Capítulo 818: Fio de Esperança (2/7)

Eu estava procurando por uma pessoa muito específica enquanto flutuávamos em círculos, arrastados pelo gigantesco redemoinho.

— Oh! Visconde Yandel! Está aqui para caçar o Lorde da…

— Porta Dimensional! Qualquer mago que consiga usar Porta Dimensional!

Verifiquei cada barco por onde passávamos, mas ninguém respondeu afirmativamente.

Para ser sincero, eu já esperava por isso. Sabia que estava me agarrando a qualquer esperança quando executei esse plano. Magos capazes de conjurar Porta Dimensional eram raros. Pouquíssimas escolas de magia ensinavam seus magos a usarem a versão aprimorada da magia, e mesmo que um deles conseguisse, um mago de quarto nível só podia conjurá-la uma única vez na vida.

E isso sem contar que esses magos preciosos estavam praticamente extintos, considerando quanto tempo a guerra contra Noark havia durado. Cada escola estava constantemente tentando formar novos magos para substituí-los, mas isso não significava nada no presente. Um mago de quarto nível não surgia do nada em apenas alguns anos. A oferta jamais conseguiria suprir a demanda.

“De certo ponto de vista, eles são o recurso humano mais valioso atualmente…”

Praticamente todos os clãs estavam desesperadamente tentando conseguir magos que pudessem conjurar Porta Dimensional, e mesmo com minha declaração de que o Clã Anabada, que não aceitava novos membros, abriria uma exceção para um mago com essa habilidade, ninguém apareceu.

“Alguns até responderam, mas eram todos mentirosos querendo uma chance de me encontrar.”

Tanto faz. Isso não era importante agora.

— Se o Visconde Yandel está procurando um mago de Porta Dimensional, então…

— Aquele maníaco por batalhas quer sair daqui? O Lorde das Lágrimas é realmente um monstro tão assustador assim?

— O palácio! Onde estão os soldados palacianos? Eles com certeza virão ao perceber que há uma emergência!

De algum modo, a multidão começou a tirar conclusões erradas sobre minhas intenções, talvez por eu ter perguntado aleatoriamente por um mago de Porta Dimensional.

“Eu não estaria fazendo isso agora se tivesse tempo, sabe.”

Mesmo que eu tivesse saído imediatamente das Memórias do Fim ao saber do colapso dimensional, ainda assim não teríamos conseguido derrotar o Lorde do Sexto Andar. Isso era óbvio. Como sua primeira fase ainda não havia terminado, só nos restava suportar esse redemoinho e esperar a segunda fase começar.

— A chuva… Parou?

A chuva forte que caía do céu cessou instantaneamente, e o céu se abriu mais uma vez, lançando ventos intensos contra nossa embarcação.

Fwoosh!

“Pra ser preciso, o céu na verdade não ‘se abriu’. Só parecia assim porque a luz começou a brilhar entre as nuvens que se afastavam.”

À medida que as nuvens densas se dissipavam, uma luz solar intensa derramou-se diretamente sobre o centro do redemoinho, como um holofote em um palco. O pilar de luz radiante brilhava ainda mais intensamente e parecia quase divino em comparação com os tons acinzentados ao nosso redor.

— Uau…

Vi os aventureiros ao nosso redor observando, boquiabertos, enquanto continuavam a ser arrastados em círculos.

Claro, nem todos estavam encantados com a visão.

— Maldição…

— O que vocês estão fazendo?! Acordem!

Pode parecer óbvio, mas poucos entre os grupos presentes sabiam exatamente o que aquele pilar de luz significava. Ainda assim, em vez de apenas ficar admirando o espetáculo, alguns aventureiros demonstraram cautela diante do novo fenômeno. Eles sabiam, por experiência, que o mais perigoso dentro do labirinto era o desconhecido.

— Tem alguma coisa vindo aí!

Suas suspeitas se confirmaram.

Quando a chuva cessava e a luz descia do céu, isso só podia significar uma coisa.

Shwaaaaaa!

As ondas finalmente cessaram com o início da segunda fase.

— Ali! Tem alguma coisa subindo?

— Mas que diabos é aquilo?!

Do centro do redemoinho, onde a luz solar incidia, a água recuou e uma ilha relativamente pequena se revelou.

— A Ilha dos Começos… Laemia?

Ouvi murmúrios de aventureiros com boa visão, mas seus palpites estavam errados. Embora ela realmente se chamasse Ilha dos Começos e seu formato fosse muito parecido…

“A localização é completamente diferente.”

A Ilha dos Começos que conhecíamos, Laemia, ficava muito mais ao sul de onde estávamos e também estava completamente submersa. Nem preciso dizer que seria difícil alcançá-la agora. Sendo assim, a ilha que víamos ali embaixo tinha que ser…

“Pra falar a verdade, só os nomes mudam. É praticamente a mesma ilha, usada apenas para raids. E, também, como altar de invocação.”

Para invocar o Lorde das Lágrimas, era necessário ancorar o barco naquele local e mergulhar até a ilha, o que significava que alguém havia invocado de propósito o Lorde do Andar. Mas quem?

Sem como descobrir, deixei a pergunta de lado. Não era algo com que eu precisasse me preocupar no momento. Não importava quais fossem seus planos, eles não poderiam ter previsto o colapso dimensional que estava por vir…

“Uh… Espera.”

Será que eu podia mesmo ter certeza de que eles não haviam previsto? Ou havia a possibilidade de que tivessem?

A dúvida me corroeu por um instante, mas logo a descartei. Era apenas uma hipótese infundada, considerando o quão poucas informações eu tinha.

— Capitão! O navio está sendo puxado! — Auyen correu até mim.

Embora não estivéssemos em pânico total, dava para ver que todos estavam nervosos e preocupados, então eu precisava acalmá-los primeiro.

— Está tudo bem — respondi. — Não se preocupem com isso.

— Ah… E-Eu me assustei à toa. Então não vai acontecer nada de mais…

— O Lorde das Lágrimas vai se revelar em breve.

Engraçado o bastante, assim que eu disse isso, algo gigantesco surgiu por trás da muralha de ondas.

Splash!

Tudo começou pelo punho, depois o cotovelo, o ombro e então… até o rosto, com o pano cobrindo os olhos e uma mordaça na boca.

— É o Lorde das Lágrimas!

— P-Precisamos fugir!

No instante em que se revelou, tudo mergulhou no caos.

Pensando bem, era de se esperar. Nenhum aventureiro ali presente jamais teria visto um monstro daquele tamanho antes.

— Q-Quão grande ele é?

— A gente tem que lutar contra isso?

Era esmagadoramente colossal, imensuravelmente mais alto até que o Hipramajent de nove metros. Não tenho certeza, mas provavelmente era maior que aquele supergigante que vi na Ilha dos Gigantes, ainda no primeiro andar subterrâneo.

Afinal, aquela coisa nem sequer estava em pé ainda.

Depois de congelar o mar inteiro de medo só com sua aparição, ignorou completamente a nossa presença e começou a se arrastar em direção à ilha.

Boom! Boom! Boom!

Cada vez que seu joelho tocava o chão, um tremor irrompia sob ele.

Enquanto todos apenas encaravam a criatura, tomados por uma presença tão opressora que até esqueciam de tremer de medo, o Lorde das Lágrimas chegou à ilha e a envolveu com os braços, como se estivesse protegendo algo precioso. Após cobrir toda a ilha com seu corpo colossal, virou a cabeça e olhou em nossa direção.

Whoa…

Embora ‘olhar’ talvez não fosse a palavra certa por causa das ataduras nos olhos, um arrepio percorreu minha espinha no momento em que senti que nossos olhares se cruzaram. E parecia que essa sensação não era só minha.

— Uhm, Capitão? O que acontece agora?

— Como eu disse, vocês não precisam se preocupar.

— A-Ah… C-certo?

— Ele só vai tentar nos matar agora.

— Perdão?

Claro, ele não começaria a nos caçar ativamente. A segunda fase era apenas aquela coisa abraçando a ilha. O problema é que, mesmo sem se mover, o Lorde das Lágrimas começaria a usar todo tipo de habilidade contra nós, e as paredes de água ao nosso redor começariam a expelir monstros para nos atacar.

Raven, que estava meio quieta desde a bronca da Amelia, falou confuso:

— E-então a gente tá encrencado? Ouvi dizer que os Lordes de Andar, do sexto andar em diante, são tão fortes quanto a maioria dos monstros de primeiro nível.

— O Lobo da Profecia foi aterrorizante… O quão assustador será esse monstro?

Os membros se encolheram ao se lembrar daquele pesadelo.

— É por isso que estou dizendo para não se preocuparem. — Falei enquanto encarava o Lorde das Lágrimas, que parecia também estar me encarando enquanto abraçava a ilha. — Está na hora.

Ainda não sabia se devia me sentir aliviado. Sinceramente, teria preferido mil vezes estar errado e termos que enfrentar apenas o Lorde do Terror1 hoje. No entanto…

A sorte nunca esteve do meu lado.

Hora de agir.

Os raios e meteoros que caíam do céu desapareceram de uma só vez, deixando para trás um momento de silêncio. No entanto, aquele silêncio estava longe de ser pacífico.

Era a calmaria antes da tempestade.

Ao menos, consegui perceber que aquele era o silêncio que precedia a grande tormenta prestes a nos atingir.

Crack.

Tudo começou com um som sutil.

Crack!

Então uma pequena fenda surgiu no mundo.

Rip! Crack!

Por fim, aquelas pequenas rachaduras se conectaram e se ramificaram como teias de aranha.

As centenas de aventureiros que antes estavam à mercê das correntes do Lorde das Lágrimas testemunharam um evento anormal que jamais haviam experimentado.

Craaaaaaack!

Por fim, um último estalo ecoou por todo o mundo.

O mundo se despedaçou em milhares de fragmentos e, sobre cada um deles, pude ver rostos desconhecidos, monstros e locais que jamais havia visto.

Um mago caçando no Grande Reino Demoníaco.

Um grande clã viajando pelo Continente Sombrio, no sétimo andar.

Um pequeno time desconhecido atravessando a nevasca no Rochedo Gélido.

Essas pessoas se moviam através dos reflexos dos milhares de fragmentos, como peças de um espelho estilhaçado.

— O quê…? Quem é aquele?!

— Bjorn… Yandel?

— Espera, aquilo atrás dele é o Grande Oceano…?

Alguns chegaram até a falar diretamente na minha direção.

E então, um floco de neve levado pelo vento pousou antes de derreter nas costas da minha mão.

Esse era o colapso dimensional, um mundo ordinário distorcido e esmagado à força por um poder desconhecido, transformado em um papel amassado.

Crack!

Mais um estalo, e os milhares de fragmentos se despedaçaram em milhões.

“Então o colapso dimensional está mesmo acontecendo.”

Mesmo já sabendo de antemão, meu coração batia com força no peito. No entanto, em contraste com meu coração acelerado, meus pensamentos se tornaram afiados e imediatamente focaram em meu dever.

— Fiquem perto de mim! — gritei apressado.

Todos os membros no barco correram até mim.

Crash!

Com o som de algo se partindo, o mundo desabou mais uma vez.

— Isso é…

Quando recuperei os sentidos e levantei a cabeça…

…um portão de pedra familiar me recebeu.