Índice de Capítulo


    Em uma grande sala escura, pequenos sons de estalos de ossos, seguidos de suspiros esguios, ecoam incessantemente.

    Ao redor, diversos esqueletos vagueiam como almas perdidas, sem rumo, movendo-se de um lado para o outro em um balé macabro. Alguns desses esqueletos estão incompletos, sem braços ou pernas, arrastando-se em uma tentativa desesperada de manter algum vestígio de mobilidade. 

    A atmosfera é pesada, impregnada de uma aura de desespero e decadência, como se a própria morte estivesse dançando ao som dos estalos de ossos.

    Um pouco mais distante do tumulto, uma jovem de cabelos ruivos começa a recobrar a consciência. 

    Seus olhos se abrem vagarosamente, encontrando a realidade sombria da sala. Com um reflexo rápido, ela percebe que está deitada sobre uma pilha de ossos quebrados e pulverizados, o resultado de uma magia de invocação mal-sucedida. A textura fria e áspera dos ossos contra sua pele a faz estremecer. 

    Sem mover um só dedo, ela permite que seus olhos vagueiem pela sala, absorvendo os detalhes da sua verdadeira situação.

    “O que é esse lugar?” A questão recai sobre ela como um lampejo frio, que desce vagarosamente por sua espinha. Como chegou a esse ambiente que prega a morte e a decomposição?

    “Eu não me lembro exatamente o que me trouxe aqui… Tudo que resta das minhas últimas memórias são a luta que tive com o golem de ossos, e logo em seguida, fui derrotada por outro e…” Suas memórias, a pouco e pouco, começam a lhe entregar uma certeza inquietante. “Aquele necromante… ele me trouxe para cá para me transformar em um servo dele?”

    “Se ele realmente me trouxe aqui para me transformar em um morto-vivo ou um draugr, talvez ele não consiga sentir a energia vital dos seres vivos, porém…” Antes que sua linha de pensamento pudesse continuar, um grunhido baixo, porém não tão baixo quanto um sussurro, atravessa a escuridão e atinge seus ouvidos. É um esqueleto, rastejando pelo chão, sem suas duas pernas.

    O esqueleto aproxima-se lentamente, seu corpo ossudo arrastando-se pela superfície rugosa, produzindo um som que rasga o silêncio como unha em lousa. 

    Evangeline fecha rapidamente os olhos, tentando não o alertar, e consequentemente os outros, para sua presença. Apesar de serem fracos individualmente, a meio-elfa não teve uma visão aprofundada dessa área, e teme que o necromante possa estar por perto.

    Cada movimento do esqueleto é uma melodia macabra, as falanges ressoando contra os ossos quebrados espalhados pelo chão. 

    Ele tateia o corpo de Evangeline, seus dedos esqueléticos deslizando sobre sua pele, buscando algo que possa completar sua forma dilapidada. 

    Ela sente cada toque frio e insensível como agulhas perfurando sua carne, o o nojo pulsando em suas veias.

    O esqueleto, em sua busca desesperada por completude, realiza pequenas batidas sob o corpo de Evangeline, seus ossos ecoando contra os dela em um diálogo sombrio. Seus movimentos são meticulosos, quase inquisitivos, mas logo ele perde o interesse. 

    Seu desejo era encontrar algum osso que pudesse usar como ligação para suas pernas ausentes, e pelo seu azar, Evangeline ainda tem seu corpo completamente intacto.

    Ela permanece imóvel, o coração martelando no peito como um tambor de guerra. 

    O esqueleto, frustrado, continua seu rastejar inquieto pela sala, deixando-a em um estado de tensão absoluta. 

    Cada segundo parece uma eternidade, a incerteza do próximo momento pendendo sobre ela como uma lâmina pronta para cair.

    Evangeline abre os olhos lentamente, observando o esqueleto afastar-se vagarosamente, rastejando-se até outra pilha de ossos perto dali. 

    A jovem meio-elfa percebe que precisa agir rapidamente; seu plano é sair da vista dos esqueletos o mais rápido possível e traçar uma estratégia. Mas como?

    “Este lugar parece infestado de esqueletos. Mesmo que eu não consiga sentir um pingo de mana deles, minha audição pode me dar uma estimativa de quantos estão nesta sala.” Erguendo suas pequenas orelhas pontudas, Evangeline começa a escutar cada som daquele espaço. 

    Pegadas arrastadas, respirações guturais, estalos sinistros e até quedas desengonçadas de alguns esqueletos dão-lhe uma boa noção de quantos podem haver.

    “Não sei ao certo quantos estão presentes, afinal, esta sala pode ter outras sub-salas. Contudo, neste lugar devem estar por volta de vinte e três ou vinte e quatro esqueletos.” Erguendo vagarosamente sua face para vislumbrar os esqueletos do local, ela nota que a maioria deles parece defeituoso, como se esta sala fosse um tipo de depósito de falhas provocadas pelo necromante e seus conciliares.

    Evangeline sente um calafrio percorrer sua espinha ao perceber a quantidade de esqueletos defeituosos. Suas formas quebradas e incompletas parecem ressoar uma melodia de inutilidade.

    “Mesmo que eu perceba uma quantidade considerável deles por aqui, eles não parecem ser muito fortes. Não tão fortes quanto os esqueletos do corredor, e nem perto daquele golem… Porém, como acho uma brecha para me mexer desse lugar?” Evangeline pondera, sua mente trabalhando febrilmente em busca de uma estratégia.

    Enquanto busca uma resposta, ela relembra do esqueleto que estava por cima dela, procurando algo. Mesmo de olhos fechados, no calor do momento, ela ainda estava respirando, algo que o esqueleto não percebera. “Talvez… só, talvez eles não tenham uma audição boa.”

    Ao olhar para o lado, Evangeline observa um pedaço de fêmur quebrado, pegando-o rapidamente e torcendo para que isso funcione. 

    “Espero que isso chame a atenção deles, mesmo que por alguns segundos!” Ela arremessa o osso com força para longe, o som ecoando na câmara silenciosa. Os esqueletos se viram abruptamente, suas cabeças desengonçadas e desprovidas de carne girando em direção ao barulho.

    Sons de estalos e pegadas começam a ressoar pelo espaço. 

    Os esqueletos se movem em direção ao som, fazendo o plano de Evangeline entrar em ação. Rapidamente, ela se levanta, seus movimentos precisos e rápidos, como uma dança de sobrevivência. 

    Mantendo os olhos fixos no tumulto que criou, Evangeline se move para um dos pilares no lugar, escondendo-se atrás dele e omitindo sua forma dos outros.

    Os esqueletos chegam ao local do barulho, perdem rapidamente o interesse e voltam aos seus movimentos erráticos, incapazes de entender o que aconteceu. Evangeline solta um suspiro silencioso de alívio. 

    — Argh…!

    “Parece que isso funcionou. Mesmo que pareçam intimidadores, ainda são bem burros em alguns aspectos, e eu agradeço por isso, que me fez sair daquele entulho de ossos. Só espero que… eles não notem nada de diferente agora. Porém, eu preciso me preparar para sair deste lugar.”

    Com o coração ainda batendo acelerado, Evangeline observa ao redor, suas mãos tremendo levemente com a adrenalina que corre em suas veias. 

    O ambiente é opressivo, cada sombra parece ter vida própria, e o ar é espesso com a presença de uma energia mágica desconhecida. 

    O cheiro de mofo e decadência pútrida enche suas narinas, uma constante lembrança do perigo que a cerca.

    Ela fecha os olhos por um momento, tentando acalmar sua mente e corpo. 

    “Preciso de um plano,” pensa, “algo que me permita sair deste lugar sem alertar esses monstros.” Sua mente volta ao momento em que jogou o osso, refletindo sobre a simplicidade e eficácia da distração. “Talvez haja outra maneira de usar isso a meu favor.”

    Determinada, Evangeline começa a vasculhar o chão ao redor, procurando mais pedaços de ossos ou detritos que possam servir como distrações. Cada movimento é cuidadoso, cada som é monitorado com atenção. 

    A meio-elfa sabe que qualquer deslize pode ser fatal, mas sua vontade de sobreviver é inabalável.

    Porém, o que ela encontra não é um osso, mas sim algo totalmente diferente de uma amontoado de células brancas — uma adaga, mais precisamente uma adaga de combate de lâmina longa. Seu fio afiado revela um brilho carmesim calmo, como se chamasse por um dono para si. 

    Surpresa e cautelosa, Evangeline observa os arredores, certificando-se de que não há olhos a espreitá-la, e rapidamente recupera essa arma destoante da área em que se encontra.

    — Uma… adaga? O que uma adaga faz neste lugar? — Ela murmura para si mesma, a voz um sussurro quase inaudível. Seus olhos, atentos e perscrutadores, percorrem cada esqueleto, buscando qualquer sinal de resposta para aquele mistério. 

    “Eles não estão segurando nenhuma arma, espada ou escudo. Nem mesmo uma peça de armadura eles portam, então… por que há uma adaga bem nesta sala?”

    O brilho da lâmina parece pulsar suavemente em suas mãos, como se a arma tivesse vida própria, uma entidade adormecida aguardando ser despertada. Evangeline sente uma corrente de energia subir por seus braços, uma sensação estranha e poderosa que a faz arrepiar. Suas mãos tremem ligeiramente ao segurar a adaga, mas ela respira fundo, tentando manter a calma.

    ”Ainda há resquícios de mana correndo por essa adaga, algo que me faz imaginar que o portador dela não seja um esqueleto comum, ou talvez…” Antes que pudesse continuar com sua conclusão, uma poderosa batida ecoa no lugar, não só chamando sua atenção para a área, como todos os esqueletos que correm em direção à região do barulho.

    Observando de longe, ela nota um ser feito de amontoado de ossos entrando na sala, percebendo ser um dos Golems de ossos do Necromante.

    “Merda! O que um golem de ossos faz aqui nesse lugar?” A exclamação ecoa em sua mente como um trovão silencioso, seus pensamentos em turbilhão. 

    Antes que ela possa concluir qualquer resposta, a explicação se revela involuntariamente. Na mão do golem, um saco enorme de panos aparece, contorcendo-se com uma vida própria e inquietante.

    “O que é aquilo? Um esqueleto? Talvez… outra falha do necromante?” Evangeline conjectura, seu coração acelerando com a possibilidade de mais um dos experimentos defeituosos do necromante. 

    O que ela não espera, contudo, é o momento em que o golem arremessa o saco de pano próximo a ela. O impacto reverbera pelo ambiente, um som surdo e brutal quando o conteúdo do saco se choca violentamente contra a parede da sala.

    Sem uma reação de preocupação ou interesse, o golem dá meia volta, seus movimentos mecânicos ecoando no espaço vazio, fechando uma grande porta de ferro pesado por onde entrara. 

    O som é um grito de metal contra metal, um lamento de engrenagens e dobradiças que perfura a tensão do ambiente. 

    O golem desaparece, deixando Evangeline em um silêncio carregado de incerteza e medo.

    ‘’Essa foi por pouco, parece que também ele não é capaz de me sentir nesse lugar, ou eu teria um péssimo momento e local para lutar com outros desses… Contudo…” Observando com cautela, seus olhos se fixam no saco de pano que ainda se move, embora não tão ávidamente como antes.

    “Por que aquele golem fez isso? Mesmo que seja um esqueleto defeituoso, fazer isso não o estragaria mais…?” A pergunta ressoa na mente de Evangeline, preenchendo-a com um misto de confusão e inquietude. 

    Para ela, essa ação do golem parece desprovida de lógica, um desperdício de recursos. Guardar esqueletos defeituosos nesse lugar apenas para serem destruídos com impactos despreocupados desafia qualquer razão que ela possa imaginar.

    Seu olhar, porém, é irresistivelmente atraído pelo saco. Uma mão emerge, lutando para se soltar das amarras do tecido. 

    “Não pode ser…!” Evangeline murmura, seus olhos arregalados em choque. A mão que tenta se libertar não é esquelética, mas de carne e osso, com uma tonalidade clara de pele. 
    “Uma pessoa!? O-o-o quê… o que uma pessoa faz nessa masmorra?” A dúvida perfura sua mente, rápida e feroz, como uma corrida de fórmula um, deixando um rastro de incerteza e medo.

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