Capítulo 81: As Cortinas do Palco
Ainda sentado diante de Takeshi, fiquei surpreso com aquelas palavras. Provado? Decisão? Ele certamente tinha uma boa imaginação.
— Sério? — cruzei os braços, tentando não rir. — Takeshi, isso tá mais vago ainda…
Ele suspirou, largando a bola e se encostou na cadeira.
— Tá, confesso, eu meio que invento essas coisas — disse, com um sorriso culpado. — Mas é divertido, né!?
— Sabia… — murmurei, já me levantando da cadeira. — Vou me encontrar com a galera, te vejo por aí.
Mas antes que eu pudesse sair direito, uma garota apareceu correndo, ofegante, com um crachá de outra turma.
— Vidente! — chamou ela, animada. — Você tava certo! Eu falei com ele, e deu tudo certo, exatamente como você disse!
— Hã? Sério? — Takeshi piscou, surpreso.
Logo depois, outro aluno chegou, um aluno do primeiro ano, com um sorriso no rosto.
— Sabe aquela coisa que você falou da prova? Aconteceu exatamente como você falou!
— Ah… sim. — Takeshi coçou a nuca, provavelmente ainda sem acreditar que tinha acertado. — Eu te avisei!
Eu ri, mas alguma coisa no jeito que ele me encarou depois, aquele leve brilho nos olhos, como se soubesse mais do que dizia, fez um frio subir pela espinha.
Provado? Decisão importante?
Não, não.
Isso ainda era vago, mas de alguma forma…
— Até mais, Takeshi — falei, acenando enquanto me afastava, o coração batendo um pouco mais rápido do que devia.
O corredor estava cheio, e o festival seguia, ainda bem barulhento e vivo.
Mas aquelas palavras dele ficaram na cabeça, algo que eu não conseguia ignorar. Sacudi a cabeça, tentando afastar o pensamento, o festival não dava espaço para ficar pensando muito.
Continuei andando sem rumo, desviando de algumas crianças com balões e alunos carregando bandejas de comida. Foi quando ouvi um grito familiar cortando a multidão.
— Shin! Onde você tava? — Akira surgiu do nada, segurando um espetinho em ambas mãos.
Seiji tava logo atrás, rindo de algo, e Rintarou fechava o grupo, com aquele olhar de quem só tava ali porque tava sendo arrastado por eles, sem direito a recusar.
— Acabei me perdendo na multidão — falei, coçando a nuca, aliviado por encontrá-los. — Vocês tão indo pra onde agora?
— Pra lá! — Akira apontou com o polegar pra uma entrada coberta de lençóis pretos, onde uma placa torta dizia “Casa Assombrada: Entre se Tiver Coragem”.
Acabamos não perdendo muito tempo, e entramos dentro.
Por dentro, luzes piscavam junto dos lençóis pendurados, uma fumaça percorrendo o chão. Mas bastou uma sombra pular do canto que Akira deu um grito tão alto que até uma criança na nossa frente acabou se assustando.
— Ei! Vocês viram aquilo!? — ele exclamou, ofegante.
— Vi, sim — disse Seiji, se apoiando no corrimão, rindo tanto que mal conseguia andar. — E ouvi melhor ainda!
Saímos da casa assombrada rindo, com Seiji brincando com Akira, quase chorando de alívio, sem nenhuma piedade.
— Seu idiota! Por que ainda tá rindo!? — Akira começou, a raiva evidente na sua voz.
— Cara, você gritou como se tivesse visto um fantasma de verdade! — Seiji respondeu, quase chorando de tanto rir.
— É… eu… era realista, tá?! — retrucou Akira, ainda vermelho. — Tinha fumaça e tudo! E você também pulou!
— Pulei de susto… do seu grito — Seiji respondeu, apoiando as mãos nos joelhos, tentando recuperar o fôlego.
Rintarou soltou uma risada abafada, como sempre fazia, e eu apenas balancei a cabeça, ainda sentindo o coração acelerado. A casa assombrada não era tão assustadora assim, só lençóis pendurados e umas luzes piscando, mas com o clima do festival, até os sustos pareciam mais intensos.
Mais adiante, paramos numa barraca de tiro ao alvo. Peguei uma daquelas armas de brinquedo e mirei com cuidado nas latas empilhadas… mas acabei por errar todas.
— Isso é mais difícil do que parece… — murmurei, pousando a arma na mesa. — Achei que fosse mais fácil.
Akira, por outro lado, acertou três com uma confiança que nem ele esperava. Ele olhou pra mim, me dando um sorriso esquisito enquanto ria, e logo virou para o Seiji.
— Viu isso!? Fala agora, Seiji, quero ouvir! — gritou ele, levantando o pequeno chaveiro que ganhou como se fosse um troféu mesmo.
— Tanto faz… — ele murmurou, desviando o olhar. — Só deu sorte…
Akira deu uma risada, ainda girando o chaveiro no dedo, mostrando ele na cara do Seiji, que tentava ignorar aquilo tudo.
Continuamos andando pelo meio da multidão, procurando mais alguma atração, e foi aí que vimos Kazuki, um pouco mais à frente, andando… de mãos dadas com uma garota de cabelo curto e um sorriso bonito.
Kazuki nos viu no meio da multidão e acenou, parando ao nosso lado com um sorriso tranquilo, o mesmo de sempre.
— E aí, pessoal! Aproveitando bem o festival? — perguntou ele, sem pressa.
— Tá ótimo até agora — respondeu Seiji, parando ao lado dele. Logo depois, inclinou-se um pouco, curioso. — Quem é ela?
— Ah, ainda não apresentei. Essa é a Yumeka, minha namorada — disse Kazuki, como se fosse a coisa mais simples do mundo.
Ela sorriu e curvou levemente a cabeça.
— Prazer em conhecer vocês.
— O prazer é nosso — respondeu Rintarou com aquele tom calmo de sempre, inclinando a cabeça em sinal de respeito.
Kazuki deu uma olhada rápida ao redor, observando as barracas e a movimentação das turmas, antes de voltar o olhar para a gente.
— Sabem onde é a casa assombrada? Yume disse que quer ver se ela realmente dá medo.
— Dá sim — Seiji respondeu com um sorriso que crescia rápido. — É só virar ali naquele corredor… mas se prepara. O Akira gritou tão alto lá dentro que assustou até o fantasma!
— Que mentira! — Akira gritou, já segurando os ombros do Seiji e balançando com força. — Eu não gritei, tá!? Foi só… uma reação estratégica pra descobrir onde o fantasma tava!
— Estratégica? — Kazuki riu, quase tropeçando de tanto rir. — Agora essa foi nova, Akira.
Yumeka também riu, cobrindo a boca com a mão, e Seiji mal conseguia parar de provocar.
— Aposto que o fantasma ainda tá se recuperando do susto, coitado dele… — completou ele.
— Tsc. Fala sério… — murmurou Akira, largando Seiji com um suspiro.
Kazuki deu um último sorriso antes de puxar Yumeka de leve pela mão.
— Bom, vamos lá encarar o terror então. Até mais, pessoal.
— Boa sorte — disse Rintarou, com um aceno breve.
Os dois desapareceram entre os grupos que se espalhavam pelo corredor, e Akira ficou olhando por alguns segundos, meio pensativo.
— Ele tem sorte, né… — murmurou, quase sem querer.
— Lá vem o drama — disse Seiji, dando um tapinha na cabeça dele. — Vamos, ainda dá tempo de pegar algodão-doce antes da peça.
— Cala a boca! Você acha que vou esquecer que me fez passar vergonha na frente de uma garota!? — resmungou Akira, mas já estava andando atrás dele, emburrado e resmungando baixo.
O festival seguiu, com mais jogos, mais risadas, um pouco de tudo. Comi um algodão-doce que grudou na mão, perdi feio num jogo de pescar peixes de plástico e ouvi Akira contar a mesma história do fantasma real umas três vezes, enquanto Seiji continuava provocando ele.
Mas, conforme o sol subia, o relógio corria junto. As horas começaram a passar rápido demais.
Era quase a hora da peça.
Quando a tarde caiu, o auditório se tornou nosso próximo destino. O lugar já começava a encher de alunos, pais, visitantes. Gente de todo lado procurando lugar, tirando fotos, cochichando. O ar tinha aquele peso familiar de expectativa, misturado com o cheiro de comida que alguém tinha levado das barracas escondido.
Encontrei uma fileira com alguns colegas da turma e me sentei entre eles, sentindo o estômago apertar de novo, como se o nervosismo tivesse decidido se instalar de vez.
Kaori apareceu pouco depois, com outras amigas do Maid Café, ainda com um laço do uniforme preso no cabelo. Sentaram algumas fileiras à frente, e Kaori virou pra trás ao notar a gente.
— Então, que peça vai ser mesmo? — perguntou, naquele tom meio brincalhão de sempre, mas com os olhos atentos, quase ansiosos.
— Segredo — respondi, tentando manter a calma. — Daqui a pouco você descobre.
— Hm… Espero que surpreendam — disse ela, mas o sorriso no rosto deixava claro que estava torcendo por nós, mesmo que não admitisse.
— Espero que corra tudo bem — murmurou Rintarou ao meu lado, ajustando os óculos enquanto observava o palco com um olhar calmo demais.
Uma das amigas se inclinou, cochichando algo no ouvido da Kaori, e as duas riram baixo. A plateia estava em clima de conversa ainda, enquanto uma turma subia ao palco. Eles apresentaram uma peça de samurais, mais piadas do que lutas, e mesmo que engraçada, minha cabeça estava em outro lugar.
Eu mal conseguia prestar atenção.
Minha atenção se dividia entre o relógio na parede, as cortinas ainda fechadas e o palco vazio. Era como olhar pra um segredo prestes a ser revelado, só que esse segredo eu mesmo tinha escrito.
Quando a peça anterior terminou, o apresentador, um aluno do terceiro ano, subiu ao palco com o microfone que chiava levemente.
— E agora… — disse ele, com um sorriso animado. — A próxima apresentação vem da turma 2-A! Com a peça… Branca de Neve! Uma salva de palmas!
A plateia respondeu com aplausos e alguns murmúrios curiosos.
Era isso.
O momento havia chegado. Tudo o que construímos, os ensaios, os figurinos, o castelo pintado às pressas, cada linha escrita no roteiro.
Mas então… algo estranho aconteceu.
Um murmúrio vinha de trás das cortinas, como vozes abafadas discutindo.
O apresentador franziu a testa, os olhos desviando para o lado com uma hesitação que pesava no ar. O microfone, ainda próximo das cortinas, pegou um “O que fazemos agora!?” abafado, seguido de um “Não acredito!” baixo, mas alto o suficiente para ecoar no auditório silencioso.
Akira se inclinou pra mim, sussurrando.
— Ei, isso não faz parte da peça, né?
— Não… — murmurei, o estômago afundando e meu coração acelerando.
Kaori virou pra trás, os olhos arregalados.
— O que tá acontecendo? — perguntou, a voz mais séria que o normal.
Rintarou ajustou os óculos, franzindo a testa.
— Algo… tá errado — disse ele, baixo.
O apresentador hesitou, tentando manter o sorriso, mas o nervosismo era notável.
— Um momento, pessoal! — anunciou, a voz falhando ao virar pro palco.
O som de vozes apressadas e passos descontrolados atravessavam as cortinas. Era como se o palco tivesse virado um caos vivo, uma confusão que ninguém no auditório podia ver e só se perguntava o que estaria acontecendo ali atrás.
E, sentado ali, com o auditório lotado e o relógio correndo, senti um frio na espinha, lembrando das palavras de Takeshi.
“Shin… você será provado. Em breve.”
Algo estava muito, muito errado.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.