Capítulo 717: Prisão (4/4)
Neste mundo, havia um ditado: quando prisioneiros vivem como prisioneiros por tempo suficiente, começam a se vangloriar de suas correntes.
Sobre quem tinha as maiores, mais pesadas e resistentes correntes.
Sobre quem suportou o maior fardo ao carregar essas correntes.
Alguns poderiam questionar se isso fazia sentido, mas aquele homem acreditava que sim.
Afinal, para ele, não era tão diferente.
Bons equipamentos.
Status.
Dinheiro.
Habilidades, experiências e assim por diante…
Havia um certo orgulho nos resultados obtidos com sangue, suor e lágrimas. E, mesmo que ele às vezes desejasse o reconhecimento dos outros por seus esforços, o homem frequentemente sentia um vazio também.
Que diferença fazia quanto dinheiro, fama ou autoridade ele obtinha? No momento em que retornasse ao seu mundo original, tudo teria sido em vão.
E assim, ele refletia.
Bons equipamentos.
Status.
Dinheiro.
Habilidades, experiências e outros…
Não importava o quanto ele falasse sobre isso, do ponto de vista dos outros, certamente parecia que ele estava se vangloriando de suas correntes.
— Hah, quero comer um xis tudo.
Porque este mundo era uma prisão.
Havia um homem que silenciosamente olhava para um espelho.
Ba-dum.
Um rosto considerado bastante bonito era acompanhado por uma armadura branca que cobria todo o seu corpo.
Ba-dum.
Depois de se observar no espelho por algum tempo, o homem sentiu-se inquieto por alguma razão.
Bem, na verdade, ele sabia o motivo.
O homem passou a mão na parte superior esquerda de sua couraça. Onde o dedo indicador tocou, havia apenas um espaço vazio, com uma marca sutil, semelhante à que fica quando se remove um adesivo de uma superfície após muito tempo.
Ele afastou a mão da marca.
Ele não era mais o paladino daquela igreja.
Oficialmente, havia deixado a igreja, tornando-se um forasteiro, e não tinha mais permissão para usar o título de paladino. O emblema em sua armadura havia sido retirado como prova disso.
Ele não tinha mais a obrigação de comparecer às orações matinais, aos agradecimentos nas refeições, nem às preces coletivas noturnas antes de dormir.
No entanto…
Ba-dum.
O homem refletido no espelho ainda se ajoelhava no carpete e fechava os olhos para rezar, mesmo que de forma informal.
Era algo que fazia todas as manhãs, mesmo depois de deixar a igreja.
— Que a bênção da estrela do crepúsculo esteja conosco…
Na verdade, o homem odiava rezar. Mesmo quando ainda fazia parte da igreja, sempre reclamava em seu íntimo sobre a frequência das preces e, às vezes, até inventava desculpas para evitá-las.
Mas havia um motivo para ele continuar com as orações matinais, ao menos. Em certo sentido, era o mesmo motivo que qualquer ser humano tinha para rezar a um deus.
— Seu servo clama desesperadamente por ti. Por favor, não retire sua autoridade de mim. Mostrai vossa misericórdia. Salvai-me da ameaça.
Ele estava com medo.
Criara um personagem tanque que usava o poder divino como principal recurso, e, se esse poder desaparecesse um dia, ele se tornaria inútil. E havia muitos exemplos de pessoas que perderam todo o poder divino após deixarem a igreja.
Bem, sendo honesto, rezar também ajudava a acalmá-lo um pouco. Mesmo uma pedra à beira da estrada desejava algo em que se apoiar.
Ba-dum.
E assim, depois de ficar ajoelhado por um tempo, em um estado quase meditativo, o homem se levantou. Em seguida, olhou para o teto.
— Por favor, eu imploro… Pelo que vi, parece que tratas bem o barão, Deusa. Continuarei a apoiá-lo ao seu lado, então, por favor?
O tom com que falava com a deusa era incrivelmente irreverente, mas isso não era incomum para ele. Mesmo quando estava na igreja, usava palavras respeitosas em voz alta, enquanto pensamentos informais dominavam seu coração e, ainda assim, seu poder divino continuava a aumentar.
Em certo sentido, talvez a deusa também desejasse um relacionamento mais próximo com ele.
…Ou não.
Toc, toc.
Quando estava prestes a sair, ouviu uma batida na porta.
— Sr. Parav, está aí?
Do outro lado, estava o rosto de uma mulher familiar.
Pequena estatura. Olhos grandes e redondos. Uma aparência gentil.
Entretanto, a mulher parecia ser tão teimosa quanto justa.
— Srta. Marrone? — perguntou surpreso. — O que houve? Ainda temos algum tempo antes do encontro…
— Apenas porque sim. Ouvi dizer que vestir uma armadura grande sozinho é difícil… Vim ver se havia algo com que eu pudesse ajudar. Mas, bem, parece que você já terminou tudo!
— Ahaha… Foi difícil no começo, mas peguei o jeito com o tempo. Obrigado por pensar em mim.
— Já que terminou, quer ir comigo? Não vai demorar muito para o encontro começar.
— Ah, tudo bem.
Com isso, os dois deixaram a hospedaria e seguiram em direção ao ponto de encontro.
Muitas pessoas já haviam chegado, e podiam ver a vice-capitão de pé, com uma expressão severa.
Versyl Gowland.
Alguém que possuía grandes correntes comparáveis às suas próprias. Outra prisioneira nesta vasta prisão.
E alguém que havia obtido um novo conjunto de correntes recentemente.
— Não notei no começo, mas, ultimamente, tenho sentido a ausência do Sr. Yandel. A Srta. Gowland deve estar tendo dificuldades…
— Ahaha… Provavelmente. Provavelmente…
Parav deu um sorriso desconfortável enquanto desacelerava sua respiração.
Ba-dum.
Mesmo sem realizar nenhum esforço físico, seu coração batia acelerado desde que acordara naquela manhã.
Era uma condição que o acometeu no dia em que voltou à cidade e nunca o deixou desde então. Mesmo após alguns dias, mesmo que devesse ter se acostumado, sentia que nunca conseguiria.
Ba-dum, ba-dum, ba-dum!
Ele ainda sentia como se fosse explodir de ansiedade, e uma sensação de vazio às vezes o tomava, dificultando sua respiração.
Tudo isso por causa de sua intuição. Ele não sabia se aquilo era uma bênção ou uma maldição.
“Por favor, permita-me sobreviver a este dia sem perigo.”
Quando sua condição piorou subitamente, ele fechou os olhos e rezou mais uma vez para a deusa daquele outro mundo.
Pshwoong!
Um som, semelhante ao de um jato de caça decolando, invadiu seus ouvidos.
Nesse momento, todos os membros do clã olharam para o céu, de onde o som vinha, e ficaram em silêncio.
— Hã?
Algo disparou em direção ao céu como um foguete antes de descrever uma parábola e cair no centro da cidade. Por estar tão alto, parecia lento, mas obviamente se movia a uma velocidade incrível. Traçava um arco claro no céu antes de chover luzes brilhantes.
Ding! Ding! Ding!
Os sinos de alarme nas muralhas da cidade começaram a soar.
Boom!
E, pouco depois, toda a cidade tremeu com o impacto.
Brrrrm!
Os tremores eram sentidos levemente no sexto subsolo.
Ali, organizei meus pensamentos enquanto olhava para Raven.
— Um portal…
Quando um bárbaro ouvia algo sem sentido, ele nunca dizia que era impossível nem limitava sua imaginação. Mas a maga que proferira aquela ideia absurda parecia estar duvidando de seus próprios sentidos.
— Bem… Pode ser que não! Só acho que consigo sentir ondas de mana específicas de portais vindo de dentro daquela caixa…
Embora ela não fosse uma Guia capaz de sentir portais à distância, ainda era uma maga mais sensível à mana do que qualquer outra pessoa.
Por isso, provavelmente ‘havia’ um portal ali.
Além disso, eu já ouvira algo assim no passado.
Tap, tap…
A Távola Redonda, vinte anos atrás.
Bem, já que muito tempo havia passado, talvez fosse a Távola Redonda de vinte e poucos anos atrás, mas, de qualquer forma…
Um espírito maligno de outro mundo, Kagureas, disse o seguinte.
— Há um portal no subsolo do palácio.
Havia um portal em algum lugar sob o palácio, em um local diferente das praças dimensionais. Esse poderia ser aquele portal.
— Provavelmente não é um portal conectado ao labirinto, certo…?
Bem, só saberíamos testando, mas a probabilidade de estar conectado ao labirinto não parecia muito alta. Kagureas também havia mencionado isso.
— Descobri isso por acaso, então não posso ter certeza, mas não acho que o portal esteja conectado ao labirinto.
Era mais um ‘ouvi dizer’ do que uma evidência factual, para ser justo. Contudo, como foi dito pela primeira pessoa a descobri-lo, eu poderia atribuir certa credibilidade.
— Há algo além do portal? — perguntei.
— Vou precisar olhar mais de perto…
— Vá em frente. Isso pode ser uma grande descoberta.
Raven pareceu gostar da minha escolha de palavras, pois se lançou entusiasmada para inspecionar a ‘caixa’ que, segundo ela, abrigava um portal. Ela deu uma volta ao redor para observar o exterior, depois outra para verificar se havia reentrâncias, e por fim usou magia de levitação para checar se havia algo acima.
Boom!
Usei minha maça de ferro para golpear as paredes, segui as instruções de Raven para usar uma pá para cavar o chão, entre outras coisas.
Depois de fazermos tudo o que podíamos, apenas uma coisa ficou clara: não havia nada mais que pudéssemos descobrir além da possibilidade de um portal existir dentro da caixa.
Bem, talvez houvesse mais uma coisa, embora não fosse algo que aprendemos durante nossa investigação.
— Hã? Sr. Yandel, olhe aqui! O teto por onde caímos se reformou!
O chão do quinto subsolo, pelo qual havíamos caído, não estava mais visível. Também não conseguia sentir os leves tremores vindos de cima.
De repente, senti uma urgência no ar. Tive a sensação de que estávamos em um lugar completamente separado do mundo exterior.
— E o teletransporte? — perguntei. — Você ainda consegue usar teletransporte, certo?
— Perdão? — Então a realização e o medo de talvez ficarmos presos ali para sempre surgiram no rosto dela. — Ahh… M-Me dê um segundo!
Ela rapidamente desenhou um círculo mágico no chão e realizou alguns testes.
— Hum, Sr. Yandel?
— Fale.
— Bem… Tenho boas e más notícias…
— Más notícias.
— Acho que não vou conseguir usar teletransporte em massa aqui… Minha mana continua se dissipando…
“Maldição, então estávamos realmente presos aqui?”
Eu me perguntava se aquilo fazia algum sentido, mas tentei manter a calma e continuar a conversa.
— E as boas notícias?
— Não consigo ver com meus olhos, mas há um círculo mágico de teletransporte gravado no chão aqui. Acho que é por isso que minha mana está se dispersando… Mas se conseguirmos ativá-lo…
— Ao ponto.
— Devemos conseguir sair, mas não saberemos onde vamos parar.
Então não precisávamos nos preocupar em ficar presos para sempre. Isso já era um pequeno alívio.
— Como você já usou círculos mágicos militares, deve conhecer o princípio. É um círculo criado em uma coordenada fixa, permitindo mover-se para frente e para trás usando mana, mas…
— Ao ponto.
— Este círculo só tem um circuito. É possível mover-se apenas entre dois pontos. Então, o que você quer fazer?
Eu não precisava nem pensar na resposta.
— Você tem certeza de que não pode descobrir mais nada aqui?
— Sim. Talvez eu conseguisse descobrir algo se tivesse equipamentos de pesquisa, mas isso é o máximo que posso fazer sozinha.
— Entendido. Então ative o círculo mágico imediatamente.
— Tudo bem.
Parecendo já saber qual seria minha decisão, Raven não disse mais nada e começou a ativar o círculo mágico.
— Pode levar algum tempo. Vou fazer alguns testes de verificação caso haja algo perigoso — ela explicou. — Avisarei quando estiver pronto, então descanse por enquanto.
Ao ouvir que levaria tempo, caminhei até a estrutura no centro da sala. Não era preta, mas também não era branca, um cubo cinza. Quando toquei o exterior, sua superfície era macia o suficiente para deixar uma marca, mas resistente o bastante para que vários golpes da minha maça de ferro não causassem nem uma rachadura.
“Se isso realmente tem um portal por dentro, deve haver uma maneira de entrar…”
Hmm, talvez fosse algo que precisasse de magia ou uma chave especial para abrir uma entrada? Mas se pudesse ser aberto com magia, Raven já teria feito algo a respeito.
O peso do tempo parecia esmagar meus ombros. Decidi pensar em outra coisa.
“Noark. Com quem eles estão trabalhando e o que estão tentando alcançar?”
Essa era provavelmente uma questão mais importante do que descobrir o que era aquela caixa misteriosa. Havia algumas coisas suspeitas que não podiam ser ignoradas, se tudo o que estavam tentando era destruir a casa real.
“Distrito Sete…”
E o Distrito Sete estava seguro?
Pelo que consegui perceber, parecia que o Trovão havia explodido mais uma vez antes do colapso total. Eu realmente esperava que estivessem bem…
— Hã?
De repente, recuei involuntariamente, me afastando da caixa.
Não havia como evitar.
Logo abaixo da parte da superfície que eu havia tocado antes, havia o contorno da mão de uma pessoa.
Quando lentamente estendi a mão em direção à marca, a mão, que parecia ter sido pressionada contra o outro lado, se moveu de novo.
Então, ouvi uma voz fraca.
— Me tire daqui.
Um calafrio percorreu minha espinha diante daquela situação completamente inesperada, mas isso me permitiu compreender o propósito daquela caixa.
— Por favor.
Aquela caixa era uma prisão.
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