Capítulo 734: Palhaço (3/6)

Uma situação completamente inesperada.

Esse era o único jeito que ele conseguia descrever o momento, mas não iria simplesmente desistir e se entregar ao desespero.

Pelo menos, era assim que Abed Necrapeto via as coisas.

“Mas é claro!”

Aquele era o Submundo, um lugar que só podia ser acessado ao usar o cajado que era, na prática, a arma de graduação dos necromantes.

Um paraíso para necromantes.

Quando criaturas mortas-vivas eram derrotadas ali, reviviam sozinhas após um curto atraso.

E o personagem que segurava o Cajado do Submundo era considerado uma entidade não viva, incapaz de morrer ali.

Bem, existia uma forma de contornar isso, mas esse não era o ponto principal.

— Pshehe…

Não havia motivo para ter medo.

Tap.

Mesmo que aquele gigante emanasse uma aura como a de um trem de carga…

Tap.

E mesmo que ele não acreditasse que pudesse atravessar as defesas absurdamente altas do bárbaro para causar qualquer dano real…

“Contanto que eu só precise sobreviver…!”

Ele tinha certeza de que, pelo menos, conseguiria fugir. Afinal, embora aquele bárbaro tivesse defesas monstruosamente altas, não era tão rápido. Necrapeto havia descoberto isso na perseguição recente.

Claro, o necromante também era tão lento que quase foi pego…

— Oh, está sorrindo?

Mas isso foi no passado.

Seus atributos físicos haviam aumentado enormemente desde então, e suas invocações também estavam muito mais fortes.

Depois de analisar a situação logicamente, concluiu que não havia necessidade de temer o bárbaro.

— Por que não posso sorrir? Pshe…

Sua confiança crescente o ajudava a relaxar um pouco.

— Bem, não é que você não possa… Mas estou impressionado. Há pouco, parecia que ia morrer de medo.

— Besteira… Só fiquei um pouco surpreso. Pshehe…

Seu corpo refletia seu estado mental à medida que seus ombros, antes curvados, se erguiam.

Pensamentos positivos geravam mais pensamentos positivos.

Assim que começou a acreditar que estava em vantagem, passou a enxergar mais e mais elementos a seu favor contra o bárbaro.

“Vinte e quatro horas… Isso deve ser suficiente.”

Se passassem vinte e quatro horas ali sem que ninguém morresse, eles seriam devolvidos ao local original. Contudo, ele não tinha nada a temer.

“Só até o capitão chegar.”

Antes de atrapalhar Bjorn Yandel, Necrapeto recebeu a informação de que seu capitão estava se movendo do Distrito 4 para o Distrito 8. Mesmo que chegasse tarde, estaria ali antes que as vinte e quatro horas acabassem, e aquele monstro do capitão deveria ser capaz de lidar com o cavaleiro misterioso.

Qualquer um podia derrotar um monstro no labirinto, mas era praticamente impossível derrotar o capitão.

Se Necrapeto sobrevivesse de alguma forma e retornasse, aquele cavaleiro estaria morto ou fora de combate, e os outros membros da equipe estariam em posição defensiva, esperando por ele.

Quando isso acontecesse, nem mesmo aquele bárbaro persistente seria…

Hush!

Ei, ele ainda estava pensando aqui. Que bárbaro rude.

Vwoong!

Um ataque bruto, sem qualquer técnica visível.

— Pshe.

Dando um leve passo para trás para desviar facilmente do golpe, Necrapeto soltou uma risada.

— Lerdo.

O bárbaro parecia pego de surpresa.

Como ele conseguiu desviar tão facilmente? Certamente teria sido atingido por isso no passado…!

“Heh heh, ele ainda não percebeu.”

Aquele bárbaro tolo não sabia nada sobre o Submundo, e essa diferença de conhecimento jogava totalmente a favor do necromante naquele terreno.

“Hmm… Talvez eu devesse aproveitar a oportunidade para matá-lo.”

Apenas com um ataque desviado, Necrapeto ganhou muita confiança e até um pouco de motivação para agir.

O Coletor de Cadáveres, Abed Necrapeto, matando o Gigante, Bjorn Yandel, em um duelo? Que história incrível seria!

Pshwoo!

Nesse momento, um gás verde irrompeu do chão entre ele e o bárbaro, e o bárbaro recuou para evitar o ataque.

Necrapeto não pensou muito nisso. Quando um gás misterioso surge do chão, desviar era a reação óbvia.

Mas o que era aquilo?

— Hã? Por que você não foi atingido?

O necromante não entendia o que o bárbaro estava falando e inclinou a cabeça. — Do que está falando?

— Espera, você não sabe? Uau, quero dizer, eu realmente não queria ser o cara que te contasse isso…

Era como se ele soubesse o que aquele gás fazia.

O necromante sentiu que havia algo errado, mas ainda assim perguntou, só para confirmar. — Você, por acaso… sabe onde estamos?

— Como eu não saberia? É o lugar que seu cajado nos trouxe. O Submundo. Eu fico amaldiçoado se for atingido por aquele gás, e você é abençoado se for.

Necrapeto ficou sem palavras diante da explicação concisa do bárbaro.

— O quê? Você realmente não sabia?

Obviamente, ele sabia. Só estava surpreso que o ‘bárbaro’ soubesse disso.

Essa foi a razão de ter ficado sem palavras por um momento. Contudo, percebeu que não fazia sentido deixar a conversa por ali.

— C-Claro que sabia. Talvez você saiba só ‘um pouco’ sobre o Submundo, considerando como é famoso.

— Ah, então podemos continuar?

O bárbaro parecia não querer manter uma conversa longa e avançou novamente, soltando outro grito de batalha.

— Grrrk!

Ao ver o bárbaro avançando, Necrapeto imediatamente quis correr, mas decidiu trocar alguns golpes para testar se conseguiria lutar. Ele então retirou os cadáveres de seu subespaço nos quais tinha mais confiança.

— Uau, um traço de Barreira? Quanto tempo você levou para trabalhar nisso?

O bárbaro imediatamente percebeu o traço do No. 3, o servo que Necrapeto criara após incontáveis Remodelações.

— Esse aqui é fácil, a fraqueza está bem aqui.

Crunch!

O No. 3, apesar de possuir imunidade a dano, foi atacado em seu único ponto fraco e desmoronou impotente.

“C-Como ele sabe?”

Claro, ele reviveria logo graças ao efeito de campo, mas a confiança crescente de Necrapeto caiu imediatamente, substituída por um aumento de inquietação.

Ainda assim, tentou se manter o mais esperançoso possível.

— Posso simplesmente resistir ao traço do Punidor Divino.

Crunch!

— Ah, e aquele traço de Músico precisa sair primeiro.

Crunch!

Mas aquele bárbaro se movia com uma eficiência absurda, como se conhecesse todos os segredos do mundo.

— Oh, uma Chama do Submundo? Tranquilo.

O bárbaro periodicamente esmagava monstros de campo que aumentavam o atributo Trevas da área e, às vezes, atacava o chão sempre que algo surgia ali.

“Por que ele está batendo naquilo?”

— Ah, você não sabia? Isso aumenta suas resistências se você acertá-los.

Ele até sabia sobre os segredos escondidos do Submundo, coisas que nem mesmo Necrapeto, com suas inúmeras visitas ao local, conhecia.

Boom!

Quando tentou uma vez, sentiu como se sua pele tivesse endurecido um pouco.

Ba-dum!

A sensação de que ‘algo está errado’ crescia cada vez mais em seu coração. Contudo, ele não desistiu. Necrapeto sacou sua carta na manga no momento certo.

— M-Mas você não vai conseguir bloquear isso!

— Oh, então finalmente vai invocá-lo? — respondeu o bárbaro com um sorriso, ajustando o martelo em suas mãos.

Uma situação completamente inesperada.

— O-O quê?

— O que foi? Não ia invocar o Rei do Submundo?

Ele estava certo.

Quando alguém que possuía o Cajado do Submundo entrava no Submundo e as condições eram cumpridas, podia invocar um chefe especial de campo.

Esse era exatamente o plano de Abed Necrapeto. Contudo…

Ba-dum!

Como aquele bárbaro sabia de tudo isso? Era como se ele já tivesse visitado o Submundo inúmeras vezes.

— Ah, não importa se você sabe! — gritou Necrapeto. — Isso não é algo que você possa bloquear tão facilmente!

Erguendo o cajado alto, ele mirou na lua no céu e lançou Chamado do Submundo mais uma vez.

— Eu posso sentir o cheiro dos vivos.

A voz de uma existência transcendente ecoou por todo o Submundo.

Mesmo sabendo que era seu aliado, Necrapeto sentiu um calafrio percorrer sua espinha ao ouvir aquela voz.

Ele se lembrava claramente de como os membros de Orcules, que desafiaram sua posição durante aquela ‘competição’ no passado, morreram com apenas um único ataque do Rei do Submundo.

No entanto, isso não lhe dava muita confiança.

Bjorn Yandel. Um guardião habilidoso o suficiente para ser um dos melhores de toda a história de Rafdônia.

Nem mesmo o Cajado do Submundo provavelmente seria capaz de matá-lo com um único ataque.

“Mas conseguirei feri-lo gravemente.”

Necrapeto decidiu que tomaria sua decisão final após ver o resultado do primeiro ataque. Se causasse dano considerável, lutaria de forma mais proativa e tentaria matar o bárbaro. Caso fosse apenas um arranhão…

“Como diabos posso matar alguém assim?”

Ele admitiria que era um objetivo impossível desde o início e fugiria para ganhar tempo.

Fwoong!

Então, qual foi o resultado?

— Você, que está vivo, responda-me.

O Rei do Submundo estava além de qualquer adjetivo como ‘enorme’. Ele olhou para o mundo abaixo de si e fez uma pergunta.

— Por que você pisou na terra dos imortais?

Era, honestamente, um evento inútil. Não importava qual fosse a resposta, o Rei do Submundo esmagaria sua mão em raiva…

Pshwoo!

Hã?

“O quê?”

Naquele momento, o bárbaro se moveu de repente, entrando no gás verde que irrompia do chão. Necrapeto não conseguia entender. Ele sabia que seria amaldiçoado se entrasse ali, então por que…?

Não demorou muito para sua pergunta ser respondida.

— Parece que eu estava enganado.

Depois de dizer isso, o Rei do Submundo desapareceu sem deixar vestígios.

— N-Não! Rei do Submundo! E-Ele está bem aqui! O vivo está aqui, então volte! Por favor, volte!

Necrapeto continuou gritando para o céu ao perceber o que havia acontecido, mas o Rei do Submundo não deu sinais de reaparecer.

Com isso, o silêncio tomou conta do local.

Pshwoo!

Depois disso, o gêiser de gás parou de emitir o vapor verde, e o bárbaro saiu dele com um sorriso no rosto.

— Parece que você não sabia disso?

Era uma pergunta casual.

Necrapeto não podia acreditar no que acabara de testemunhar.

“Como diabos ele sabe disso?!”

Não fazia sentido. Nas inúmeras vezes em que havia invocado o Rei do Submundo, nenhum alvo sequer tentou evitar o ataque usando esse método. Nem sequer era mencionado nas memórias do último necromante que possuíra o Cajado do Submundo. Não havia como Necrapeto descobrir aquilo sozinho.

— C-Como você sabe tudo isso? — perguntou Necrapeto, fingindo conceder, e o bárbaro apenas deu de ombros.

— Por que eu deveria te contar?

Era a frase que o bárbaro usava frequentemente para ridicularizar os outros.

— Ser atingido é a melhor forma de aprender.

Contudo, algo naquela frase imediatamente chamou a atenção de Necrapeto.

Ba-dum!

Não era a sensação de que algo havia dado errado agora, não.

Ba-dum!

Era a sensação de que algo estava errado havia muito, muito tempo.

Sob o céu verde, eu corria por uma terra desolada.

Hush!

À minha frente, uma quimera quadrúpede fugia comigo em perseguição, carregando o Coletor de Cadáveres.

“Tsk, será que peguei pesado demais?”

Primeiramente, a batalha em si foi bastante simples.

Mesmo com o buff do Submundo nos cadáveres, um necromante era uma classe que focava em batalhas de desgaste.

Naturalmente, mesmo suas unidades mais elite não podiam deixar de ser individualmente fracas em combate, e algo assim não tinha chance contra mim.

Afinal, o Bárbaro de Escudo era uma build que ficava mais forte quanto mais apanhava.

Além disso, como já tinha jogado como necromante antes, meu conhecimento sobre a classe era bastante detalhado, e eu já havia visitado o Submundo inúmeras vezes. Nada ali era novidade para mim.

O problema foi que, depois de eu neutralizar o Rei do Submundo, o espírito combativo de Necrapeto pareceu ser esmagado, e ele começou a fugir imediatamente.

“Acho que… está na hora.”

Claro, eu não fazia ideia de quantos acúmulos eu já tinha acumulado. Graças a ter corrido pelo exército de cadáveres e deixado que me atingissem, provavelmente acumulei uma boa quantidade.

“Bem, acho que saberei ao usar.”

Imediatamente, ao usar o efeito ativo da armadura, o guerreiro espiritual que surgiu atrás de mim avançou.

Embora não fosse comparável ao Rei do Submundo que vi há pouco, ainda assim era incrivelmente grande.

Necrapeto acabou se virando no mesmo instante e gritou para mim — Q-q-que diabos é isso?!

Cara, ele não era mais uma criança. Por que sempre fazia perguntas idiotas esperando que eu respondesse?

“Ser atingido é a melhor forma de aprender.”

Vwoong!

Com isso, o guerreiro espiritual deu mais um passo à frente antes de balançar sua enorme espada.

O tamanho esmagador trivializou a distância entre mim e meu alvo.

Boom!

Uma nuvem de fumaça surgiu com o impacto da explosão.

Certo, isso deve ter consumido sua habilidade de salvar vidas. O próximo golpe…

Hehe.

Deverá matá-lo.