Índice de Capítulo
    ILLUSIA-4

    O nome explodiu no ar feito uma batata frita caindo em óleo fervente. Snowbear. Quintus sentiu o mundo desabar sobre ele.

    Suas mãos começaram a tremer descontroladamente enquanto a voz fantasmagórica de Gustavo ressurgia do passado igual a um profeta do apocalipse romântico em forma de recordação: 

    “Cara, você sabe que ‘ela’ provavelmente é um homem de 45 anos que mora no porão da mãe e coleciona figurinhas de anime em almofadas de tamanho real, né?”

    — Não, não, não… — o jovem Maximus balançou a cabeça, como se soubesse que só um movimento enérgico seria suficiente para desintegrar as memórias que o perseguiam — A Regra 29… Gustavo falou sobre a Regra 29…

    Dr. Zaratustra inclinou-se interessado, ajustando-se na poltrona e com a curiosidade científica de quem acabou de descobrir uma nova fobia para catalogar.

    — Que regra é essa, meu jovem?

    — Não existem mulheres na internet! — Quintus respondeu, com a voz embargada — São apenas homens gordos disfarçados…

    Vento Leste, que até então permanecera em silêncio contemplativo, finalmente se manifestou:

    — O vento do destino sopra em direções que nem sempre compreendemos, meu querido. Às vezes ele traz um lindo gato branco… às vezes traz tempestade.

    — Muito filosófico! — respondeu Quintus, sarcástico, igual a alguem que está segurando uma bomba-relógio mental — Mas e se o vento trouxer… ah, não. Isso é um pesadelo, não vamos entrar nisso.

    A plateia riu, todavia, o jovem Maximus estava à beira de um ataque de pânico. Suas pernas tremiam e ele continuou sem coragem de encarar ninguém em particular: 

    — Meu Deus… — continuou Quintus cobriu o rosto com as mãos — E se for verdade? E se eu me apaixonei por… por…

    Dona Jabá, vendo o desespero do seu revolucionário mirim, com um brilho de curiosidade maliciosa nos olhos, perguntou:

    — Me conte, quais medos apocalípticos passam pela sua cabeça?

    O jovem Maximus finalmente olhou para a velha sindicalista, com os olhos cheios de desespero, e disse:

    — De Snowbear… ser um caminhoneiro de 52 anos chamado Valdecir, morador de Cuiabá, que usa fio dental rosa, e acha que está abafando!

    A plateia explodiu em gargalhadas, mas Quintus não estava brincando. Suas mãos suavam frio enquanto cenários apocalípticos se desenrolavam em sua mente: ele sendo apresentado num programa nacional a um homem barbudo que o chamaria de “meu docinho” com voz grossa de cigarro.

    Professora Nimsay observava tudo com interesse científico, rabiscando anotações em seu caderno.

    — Não se preocupe… Eu sempre estarei aqui! 

    Dr. Zaratustra bateu palmas, empolgado.

    — Genial! Estamos presenciando um colapso da realidade subjetiva em tempo real!

    Dawana, percebendo que tinha o momento perfeito nas mãos, ergueu-se em seu iate feito uma deusa do caos televisivo.

    — Oh, querido Quintus… Que falta de fé! Você está prestes a descobrir se seus medos eram fundados ou se o amor verdadeiro realmente existe no mundo virtual.

    As luzes do estúdio começaram a piscar em sequência dramática, anunciando a entrada mais aguardada da história do reality show. Uma música épica começou a tocar, contudo, para o jovem Maximus soava tal qual uma marcha fúnebre.

    Dawana querendo aumentar o impacto dramático da situação, bateu o punho na mesa de seu iate criando mais um evento para a audiência.

    — SILÊNCIO! — gritou — Vocês vão conhecer Snowbear AGORA!

    Finalmente as luzes se apagaram completamente. Lentamente, as portas se abriram, revelando uma silhueta.

    Quintus franziu os olhos, tentando decifrar a figura que se aproximava contra as sombras. Era uma mulher? Um homem? Uma boneca inflável que havia ganhado vida própria? Uma pegadinha? 

    Os luzes voltaram refletindo na nova candidata.

    As luzes se acenderam novamente, refletindo intensamente na nova candidata.  Elas estavam tão intensas que ele tinha a sensação de estar observando um eclipse solar sem óculos de proteção, mas com muito mais ansiedade e suor.

    Snowbear entrou. Cabelos loiros prateados caíam em ondas até a cintura, vestia um conjunto branco que parecia ter sido desenhado por anjos. Ela estava de costas, e Quintus se agarrou na esperança feito um náufrago se agarra a uma boia furada: 

    “Por favor, que seja mulher. Por favor, que não seja um garoto de cabelos longos que descobriu o poder transformador do condicionador. São Desespero, Santa Carência! Por favor, que seja uma mulher de verdade e não um cosplayer muito dedicado.”

    As luzes diminuiram e quando ela se virou, o jovem Maximus teve certeza de que havia morrido e ido para o céu. Deus tinha sido bom pelo menos uma vez na sua vida. 

    Ele se beliscou com tanta força que deixou uma marca vermelha no braço, depois se deu um tapa na cara que ecoou pelo cassino. 

    O sonho não desapareceu. Não estava sonhando. Era real. Snowbear era tudo que ele imaginou e mais um pouco. O que, conhecendo sua sorte, deveria ser um sinal de alerta maior que sirene de ambulância.

    — Olá, Quintus — ela disse com sotaque americano suave, caminhando em direção a ele, parecendo flutuar — Finalmente nos encontramos.

    Ele se deu outro tapa na cara, desta vez com tanta força que sua visão ficou embaçada por alguns segundos. Definitivamente não estava sonhando. Ou estava tendo o melhor sonho da sua vida e não queria acordar nem para ir ao banheiro. 

    Quintus ficou paralisado. Sua boca se abriu e fechou várias vezes, porém nenhum som saiu. Fez uma tentativa ridícula de se dar um tapa, mas logo desistiu. Finalmente decidiu que nunca mais se bateria, vai que ele realmente acordava.

    — Eu… — ele tentou falar — Você… nós… como…?

    Antes de responder, Snowbear sorriu, e a luz que emitiu fez o cassino parecer mais iluminado do que nunca.

    — Vim do Canadá especialmente para te conhecer. Depois de tudo que passamos juntos online, não podia perder a chance de estar aqui.

    — Mas… mas… você é real? — Quintus gaguejou.

    — Muito real! — ela riu, e o som era semelhante a uma música celestial — E vim com uma proposta muito especial.

    O jovem Maximus engoliu em seco. 

    — Que proposta?

    Snowbear se aproximou mais, e ele pôde sentir o perfume dela, doce e envolvente, espalhando uma sensação de frescor no ar.

    — Quero te levar para morar comigo no Canadá. Longe de toda essa loucura. Só nós dois, uma casa na montanha, uma vida simples e feliz.

    Quintus beliscou o próprio braço, tentando apagar a realidade. Devia estar alucinado, devia ter escutado errado. Por isso, perguntou, com a voz trêmula:

    — Isso… isso é um sonho? 

    A plateia estava extasiada com a beleza dela, alguns homens chegaram a babar visivelmente, e uma senhora na primeira fila gritou:

    — EU TAMBÉM QUERO IR PARA O CANADÁ!

    Na cabeça de Quintus, Snowbear competia com Mirela, contudo, em poucos segundos tinha dito palavras fofas e boas mais do que os 17 anos que conviveu com sua quase vizinha eternamente inalcançável.

    Repentinamente, algo se moveu no fundo do cassino. Era Nyck, correndo em direção ao palco igual a um doido, tendo aparentemente escapado dos guarda-costas. Dawana falava baixinho no ponto eletrônico, provavelmente dando ordens para conter o garoto e mentalmente já redigindo cartas de demissão para toda a equipe de segurança.

    Nyck se aproximou do palco, mas foi segurado por outros guarda-costas que protegiam o palco. Enquanto se debatia, ele gritou em aparente desespero:

    — Quintusss! Isso deve ser algum golpe! Nada na vida é bom e sem custo! E me escolhendo você tem a mim e a Eloisa. Pense bemmmm!

    E foi arrastado novamente para longe das câmeras e para o fundo do cassino, seus gritos ecoando feito o lamento de alguém sendo separado de seu amor.

    — Quintus!? — Snowbear chamou sua atenção novamente, trazendo-o de volta ao sonho que tinha sido momentaneamente desfeito pela invasão.

    — Mas… Minha proposta… Tem uma condição. 

    Apoie-me

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota