Capítulo 7: Não Me Olha Assim
— Desculpa! Desculpa. Tudo isso é muito estranho mesmo — disse, balançando a mão em negação. — Eu não entendi nada sobre essa história de nascimento, muito menos você ser tão velha faz algum sentido.
— Hehe. Eu entendo o que pensa! — respondeu. Ela tirou uma folha de seu cabelo, colocando na ponta do meu nariz logo após. — Tive preocupações parecidas quando eu saí daquele tubo que me criaram.
Que?
Tubo?!
Como assim?
Não sei, nada faz mais sentido.
Pude escutar apenas o vento por alguns segundos, como se ela esperasse pacientemente por minha resposta. Seu jeito desde o começo me lembrava um cachorrinho esperando o próximo comando.
Era fofo, mas, de certa forma, preocupante.
Estendi minha mão, hesitando logo em seguida. Seu olhar penetrante pedia por carinho, e eu me segurava muito para não concluir esse propósito.
— Então, você nasceu assim? Com essa idade? — perguntei, checando seu rosto de cima para baixo, percebendo cada vez mais as semelhanças.
— Óbvio que não, mamãe! Pelo que o carinha de óculos disse, eu nasci com estrutura corporal perto dos catorze anos. E isso foi… cinco anos atrás? — Colocou a mão sobre o queixo, ficando com uma cara muito pensativa. Logo, franziu as sobrancelhas, querendo muito lembrar de algum detalhe importante. — É… acho que foi isso mesmo.
Cinco anos?
Ah!
Cinco anos atrás foi quando eu fui presa.
Se for parar pra pensar em algo estranho que aconteceu nessa época…
Me recordo vagamente de ter tido um evento um tanto bizarro assim que entrei na prisão. Uma sala onde eles pegaram seringas e retiraram meu sangue. Pelo menos é isso que deduzi, já que estava inconsciente naquela hora.
Lembro-me apenas de entrar na sala, ver seringas vazias e apagar. Após acordar, vi as seringas cheias de sangue.
— Atualmente, você deve ter por volta de…
— Dezoito. — Karina completou minha fala. — Hehehe. Você tem realmente os olhos bem parecidos com os meus.
Não, não eram nada parecidos.
Eram olhos pretos e vazios, mas… vamos deixar ela ficar feliz com esses pequenos detalhes.
— Você realmente vai querer esse nome? Posso pensar em algo melhor — disse, enquanto tocava as setas que estavam em seu rosto. Elas pareciam bastante reais, como se estivessem grudadas na pele. Não era tinta ou nada parecido.
De alguma forma, já tinha me apegado a essa garota na minha frente.
— Eu gostei de verdade! Primeiro presente que recebo da mamãe. — Sorriu mais uma vez.
Meu coração amoleceu cada vez mais, mesmo querendo o total oposto disso.
— Karina?
— Oi!
— Karina!
— Hehehe. — Colocou a língua para fora.
Que fofa.
Coloquei minha mão para fazer um cafuné, e ela logo abaixou sua cabeça para receber. Uma grande juba se escondia atrás de um pequeno laço na sua cabeça.
Foi como acariciar um animal peludo.
Passando de lugar em lugar, ela se movia apropriadamente junto de minha mão, como se aproveitasse mais do que eu todo esse carinho.
Mas ainda tinha algo me incomodando, e bastante.
— Não precisa me chamar dessa maneira.
Ela entristeceu no mesmo instante.
Sua expressão mudou como um flash, o que me fez sentir mal por ela.
— Não posso… chamar a mamãe de mamãe? — perguntou, fazendo beicinho.
— É meio… infantil?
— Do que eu vou chamar você, então? — Continuou com a expressão triste.
Meu coração estava em um combate sério. Deixar ou não ela me chamar dessa forma nada apropriada? Eu não sirvo para cuidar de ninguém! Mas, ao mesmo tempo, não queria deixar ela ficar nenhum pouco triste.
Não! Eu não a aceitei como filha. Quem sabe se ela foi mandada aqui pra me vigiar e depois me entregar para mais sessões de tortura? Não devo baixar a guarda.
Abri os olhos, e sua expressão não tinha mudado em nada. Agora parecia mais um cachorro carente do que qualquer coisa.
— Pode chamar assim mesmo, então… — sussurrei.
— Hehe! Consegui.
Então… ela só estava fingindo?
Maldita! Como pode usar essa carinha fofa contra mim?
Ela deitou em meu colo, tomando cuidado para não mexer nas hastes de metal.
Meus pés estavam completamente esticados em uma cama feita de folhas, da qual supus que ela fez todo esse trabalho. Tinha várias perguntas que queria fazer para ela.
“Por que não consigo controlar esse ferro?”
“Quem é seu pai?”
“Como você me encontrou?”
Mas, dentre todas essas, apenas disse qual estava mais me incomodando.
— Você tem… algum pai?
— Direta ao ponto, então. Deixo este questionamento para você: sou parecida com alguém que você conheça?
Olhando para ela…
Não?
Não existe ninguém que me venha à mente com essas características. Só consigo ver as semelhanças comigo, mas de onde veio esse cabelo preto e olhos da mesma cor… não faço ideia.
Talvez meu cabelo seja pintado?
— Olha, eu vou te contar uma coisa aqui, mas não diga pro carinha de óculos — disse Karina, enquanto se aproximava de meu ouvido. — Ouvi dizer um dia que eles usaram seu sangue…
Concordei, balançando a cabeça.
— … Junto a uma energia que encontraram em uma boneca. Pelo que estudaram, era alguma coisa espiritual ou algo assim — Terminou sua fala.
— Boneca?
— Sabe não? Era uma marionete que você tinha no seu quarto.
…
Gaia?
Gaia?! Não, não. É impossível, né?
Então… Gaia deve ter conseguido fugir. As probabilidades de você estar viva só aumentam a cada momento.
Tentei me manter calma, mas estava pulando de…
Sobre o que estava comemorando?
Parei para refletir um pouco.
Karina pode ser filha minha e de Gaia? Mas como isso funciona? Gaia era só um espírito, afinal.
Mas, se essa máquina pode juntar tudo isso e criar ela? Então poderia considerar nossa filha? Ah… Eu quero muito que você esteja viva agora.
Quero que você a veja.
Uma pessoa achou um atalho muito bom e acabou criando uma grande esperança para mim.
Ri um pouco, quebrando o silêncio que havia se formado.
— Eu… entendo.
— Daí, depois de um tempo, eles bobearam de falar a localização da mamãe e eu fugi. Não tava mais aguentando ser mandada lá.
Esse negócio de fugir de onde trabalha… Aonde eu vi isso mesmo?
Ah…
Elas são realmente parecidas.
— Você só fugiu para me encontrar? — perguntei. A minha cabeça girava como nunca.
— Foi! Hehehe. É que eu sou muito boa, daí foi só dar uns sacodes naqueles caras e sair andando. Uma experiência realmente única para mim — disse Karina, mostrando a língua. Ela pegou um graveto e começou a desenhar na terra.
Deuses!
Por que ela tinha que ser assim?
Naquele mesmo instante, desmaiei de tanta informação que havia sido colocada em minha mente. Toda essa situação era uma dor de cabeça.
Ser mãe…
Uma filha minha e de…
Caí no sono.
Abri meus olhos.
Ainda estava no mesmo lugar, só que agora, de manhã. Os pássaros cantavam mais alegres, e o vento parecia rodar ainda mais naquele horário.
Se bem que… nada disso importava.
Olhei para os lados, procurando Karina. Talvez ela tivesse ido embora? Ou foi só um longo sonho mesmo?
Me levantei, apenas para ver ela sentada ao meu lado. Fiquei aliviada por ela não ter sumido.
Já estava me apegando demais, mas não queria parar com isso.
Estava bastante dorminhoca naquele momento, tentando entender o que estava acontecendo com ela.
Suas mãos mexiam de um lado para o outro, enquanto pegava algumas ferramentas ao seu lado. Mas… nada se comparava ao que ela estava realmente fazendo.
As hastes pareciam se mover ao seu comando.
— Você também… controla metais?
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.