Capítulo 739: Destino Reverso (2/6)
Nuvens cinzentas passavam rapidamente pelo céu, lançando sombras sobre o espaço aberto que os bárbaros utilizavam para se reunir e discutir assuntos de toda sorte.
As outras raças geralmente regulamentavam espaços fechados como áreas comunais, citando preocupações com formalidade e segurança, mas os bárbaros consideravam isso ineficiente.
Qual era o sentido de se reunir em ambientes fechados e sentar em cadeiras quando podiam simplesmente ficar de pé e conversar?
Como resultado, a terra sagrada dos bárbaros não possuía um local oficialmente designado como sala de reuniões. Foi por essa razão que Versyl foi conduzida à área comum, aberta a todos, quando perguntou a administradora-chefe sobre um lugar que pudesse usar para falar com dezenas de pessoas ao mesmo tempo.
Ela não conseguia entender como um grupo daquele tamanho populacional não tinha sequer um edifício para ocasiões como aquela.
— Não tente entender tudo. Será muito mais saudável para você aceitar os bárbaros como são.
Depois de ouvir o tom resignado da administradora-chefe, Versyl simplesmente assentiu. Ela percebeu que o conselho era genuíno, e a administradora-chefe não estava errado. Uma enorme sala de reuniões ‘realmente’ tornaria mais difícil comunicar-se com dezenas de pessoas simultaneamente.
“E com todos reunidos aqui assim, também há um senso de igualdade…”
Talvez essa fosse a verdadeira força dos bárbaros.
Aceitar os costumes deles pelo que eram permitiu que ela visse o lado positivo das coisas. Contudo, os muitos líderes de clãs convocados para o campo não pareciam inclinados a concordar.
— Ahem…
— Por que nos chamou aqui esta manhã?
— Falar de algo sério em um lugar como este… Os bárbaros não têm uma sala de reuniões?
— Não têm.
— Hah! Ouvi dizer que eles evoluíram de certa forma, mas ainda…
Versyl decidiu interromper os líderes ali mesmo. — Isso já é o suficiente.
Ela podia perceber que aqueles diante dela não compreendiam a situação em que estavam. Eles ‘não’ eram convidados.
“Preciso deixar isso claro antes de começar.”
Versyl decidiu esclarecer uma coisa antes de iniciar a reunião.
— Parece que isso pode ter passado despercebido por todos aqui, mas somos refugiados que fugiram do campo de batalha em busca de segurança. Os bárbaros que nos acolheram são os mestres desta terra.
Um dos líderes pigarreou desconfortavelmente.
— Sendo assim, pensei que poderíamos reservar um momento para demonstrar nossa gratidão por nos fornecerem comida e lugares para ficar. O que acham?
Quando ninguém respondeu, ela acrescentou — Quem sabe? Se decidirem nos expulsar daqui, talvez não tenhamos escolha a não ser voltar ao Distrito 7.
Versyl lançou um olhar para Ainar, que sorriu enquanto avançava.
— Isso mesmo, seus parasitas! Vocês pediram para que salvássemos vocês, os alimentássemos e déssemos camas. Se não forem completamente sem vergonha, deveriam pelo menos soltar um grito de batalha para demonstrar respeito e agradecer!
— G-Grito de batalha?
— Quer dizer aquele… B-Behela?
— Claro, podem recusar se não quiserem fazer isso! — disse Ainar com uma voz ácida. — Nós, bárbaros, respeitamos a livre vontade!
— Ah… E-Então, por motivos religiosos, terei que recusar…
— Oh! Então pode deixar a terra sagrada agora mesmo!
— Você disse que respeitaria minha livre vontade!
— Liberdade vem com grande responsabilidade. Você não sabia disso?
O homem ficou mudo enquanto Ainar o encarava como se ele fosse lixo, e o mesmo aconteceu com os outros líderes presentes.
Era hora de Versyl oferecer uma alternativa.
— Senhorita Ainar, por favor, pare. Aquela pessoa recusou apenas por motivos religiosos. Tenho certeza de que ele é grato à tribo bárbara.
— Oh, é mesmo?
O homem aproveitou a oportunidade para assentir.
— C-Claro. Tenho minha consciência, afinal.
Os outros líderes de clãs também aproveitaram a oportunidade para expressar sua gratidão.
— Senhora Fenelin. Agradecemos verdadeiramente.
— O mesmo de nós, do Clã Partia. Nunca esqueceremos essa gentileza enquanto vivermos.
Versyl escondeu um sorriso satisfeito ao ver aquilo.
Haveria mais a ganhar permitindo que simplesmente agradecessem do que insistindo no grito de batalha. À primeira vista, podia parecer que o gesto de gratidão era apenas o mínimo esperado deles, mas as pequenas ações tomadas agora se acumulavam para formar a base de um relacionamento mais próximo.
— Vice-capitã Gowland.
— Sim, Capitão Erta.
— Posso saber por que nos reuniu aqui esta manhã? Não espero que tenha sido apenas para que todos demonstrassem sua gratidão.
— Ah, isso? — Sentindo a oportunidade, Versyl deu um passo à frente e falou em voz alta o suficiente para todos ouvirem.
— Há uma hora, a barreira entre a terra sagrada e o Distrito 7 começou a enfraquecer.
Essa breve declaração serviu como um trovão de realização para os aventureiros, todos os quais haviam baixado a guarda após chegarem à terra sagrada.
— O q-que quer dizer com isso? — perguntou um deles, gaguejando.
— Os Noarkianos foram os que ergueram aquela barreira ao redor da terra sagrada em primeiro lugar! Eles não podem se dar ao luxo de prestar atenção em nós enquanto lutam contra o palácio!
Não era o grupo deles que os Noarkianos temiam, mas sim os bárbaros ainda vivendo na terra sagrada, corrigiu Versyl em sua mente. Contudo, isso não vinha ao caso.
— Mas por que agora? Por qual razão…
— A razão não importa — interveio Versyl, passando para seu ponto principal.
— O fato é que a barreira começou a enfraquecer. Quando a verifiquei, estava no processo de se dissipar naturalmente porque seu suprimento de mana foi cortado.
— Vice-capitã. Quanto tempo temos? — perguntou calmamente um homem.
Seria ele o capitão do Clã Ravraim? Versyl se perguntou. Ele permanecera resolutamente racional, mesmo entre aquele grupo de líderes de clãs que Versyl gostaria de dar uma pancada na cabeça pelo menos uma vez.
Ela combinou o tom dele em sua resposta. — Não é definitivo, mas estimo que temos cerca de uma hora.
— Apenas uma…
— Em qualquer caso, essa é a situação, então precisamos nos preparar. Por minha parte, só consigo pensar em duas razões para a barreira estar sendo derrubada de repente.
— Poderia nos dizer o que pensa?
— A primeira é que houve um problema genuíno e o suprimento de mana foi interrompido.
— E a segunda?
Ela se virou para o homem que gritou a pergunta. — Os Noarkianos agora têm força suficiente. Ficaram fortes o bastante para nos eliminar.
Na verdade, Versyl achava que a segunda razão era a mais provável, e parecia que sua opinião estava refletida em suas palavras.
Um pesado silêncio se seguiu. O campo ficou mortalmente quieto, quieto demais para haver dezenas de pessoas presentes.
O silêncio acabou sendo quebrado pelas palavras de uma mulher.
— Então, o que devemos fazer agora…?
Quem poderia dizer?
Versyl honestamente queria soltar uma desculpa, dizer que também não sabia, e ainda assim…
— A partir de hoje, você é a vice-capitã de nosso clã.
Isso não seria suficiente.
Ela fechou os olhos, respirou fundo para se recompor, abriu-os novamente e declarou — Precisamos nos preparar para lutar.
— Qual será a estratégia, se me permite perguntar?
— Vamos priorizar a defesa acima de tudo. Se montarmos acampamentos na frente do portão, eles não conseguirão entrar facilmente.
— Imagino que haja um passo seguinte?
— Sim. Avaliaremos o curso da batalha e esperaremos uma oportunidade surgir. Quando surgir, não deveríamos atravessar as linhas deles?
— A-Atravessar…?
Era um plano que nenhum dos líderes poderia conceber, como evidenciado pelos olhares arregalados. No entanto, Versyl apenas deu de ombros. Embora fosse uma maga e atacasse à distância, ela aprendera sua lição.
— Sim. A melhor defesa é um bom ataque.
Se ela realmente desejava proteger aquilo que lhe era valioso, precisava saber como fazer seus golpes valerem a pena.
A administradora-chefe da tribo bárbara, Shavin Emoor, era a pessoa mais ocupada na terra sagrada.
Era algo esperado, afinal.
Mais uma vez, a terra sagrada havia sido envolvida em outra batalha, e, infelizmente, ela era, atualmente, a responsável por tudo que acontecia dentro de suas fronteiras. Por isso, precisava permanecer focada e…
— Senhorita Emoor, trouxe-lhe um pouco de chá. Por favor, tome antes de continuar.
— E-Eh? — ela gaguejou, surpresa pela voz. — Mas olhe a hora! É…
— Você deveria ter ao menos um momento para tomar uma xícara de chá. Não há necessidade de se colocar sob tanta pressão.
— E-Eu entendo suas intenções, mas nossos inimigos logo estarão invadindo. Como eu poderia descansar?
Emoor sentia que estava prestes a perder o controle. Sua especialidade profissional era trabalho de escritório e administração, não guerra!
— Nesse caso, não vou insistir… Mas vou deixar aqui, pelo menos. Beba quando puder, nem que seja pelo esforço que fiz para prepará-lo. Às vezes, você precisa relaxar um pouco para ser mais produtiva no trabalho.
— Ah… Sim, claro… Obrigada, senhor Rotmiller.
Parecia mesmo que Rotmiller tinha vindo apenas para entregar o chá, pois ele simplesmente se virou para sair depois de colocar a bebida sobre a mesa. Só então Shavin Emoor percebeu o que havia mudado em Rotmiller.
— S-Senhor Rotmiller? O que está vestindo?
Ele sempre usava roupas simples e comuns, então por que agora estava armado e equipado como se fosse entrar no labirinto?
— Oh… Suponho que seja a primeira vez que me vê assim? Não me desfiz do meu velho equipamento, só por precaução, e agora estou grato por não tê-lo feito.
— Você… — Ela lutou para encontrar as palavras. — Também está planejando lutar?
— Por que não? Eles precisarão de toda a ajuda que conseguirem.
— Mas você era um batedor!
Alguns poderiam ver suas palavras como um sinal de desrespeito. No entanto, Rotmiller não pareceu interpretá-las assim, respondendo apenas com um sorriso gentil.
— Haha, não precisa se preocupar tanto. Mesmo como batedor, eu ainda era um aventureiro. Alguém que entrava no labirinto para proteger aquilo que lhe era importante.
Shavin Emoor encontrou-se sem resposta. Objetivamente, eles não eram próximos o suficiente para que ela pudesse realisticamente impedi-lo.
— De qualquer forma — Rotmiller disse após um momento de silêncio — vim aqui apenas para vê-la uma última vez. Será difícil nos vermos novamente depois que eu sair para o campo de batalha.
No final, havia apenas uma coisa que ela poderia dizer.
— Por favor, tenha cuidado.
Essas poucas palavras carregavam os verdadeiros sentimentos de seu coração, e ele as retribuiu com uma resposta curta.
— Eu voltarei para você.
Com isso, Rotmiller deixou a sala, deixando Shavin Emoor com as bochechas coradas.
“V-Voltar…? Para mim…!”
Mesmo enquanto sorvia o chá perfumado, seu coração não parava de acelerar.
“Senhor Leão.”
Apenas uma pessoa o chamava por esse título na Távola Redonda. A mesma pessoa que agia como porta-voz de Auril Gavis.
“Lobo.”
Curiosamente, a máscara da Heerkmuta que essa pessoa usava também era de um lobo negro. Contudo, chamar isso de coincidência seria forçar demais.
“Então ele sempre fez parte dessa organização.”
Mesmo sem ter o quadro completo, eu podia supor que ele provavelmente escolheu a máscara de lobo de propósito.
— Haha, por favor, não fique tão desconfiado — ele disse, tentando me apaziguar. — Não sou seu inimigo.
Eu não comprei. — Então por que está no meu caminho?
— Eu não disse isso.
— Não está? Então saia.
Ele não fez nenhum movimento para me dar passagem. — Já disse, não precisa ficar tão desconfiado. Estou aqui apenas para transmitir um conselho do ancião.
Pelo ancião, ele provavelmente se referia ao velho, Auril Gavis.
— Um conselho… — repeti.
Do francês antigo avis, baseado no latim advisum, ‘conselho’. Uma palavra que significava ajudar alguém a enxergar um curso de ação melhor a seguir.
Mas então, por que eu sempre me sentia tão em guarda quando ouvia essa palavra? Como se toda vez que fosse jogada para mim, a escolha ‘melhor’ não fosse realmente melhor para mim?
Vai saber. Contudo, aparentemente tomando minha resposta como permissão para continuar, ele deu o ‘conselho’.
— Vendo que veio por aqui, suponho que está indo para a terra sagrada?
Eu não respondi.
— Não vá para a terra sagrada, mas sim para lá — ele disse, apontando para o Distrito 7, atualmente em chamas.
Fiquei sem palavras e sequer consegui rir do que acabara de ouvir.
— Então mentiu quando disse que não estava no meu caminho.
— Estou sendo sincero quando digo que não planejo impedi-lo. Se disser que tomará este caminho e irá para a terra sagrada, então eu sairei do seu caminho, Senhor Leão.
— Sério? Então saia.
— Se é o que deseja.
Eu não esperava nada dele, mas ele realmente saiu do caminho, encostando-se no canto da muralha.
Dei um passo em sua direção, ainda mantendo minha guarda caso ele tentasse algo.
— Ah, e mais uma coisa — ele disse, me chamando bem quando eu estava prestes a passar por ele. — Não foi uma boa decisão matar o Palhaço.
— De que minha decisão importa para você?
— Importa para você. Talvez não para mais ninguém, mas o ancião acredita que Palhaço teria sido de grande ajuda para você se tivesse sido mantido vivo.
— Não sei se ele teria sido útil. Tudo que sei que esse ancião seu é intrometido demais.
— Ele é um ser bondoso e nobre.
Uau, como se alguém tivesse dúvida de que ele era um fanático por Auril Gavis.
Eu não sentia vontade nenhuma de continuar a conversa e segui em frente.
Thud.
Um passo.
Thud.
Dois passos.
Thud.
Consegui dar três passos antes de não conseguir mais ignorar o pensamento.
“Hah, isso está me enlouquecendo…”
— Por quê? — perguntei, me virando. Não gostei de como os olhos dele curvaram-se em um sorriso atrás da máscara assim que falei, mas a questão que estava me incomodando o tempo todo não me deixaria. — Por que não devo ir para a terra sagrada?
Ele parecia estar esperando por essa pergunta. — Porque, dependendo de onde você for, as pessoas que morrerão mudarão… Então, não vá para a terra sagrada, mas para o Distrito 7. Essa será a decisão mais benéfica para você, Senhor Leão.
— Mais benéfica para mim… — sorri enquanto confirmava uma última coisa. — É isso, então. Esse seu ancião também contou a você sobre esse futuro?
— Não sei do que está falando, mas isso é tudo que posso lhe dizer…
Oh, eu não estava realmente pedindo mais conselhos.
Minha mão disparou, agarrando-o pelo pescoço e o pressionando contra a beira da muralha.
— Você vai sobreviver a isso ou morrer?
Talvez eu confiasse nele se ele acertasse.
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