Capítulo 817: Fio de Esperança (1/7)
— Bjorn!
— Você não se machucou!
— Bom trabalho. Você também, Auyen.
— Hahaha. Não é nada, Madame… cof, Srta. Raines. É minha maior e única glória ser útil ao capitão.
Assim que voltamos para a caverna, os membros que esperavam se aproximaram para nos receber.
— E então, Yandel, conseguiu o que queria?
— Mais ou menos — respondi vagamente à Amelia. — E aqui, como foi?
— Nada de especial. Bem, todo mundo ficou um pouco inquieto…
Eu não podia negar que estava um pouco preocupado, mas tirando o fato de não terem conseguido descansar direito por causa do Dia Final, parecia que nada mais tinha acontecido.
— Então… o que vai acontecer agora? Para ser sincero, estou com uma sensação estranha faz um tempo… — perguntou Parav, tremendo.
Isso não era um bom sinal. As reações dele davam algum crédito à minha suspeita de que o colapso dimensional estava se aproximando.
— É, como o Parav disse. Você só falou pra gente se preparar, mas não disse pra quê. Acho que já está na hora de contar.
Suspirei. Deveria contar ou não? Apesar da hesitação, ela não durou muito.
— Recebi uma informação de que um colapso dimensional pode ocorrer em breve.
Foi apenas uma declaração curta e factual, mas o silêncio caiu sobre todos, seguido rapidamente por um alvoroço.
— O quê?
— Um colapso dimensional…?
— Mas você disse que recebeu uma informação, né? O que isso quer dizer? Você ouviu isso daquele cara que veio do passado?
— Não, mais importante que isso é: quando isso vai acontecer? — A pergunta da Raven atravessou o caos, me pressionando a dar uma resposta honesta.
— Emily — chamei, — quanto tempo faz desde que você lançou o Dia Final?
— Cerca de vinte horas.
— Então será em mais ou menos quatro horas. Se a informação que recebi estiver certa, claro.
— Quatro horas?! — gritou Raven, chocada. — Mas isso é logo! Por que está nos dizendo algo tão importante só agora?! E por que foi pra tão longe sabendo que tínhamos tão pouco tempo?!
— Houve… motivos suficientes pra isso.
— Mas então, pelo menos diga quais foram esses motivos…!
— Chega, maga — Amelia interveio, impedindo Raven de continuar.
— Como é?
— Yandel disse que teve um motivo. Isso basta.
Admita-se, eu fiquei um pouco surpreso. Se Raven não estivesse aqui, teria sido a própria Amelia a me questionar. Mas talvez fosse diferente com ela, já que só fazia isso quando estávamos a sós?
Ignorando meus pensamentos, Amelia continuou: — Yandel é o nosso líder, e o que você está fazendo agora é ir contra a ordem hierárquica do grupo. Você já esteve no exército, então deve entender o que quero dizer.
Raven pareceu repensar suas ações diante da repreensão firme. — Eu… peço desculpas. Passei do ponto.
Bom, parece que ninguém aqui conseguia vencer a Amelia de verdade. Seja como for, já que ela usou o bastão, cabia a mim usar a cenoura.
— Não precisa ir tão longe, Emily. Todos aqui, não só a Raven, devem estar curiosos… Sendo direto: obtive a informação sobre o colapso dimensional antes de sair para a base secreta. Mas concluí que, fosse eu ou não, pouca coisa mudaria. Então fui até lá tentar conseguir o máximo de informação adicional, mesmo que no fim não tenha conseguido muita coisa.
— Como assim, pouca coisa mudaria?
— Pensa bem. O colapso dimensional vai acontecer hoje, mas e daí se sairmos daqui um pouco antes? O sexto andar já está um caos desde que o Lorde do Andar surgiu.
Nenhum dos membros pareceu ter resposta pra isso. O silêncio perdurou até que Kaislan se adiantou como representante do grupo para perguntar:
— Então… você tem um novo plano?
Sorri de lado.
— Não, nada disso.
A conversa que tive na base secreta não tinha nada a ver com sobreviver ao colapso dimensional, e nós nunca tivemos uma estratégia pra vencer isso, de qualquer forma.
— Mas vocês vão simplesmente se deitar e morrer só porque não temos um plano? Vamos encarar de frente. Somos aventureiros, não somos?
Como sempre fizemos.
Dessa vez, eu faria tudo ao meu alcance pra salvar todos eles. Se houvesse um ponto de maior perigo, era lá que eu estaria.
Mas não disse isso em voz alta. Não precisava.
— Sempre confiarei em você e o seguirei, Capitão.
— Hah… Nem quero imaginar o que você está planejando dessa vez…
— Tudo bem… então só não seja tão imprudente de novo, tá?
Todos aqui, exceto talvez o mestre da Guilda, Beleg, que entrou no labirinto comigo pela primeira vez, eram membros do clã que confiavam em mim.
Bom, havia uma outra exceção.
— Hmm, mas encarar de frente assim… Não foi você que quase desistiu de tudo há pouco tempo? — perguntou Kaislan num tom exageradamente brincalhão. Ele obviamente estava tentando me provocar um pouco, mas a pergunta era válida.
— Sim. Então animem-se.
Kaislan inclinou a cabeça, confuso com minha resposta.
— Hã?
Ignorando-o, olhei para o grupo e disse:
— Quando um bárbaro diz pra encarar de frente, é porque já concluiu que dá pra encarar de frente.
Mesmo que o céu desabasse sobre nós, com certeza haveria uma brecha por onde poderíamos sair.
【Você entrou no Grande Oceano no Sexto Andar.】
Cerca de quatro horas antes do colapso dimensional, deixamos Memórias do Fim, nome apropriado para as muitas lembranças que agora tínhamos dali, e retornamos à Ilha da Caveira original.
Bom, talvez ‘retornamos’ não fosse exatamente a palavra certa.
Splash!
O portal nos cuspiu de volta e desapareceu como se seu trabalho tivesse terminado, nos lançando em uma escuridão profunda e abissal. Como esperado, todo o sistema de cavernas estava submerso, mas isso não era problema para nós.
Pense bem. Se soubéssemos que poderia ser um problema e não tivéssemos feito nada, o problema real estaria na nossa inteligência.
Conforme o plano, Raven usou sua magia para criar um orbe de luz assim que saiu do portal. Com a visão restaurada, nos comunicamos por sinais manuais enquanto prendíamos os ganchos das cordas amarradas em nossos corpos.
Nome: Formação Cardume da Escola Anabada.
Era uma formação especializada para viagens subaquáticas, onde todo o grupo era guiado até o destino apenas com a natação do integrante da frente.
Falando nisso, esse integrante da frente era eu. Mesmo que bárbaros não soubessem nadar, eles tinham mais facilidade para andar debaixo d’água do que outras raças.
Thud! Thud!
Após usar a Gigantificação, caminhei com passos firmes contra a corrente como se estivesse subindo uma montanha. Como havíamos lançado magia de mergulho em todos os membros antes de passar pelo portal, não precisávamos nos preocupar com a respiração por um tempo.
Thud!
Assim que saímos da caverna, consegui ver toda a Ilha da Caveira submersa. A ilha afogada não possuía nenhuma da energia serena da cidade submersa de Atlântida, mas sim uma atmosfera de que uma tempestade estava em curso.
Swoosh!
As correntes eram extremas, incomparáveis ao fluxo da caverna, e cheias de destroços.
“Vou ter que mudar o plano.”
Mesmo com meu corpo ampliado pela Gigantificação, comecei a flutuar, incapaz de resistir ao fluxo das torrentes. Consegui me firmar segurando o chão, mas as rochas, árvores e outros detritos girando ao nosso redor estavam tornando quase impossível fazer qualquer coisa.
Então, abandonei o Plano A: caminhar até um local seguro antes de invocar o barco.
Splash!
Invocamos o barco imediatamente, e eu subi nele na mesma hora, agarrando um dos pilares com força de urso.
O barco do Clã Anabada era uma embarcação de alto nível e possuía até um sistema de propulsão por mana. Era construído com madeira flutuante da mais alta qualidade, aprimorada com o feitiço Impulsionar Flutuabilidade aplicado em toda a embarcação.
Swooosh!
Em outras palavras, no momento em que era invocado debaixo d’água, flutuava automaticamente até a superfície como um bloco de isopor empurrado no fundo.
Logo, o mundo se iluminou, e o ar encheu meus pulmões enquanto eu respirava profundamente.
— Auyen — chamei, após recuperar o fôlego — como está o barco?
— As velas estão quebradas, e o sistema de propulsão por mana sofreu muitos danos! Nesse ritmo, só conseguiremos… flutuar…
— Tudo bem.
— …Como?
— Só flutuar já é o suficiente.
Depois de verificar os companheiros, observei o entorno com mais atenção.
‘Forte’ não bastava pra descrever a chuva que caía ao nosso redor. Era como se os próprios céus tivessem se aberto para despejar água sobre nós. O oceano também parecia decidido a reivindicar seus espólios, e as ondas se agitavam como tsunamis.
Os meteoros e relâmpagos que caíam eram do Dia Final, então nem me importei com eles.
“Por que esse desgraçado teve que ser invocado justo antes do colapso?”
Os efeitos ambientais que estávamos enfrentando aconteciam porque o Lorde do Sexto Andar havia sido invocado. A maioria dos Lordes dos Andares possuía um efeito especial que afetava todo o andar, e ele não era exceção.
【Lorde das Lágrimas, Tetraseia, desperta de seu sono profundo.】
No momento em que era invocado, a chuva começava a cair sobre todo o sexto andar, submergindo todas as ilhas em água.
【Todas as ondas convergem para a Ilha dos Começos.】
Depois de submersas por tempo suficiente, as ondas caíam como tsunamis e convocavam todos os aventureiros do sexto andar para um único local.
O Fantasma Dourado provavelmente também sabia disso, e foi forçado a deixar a ilha antes que fosse submersa para procurar outra. Afinal, havia algumas ilhas que continuavam seguras mesmo após a invocação do Lorde das Lágrimas.
“Não dá pra negar que é curioso ele saber de algo tão valioso assim.”
De qualquer forma, eu tinha coisas mais urgentes com que me preocupar.
Como os padrões das ondas eram fixos, já era tarde demais para procurar um ponto seguro pra esperar a tempestade passar. Não que isso importasse.
“O colapso dimensional vai começar logo, de qualquer forma.”
— Capitão? Com os danos no motor de propulsão por mana, não conseguimos controlar o barco…!
— Tá tudo bem, é só ficar onde está.
— Como?
— Já disse. Só conseguir flutuar já é o suficiente.
Me acomodei e apenas observei enquanto o barco balançava e era levado pelas ondas até onde o Lorde do Andar nos esperava.
— Mas desse jeito… vamos acabar indo direto para onde ele está. — Raven perguntou cautelosamente, notando minha inércia. Talvez pela bronca que levou da Amelia antes, ela parecia menos segura ao falar agora.
— Tudo bem. Esse é o objetivo.
— Ah — ela suspirou, claramente aliviada. — Então você tinha um plano?
Não respondi mais e escolhi ficar em silêncio, e Raven também não insistiu.
Com o tempo, conseguimos vê-los.
— Oh! Um navio!
— Parece que estão todos em pânico ali.
— Claro que estão com medo. Como não estariam com todas as ilhas submergindo e as ondas violentas desse jeito?
Logo, começamos a ver mais e mais embarcações que também haviam sido arrastadas pelas ondas, assim como nós. Diferente de nós, porém, a maioria lutava desesperadamente contra a força das correntes, tentando escapar em vez de apenas se deixar levar.
“Resistir não vai te libertar.”
Não que estivessem se debatendo em vão. Aquilo ajudava a diminuir a velocidade com que eram levados. Também era por isso que conseguiam nos ver aqui, em vez de já estarmos na ilha.
— Tem… tem muitos navios aqui!
Enquanto éramos puxados pelas ondas, finalmente chegamos ao nosso destino.
Shwoooooo!
O redemoinho girava de forma selvagem, como se quisesse sugar todas as águas do sexto andar. E lá, em seu centro, havia centenas de embarcações, cada uma sendo arrastada para a órbita do redemoinho. Reconheci as bandeiras dos clãs em cada um dos navios, mas nenhum deles era de um dos clãs realmente famosos.
“Bom, o fato de terem sido arrastados até aqui já mostra que são figurantes.”
Os clãs mais fortes ou já haviam subido para o sétimo andar ou encontrado uma das ilhas seguras assim que o Lorde do Andar foi invocado.
Mas quando o colapso começasse, todos estaríamos em pé de igualdade.
— Clã Anabada! É a bandeira do Clã Anabada! — alguém gritou de um dos navios ao reconhecer a bandeira em nosso barco.
— O Clã Anabada? Aquele liderado pelo Visconde Yandel?
— O grande aventureiro que derrotou o Lorde do Terror e gravou seu nome na Pedra da Honra!
— E-Estamos salvos!
Dava pra entender por que estavam me chamando com tanto fervor. Essas pessoas estavam presas ali, apenas esperando pela morte quando a segunda fase começasse. Com certeza sentiram que minha chegada era um último fio de esperança lançado para ajudá-los a sobreviver milagrosamente.
— Mas por quê? Ele com certeza teria como escapar daqui!
— Tá brincando? É o Barão Yandel… quer dizer, o Visconde!
— É o herói que derrotou o Lorde do Andar para salvar outros aventureiros no terceiro andar. Com certeza também está aqui para nos salvar!
— Só precisamos seguir as ordens dele! Isso vai aumentar nossas chances de sobrevivência!
— Isso aí!
Antes mesmo que eu dissesse qualquer coisa, começaram a mover seus barcos para se prenderem ao nosso. Mas eu não os impedi nem tentei desviar. As centenas de embarcações aqui presentes eram o primeiro motivo pelo qual eu não enfrentei o colapso dimensional dentro das Memórias do Fim.
— Você é o capitão?
— Sim! Sou o Capitão Mellder do Clã Mão Pequena, Visconde Yandel! Confiamos no seu julgamento de agora em diante, por favor, nos dê suas ordens!
— Não vou dar ordens, mas vou perguntar uma coisa.
— Sim, o que for, responderei o melhor que…
— Vocês têm um mago que saiba usar a Porta Dimensional?
O Capitão Mellder, do Clã Mão Pequena, gaguejou diante do desespero na minha voz.
— Hã?
É. Sabia que não teria nenhum aqui.
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