Capítulo 686: Borboleta (6/6)
Ela era, sem dúvida, um espírito maligno, mas um sem memórias do outro mundo. Parte de mim não podia evitar rir da expectativa dela de que eu acreditasse nisso. Quão absurdo.
Contudo, alguns momentos depois, uma inspiração repentina me atingiu.
— Você foi… revivida por uma Pedra da Ressurreição?
Isso explicaria o dilema dela.
Muitas condições eram necessárias para usar uma Pedra da Ressurreição, mas a maior penalidade era a perda de memória. Eu já havia experimentado isso algumas vezes ao usar a pedra para reviver um aliado. Como o valor de relacionamento caía para zero, eles acabavam indo embora e faziam eu desperdiçar minha Pedra…
— Pedra da Ressurreição…?
Mas o que era aquela reação dela?
— Não sei por que você mencionou isso, mas não tem nada a ver com uma Pedra da Ressurreição.
— Então por que você não tem memórias?
As mãos de Jaina se fecharam com força quando fiz essa pergunta. — Eu… Há algum tempo, ofereci todas as minhas memórias daquele mundo a Karui. Por isso, não restaram mais nenhuma.
Ah, então era isso. Eu tinha certeza de que tinha a ver com uma Pedra da Ressurreição.
Senti-me um pouco constrangido pela correção.
“…Então você também pode oferecer memórias.”
Recordando a época em que joguei como sacerdote de Karui, comecei a aceitar a história dela.
Sempre que tudo falhava e eu me aproximava de um game over, Karui aparecia para fazer uma oferta, sem exceção.
↬Eu vou salvar você, então pague o preço…↫
Esse preço era sempre aleatório, e as opções que eu podia escolher também eram incontáveis.
Coisas como todos os valores de relacionamento que eu tinha com outros personagens caindo para zero. Uma das essências que eu estava perdendo sendo retirada de mim. Incorrer em lesões físicas permanentes. Houve até casos em que Karui exigiu a alma de um NPC aliado.
“Uma das piores condições era, em troca de ser salvo, ter que ir à cidade e me tornar o criminoso mais procurado.”
Os contratos com Karui eram absolutos. Mesmo que o pagamento fosse adiado, o personagem receberia uma punição divina e morreria se não cumprisse a promessa.
De qualquer forma, isso não era o mais importante.
— Imagino que você estava numa situação bem desesperadora para oferecer suas memórias — comentei baixinho.
Jaina pareceu um pouco dividida. — Sim… Parecia ser. Provavelmente.
Hmm, parecia que ela estava tentando contornar a questão.
Pensei por um momento se deveria insistir, mas ela acabou falando primeiro.
— Ofereci duas coisas naquele dia. A primeira foi para nos mover a todos para um lugar seguro… Foi quando perdi todas as minhas memórias do mundo original.
— E?
— A segunda… A segunda foi para salvar alguém que estava morrendo. O preço disso foi perder todas as memórias que eu tinha sobre essa pessoa.
Hesitei. — Eles eram importantes para você?
— Eu não sei… Mas provavelmente. Importantes o suficiente para oferecer as memórias, pelo menos.
— O que aconteceu entre você e eles depois?
— Não aconteceu muita coisa. Eles morreram no labirinto pouco tempo depois. — Notando meu silêncio repentino, ela disse — Não precisa levar isso tão a sério. Eu não senti muita coisa, mesmo quando morreram na minha frente.
Ouvir Jaina falar com um tom calmo me fez entender ainda mais por que as pessoas deste mundo chamavam Karui de deus maligno.
— Então como você acabou se juntando a Baekho Lee? Está tentando voltar ao seu mundo original?
— Não, não me importo muito com aquele mundo. Afinal, não lembro de nada sobre ele. Na verdade, aqui é a ‘realidade’ para mim, e aquele é o mundo dos sonhos.
Embora nossas jornadas fossem extremamente diferentes, a situação dela era semelhante à minha. Talvez por isso. Mesmo que eu planejasse apenas obter informações dela, comecei a ficar genuinamente curioso sobre a história de Jaina.
— Há apenas uma razão para eu estar trabalhando com Baekho Lee — ela revelou.
— Qual é?
— Para recuperar minhas memórias perdidas, preciso de uma oferta enorme.
— Entendo…
Como Jaina disse, não era impossível recuperar o que se ofereceu a Karui em Dungeon and Stone. Até mesmo danos permanentes ao corpo podiam ser curados se alguém oferecesse o suficiente a Karui.
— Só estou andando com ele porque é fácil conseguir materiais de alta qualidade perto dele. Não tenho outro motivo.
Caramba, eu nunca esperava que as circunstâncias dela fossem essas.
Como ela já havia dito que não se importava com o mundo moderno, estava claro qual memória ela tentava recuperar. No entanto, isso levou a mais uma pergunta.
— …Por que está tentando recuperar suas memórias?
Ela já havia perdido todas as memórias de ‘aquela pessoa’. E também me disse que não sentiu muito quando eles morreram. Então, por que essa mulher estava se esforçando tanto?
— Foi… frustrante.
A resposta de Jaina foi bem simples.
— Quando aquela pessoa morreu naquele dia, eu não consegui entender uma única coisa que eles disseram ou a expressão que fizeram. Isso me frustrou e me deixou com muita raiva… Por quê? Isso é estranho?
— Não… De forma alguma.
Logo depois, o feitiço de detecção de Jaina captou um monstro, então encerramos nossa conversa ali. Nunca voltamos a tocar no assunto, nem em nada parecido.
E, no entanto, a conversa continuou a ecoar na minha mente.
“Um espírito maligno amnésico…”
O mundo era realmente vasto.
Boom!
Independente da chuva periódica de meteoros caindo do céu no Túmulo Estelar, o clima da Terra Primordial mudava com frequência, e cada uma dessas mudanças era letal.
— Haah… Haah…
Dessa vez era uma onda de calor.
Bem, eu nem sabia se podia chamar isso de ‘onda de calor’.
Fwoosh!
As árvores que não conseguiam suportar o calor exalavam vapor de dentro. Algumas até pegavam fogo nos piores cenários.
Ainda assim, graças à resistência ao fogo proporcionada pelo Orbe de Fogo, eu não me queimava nem sofria dano contínuo, mas ainda não podia fazer muita coisa sobre o calor.
Se tivéssemos um mago aqui, eu pediria para ele ligar o ar-condicionado ou algo do tipo.
— …Estamos cercados — observei.
— O que você vai fazer?
— Não dá para fugir com nossa velocidade, então teremos que lutar.
Mesmo que nos movêssemos deliberadamente para evitar monstros o máximo possível, havia casos em que éramos obrigados a lutar.
Um tanque e uma sacerdotisa. Embora não fosse uma boa composição para caçar monstros, ainda conseguimos nos manter bem sozinhos, e isso porque…
【Jaina Flyer lançou Vento Podre.】
【Todos os inimigos na área receberão dano de atributo escuridão e terão seus atributos de Resistência Física reduzidos.】
A sacerdotisa não era uma sacerdotisa comum para começar.
[Você lançou Swing.]
E eu também não era um tanque comum.
Crunch!
Monstros de quarto nível para baixo eram administráveis, embora demorássemos um pouco para lidar com eles.
Boom!
— É um Bartanus!
— Suba!
Em qualquer caso, sempre que um monstro de terceiro nível aparecia enquanto estávamos lutando, eu colocava Jaina nas costas e corria o mais rápido que podia. Como éramos uma dupla tanque e sacerdote, ‘poderíamos’ matá-lo se lutássemos por algumas horas, mas isso só seria possível se estivesse sozinho.
E não tínhamos horas para gastar aqui.
“…Hã?”
Congelei, fazendo Jaina perguntar cautelosamente por que parei na frente dela. Em vez de responder, apenas apontei com o dedo para um pedaço de pano rasgado pendurado na árvore.
Era um vestígio de um humano, algo que não havíamos visto quando passamos por aqui antes.
Estendi a mão e espalhei o pano para ver uma mensagem escrita nele.
“Se você vir isso… … …monumento.”
O calor intenso tinha queimado a seção do meio, deixando-a preta demais para que eu pudesse ler, mas entendi imediatamente o que tentava dizer.
— Está nos dizendo para irmos ao monumento central na Floresta Primordial.
Baekho Lee, Vovô Caído, Arqueiro e GM.
Parecia que um desses quatro havia deixado essa marca aqui para nos informar que devíamos ir ao monumento central.
— Por que esses quatro…? — Jaina ponderou.
— Você acha que o Aures deixaria algo assim?
— Ah, entendi.
— De qualquer forma, se formos ao monumento, conseguiremos encontrar pelo menos mais uma pessoa.
Era uma boa notícia. Exceto por Aures, os outros eram causadores de dano. Não importava quem dos quatro encontrássemos, teríamos nossa formação de dano, tanque e curandeiro. Depois disso, nossa segurança e velocidade de movimento aumentariam significativamente.
— Vamos nos mover.
— Certo.
Ao determinar que poderíamos perder nossos aliados se nos atrasássemos, movi-me o mais rápido possível naquela direção.
Uma hora, duas horas, três horas…
Enquanto marchávamos sem descanso, de repente ouvimos a voz de um homem familiar rompendo o silêncio.
— B-Barão?
Caramba, isso me assustou. Quase balancei meu martelo.
Olhei na direção do som. — Havellion?
O GM surgiu do nada, desfazendo sua invisibilidade. Surpreendentemente, conseguimos nos reunir com um aliado antes de chegarmos ao nosso destino.
— Barãoooooo!
Desviei rapidamente do GM enquanto ele tentava me abraçar, então perguntei — Foi você que deixou o pano com a mensagem na árvore?
— N-não. Eu o vi há pouco tempo e também estava seguindo-o!
“Hmm, entendo.”
Por alguma razão, as coisas estavam indo bem. Nesse ritmo, haveria mais um aliado no monumento, já que seria ele quem havia pendurado aquele pano na árvore.
E nossos dois se tornaram três.
— O que aconteceu com você, Barão…
— Estamos quase lá, então conversamos quando chegarmos.
Eu também estava curioso sobre o que aconteceu com o GM, mas como não estávamos longe do nosso destino, decidi manter o foco e continuar avançando.
— O que é isso…?
Cerca de trinta minutos depois, ao passar pela vegetação, consegui ver o túmulo cravado na cratera que tínhamos visto antes. Porém, o problema era…
— I-Isso estava aqui originalmente?
— De jeito nenhum.
Onde só deveria estar o túmulo, havia agora um prédio misterioso ao lado dele. Parecia a entrada de um templo, mas sem uma porta. Podia-se ver degraus que desciam, mas mesmo quando me aproximei para olhar, estava escuro demais para enxergar qualquer coisa lá dentro.
— Essas letras estão vermelhas… Isso não era assim antes, certo?
— Não! Tenho certeza, pois investiguei o túmulo antes. Não era assim.
Havia hieróglifos incompreensíveis na linha superior do túmulo.
O que estava acontecendo?
Embora tudo fosse confuso, a maior pergunta era outra.
— …Mas por que não tem ninguém aqui?
Viemos até aqui depois de ler a mensagem no pano, mas não havia ninguém esperando por nós.
— Vamos esperar um pouco. Talvez eles tenham ido deixar mais mensagens por perto.
— Certo… — disse o GM relutante. — Então, vou investigar o túmulo por enquanto. Consigo sentir um fluxo de mana, diferente de antes…
— Eu vou dar uma olhada no prédio. Ele me parece familiar — comentou Jaina.
Surpreso, perguntei — Familiar?
— É difícil de explicar. Apenas saiba que parece estar relacionado a uma entidade antiga.
— …Entendi.
Com isso, os dois começaram suas investigações, e eu fiquei de guarda, observando.
*Por que ninguém está vindo?*
Após cerca de três dias esperando alguém aparecer, justo quando eu começava a duvidar se havia algum sentido em continuar esperando…
— Felizmente, parece que não cheguei atrasado.
O Vovô Caído apareceu, parecendo bem tranquilo.
Ele parecia normal demais para um mago que tinha acabado de andar pelo nono andar por três dias sozinho.
“…Acho que ele consegue jogar solo de algum modo, mesmo sendo mago.”
Embora fosse surpreendente, eu tinha algo que precisava perguntar antes de verificar suas habilidades.
— Foi você quem colocou aquele pano?
— …Pano? — ele perguntou, parecendo não ter ideia.
Expliquei sobre o pano amarrado na árvore, e o Vovô Caído me informou que nem sequer o tinha visto.
— Apenas presumi que alguém viria ao monumento central, então vim até aqui.
— Então você também não sabe quem colocou aquele pano.
— Não, provavelmente foi o Baekho.
— Como tem tanta certeza? Não há chance de que o Aures faria isso, então ele é o único que sobra.
— Com licença? — o GM perguntou, inclinando a cabeça. — Mas poderia ter sido o Sr. Bryat.
A resposta de Vovô Caído foi direta.
— Bryat está morto.

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