Índice de Capítulo

    O sol já começava a desaparecer atrás de alguns prédios quando saí da escola, após me despedir de Seiji, Rintarou e Kaori. O céu estava com cores dos típicos tons que só aparecem quando o dia já se aproxima do fim, mas a noite ainda não tinha chegado completamente.

    Passei na biblioteca para trabalhar, como de costume. Vi Arata, alegre como sempre, mas não falei muito com ele ou os outros funcionários. Arata só ergueu uma sobrancelha quando me viu entrar e depois continuou organizando os livros da estante de lançamentos recentes.

    Acho que tinha notado que minha cabeça estava em outro lugar, e, pra falar a verdade, ele tinha razão.

    Fiquei por ali por algum tempo, arrumando algumas capas, respondendo os poucos clientes que passavam por ali, mas não consegui prestar atenção em nada.

    Apenas me lembrava da conversa com Seiji sobre os nacionais, e da promessa com Yuki.

    — Até amanhã. — Algum tempo depois, me despedi com um aceno rápido e voltei pra casa.

    À noite, depois do jantar com minha mãe e Hana, fui pro meu quarto e larguei a mochila num canto. Me joguei na cama e encarei o teto escuro durante algum tempo. 

    Me virei e peguei o celular, abrindo a conversa com a Yuki, que continuava vazia desde o festival.

    Fiquei ali parado, como se digitar algo fosse uma coisa impossível.

    — Como eu devo começar…? — murmurei.

    Depois de muito tempo pensando, reuni toda a coragem que tinha e comecei a escrever algo.

    “Olá, Yuki. A sua competição é quando? Amanhã?”

    Apaguei no mesmo instante. Não parecia tão ruim, mas também não parecia boa.

    “Oi, Yuki! Sobre a sua competição… quando é?”

    Novamente, apaguei. Também não parecia certo.

    Formal demais, talvez. Ou talvez só… não soasse como eu. Eu não sabia o que escrever.

    “Por que é tão difícil?”

    Soltei um suspiro, deixando o celular cair sobre o peito. A tela ainda acesa, a conversa em branco, e eu, parado, sem saber por onde começar.

    Foi então que meu celular apitou no mesmo instante. Liguei, já esperando ser alguma notificação qualquer, mas para minha surpresa, tinha uma mensagem… dela.

    De Yuki.

    “O que você tanto escreve?”

    — O quê…!? — murmurei, me endireitando de repente. O susto fez o celular escorregar da minha mão e desaparecer em algum canto da cama.

    Comecei a revirar os lençóis, procurando com urgência. Meu coração já estava acelerado, as palavras dela ainda ecoando na minha cabeça.

    Ela… tinha visto?

    — Ah…

    Esqueci completamente que dá para ver quando alguém está escrevendo…

    Quando finalmente achei o celular e liguei a tela, meus dedos, mais rápidos que minha cabeça, clicaram onde não deviam.

    O ícone da ligação.

    A tela mudou no mesmo instante.

    Chamando Yuki.

    — Não, não, não, não… — minha voz saiu num sussurro meio desesperado, e o pânico bateu antes que eu pudesse fazer qualquer coisa. Tentei tocar rapidamente no botão de encerrar…

    Mas já era tarde.

    — Alô? — a voz dela soou, clara. — Shin?

    “Que rápido!”

    Foi como se meu coração parasse por um segundo.

    Ela atendeu no mesmo instante. Eu estava em uma chamada com Yuki.

    — Y-yuki!? — gaguejei.

    — Shin? — ela perguntou, soando confusa e surpresa com a ligação.

    — Eu… Ah, foi sem querer. Tipo… eu só queria mandar uma mensagem, mas aí… o dedo escorregou na tela…

    Houve um breve momento de silêncio, mas que pareceu durar muito mais do que deveria. Fiquei me perguntando se ela tinha me achado um idiota ou se já tinha desligado a chamada.

    Até que ouvi um riso baixo, abafado, leve. Quase como se ela estivesse tentando esconder.

    — Então era só isso… — seu riso era suave… e doce.

    Meu rosto esquentou na mesma hora ao ouvir aquele som.

    — D-desculpa — murmurei, apertando o celular com força. — De verdade. Foi sem querer mesmo…

    — Não tem problema. Bom… — ela disse, depois de um instante, com a voz ainda calma —…Já que aconteceu, posso perguntar: o que você estava tentando escrever?

    Eu engoli em seco.

    O que eu deveria falar? 

    Dizia que estava tentando lembrar a data da competição dela porque, mesmo depois de tudo, ainda queria ir e torcer por ela?

    Pensando bem, provavelmente não teria coragem de dizer isso pra ela.

    Fiquei em silêncio por um momento, só ouvindo a respiração calma dela do outro lado.

    — Ah… eu… — murmurei, sem saber o que dizer.

    Respirei fundo, reunindo coragem.

    — Eu só… lembrei da sua competição — disse, tentando manter a voz firme. — …E queria desejar boa sorte antes da sua corrida.

    — Ah…

    A resposta dela foi baixa. Não parecia surpresa… mas havia algo na sua voz… uma hesitação suave, talvez.

    — E… se for amanhã mesmo, eu queria ir — continuei, sentindo o coração acelerar de leve, enquanto chutava a data. — Eu prometi que estaria lá. E… ainda quero cumprir isso.

    Do outro lado, só silêncio. Mas não um silêncio frio, era um daqueles que provavelmente estavam cheios de pensamentos. Como se ela estivesse realmente tentando processar o que eu tinha dito.

    — Hã…? Você ainda lembra disso!?

    — Claro que lembro! — A resposta escapou antes mesmo que eu pudesse pensar. — Não tinha como esquecer essa promessa que eu fiz…

    — Você… não precisa mesmo, Shin. Você pode estar ocupado, ou…

    — Yuki — interrompi, antes que ela desse mais uma desculpa. — Eu quero estar lá. Mesmo que seja só para ficar de canto na plateia e torcer em silêncio, eu prometi. Então eu quero ver você correr!

    Eu precisava fazer isso.

    O silêncio logo se instalou na chamada. Demorou alguns segundos até que uma resposta viesse do outro lado da linha.

    — Então… tudo bem. — A voz dela saiu mais suave daquela vez, e mais baixa. Quase… tímida? — Eu… ia gostar disso.

    Meu coração acelerou com aquela resposta.

    — Ah, mas… acabei esquecendo o local — ri, meio sem graça. — Pode me mandar depois?

    — Mando sim.

    — Sério?

    — Sério. — E então, quase num sussurro: — Eu… ia ficar muito feliz…

    As palavras vieram baixas, quase inaudíveis pelo som de fundo. Quase como se ela tivesse dito sem perceber, mas eu ouvi.

    Ou achei que ouvi.

    — Hã… o que você disse?

    Um breve silêncio, novamente.

    — N-nada! — ela respondeu, a voz um pouco mais alta. — Eu não disse nada.

    — Sério? Tenho certeza de que ouvi alguma coisa… — tentei insistir, rindo de leve.

    — Shin! — exclamou, e dessa vez o volume me fez afastar um pouco o celular do ouvido. — Eu disse que não foi nada!

    A voz dela depois suavizou, ficando mais baixa. Era quase como um sussurro que escapa sem querer.

    — …Mas obrigada. E… boa noite, Shin.

    Aquela última frase me pegou mais desprevenido do que qualquer outra. O jeito como ela disse meu nome. O som leve e doce daquele agradecimento…

    “Meu coração…”

    — Boa noite, Yuki — respondi, sentindo o rosto esquentar novamente.

    A chamada terminou logo depois, deixando só o silêncio do quarto… que não parecia mais o mesmo de antes.

    Me joguei de costas na cama, o celular ainda sobre o peito. Fiquei olhando o teto por um bom tempo, com um sorriso idiota que eu não tentei esconder.

    E que também nem precisava.

    No dia seguinte, ela estaria lá, correndo.

    E eu estaria assistindo. Cumprindo uma promessa que parecia simples antes, mas que, no momento, carregava um peso maior do que eu imaginava.

    Talvez, só talvez…

    Eu estivesse começando a entender o quanto ela realmente significava pra mim.

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