, exatamente? — Agora era minha vez.

    — Você sabe.

    — Não sei não…

    — O “eu te amo”… — Sua voz foi diminuindo conforme falava a frase.

    Deixava bem evidente sua vergonha.

    Cheirei seu cabelo, beijando logo após.

    — Apenas retribuindo. Eu te amo, Gaia — sussurrei em seu ouvido.

    Um arrepio passou por seu corpo logo após eu falar aquilo.

    O clima ficou desconfortável novamente.

    A conversa tinha acabado e eu não sabia como iria fazer ela andar de novo.

    Até que…

    Um alto sino tocou, sino esse que indicava a entrega do jantar.

    Pelo menos era isso que pensava.

    Gaia deitou-se na cama atrás, olhando para mim enquanto cobria parte de seus olhos com o braço.

    Me levantei, indo em direção à entrada da cabana.

    — Eu tenho que pegar a janta! — gritei. — V-você não vai vir não?

    — Hmmm… O que você acha, Seven? — respondeu Gaia, rindo. — Pode pegar minha parte? Só desta vez.

    — Tudo bem… da próxima vez você me paga então.

    — Vai me punir? — disse Gaia.

    Não respondi à sua provocação.

    Andei até a grande fogueira que tinha sido instaurada como centro do acampamento. Nela restavam algumas mesas cheias de panelas e alguns soldados que organizavam toda a fila da comida.

    Pelo visto, naquela noite seria sopa.

    Os feridos continuavam nas cabanas separadamente, enquanto seus familiares tinham vindo até o ponto para pegar os alimentos. Pão, sopa e alguma bebida eram servidos em abundância a qualquer um.

    Eles tinham suprimentos de sobra, como se aquela cidade estivesse esperando o dia em que isso fosse acontecer. Uma saída de emergência ou um plano B.

    No final da fila, estava Ester, visivelmente mais calma.

    Me aproximei dela.

    Assim que me notou, acenou com um sorriso no rosto. Um sorriso que momentos atrás pensei nunca mais ver.


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