Capítulo 774: O Décimo Terceiro Mês (1/9)
O longo serviço fúnebre, que de alguma forma ainda pareceu curto demais, chegou ao fim.
Os corpos dos guerreiros que puderam ser recuperados foram depositados na floresta, de acordo com as tradições da tribo. Quanto àqueles cujos corpos não estavam em condições de serem trazidos de volta, seus nomes foram coletados e homenageados juntos em um memorial coletivo.
Já os humanos receberam serviços de acordo com seus próprios costumes. Uma cova profunda foi cavada no solo para que os corpos fossem enterrados, e uma lápide foi colocada para marcar o túmulo.
— Isso realmente vai ficar bem? — murmurou alguém. — Se ele for enterrado aqui, em terras bárbaras, então…
Eu também estava um pouco preocupado com isso, mas, surpreendentemente, a família de James Calla queria que ele fosse enterrado aqui. Disseram algo sobre não haver outro lugar para sepultá-lo em Rafdonia de qualquer forma. Apenas os nobres que podiam pagar por um terreno em Árvore Gnomo eram enterrados lá. A maioria era cremada e suas cinzas armazenadas em suas casas.
— Sabe, eu… — gaguejou outra voz feminina ao meu lado. — Acho que ele vai gostar mais assim, sendo enterrado ao lado de seus aliados. Tudo o que ele fazia era trabalhar…
Eu olhei para a irmã mais nova de Calla, que observava o túmulo do irmão com os olhos marejados. — Eu não acho. Estamos falando do cara que saía para beber, mas sempre ia embora cedo para casa porque não suportava fazer você esperar.
— Ah… Então ele… Meu irmão era…
Ela desabou em soluços. Enquanto a observava, um pensamento me atingiu.
“Por que a verdade só vinha à tona quando já era tarde demais? Estariam os mortais condenados a nunca perceberem o que tinham até perderem?”
Não havia como saber, e a pergunta permaneceu enquanto eu lentamente virava a cabeça.
Lá, bem ao lado de James Calla, estava outro túmulo, o de Versyl Gowland. Sua data de nascimento e a recente data de falecimento estavam gravadas na lápide. Diferente de Calla, no entanto, cujo local de descanso estava cercado por parentes próximos e distantes, ninguém da família havia vindo para o dela.
E eu sabia exatamente por quê. Afinal, fomos aliados.
“O motivo de eu ter cortado contato com minha família? Só porque sim. Eles atrapalhavam minha vida de aventureira.”
Embora esse fosse o motivo que ela dava, eu sabia que não era a verdade. A verdade era que os Gowland não eram sua verdadeira família. Não foi o medo de ser descoberta como um espírito maligno que a afastou, mas sim a tortura de ter que fingir ser parte daquela família depois de tomar o corpo da filha deles.
“Por isso que disse algumas coisas duras quando os abandonei. Bem, mesmo depois disso, ainda decidi pagar os impostos deles. Não me arrependo. Também não era tanto dinheiro assim.”
Eu precisaria averiguar isso depois que tudo terminasse.
A riqueza de Versyl deveria ir para sua família. O clã não estava com dificuldades financeiras e, legalmente falando, era justo que os bens dos falecidos fossem entregues aos seus parentes mais próximos.
Fiquei parado diante do túmulo, perdido em pensamentos, até que Sven Parav murmurou suavemente ao meu lado.
— Que você seja guiada para onde deseja estar…
Foi uma oração simples, desprovida de ornamentos, mas entendi seu verdadeiro significado e compartilhei do mesmo sentimento. Afinal, ambos sabíamos de onde eles realmente vieram.
Vwoong!
Mas, falando sério, ele era algum tipo de santo ou coisa assim? Mesmo sem usar uma habilidade, sua voz parecia carregar uma autoridade misteriosa, como se estivesse imbuída de poder divino. Sempre que ele orava com fervor, como agora, seu corpo brilhava com uma sutil luz branca.
Voltei minha atenção para além do túmulo de Gowland, onde repousava Rotmiller.
O anão bebia bem em frente ao túmulo, enquanto Missha fungava baixinho, reprimindo a raiva.
Um pouco mais afastada estava Shavin Emoor, em silêncio, olhando para o túmulo com um olhar vazio de qualquer esperança.
Normalmente, eu teria saído para lhe dar espaço, mas, lembrando das palavras que Rotmiller me deixara, fui até ela.
Ela não disse nada quando me aproximei, então entendi o recado e apenas fiquei ali ao seu lado.
Passou um tempo até que Shavin finalmente falasse.
— Sr. Yandel… Seria estranho se eu chorasse, não seria?
— O que quer dizer?
— O Sr. Rotmiller e eu… não éramos nada, na verdade.
Ah. Então era isso.
Eu não podia negar que a relação deles terminou antes mesmo de começar.
— Estou com inveja — ela admitiu. — A Srta. Karlstein ali, e o Sr. Hikurod… Eles faziam parte da equipe dele. Podem chorar o quanto quiserem… Mas eu…
Eu a cortei. — E o que importa?
Na verdade, passei um tempo ponderando se deveria contar a Shavin sobre o testamento que Rotmiller me deixou, sem conseguir decidir. Mas, vendo-a agora, a decisão foi tomada por mim.
— Antes de morrer, Rotmiller me disse para cuidar de você — revelei, pegando-a de surpresa.
— O quê?
— Nem da Missha, nem daquele anão, nem de mais ninguém… Ele me disse para tratar você bem.
Shavin mordeu o lábio, tentando segurar as lágrimas. — Mas…
“Mas o quê?”
Suspirei e segurei seu ombro.
— Então que diferença faz o tipo de relação que vocês tinham? Se está triste, chore. Se está feliz, sorria. Você agora também é uma membro da nossa tribo.
— Eu posso…? Está mesmo tudo bem…?
Respondi com um aceno silencioso, e só então Shavin permitiu que as lágrimas caíssem. Seus ombros tremeram com respirações vacilantes no início, mas, conforme o tempo passava, logo ela chorava abertamente.
Escondi as mãos nos bolsos e as apertei.
Por mais vezes que passasse por isso, nunca ficava mais fácil.
Depois do funeral, voltei ao palácio para conversar com Astarota sobre como Ragna estava lidando com sua pseudo-prisão e sobre o que fazer com Eltora.
No entanto…
— Não posso deixar nenhum dos dois aparecer em público. Ainda não.
— Por quê? — questionei.
— A decisão sobre a posição da Condessa Peprok cabe apenas a Sua Majestade.
— Eu sabia disso quando perguntei. Tudo o que estou dizendo é que cuidarei dela até que ele tome uma decisão.
— Impossível.
— E por quê?
— Por que as ações da família real precisariam de um motivo?
Nossa. Ele era incrivelmente inflexível nessas coisas. E agia tão relaxado em outros momentos.
De qualquer forma, parecia que eu teria que adiar a saída de Ragna do palácio.
— E por que Eltora não pode sair?
— Ele é filho de um traidor. Se o libertarmos agora, as coisas podem se complicar de formas imprevisíveis e desnecessárias. Mas não se preocupe. É inegável que ele contribuiu muito para a guerra. Como prometi, farei o possível para garantir que ele mantenha a vida.
“Bem, então é isso. Fiz o que pude, agora deixo o resto para ele.”
Eu realmente não me importava tanto assim com o que aconteceria com Eltora, então não insisti no assunto.
— Pelo menos posso ver Ragna uma última vez antes de ir? — Perguntei.
— Pode, mas não fará diferença. Ela ainda não acordou.
— Ainda?
— Sim, ainda. Quer vê-la mesmo assim?
— Quando terminarmos nossa conversa.
— Parece que você ainda tem muito a dizer.
— Quero dizer, com o estado do mundo, não tem como evitar.
Astarota sorriu com isso e inclinou o bule para encher minha xícara de chá meio vazia, seu jeito de sinalizar que estava disposto a continuar a conversa. Conhecendo-o, porém, não havia como saber quando ele decidiria encerrá-la, então resolvi priorizar as perguntas mais importantes primeiro.
— O labirinto… Ele será reaberto?
— Por que está perguntando isso para mim? Essa é uma decisão para o próximo primeiro-ministro eleito.
— Não brinque comigo.
— Não posso dizer exatamente quando, mas o labirinto será reaberto em um futuro próximo. Também estamos no limite, afinal, sem poder coletar pedras de mana há um ano.
— Então Noark também vai invadir o labirinto. Há algum plano para isso?
— Um fazendeiro não deixa de plantar por medo de pragas.
— Ou seja, vocês não têm nada.
— Isso não é algo com que a classe trabalhadora deve lidar? — ele descartou. Notando o olhar que lhe lancei, suspirou e acrescentou: — Haverá certas restrições. Ser barrado na entrada caso esteja abaixo de certo nível ou não tenha ligação com o exército, algo assim. Essas contramedidas também estão sendo discutidas nas Reuniões Palacianas.
— Entendo.
— Falando nisso, por que você não compareceu à última? Se está curioso sobre essas coisas, deveria simplesmente participar.
— Tinha outras coisas para resolver.
Embora minha resposta fosse firme, ainda que vaga, fiquei um pouco surpreso. Ele sabia exatamente onde eu estava e o que estava fazendo, sem dúvida alguma, e ainda assim me fazia essas perguntas. Que sujeito estranho.
— Vou lhe dar um conselho, Bjorn Yandel.
Estremeci ao vê-lo endurecer a expressão de repente. Ele leu minha mente ou algo assim?
Pelo que me disse em seguida, porém, não precisava me preocupar com isso.
O que não significava que eu havia entendido.
— Em breve será o décimo terceiro mês — ele continuou. — Por decreto de Sua Majestade, esse mês sempre tem um grande festival, e considerando os tempos em que vivemos, precisamos disso mais do que nunca.
Oh. Eu realmente não sabia disso.
— E daí? — perguntei, esperando que ele explicasse o que isso tinha a ver comigo.
Astarota estreitou os olhos antes de pousar sua xícara de chá. — Descanse por enquanto.
O que era isso? Ele estava preocupado comigo? Mas não fazia sentido.
— Eu já estou descansando bem, sabia? — desconversei.
— Correr até o palácio para me fazer essas perguntas logo após um funeral é o que você chama de descanso? — ele rebateu imediatamente. Quando me calei, continuou: — Eu o informarei sobre qualquer nova informação que obtivermos sobre o labirinto ou a guerra. Até lá… Você precisa descansar, Bjorn Yandel.
Eu não tinha resposta. Não porque não conseguia pensar em uma, mas porque sua súbita preocupação era desconcertante demais para mim.
Quando fiquei quieto, ainda sem palavras, ele bebeu seu chá quente de um gole só, aparentemente tão envergonhado quanto eu.
— Isso encerra nossa conversa. Vá agora. Ah, mas pode falar com o homem na entrada sobre a Condessa Peprok. Ele o guiará até ela.
Bem. Eu não sabia o que dizer sobre isso.
— Certo.
Até Astarota havia mudado desde que nos conhecemos.
Assim que minha conversa com Astarota terminou, fui visitar Ragna. Como me disseram, ela ainda dormia. Aproveitei a oportunidade para conversar com Hyeonbyeol sobre algumas coisas e então parti.
Ah, e Eltora apareceu no meio do caminho para reclamar sobre quanto tempo ainda ficaria preso ali, mas isso não era realmente importante.
“Descansar, hein?”
Não conseguia tirar esse pensamento da cabeça enquanto saía do palácio e voltava para a terra sagrada.
Será que eu realmente podia me dar ao luxo de descansar? Baekho de repente se declarou o protagonista, o exército de Noark ainda resistia no distrito vizinho, e eu nem sabia quando o rei acordaria.
“Sem chance…”
Na verdade, depois de voltar para a terra sagrada, fiz tudo menos descansar. Em resumo…
Visitei a aliança de nobres não humanos, Melbeth, para verificar se tinham novas informações.
Compareci às Reuniões Palacianas sempre que eram convocadas para avaliar a situação política.
Encontrei nobres poderosos, como o Conde Alminus, para estabelecer contatos e até me reuni com Sven Parav para discutir suas novas habilidades.
Tomei um drink com o Sr. Urso depois de muito tempo.
E, sempre que podia, cumpria meus deveres como Chefe da tribo.
Embora Shavin Emoor estivesse cuidando desse trabalho na minha ausência, ela também precisava descansar. Além disso, eu conseguia lidar com tudo sozinho.
“Minha agenda está bem cheia…”
O tempo passou rápido enquanto eu lidava com meu cronograma apertado, correndo pela cidade. Curiosamente, no entanto, meu corpo e minha mente não estavam exaustos.
“Este corpo bárbaro é forte demais para se cansar com trabalho braçal. Além disso, manter-me ocupado é mais fácil, pois não fico distraído com outros pensamentos.”
As pessoas ao meu redor, especialmente Amelia, queriam que eu descansasse, como Astarota sugeriu, mas eu evitava o assunto ou recusava educadamente. No entanto, eventualmente, fiquei sem desculpas.
— Yandel.
Amelia entrou na minha tenda enquanto eu trabalhava tarde da noite para terminar algumas pendências como chefe da tribo.
— Você sabe que o festival começa amanhã de manhã, certo? — ela perguntou.
— Claro. Por isso estou ocupado agora. Nossos guerreiros trabalharam duro, então precisam de tempo para aproveitar.
— Mas e você?
— Ah, minha agenda amanhã? Depois do festival na tribo, preciso visitar a capital imperial à noite. Parece que o Conde Alminus está organizando um evento e disse que doaria generosamente para o nosso clã se eu comparecesse…
— Chega disso.
Amelia me interrompeu e, de repente, jogou algo em mim. Olhei para baixo e vi que era uma roupa.
— Amanhã, às nove da manhã — ela disse. — Vista isso e saia comigo.
— Hã? Não, mas como eu disse, já tenho planos para amanhã…
— A escolha é sua.
— Oh, então…
— Mas se você não for, estou deixando o clã.
Ou seja, não era minha escolha?
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.