Capítulo 757: Refém (2/4)
O ronco alto, semelhante ao de um ogro, ecoava como trilha sonora no cofre subterrâneo destruído do Banco de Alminus.
Lá, Amelia soltou um suspiro enquanto olhava para Ainar. Não que estivesse desapontada com ela.
“Usaram alguma droga nela…”
Embora tivesse falado com Ainar de uma distância relativamente próxima e por um período significativo, Ainar não mostrava sinais de acordar. O fato de estar sendo mantida inconsciente à força por drogas parecia ser a única…
— U-Ugh…
De repente, Ainar soltou um gemido enquanto dormia. Amelia apressou-se até ela, concluindo que precisaria ajudá-la caso ela não conseguisse regular a respiração. No entanto, sua preocupação foi desnecessária.
— Mmph…
Ainar esfregou o estômago algumas vezes antes de virar-se para o ombro.
Hoooooonk!
Então, começou a roncar ainda mais alto do que antes.
Amelia a encarou, questionando se a bárbara realmente estava drogada ou apenas profundamente adormecida.
“Não, não pode ser…”
Não. Nem mesmo um bárbaro não seria tão alheio ao perigo em uma situação que ameaçasse sua segurança pessoal.
— Então… Não deveríamos acordá-la agora?
— Como? Ainar Fenelin está atualmente sob o efeito de uma droga.
— Ah… — Auyen acenou com a cabeça, como se apenas então tivesse percebido. — É mesmo?
Amelia escolheu ignorar Eltora Tercerion, o homem que seria registrado na história como um filho notoriamente desleal, enquanto ele murmurava. — Droga? Houve algum relatório sobre isso?
A desculpa da droga seria menos embaraçosa para todos. Não que isso importasse muito, considerando a situação delicada em que estavam.
— Hm… Posso continuar com minha história? — perguntou Eltora.
Amelia recompôs-se, desviando a atenção de Ainar de volta para ele. — Onde paramos?
Sua pergunta curta tinha um tom gélido, e o olhar nos olhos dela provava que ainda estava em alerta contra ele. Era natural, já que Eltora Tercerion estava tentando trair o pai e se aliar ao lado deles.
Após uma longa conversa, ela aceitou que ele não estava sendo controlado ou manipulado. Contudo, aceitar a verdade era uma questão completamente diferente.
— Eu estava falando sobre o quão benéfico será para o palácio e para o Clã Anabada se vocês aceitarem minhas sugestões.
— Ah, isso é verdade… Mas não é necessário.
Amelia não se importava em obter algo da situação. Ou, mais precisamente, ela não via necessidade de continuar ouvindo.
Seu raciocínio era o seguinte: usar o filho do marquês como espião? Não havia sentido em perder tempo articulando a vantagem estratégica disso. Ela decidiu focar no que era mais importante.
— Por que você está tentando trair seu pai?
A motivação, o fator que impulsionava as pessoas a agirem e criarem novas situações.
— Como já disse antes, minha maior razão é sobreviver.
— Você concluiu que o palácio vencerá esta guerra?
— Claro que sim. Ir contra o palácio é insano desde o início.
À primeira vista, parecia uma decisão lógica. Contudo, Amelia sabia que todos carregavam ganância em seus corações, e até mesmo um fragmento dessa ganância tinha o poder de levar alguém a extremos absurdos.
— Mas se você tiver sucesso — ela insinuou — não perderá essa vida de príncipe que leva?
Era da natureza humana focar na única razão para o sucesso e ignorar as noventa e nove razões para o fracasso. Mas como o filho do marquês foi capaz de tomar essa decisão tão rapidamente? Pelo que parecia, ele a tomou assim que o marquês desabou. Como isso era possível?
A resposta era bem simples.
— De forma alguma. Mesmo que a revolta tenha sucesso, seria difícil para mim manter meu estilo de vida atual. Meu pai… — Eltora hesitou. — Não, o Marquês Ageni Lawton Tercerion quer se livrar de mim o quanto antes.
— Não entendo. Por que o marquês faria isso com seu filho mais velho?
— Eu mesmo não entendia até bem depois. O marquês me trata assim porque sabe o que eu sou.
— E… o que você é?
Eltora deu um sorriso amargo à pergunta de Amelia. Em seguida, respondeu de forma breve, como faria um bárbaro.
— Eu sou um espírito maligno.
Em certo sentido, era sua primeira confissão na vida.
— Hah, isso não foi tão difícil.
Mesmo enquanto seu coração batia com adrenalina e emoção, Eltora também sentia uma sensação desconhecida de liberdade, um sentimento que ele experimentava apenas naquele momento.
Auyen Rockrobe, o navegador que havia conseguido ferir o marquês, estava em choque ao descobrir que o filho do marquês era um espírito maligno.
— Oh?
E Amelia Rainwales, uma profissional em esconder emoções e uma assassina de origem noarkiana, mostrava interesse aberto pela revelação.
De repente, tudo fazia um pouco mais de sentido. Se o que ele dizia era verdade, a traição de Eltora Tercerion não era inesperada nem estranha. Pelo contrário, a causa e o efeito eram absolutamente claros e naturais. Porém…
— Neste ponto, praticamente coloquei minha vida em suas mãos. Então, você pode confiar em mim agora?
Mesmo assim, Amelia não assentiu. Isso fazia parte de sua natureza desconfiada.
Uma confissão era apenas uma confissão. Não havia provas. E se isso também fosse uma mentira?
Felizmente, ela tinha suas próprias formas de discernir a verdade.
— Um objeto de metal que voa pelos céus.
— Um avião.
— Um anão deu uma maçã envenenada para uma princesa, e ela morreu. Qual o nome da princesa?
— Você está… está falando da Branca de Neve?
— Calças quadradas.
— Bob Esponja… Não, como você sabe disso?
— Eu confio em você. Você é um espírito maligno.
Usando o conhecimento de outro mundo que obtivera de Hansu Lee, Amelia chegou à decisão final: Eltora Tercerion era definitivamente um espírito maligno. Embora tivesse tropeçado no conhecimento sobre Branca de Neve e não pudesse responder, isso estava dentro da margem aceitável de erros. Mesmo pessoas nascidas no mesmo mundo tinham diferenças de nível de conhecimento. Provavelmente, Eltora simplesmente não teve acesso a tais recursos.
Lembrando-se de seu tempo em Noark, onde não podia receber educação mesmo que quisesse, Amelia sentiu um certo senso de afinidade com Eltora. No entanto, ela não mencionou isso em voz alta.
— O quê? — ele perguntou cautelosamente. — Que tipo de olhar é esse?
— Não é nada.
— Tanto faz. Então você confia em mim agora?
— Claro, resolvi todas as dúvidas que tinha sobre você.
Eltora ficou eufórico com isso. Depois de apresentar todas as provas que conseguiu reunir, ele finalmente havia conseguido provar sua confiabilidade para essa descrente.
— Então agora você vai me aceitar?
Sua pergunta, nascida de resquícios de insegurança, foi recebida com uma notícia chocante e desanimadora.
— Isso… infelizmente, não cabe a mim decidir.
— Não cabe a você? O que quer dizer?
— É exatamente o que parece. O capitão do Clã Anabada é Yandel, e a vice-capitã é outra mulher.
— O que você…?! — Eltora sentiu-se mais traído agora do que quando foi descartado sem razão pelo marquês. Sabendo que sua vida estava por um fio, tentou argumentar o melhor que pôde. — Não tente mentir para mim! Eu também sei muito sobre a sua organização!
— Não, mesmo que diga isso…
— Você é a mulher de Yandel!
Amelia piscou, surpresa. — Hã?
— Além disso, pelo que ouvi, entre as muitas mulheres que Yandel tem, você é a que ele mais confia e na qual mais se apoia! Ele sempre pede seus conselhos e opiniões sobre o que faz! E agora está dizendo que não é sua decisão?
— Hm… Não sei se diria tanto assim…
— Você praticamente é uma com Yandel!
— Hã…?
— Então, se vai me recusar, pelo menos seja honesta! Todo mundo no mundo já sabe que, se o Barão Yandel começar a tomar esposas, você será a primeira escolha dele!
— P-Primeira esposa?
— Quem mais seria? A Espírito de Sangue, que se perdeu na sede de sangue por causa da guerra? A Karlstein, que não tem nada a mostrar além de ter sido parte do time original dele? Ou Raven, que já está do lado do palácio? Ou aquela Lança Divina com músculos no lugar do cérebro?
— Eu nunca sequer cogitei a ideia de…
— Nem tente dizer que não tem influência! Eu sei que Yandel a valoriza e confia em você mais do que em qualquer outra pessoa!
Talvez por causa do estresse da situação de trair o próprio pai, Eltora despejou toda a sensação de injustiça que sentia, levado por suas emoções pela primeira vez em muito tempo.
— Bem-vindo ao grupo.
E, de alguma forma, isso foi o suficiente para ele conseguir exatamente o que queria.
Ainar Fenelin teve um pensamento enquanto mantinha os olhos fechados calmamente.
“Posso acordar agora…?”
Na verdade, ela não tinha acabado de acordar de seu sono profundo. Recuperou a consciência há bastante tempo, mas fingiu estar dormindo. E isso por um motivo muito simples.
— Ah, isso é verdade… Mas não é necessário.
Quando despertou, ouviu a voz de Amelia, o que significava que os aliados em quem confiava para resgatá-la haviam chegado.
Naturalmente, Ainar ficou muito feliz. Contudo…
— Ainar Fenelin está atualmente sob o efeito de uma droga.
Por ter aprendido algo sobre isso anteriormente, Ainar interpretou aquelas palavras como ordens que significavam ‘não acorde ainda’.
Assim, ela manteve os olhos firmemente fechados e sentiu que não precisava se apressar. Embora não tivesse uma prova concreta disso, não duvidava de sua decisão. Para os bárbaros, saber a hora de deitar e dormir era tão fácil quanto saber quando a carne estava pronta para comer.
De qualquer forma, era isso.
— Onde paramos?
— Eu estava falando sobre como será benéfico para o palácio e para o Clã Anabada se vocês concordarem com minhas sugestões.
Amelia estava tendo uma conversa bastante séria com um homem misterioso. Enquanto ouvia, Ainar percebeu que o homem era o filho do marquês.
“Ugh! Minha cabeça!”
Com uma dor de cabeça repentina, Ainar decidiu continuar fingindo que estava dormindo por mais um tempo, o que levou à situação atual: o silêncio que pairou após o término da conversa.
“Acho que devo me levantar agora…”
Após decidir que era o momento certo para agir, Ainar bocejou o mais naturalmente possível e se sentou.
— Ah, não se preocupe! Estou do mesmo lado que vocês agora…
O homem encontrou seu olhar e tentou explicar a situação rapidamente antes que ocorresse qualquer mal-entendido.
Smash!
Mesmo assim, ela deu um soco no rosto dele.
— Pare… Ele está do nosso lado.
Emily naturalmente a interrompeu, e só então Ainar se acalmou.
— Ah, sério? Desculpe! Eu não sabia!
Não era como se ela realmente não soubesse.
Ela sabia muito bem que ele estava do lado deles, depois de ouvir a conversa. Ainda assim, não conseguia entender por que o socou mesmo assim.
“Hmm…”
Depois de acordar, Ainar refletiu longamente pela primeira vez em muito tempo, e, como alguém que sempre fora chamada de brilhante desde jovem, encontrou rapidamente uma resposta.
— Além disso, pelo que ouvi, entre as muitas mulheres que Yandel tem, você é a que ele mais confia e na qual mais se apoia!
O fato de informações falsas terem sido compartilhadas? Ela não se importava. Os humanos eram uma raça traiçoeira que não conseguia viver sem mentiras.
— Todo mundo já sabe que, se o Barão Yandel começar a tomar esposas, você será a primeira escolha dele!
Da mesma forma, era compreensível que ele achasse que a esposa legítima do grande guerreiro seria uma humana.
Afinal, ele era humano. Ele apenas não sabe como são os bárbaros.
— Ou aquela Lança Divina com músculos no lugar do cérebro?
Essas palavras deveriam ter sido um elogio para ela, mas, por algum motivo, ela se sentiu ofendida por elas.
Ainda assim, também não era essa a razão.
“Porque…”
Porque sim!
— Behelaaah!
— Tão de repente?
— Eu só quis fazer isso!
Essa foi a resposta que Ainar encontrou.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.