Capítulo 737: Palhaço (6/6)
Ele perguntou se eu tinha ficado de repente interessado nele. Quando respondi com um aceno sem a menor hesitação, ele foi quem acabou ficando desconcertado.
Eu me perguntava o que havia de errado com ele.
“Por que eu perguntaria se não estivesse curioso?”
Por que perderia tempo com algo que não me interessava?
Não entendi por que ele ficou desconcertado, mas entendi a expressão que fez logo depois. Quando nossos olhos se encontraram, ele desviou o olhar.
— Está com vergonha agora? — perguntei, abertamente enojado, sem nem perceber.
Ele também pareceu perceber o que havia acontecido, tentando rapidamente se justificar.
— É-É natural! N-Ninguém nunca perguntou meu v-verdadeiro nome até agora!
Essa conversa estava tomando o mesmo rumo que alguém dizendo: ‘V-Você é o meu primeiro!’
Por pouco não desci meu martelo nele de desgosto, mas consegui me segurar.
— Então — perguntei novamente — qual é o seu verdadeiro nome? Não vai responder?
— N-Não vai adiantar me ameaçar! Já fiz as pazes com a minha morte!
“Hah, esse cara estava me irritando de novo.”
Quando o encarei, ele lentamente desviou o olhar de novo.
— Então… Estou dizendo isso não porque você me ameaçou. Certo?
Como assim? Ele ia dizer de qualquer jeito.
Enquanto eu o observava, confuso, ele finalmente disse um nome em inglês.
— Jester Arlecchino.
— Você é americano?
— Sim. Meu pai era um imigrante da Itália.
Eu não perguntei de onde o pai dele era, mas supus que significava que ele estava disposto a conversar.
— Entendo — disse. — E quanto tempo faz desde que você veio para cá?
— Faz dezenove anos.
— É bastante tempo.
— Pshe… Não preciso da sua pena. Eu gosto deste mundo, sabia? Mesmo que alguém dissesse que me mandaria de volta, eu recusaria!
Uh… Eu não sentia nem um pingo de pena por ele. E também não tinha intenção de voltar para o mundo moderno.
Ainda assim, já que estávamos nesse assunto, perguntei outra coisa.
— O que você gosta tanto neste mundo?
— Sou forte aqui. E posso fazer o que quiser com os mais fracos que eu. É como um sonho realizado.
Eu não conseguia acreditar no cara, mesmo enquanto ele dizia isso. Esqueça desequilibrado, ele era como um adolescente que fingia ser um assassino em série.
— Parece que você odiava a realidade — comentei.
Ele não disse nada. Parecia que eu tinha acertado em cheio.
Sorri enquanto continuava.
— Ah, não estou tirando sarro de você. Também não sou tão diferente assim.
Ele parecia confuso com minha tentativa honesta de formar um vínculo de simpatia com ele.
— O quê? Você?
Sorri novamente diante de sua descrença.
— Então acha que alguém que jogou um jogo 2D por nove anos seguidos gostava da realidade?
— Ah… — Ele soltou um pequeno suspiro de concordância, e então perguntou cuidadosamente — Mas você é mesmo o Elfnuna…? Aquele que postou vários guias estratégicos no Stone Iven?
— Sim, sou eu. Só descobri que ficou famoso depois que vim para cá. Mas por que ficou tão famoso assim?
— É-É natural que tenha ficado! Ninguém que jogava Dungeon and Stone deixava de ler seus posts!
— Uh… Sério…?
Eu tinha dificuldade em acreditar, mesmo enquanto ele dizia isso.
Eu só fazia aqueles resumos sobre distribuição de status, combinações de habilidades e taxas de drop para acompanhar meu próprio progresso no jogo, e compartilhei porque achei que seria um desperdício não fazê-lo, considerando o tempo que investi neles. Não sentia que eram tão impressionantes.
— A contagem de visualizações quando postei era bem baixa, sabe?
— O número de jogadores do jogo em si era bem baixo.
— Mas parecia que todo mundo que veio para cá sabia disso?
— As pessoas que foram puxadas para cá eram justamente aquelas que levavam o jogo a sério.
Ah, isso era verdade.
Zerar o jogo mesmo usando a versão com trapaças significava que eram jogadores veteranos que pelo menos gostavam um pouco do jogo. Havia uma boa chance de terem tropeçado nos meus posts enquanto procuravam informações.
— E o ambiente também contribuiu para tornar o apelido Elfnuna famoso.
— O ambiente?
— Todo mundo veio para cá depois de jogar usando a versão com trapaça… Então todos diziam que, se alguém viesse para este mundo depois de zerar a versão original, teria que ser o Elfnuna.
Eu não sabia o que dizer sobre isso.
— A propósito… Acho que o boato era verdadeiro. Você ficou tão forte, e ainda nem se passaram alguns anos.
Hã? Ele não sabia de nada.
Eu o cortei — Só metade desse boato é verdade.
— Como?
— É verdade que zerei a versão original e vim para cá, mas não recebi nenhum bônus que me deixasse mais forte.
— Como isso faz sentido?
— Porque joguei a versão original por nove anos.
Isso significava que, naturalmente, eu sabia mais do que os jogadores que vieram para cá após zerar as versões com trapaças. O conhecimento vinha com o território. Não diria que esse conhecimento era um bônus pelo meu esforço.
— Já chega de falar sobre mim. Continue falando sobre você.
— Não acho que tenho qualquer obrigação, sabe? Pshe.
Ah, lá vem de novo. Estava claro que ele ia acabar falando de qualquer jeito.
— Você começou em Noark?
— Não, foi no Distrito 5. Filho de algum comerciante. Pshe… Foi bem engraçado ver os pais gritando: ‘Filho! Filho!’ quando nem perceberam que o filho tinha sido possuído por um espírito maligno!
Ele não precisava entrar nesse nível de detalhe.
— Não me importa — descartei. — Quando se tornou um aventureiro?
— Cerca de um mês depois. Com a ajuda dos pais, consegui algum equipamento básico e entrei no labirinto.
“Um mês…”
Por mais que eu pensasse, suas circunstâncias pareciam ótimas.
Eu precisei terminar um sangrento ritual de maioridade e ir direto ao labirinto assim que acordei.
“Bem, ainda é provavelmente melhor do que começar em Noark.”
De qualquer forma, como parecia que ele responderia às minhas perguntas, fui direto às importantes.
— Quando matou alguém pela primeira vez?
— Hmm… Quem sabe? Quando foi…? Ah! Foi por volta do quinto mês!
— Quem foi?
— Foi meu primeiro companheiro de equipe que conheci através da Guilda de Aventureiros! Ahhh, que bom amigo ele era…
— Então por que o matou?
— Porque tentou me estuprar no labirinto.
Hã?
— Uh…?
Fiquei sem palavras diante da motivação inesperada para seu primeiro assassinato. Um momento de silêncio se passou. Necrapeto parecia se divertir com isso.
— Pshehe, qual é a dessa sua cara? Pshehe!
— Vou perguntar de novo, mas seu companheiro era um homem?
— Foi o que eu disse. Ele também era muito mais forte do que eu. Por isso agi como se estivesse sendo dominado antes de rapidamente esfaquear o pescoço dele com minha adaga! Foi bem fácil. Se fosse agora, eu o teria transformado em um morto-vivo e feito ele limpar minha bunda pelo resto da vida! Bem, graças a isso, aprendi uma coisa.
— O quê?
— A resposta é…! Matar pessoas dá dinheiro, pshe!
As adversidades fortalecem as pessoas. Pelo que pude perceber, a verdade que aprendi com Hans A foi o que ele aprendeu cinco meses depois de sua chegada.
— Bem, ficou mais fácil depois disso… Eu mostrava coisas que muitas pessoas queriam e esperava até que começassem a demonstrar ganância por isso. E quando abaixavam a guarda… Bam! Graças a isso, pude ficar mais forte mais rápido, e não precisei continuar usando essa tática problemática depois de ficar mais forte. Podia simplesmente matá-los!
Agora eu entendia como ele tinha se tornado assim. Se ele fosse desse jeito desde o início, não teria esperado até o quinto mês para matar alguém. No entanto, seu primeiro aliado lhe deu um grande choque e estabeleceu as regras do mundo para ele. Depois disso, as muitas pessoas que caíram em sua armadilha por ganância em relação a seus pertences teriam se tornado ‘provas’ de sua perspectiva.
Ainda assim, eu não sentia simpatia por ele. Na verdade, tinha outro pensamento em mente.
Se o primeiro aliado dele não fosse aquele cara, mas alguém melhor, como Erwen, o anão ou Raven… Onde ele estaria agora?
— Pshehe…
Era um experimento mental inútil.
Qual o sentido de se preocupar com o passado?
Mesmo aqueles assassinos em série infames foram, um dia, bebês fracos que não podiam machucar uma mosca.
— De qualquer forma, para resumir — comecei — você acabou sendo exposto como um espírito maligno e recebeu um convite para Orcules.
— Pshehe, bem! Suponho que você poderia dizer isso!
Ele parecia tão tímido no início, mas parecia gostar de contar sua história para os outros. Ele dava detalhes sobre perguntas que eu nem tinha feito, o que me permitiu entendê-lo melhor do que antes.
— E quando começou a falar como um idiota?
— Hmm… — ele murmurou, refletindo genuinamente sobre a resposta. — Eu só falava assim na Távola Redonda originalmente. Era para esconder minha identidade.
— Mas você fala assim fora também.
— Ah… Isso acabou acontecendo em algum momento. Vamos ver, quando comecei a falar assim na minha vida diária…? — Depois de um momento de reflexão, ele pareceu se lembrar. — Ah! Acho que foi depois que você apareceu na Távola Redonda!
Fiquei sem palavras mais uma vez diante do momento inesperado. A aparição de Leão provavelmente tinha excitado ainda mais seu cérebro infantil.
— Então qual é o seu objetivo? — perguntei.
— Meu… Objetivo…? — Ele arrastou as palavras, provavelmente pego de surpresa pela pergunta.
— Você disse que não queria voltar para casa… Não parece ter desprezo pelo palácio como o seu capitão… E também não parece satisfeito com seu estado atual.
Mesmo apresentando essas razões, ele pensou por um longo tempo até que, finalmente, deu uma resposta.
— Eu não tenho um objetivo.
— Não tem?
— Bem, suponho que, se precisar inventar um, seria morrer de uma maneira legal.
“Entendi…”
— Última pergunta.
— Pshehe… Já a última? No começo eu estava tranquilo, mas agora fico um pouco decepcionado por isso ter que acabar.
— O que quis dizer antes?
— Que parte?
— Que este é um mundo difícil de se viver. Você disse isso.
Ele ficou tenso, mas então forçou os músculos a relaxar enquanto jogava uma resposta de brincadeira — Quem sabe? Acho que está bem claro o que quis dizer. Este é um mundo muito difícil e caótico de se viver!
Eu não tentei pressionar o assunto.
“Um tipo de mecanismo de defesa, talvez…”
Na verdade, as pessoas com vontades fortes, egos inflados e objetivos egoístas eram, frequentemente, as mais fracas mentalmente.
Esse cara parecia ser uma dessas pessoas. O palhaço usava sua maquiagem sorridente para esconder a tristeza que carregava por dentro.
— Hah! Ainda assim, isso foi ótimo! Uma pena que não houvesse uma plateia aqui… Mas a pessoa que vai me matar é o herói da cidade, um espírito maligno, Elfnuna, e a pessoa que zerou a dificuldade original!
Esse cara se escondeu atrás da máscara de palhaço até o fim e deu um sorriso valente.
E eu não gostei nem um pouco disso.
“Muito bem, o que eu deveria fazer? Seria um grande desperdício simplesmente deixá-lo ir assim…”
Depois de pensar um pouco, fiz uma proposta.
— Você disse que queria morrer de uma maneira legal? Não é um desperdício morrer como um figurante aqui?
— O que está tentando dizer?
— Vou criar o melhor palco que você deseja. Então me siga.
— Hahaha, está tentando me recrutar?
— Tenho quase certeza de que Orcules não se importa com lealdades ou algo assim.
— Pshe, isso é verdade.
Uma ruga de concentração profunda se formou entre suas sobrancelhas.
Ah, claro, essa ação não significava muito. Sua resposta já estava forçada desde o início.
— Bem… Certo! Perdi um pouco do entusiasmo ao descobrir que é você, mas ainda assim, você é o Leão!
— Então você aceita?
— Também estou curioso para ver a cara do capitão e dos outros membros da minha equipe quando me virem voltar como inimigo após traí-los!
Ele falava como um hedonista, mas pude sentir os sentimentos que todos os humanos têm em uma situação dessas.
Alívio.
Esperança.
Alegria por ter sobrevivido.
E…
— Isso vai ser muito divertido…
A traição dessa falsa esperança.
Crunch!
— …agh?
Depois de ter metade da cabeça esmagada pelo meu martelo, ele me olhou com descrença e confusão nos olhos. A expressão de fraqueza que ele vinha escondendo sob sua máscara.
— Hah — suspirei. — Isso foi ótimo.
Sim, era isso.
— Mas… Por quê…
Respondi à sua pergunta desesperada:
— Porque é divertido.
Ainda melhor pelo fato de não ter sido uma morte nem um pouco legal.
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