Índice de Capítulo

    Diferente do abraço reconfortante do armário, as ruas eram sombrias e assoladas pela morte.

    Parav continuou correndo, e então correu ainda mais longe.

    Lilith Marrone, a mulher cujo nome ele ainda não sabia, e a criança que ainda chorava agarrada a ele.

    Ele carregava as três pessoas em suas costas.

    A inquietação de Parav não diminuía com a distância. Na verdade, sua mente ficava cada vez mais repleta de pensamentos variados, cada um pequeno e insignificante.

    Era desconfortável correr porque suas mãos estavam ocupadas.

    Seus quadris estavam rígidos depois de tanto tempo no armário. Ele queria comer morangos direto da geladeira.

    Por que a Deusa não concedeu a seus paladinos algum tipo de habilidade de movimento?

    “Se eu também tivesse Gigantificação…”

    Então ele poderia facilmente carregar três pessoas nas costas e correr de forma muito mais eficiente. Havia diversas essências com habilidades incríveis como essa.

    Apesar de sua súbita inveja, não havia muito o que ele pudesse fazer. Os fiéis que possuíam poder divino não podiam consumir essências, assim como os magos.

    “Afinal, por que isso é assim?”

    A igreja dizia que suas almas pertenciam à Deusa e, por isso, não deviam ser maculadas com as marcas de outras almas. Mas como isso fazia sentido…?

    Parav parou de repente.

    — Todos, fiquem quietos — sussurrou, escondendo-se rapidamente entre os prédios. Resumidamente, estavam a menos de cinco minutos da área leste em chamas do Distrito 7. — Parece que o exército palaciano e os noarkianos estão lutando.

    — E se procurássemos outro beco? Poderíamos contorná-los.

    — Se quisermos chegar à filial leste de que você falou, passar por aqui será o caminho mais rápido.

    Levaria cerca de três vezes mais tempo para contornar o conflito, e ainda havia a questão de encontrar um caminho viável enquanto tudo estava pegando fogo.

    — Como parece que nenhum dos lados está em vantagem, que tal aproveitarmos a oportunidade para avançar rapidamente? — sugeriu Marrone.

    Parav ponderou por um momento e depois assentiu. — Certo. Isso será um pouco perigoso, mas considerando tudo, acho que será o caminho mais seguro.

    Com isso, a discussão terminou.

    Parav soltou um suspiro profundo antes de sair correndo do beco em direção ao campo de batalha. Suas mãos já estavam ocupadas segurando as três pessoas em suas costas.

    — Deixo com você! — sussurrou em tom urgente.

    Agora, Marrone era a única encarregada da defesa. Parav não podia evitar o desconforto de colocar sua segurança nas mãos de outra pessoa, mas não havia escolha. Ele até considerou fechar os olhos e simplesmente correr direto, às cegas.

    “Isso seria exagerado, certo?”

    No final, no entanto, ele manteve os olhos abertos enquanto avançava pelo campo de batalha ensanguentado.

    — Quem são esses caras?

    — São inimigos?

    No início, nenhum dos lados agiu porque não conseguiam determinar se os recém-chegados eram aliados ou inimigos, mas essa confusão não durou muito.

    — Lilith Marrone!

    — Sven Parav!

    — Eles são aliados de Yandel!

    — Matem-nos!

    Os noarkianos os reconheceram e começaram imediatamente a atacá-los, enquanto os soldados do palácio os protegiam com entusiasmo.

    — Aliados de Yandel! O palácio definitivamente está tramando algo! Precisamos matá-los aqui!

    — Pelo modo como avançam focados, deve haver um bom motivo para isso! Precisamos dar tudo de nós para protegê-los!

    Foi uma reviravolta completamente inesperada. Ele só planejava usar o caos da batalha para passar despercebido.

    “Acho que os prós e contras se equilibram?”

    Ele não precisava pensar muito sobre isso. Apenas precisava se concentrar em seguir em frente e atravessar até o outro lado.

    Boom!

    — Uwaaak!

    Stab!

    Os magos do palácio desviaram os feitiços lançados contra eles, e os soldados defenderam contra as espadas direcionadas ao peito de Parav. Os ataques que escapavam eram bloqueados pela barreira de mana que Marrone mal conseguia manter.

    Foi um momento crítico atrás do outro.

    Fwoosh!

    O resultado foi que ele atravessou o campo de batalha sem ferimentos e chegou à área leste, ainda em chamas. Mesmo assim, as pessoas tentando matá-los e as que tentavam protegê-los continuavam lutando atrás dele…

    Bem, pelo menos ninguém os seguiria para dentro das chamas.

    【Sven Parav lançou Oração de Proteção.】

    Parav lançou o feitiço divino conforme o planejado. Após confirmar rapidamente que uma barreira espessa cercava os quatro protegidos por Marrone, ele começou a correr para dentro do fogo.

    — Huh?

    — Por que ele está indo para lá?

    Os aliados e inimigos murmuraram em derrota ao perceberem que ele corria para dentro das chamas.

    Fwoosh!

    Depois de entrar no fogo, ele começou a correr rapidamente pela rua. Era difícil enxergar por causa das chamas e da fumaça, mas como só precisava seguir em frente, não teve muitos problemas.

    — Ali!

    Algum tempo depois, Parav finalmente avistou a filial leste da Igreja de Reatlas à distância. O pequeno templo tinha uma estátua familiar da Deusa instalada na entrada.

    Parecia que as palavras do aventureiro eram verdadeiras. Embora tudo ao redor estivesse queimando, a igreja permanecia firme em sua forma original. Uma barreira translúcida brilhava entre as chamas dançantes, bloqueando o fogo de se aproximar do prédio.

    Ao entrar na barreira, ele foi até a grande porta de entrada, que se abriu sem necessidade de chave.

    — Q-Q-Quem é você?

    Para sua surpresa, havia pessoas dentro do templo. Um número considerável, inclusive.

    — Como você chegou aqui, passando pelas chamas…?

    — N-Não acho que sejam noarkianos…

    — Fiquem atrás de mim por enquanto.

    À medida que os quatro apareciam, os evacuados ficaram em alerta, o medo evidente em seus olhos.

    “Um, dois, três, quatro, cinco, seis…”

    Havia um total de trinta e sete evacuados ali.

    Claro, não era tão estranho ver pessoas se escondendo do fogo e da guerra. Afinal, os quatro também tinham vindo procurar segurança e abrigo.

    Não, o verdadeiro problema era…

    — Mamãe…

    — V-Vai ficar tudo bem… Nada vai acontecer aqui…

    Parav sentiu instintivamente.

    Ba-dum, ba-dum.

    Esse lugar também não era seguro.


    — Hmm? Ah! Se está falando do chefe, eu o vi naquela floresta ali! Ele está quebrando as cabeças dos cadáveres, dizendo que podem estar fingindo ser mortos!

    — Entendo. Mas… não é toda esta área uma floresta…?

    — Não, você está me ouvindo mesmo? Aquela floresta! Aquela floresta ali!

    — Certo… Como estou um tanto ocupado, poderia talvez levar a mensagem para o Sr. Yandel por mim? Diga que, como todos os inimigos na terra sagrada estão mortos, ele deve vir aqui ajudar.

    — Claro! — O guerreiro, que parecia ter pouco mais de vinte anos, se virou e voltou pelo caminho de onde veio.

    “Como pode ser tão simples e inocente com essa aparência tão rude…?”

    Versyl Gowland apenas sorriu por um momento enquanto observava a figura do guerreiro se afastando. Em seguida, rapidamente voltou sua atenção para o campo de batalha.

    Embora a batalha estivesse encerrada, havia muitas coisas que precisavam ser feitas.

    Primeiro de tudo, os inimigos poderiam lançar outro ataque, então ela precisava de pessoas vigilantes nas muralhas.

    Os cadáveres empilhados como montanhas também precisavam ser tratados. Nesse ritmo, começariam a apodrecer e espalhar um cheiro terrível, além de ser algo totalmente anti-higiênico.

    — Aquele é um noarkiano! Apenas jogue de lado!

    — É difícil distinguir entre os humanos!

    — Hah… Então verificaremos se são noarkianos ou não, e você pode ir reunir os bárbaros!

    — Oh, boa ideia!

    Mesmo sem ter dado ordens detalhadas, a operação foi evoluindo aos poucos para algo mais eficiente.

    A forma como os corpos eram tratados era como o dia e a noite. Os restos mortais dos aliados eram reunidos com respeito, enquanto os corpos inimigos eram simplesmente jogados em uma pilha.

    — Gowland… Não, vice-capitã. O que faremos com os corpos dos noarkianos? Conforme ordenado, saqueamos seus pertences e os jogamos em um monte…

    Versyl deu uma resposta curta à pergunta de Kaislan. — Vamos queimá-los. Não vamos dar-lhes um enterro quando nem sequer sabemos seus nomes.

    — E quanto aos pertences dos guerreiros e aventureiros que recuperamos? O que faremos com eles?

    — Organize-os ao lado de seus respectivos corpos. Depois que a maioria for reunida, aplicaremos magia de preservação neles. Precisaremos enviar os pertences de volta às famílias dos falecidos assim que forem identificados, então certifique-se de que ninguém coloque as mãos neles.

    — Não acredito que alguém faria isso, mas pedirei que sejam mais cuidadosos.

    Versyl não conseguiu evitar um leve sorriso enquanto observava o trabalho de limpeza do alto das muralhas. De sua posição vantajosa, ela via com clareza o contraste no tratamento dado aos corpos, o que a fez perceber novamente por que precisavam vencer essa guerra a qualquer custo.

    Se os noarkianos tivessem vencido, a situação seria exatamente oposta…

    — Behel-LAAAH!

    — Behel-LAAAH!

    Um grito repentino vindo de baixo a tirou de seus pensamentos.

    Era óbvio quem havia chegado.

    — O guerreiro mais fortes do mundo!

    — O guardião da terra sagrada chegou!

    Havia apenas uma pessoa que esses guerreiros chamariam com tanto respeito e admiração.

    — O chefe! É o chefe!

    Versyl deixou a patrulha das muralhas para James Calla, o que tinha a melhor visão do grupo, e desceu para o chão.

    — Senhor… Você não se feriu, certo? Eu estava realmente preocupada com você…

    — Não me machuquei. E também estava preocupado com você.

    — S-Sério?

    — Hmm? Naturalmente.

    — Hehe… Acho que não é ‘anti-natural’… Ou é?

    Erwen ficou tão feliz em vê-lo depois de tanto tempo que simplesmente se agarrou a ele. No entanto, comparado a ela, Yandel parecia um tanto exausto.

    — Bom trabalho — cumprimentou Versyl.

    — Ah, bom trabalho para você também. Tenho certeza de que foi uma posição difícil.

    Foi um pequeno gesto de encorajamento, mas, por algum motivo, ela não conseguiu responder.

    O peso das palavras ‘posição difícil’ a atingiu em cheio. Embora não fosse sua primeira vez como vice-capitã de um clã, as circunstâncias agora eram completamente diferentes.

    Naquela época, não havia guerra, e os laços entre os membros não eram tão estreitos.

    “Mas este homem fazia esse trabalho todos os dias.”

    Ela sentiu mais uma vez o quanto aquele bárbaro, que inicialmente parecia simplório e ignorante, havia sofrido por tanto tempo.

    — Quero ouvir tudo o que aconteceu até agora — ele disse.

    — Ah, claro.

    Versyl explicou calmamente tudo o que havia ocorrido. No entanto, por algum motivo, não pôde evitar misturar suas emoções no relatório.

    Ela reclamava em alguns momentos e mostrava tristeza em outros. Era como uma criança contando ao pai sobre os problemas na escola naquele dia.

    — Entendo.

    Após o relatório, o bárbaro pensou por um momento antes de dar uma ordem, como se a conclusão fosse óbvia.

    — Versyl, chame todos os membros de todos os clãs. Tenho algo a dizer.

    Curiosamente, essa ordem trouxe para ela mais alívio do que qualquer outra já havia trazido. Era inesperado, considerando sua personalidade proativa. Quem poderia imaginar que simplesmente seguir ordens sem carregar nenhuma responsabilidade poderia ser tão libertador?

    — Vou reuni-los imediatamente. — Ela não fez mais comentários e prontamente convocou todos para Yandel. Só depois de terminar perguntou o motivo da reunião. — Então, o que você vai nos dizer…?

    — Estou pensando em sair e lutar com todos. Ouvi dizer que eles são bastante habilidosos.

    — Habilidosos, bem… Eles provavelmente prefeririam ficar aqui e permanecer seguros?

    Versyl tentou ser o mais cuidadosa possível com suas palavras, mas o bárbaro sorriu como se nada o preocupasse.

    — Ah, isso? Não se preocupe com isso.

    Ele então deu um leve tapinha em seu ombro para encorajá-la antes de se posicionar diante de todos.

    — Saudações. Soube que vocês seguiram minha vice-capitã e permaneceram em minha terra sagrada enquanto eu estava fora?

    — Perdão? Ah, sim… Obrigado, Barão Yandel.

    — Sim. Vocês deveriam estar gratos. Se têm alguma consciência.

    Ele não mencionou nada sobre o fato de eles arriscarem suas vidas para proteger a terra sagrada, apenas falou da generosidade que lhes foi mostrada enquanto continuava:

    — A razão pela qual os chamei aqui é simples.

    — O que seria?

    — Ah, não é nada demais. Estou planejando sair para lutar agora, e quero que vocês me ajudem.

    — Nós?

    O status como barão, a reputação como o Gigante. Eles não conseguiam dizer nada, já que estavam em desvantagem nesses dois aspectos. No entanto, seus olhares gritavam claramente: ‘E por que faríamos isso?’

    Yandel, porém, era perspicaz.

    — Então, preferem ser expulsos da terra sagrada?

    Foi um golpe certeiro, possível apenas porque ele era um bárbaro que não se importava com formalidades ou pretensões vazias.

    — Então está dizendo que, se não o seguirmos, vai nos expulsar da terra sagrada? Como pode nos ameaçar assim?

    — Os traidores malignos declararam guerra contra nós, e você planeja garantir sua segurança e somente a sua? Isso é algo que um cidadão honrado de Rafdônia deveria fazer?

    Ao invocar o nome do palácio, os aventureiros não ousaram desafiá-lo. Todos ficaram em silêncio.

    O mais surpreendente aconteceu logo depois.

    — Não se preocupem muito — tranquilizou Yandel. — Esta é uma oportunidade para vocês conquistarem feitos.

    — E por feitos, você quer dizer…?

    Assim que surgiram conversas sobre ganhos, os olhos dos aventureiros começaram a brilhar.

    — Talvez vocês não saibam porque estão presos aqui, mas o exército do Distrito 5 foi transferido para o Distrito 7 a meu pedido. O exército está atacando pelo norte… E, no meu caminho até aqui, causei um incêndio, então a área leste também está um caos. O que acham que aconteceria se atacarmos agora do sul?

    — Vamos cercar o inimigo!

    — Sim, e por que acham que as forças deles deixaram soldados aqui e recuaram? Acham que foi só porque conseguiram derrubar o portão? Não. Eles não tiveram escolha a não ser recuar porque algo mais sério os forçou a isso!

    — Ah! Então foi isso que aconteceu…!

    — Eu também estava curioso sobre isso, mas agora tudo faz sentido!

    Depois de usar o ‘bastão’ no início, Yandel trouxe a ‘cenoura’. Os aventureiros o ouviam como se estivessem hipnotizados. Não demorou muito para que se rendessem completamente às suas palavras.

    — Então, estou planejando levar todos que possam lutar até o Distrito 7…

    O queixo de Versyl caiu. Ela não conseguiu evitar se impressionar com o que estava vendo.

    “Essas são as mesmas pessoas de antes?”

    Enquanto ela agia como vice-capitã, esses aventureiros não faziam nada além de procurar maneiras de evitar lutar, mesmo quando ela argumentava que precisavam proteger a terra sagrada para garantir a própria sobrevivência. Mas agora, seus olhos brilhavam de motivação.

    — Alguém quer desistir?

    Era como se todos acreditassem que o sucesso era o único desfecho possível.

    Um pequeno gesto, um grande impacto.

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