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    No começo, achei que não era nada tão sério. Afinal, regiões envoltas em trevas estão espalhadas por todos os cantos do labirinto. Por não ter nenhuma característica marcante, ainda não consegui identificar exatamente em qual mapa estou, mas imaginei que bastaria explorar um pouco para descobrir. Mas o que está acontecendo aqui?

    “Não faço ideia.”

    Mesmo tendo me afastado bastante do ponto de início, continuo sem entender nada. Não vi nenhum monstro que pudesse servir de pista, e o terreno continua igual ao do começo. Claro, mesmo que um monstro aparecesse, não haveria como saber se ele foi trazido pelo Colapso ou se já vivia por aqui.

    Tap, tap.

    Continuei me movendo devagar, vasculhando o entorno, e comecei a me sentir um pouco confuso. Chegou num ponto em que a ausência de características acabou se tornando… uma característica própria.

    “Um terreno só de chão batido, por tanto tempo…”

    Alguns lugares me vêm à mente, mas ainda não tenho certeza. De uma coisa, porém, eu tenho quase certeza: é pouco provável que este seja um mapa dos andares inferiores.

    “Já explorei pessoalmente quase tudo abaixo do sétimo andar.”

    “Hah… onde é que eu fui parar?” Enquanto andava com o cenho franzido, o mago especial veio se meter.

    — Bem… seja lá onde estamos, não parece haver perigo imediato. Que tal pararmos um pouco para descansar?

    Num primeiro momento, parecia uma sugestão razoável. Mas nós somos aventureiros. Crescemos enfrentando monstros e fazendo descobertas. Nem precisa ir muito longe, basta lembrar do intervalo anterior, se não tivéssemos explorado a Floresta em Chamas e aprimorado a Orbe de Fogo, teríamos enfrentado sérios problemas contra o dragão vermelho.

    “Bom… fora isso, a curiosidade também tá pesando.”

    Pra ser sincero, minha curiosidade como gamer também está falando alto. Onde será que eu vim parar? Será que, assim como aqueles sobreviventes que encontramos na Floresta em Chamas, esse lugar esconde algum mistério do labirinto que ainda não conheço? Ah, claro, não falei isso em voz alta.

    — De qualquer forma, temos que investigar. Pode ser que haja sobreviventes tentando passar um tempo com segurança por aqui, como nós.

    Como apresentei um motivo plausível, todos os passageiros aceitaram e ficaram em silêncio. Mas, talvez entediado de andar sem rumo num campo aberto, o falante mago especial puxou um novo assunto.

    — Aliás, vocês não acham isso tudo meio estranho?

    — O quê agora?

    — O Colapso Dimensional. Quanto mais penso, mais esquisita ele parece.

    — Tá, então fala logo.

    Fiquei tão impaciente que acabei elevando a voz, e o mago se apressou ao perceber isso.

    — O fenômeno de distorção… ou seja, durante o Colapso, há uma barreira translúcida em cada terreno. Ao ultrapassá-la, a região muda completamente. Vamos chamar isso de ‘parede dimensional’ a partir de agora…

    — Tá, tá, continua.

    Cof, cof. O motivo de termos conseguido despistar os monstros ao nos movermos constantemente… foi porque eles não conseguiam atravessar essa parede dimensional.

    — E daí?

    — Mas não acha estranho esse critério? Quando o Colapso acontece num mesmo ponto, a geografia muda e os monstros que estavam conosco se transferem para o novo terreno. Mas atravessar a parede dimensional… eles não conseguem?

    — Hm…

    Era algo mais interessante do que eu esperava. Se fosse só alguma bobagem, já ia aproveitar pra dar um cascudo nele.

    — Realmente… agora que falou, é meio esquisito.

    No jogo eu só aceitava como era, e agora que isso virou realidade, nem me sobrava cabeça pra pensar nesses detalhes. Mas, como esperado de alguém que se diz mago, esse aí pensava diferente.

    — Nossa escola, Spheris, pesquisa fenômenos físicos do labirinto, incluindo magia de ‘espaço’. Isso porque a estrutura do labirinto se assemelha muito a uma magia espacial em larga escala…

    — Resume, fala de um jeito que dê pra entender.

    — Pode ser que esse ‘critério’ mencionado esteja relacionado aos aventureiros… mais precisamente, aos seres vindos de outra dimensão.

    — Tipo a gente?

    — Exato. Ao contrário do que dizem por aí, o labirinto não está se desfazendo por completo. Apenas o espaço ao nosso redor está colapsando. Como se o labirinto estivesse tentando expulsar os intrusos.

    É só uma teoria sem provas, mas essa última fala me incomodou. Como se o labirinto estivesse tentando expulsar os intrusos… Acho que até a Arta tinha dito algo com essa nuance quando falou sobre o Colapso…

    — Nesse caso, os monstros mudarem de região junto com a gente seria só porque estavam por perto e acabaram sendo levados também?

    — Sim, exatamente!

    O mago especial assentiu animado ao perceber o interesse da sacerdotisa. Mas, por outro lado, a voz dela transbordava desconfiança.

    — Então como você explica aquilo? Você usa magia pra lançar monstros do outro lado da parede dimensional.

    — Ah! Eu pensei nisso também! Mas veja, é diferente. Quando eu lanço uma bola de fogo na direção da parede, ela não atravessa, certo? É a mesma coisa. Como a ‘magia espacial’ que lancei também é afetada pela parede, o alvo da magia, no caso, o monstro, acaba sendo arrastado junto.

    — …

    A sacerdotisa franziu a testa, como se não tivesse entendido direito.

    Mas talvez, com o conhecimento de um sacerdote, não tivesse como refutar a teoria com argumentos sólidos.

    — Mas se fosse algo tão significativo, já não teriam estudado e divulgado?

    Khm…! Esse fenômeno só parece estranho para quem passou por um Colapso. E quantos magos você acha que sobreviveram depois disso?

    — Deve ter bastante, né?

    — Os magos que exploram o labirinto, na maioria das vezes, ignoram a pesquisa. Só se interessam por lançar chamas maiores e mais rápidas. Você acha que gente assim tenta entender o que está por trás dos fenômenos?

    O mago especial falava como se só ele fosse genial o bastante pra fazer essa descoberta, mas eu discordo.

    “Com certeza a família real meteu o dedo nisso.”

    Não é óbvio? A família real está por trás dos Colapsos Dimensionais. E você acha que aqueles desgraçados, que colocam aventureiros em risco a cada nova leva, deixariam pesquisas acadêmicas sobre o Colapso seguirem adiante? Duvido muito. E com isso em mente…

    — Hehe, se eu voltar vivo pra cidade, vou fazer uma pesquisa séria! Só de conseguir algo publicável, o meio acadêmico vai à loucura!

    A expectativa de vida do mago especial não parece das maiores. E mesmo que consiga voltar vivo pra cidade, antes de terminar a pesquisa, uns caras bem perigosos vão bater à sua porta…

    Schlup.

    De repente, meu pé afundou como se eu tivesse pisado em lama.

    — Hã…?

    Sem saber o que é senti um calafrio instintivo.

    【O personagem entrou no alcance de Corpo de Terra.】

    【A resistência à terra diminui proporcionalmente à distância em relação ao conjurador.】

    【Movimento bloqueado.】

    Logo depois, senti algo no solo agarrar meu tornozelo e puxar. Foi então que percebi onde eu estava.

    Pradaria das Rochas Antigas, no Cemitério Estelar do 9º Andar. Mais precisamente… no campo oculto acessado através da ‘Porta do Espírito’ naquele local.

    “Salão Eterno.”1

    O lugar onde aparecem os Espíritos Primordiais, monstros de primeiro nível.

    “…Cai num lugar mais problemático do que eu imaginava.”

    Que gosto amargo na boca… mas, fazer o quê.

    — Todo mundo em alerta!


    Não levou nem um segundo para que todos os passageiros, eu incluso, percebessem que algo estava muito errado.

    — M-Minhas pernas…!

    — Mas o que é isso…? Parece que alguém está me puxando…!

    Meus pés, afetados pela penalidade de ‘movimento bloqueado’, estavam grudados ao chão, incapazes de se mover. E isso não era tudo.

    — O chão! O chão também está se mexendo!

    Corpo de Terra era uma habilidade que tornava os alvos dentro de seu alcance incapazes de se mover, arrastando-os lentamente até o centro. E, claro, no centro estaria o Espírito Primordial, de boca aberta, pronto para nos engolir.

    — Milorde…!

    — O-O que está acontecendo?!

    Todos pareciam ter captado a gravidade da situação, mas ninguém tinha ideia do que fazer. Em vez de perder tempo explicando, fui direto ao ponto.

    — Elbein Cutter! Quanto tempo você precisa para lançar uma magia de teletransporte múltiplo?

    — Depende da distância! Preciso saber até onde quer ir…

    Hm, pela descrição, o raio de Corpo de Terra era de um quilômetro. Seríamos puxados gradualmente até o centro, traçando uma órbita espiral como satélites sob gravidade.

    — Configure para um quilômetro… não, por precaução, faça um quilômetro e meio.

    — Oh, é uma distância menor do que pensei. Se for isso, então…

    — Ah, não vai dar pra desenhar um círculo mágico no chão!

    — O quê? Nesse caso terei que traçar no ar… o que leva mais tempo!

    — Fala em números. Quantos minutos, exatamente?

    — Dez! Dez minutos!

    — Dez?

    — Mais do que isso, nem eu consigo!

    O mago especial parecia achar que eu estava insatisfeito, mas era o contrário. Dez minutos era muito menos do que eu esperava.

    “Talvez por ser a especialidade dele mesmo.”

    Se fosse a Raven, teria levado de vinte a trinta minutos. Incrível como, apesar da personalidade irritante, esse cara tinha mesmo talento.

    — Entendido. Comece agora mesmo.

    Assim que dei a ordem, o mago fechou os olhos e começou a mover os lábios em silêncio, como se estivesse fazendo cálculos mentais. Os outros passageiros também perceberam que ele tinha um papel vital e mantiveram a voz baixa para não atrapalhar.

    — E-Essa situação… o que exatamente está acontecendo?

    Hah… como explicar isso? Já que não havia mais nada que eu pudesse fazer até a magia ser lançada, contei tudo o que sabia.

    Expliquei que havia um Espírito Primordial nas redondezas. Que era um monstro de primeiro nível visível a partir do nono andar e que, uma vez dentro de sua área, não havia como escapar por meios físicos.

    — …E se ele não conseguir lançar a magia a tempo?

    Depois de ouvir tudo, o ladino fez a pergunta, com cautela. Fui direto, como sempre.

    — Vamos acabar cara a cara com o Espírito Primordial que está nos esperando no centro.

    — Com um monstro de primeiro nível…?

    — Tá morrendo de medo?

    — Sim, mas isso não significa que eu vá morrer sem lutar. Me diga tudo o que souber sobre ele. Só assim poderei fugir ou fazer qualquer coisa.

    — Pensamento saudável, até mais do que eu esperava.

    Gostei da atitude dele, então comecei a explicar sobre o Espírito Primordial. Mas ao ouvir, o semblante do rapaz se fechou ainda mais.

    — Nem ataques físicos funcionam… que tipo de aberração é essa…?

    Monstros de primeiro nível são todos assim. Só pelo efeito de Corpo de Terra já dava pra ver que não fazia sentido nenhum. Um raio de um quilômetro com efeito de movimento bloqueado? Ridículo.

    — Mas não se preocupe demais. Se a magia for lançada a tempo, vai dar tudo certo.

    — Ou seja, nossas vidas estão todas nas mãos daquele homem…

    Todos olharam para o mago especial, que continuava completamente imerso na conjuração da magia de teletransporte múltiplo. Quanto tempo havia se passado desde então?

    — Está ficando cada vez mais fundo.

    Antes, os pés estavam apenas presos. Agora, já estávamos afundando até a altura das coxas. E o movimento do solo havia acelerado bastante. De longe, parecia uma enchente arrastando lama por todo lado.

    — Cuidado pra não cair. Se alguém tombar, nem eu vou conseguir ajudar.

    — Entendido. Aliás, Sir Cutter é impressionante mesmo. Mostrar esse nível de concentração numa situação dessas…

    — Concordo… a personalidade é duvidosa, mas a habilidade é inegável…

    Estávamos começando a ver o mago especial sob uma nova luz, admirando seu esforço silencioso… Quando de repente…

    — Q-Q-Quem está aí?! Tem alguém aí?!

    Uma voz desconhecida surgiu do meio da escuridão.


    A voz aflita que perguntava se havia alguém por perto… não era uma só.

    — Que barulho foi esse? Quem tá aí?

    — Tô dizendo, ouvi claramente vozes humanas!

    — Deve ter se enganado. Quem é que estaria num lugar desses? Em vez de falar bobagem, pensa logo num jeito de sair daqui…

    Pelo som das vozes, identifiquei no mínimo três pessoas.

    — Quem está aí?!

    Gritei em alto e bom som, e do outro lado ouvi um claro sinal de surpresa.

    — M-Mas então tinha mesmo alguém aí!

    — Espere um momento!

    Logo em seguida, uma chama escarlate flutuou na escuridão, iluminando o campo de visão. Não parecia ser magia… devia ser um espírito. De qualquer forma…

    Fuuuuuuuuuung…

    Com o campo de visão ampliado, vimos, a uns vinte metros de distância, seis aventureiros sendo arrastados pelo deslizamento de terra, assim como nós. Não deviam estar por perto desde o começo. Devem ter cruzado nosso caminho por coincidência, com as órbitas se sobrepondo.

    — Situação estranha pra isso, mas vamos nos apresentar! Prazer em conhecê-los! Somos sobreviventes do Clã Illuma! E vocês são quem?

    — Sou Bjorn, filho de Yandel!

    — …O Visconde Yandel? Ah! Então é por isso que você tem esse porte todo! E, por acaso, os que estão com você também são do Clã Anabada?

    — Me separei deles por um motivo. Esses aqui são companheiros que encontrei recentemente.

    — Ah… entendo! Sinto muito por isso! Mas então, sabem explicar o que está acontecendo?

    — O que vocês sabem até agora?

    — Nada! Na verdade, nem sabemos onde estamos! Estávamos vasculhando o local quando, de repente, nossos pés afundaram e não conseguimos mais nos mover!

    Bom, considerando que até hoje quase nada foi revelado sobre o nono andar, é de se esperar que eles não saibam nada sobre o Salão Eterno, esse campo oculto.

    — Três minutos.

    Em três minutos, se completam os dez prometidos pelo mago especial. Ou seja, a magia estará pronta. Mas o cálculo inicial foi feito com base só em nosso grupo. Se quisermos incluir mais seis pessoas, o tempo terá que ser reajustado.

    — Hã? Pode repetir mais alto? Não ouvimos o que você disse…

    — Vou dar três minutos pra vocês!!

    — O-O que quer dizer com isso?

    O que mais poderia ser?

    — Se expliquem nesse tempo!

    Se não entendessem isso… já estavam reprovados na triagem inicial.

    — O que vocês sabem fazer?

    A única maneira de provar que têm direito de sobreviver… é por mérito próprio.

    1. Talvez o nome mais apropriado seja Buraco Sem Fim, tradução um pouco difícil neste termo.[]
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