Capítulo 246: Ponto de Mudança (6/6)

“Que tipo de erro eu tinha cometido para Missha estar agindo assim?”

Pensamentos desse tipo nem me ocorriam. Isso porque a Missha estava ao meu lado há mais tempo. Um bárbaro que lia livros, um bárbaro que sabia como desempenhar o papel de batedor, um bárbaro que fingia ser ignorante, mas era na verdade esperto, um bárbaro que sempre sabia algo que os outros não sabiam, tudo isso era óbvio para ela, deviam haver muitas coisas suspeitas sobre mim. Até agora, ela teria ignorado, dizendo que era apenas o tipo de pessoa que eu era, mas os eventos daquele dia a fizeram perceber completamente. Afinal, ela me conhecia melhor do que ninguém.

— Por que eu deveria fazer o que meu inimigo diz?

Eu poderia ter evitado responder com um raciocínio bárbaro, mas isso provavelmente teria parecido estranho para a Missha também. Se nada mais, ela sabia que eu sempre tinha um motivo para ser teimoso.

— Se você não responder, vou matar aquela Gata Vermelha.

Quando ouvi Baekho dizer isso, senti um profundo desespero. Talvez Missha tivesse percebido, também, que eu tinha sido encurralado e estava desesperadamente segurando uma resposta.

— …Desaparecer? O que você quer dizer? — No meio da noite, enquanto todos os outros dormiam, Missha se aproximou de mim cautelosamente e expressou sua ansiedade, e eu fingi não ter ideia do que ela estava falando. — Por que eu desapareceria de repente?

— B-Bem, isso é… eu tive um pesadelo. Nyah. — Missha inventou uma desculpa sobre um sonho. Parecia que ela acreditava que revelar seus medos ocultos poderia torná-los realidade.

— Sonho? Se você está com tanto medo, pode dormir ao meu lado!

— N-Não estou com tanto medo! Hmph, tudo bem! Se você só vai fazer piadas, vá dormir, seu bárrrbaro cabeçudo! — Missha saiu em um acesso de frustração e eu suspirei no quarto agora silencioso. Meu peito estava apertado.

“Desaparecer de repente…”

Eu sabia por que ela tinha perguntado isso, porque eu entrei sorrateiramente em seu quarto ontem e vi o livro em sua mesa. Era um livro que eu havia lido na biblioteca antes — um que listava alguns comportamentos e hábitos de espíritos malignos.

“Os espíritos malignos são inteligentes e bons em atuar. Além disso, eles não se apegam às pessoas. Em caso de crise em que sua identidade possa ser exposta, eles escolhem cortar todos os laços e se esconder.”

Era uma descrição com a qual eu podia me identificar bastante. Eu estava destinado a morrer se minha identidade fosse exposta, afinal. No início, eu tentaria me distanciar das pessoas ao meu redor o máximo possível, e se isso não funcionasse, eventualmente mudaria minha identidade. Se nem essa opção funcionasse…

“Eu provavelmente iria para Noark.”

Na verdade, Noark era uma cidade composta por pessoas assim. Criminosos que não podiam mais permanecer em Rafdonia e espíritos malignos se escondiam nos esgotos, e Noark os acolhia.

“Até o Palhaço é famoso por ter se juntado a Orcules assim que foi exposto como um espírito maligno.”

Deitei na cama e fiquei olhando para o teto, com a cabeça cheia de pensamentos confusos.

“Se descobrirem que sou um espírito maligno…”

Como a equipe reagiria? Eles se sentiriam traídos e com raiva da minha enganação? Bem, eu não tinha certeza. Missha, pelo menos, parecia mais ansiosa com a ideia de que eu poderia desaparecer do lado dela se fosse um espírito maligno do que com a ideia de eu ser um espírito maligno em primeiro lugar.

“Maldito Baekho.”

Eu admiti para mim mesmo. Eu estava com medo da minha verdadeira identidade ser revelada para eles. Mais do que a guilhotina para a qual eu poderia ser arrastado, eu estava com medo de tudo o que eu construí desmoronar, mesmo que o que eu construí pudesse ser apenas um castelo de areia.

Voom.

Eu tirei um dispositivo mágico do subespaço que permitia ao usuário ter conversas secretas com outros.¹

— Tudo bem, se é isso que você quer, eu vou te expor eu mesmo. Hans Chrisen é um espírito maligno! Eu tenho provas disso na minha mochila…

Para referência, ele vinha com uma função de gravação. O anão que conheci na Floresta do Doppelganger usou isso para encurralar Hans G.

Click.

Quando pressionei o sulco na parte inferior do dispositivo, a conversa que os dois tiveram naquela época começou a ser reproduzida em ricos detalhes.

— O que há para pensar? Eles são NPCs de qualquer maneira.

— Mas eles são camaradas que estiveram com…

— Que piada. Você acha que esses caras vão pensar assim quando descobrirem sua identidade?

Hans G não conseguiu dizer nada em resposta a isso, porque ele sabia a verdade.

— A pessoa que seus camaradas pensavam ser um amigo era o verdadeiro Hans. E como você sabe, o verdadeiro Hans não está mais neste mundo.

Nós éramos espíritos malignos. Não importava que tipo de relacionamentos construíssemos aqui, eles só poderiam ser precários, construídos sobre mentiras.

— Mas… eu os considero meus verdadeiros companheiros.

Hans G respondeu assim naquele dia, mas como ele realmente agiu quando as coisas ficaram difíceis?

— Por quê…?

— S-Sinto muito.

Quando o anão acabou em apuros e expôs sua identidade à força, Hans G lançou chamas no guerreiro de sua equipe e tomou o lado do anão. A verdade era que ele sabia que eles não poderiam mais voltar ao relacionamento antigo. Os companheiros que antes eram preciosos para ele agora o consideravam um inimigo.

Click.

Eu pressionei o botão novamente para desligar o som. De repente, as palavras de Takelan vieram à mente.

— Chegará um dia em que você se sentirá da mesma forma que eu.

Ele estava errado. Se um momento de desespero me atingisse, teria um final muito mais terrível e miserável.

Mais dois dias se passaram. Nesse meio tempo, nada significativo aconteceu. Não havia mais pistas sobre o grande clã que se suspeitava estar por trás da tentativa de assassinato, e os eventos daquele dia foram obscurecidos e enterrados no esquecimento. Não havia mais nada para investigar. Graças a isso, no entanto, o número de cavaleiros me guardando aumentou. Uma vez que foi provado que havia uma facção com intenções maliciosas em relação ao palácio me mirando, a ideia de que eu precisava de mais proteção ganhou mais força. Um pouco de força demais.

“Ha, graças a isso, não posso ir a lugar nenhum.”

Já havia três guarda-costas comigo. Claro, isso era só dentro da casa, havia mais de trinta cavaleiros de guarda do lado de fora. Se eu saísse, todas essas pessoas me seguiam. Eles até arranjaram alguém para provar minha comida.

— Eu vou experimentar primeiro, caso esteja envenenado. — Em cada refeição, um cavaleiro com maior resistência a venenos provava uma mordida primeiro.

— N-Não há necessidade! P-Prrr que eu prejudicaria o Bjorrrn…?

— É melhor ter certeza. Mmm, isso está delicioso. Você é uma ótima cozinheira, Lady Karlstein.

— I-Isso não é nada reconfortante! — Isso não fazia nada para melhorar o humor da Missha, já que o provador dizia isso em toda refeição, mas ainda assim, a inflexibilidade deles os fazia parecer mais confiáveis.

“Mesmo que Noark envie um assassino, pelo menos não vou precisar me preocupar com isso.”

Assim que o café da manhã acabou, Ainar foi para a terra sagrada, e Erwen saiu para encontrar sua irmã mais nova: eu tinha planos semelhantes.

— …Você vai sair?

— Eu deveria começar a trabalhar. — Agora que eu tinha descansado o suficiente, era hora de começar a trabalhar duro novamente e fazer as coisas que eu vinha adiando.

— Você vai fazer compras de novo?

— Não, este é outro negócio.

— Hmm?

Normalmente, eu passava nosso tempo livre fazendo compras, mas a missão de hoje era diferente.

“Embora eu tenha ganhado muito dinheiro desta vez, meu poder de compra aumentará mesmo que eu não faça nada. Não há necessidade de fazer compras agora.”

Para começar, o custo dos equipamentos já começou a despencar como resultado de uma grande quantidade de aventureiros morrendo, levando a uma diminuição na demanda. Enquanto isso, os preços dos alimentos aumentaram. As preocupações de que o fornecimento de pedras de mana pudesse diminuir no próximo mês levaram ao acúmulo.

“Eu deveria tentar evitar usar dinheiro o máximo possível.”

A moeda aqui não era um simples pedaço de papel cujo valor era determinado por consenso social. Ela tinha valor real. Este mundo funcionava com pedras de mana que podiam ser transformadas em ferro ou trigo pelas mãos dos alquimistas. Ao contrário do valor do trabalho, a moeda aqui nunca depreciava.

“Eu me pergunto se Hikurod estará bem…?”

De repente, o anão veio à mente. Parecia que os negócios em sua forja estavam indo bem esses dias, mas eu tinha certeza de que, em um momento como este, era uma cidade fantasma. Eu me senti mal por ele. Ele usou todo o seu dinheiro para abrir aquela loja, apenas para algo assim acontecer.

“Eu deveria ir vê-lo mais tarde quando tiver tempo.”

Eu me vesti e saí com a Missha. Do lado de fora estava uma carruagem preparada pelos cavaleiros. Eu achei completamente desnecessário.

— Por favor, entre.

A essa altura, eu estava acostumado a esse tratamento e entrei na carruagem. Não era como se custasse dinheiro de qualquer maneira, e eles disseram que era muito mais fácil me proteger assim, então o que eu poderia fazer?

— Para onde devo levá-lo?

— Para o Grande Templo de Reatlas. — Assim que disse ao cocheiro meu destino, a carruagem começou a se mover.

— …Reatlas? Por que você está indo para lá de repente? — Missha me deu um olhar um tanto inquieto. Eu podia entender seu sentimento. As facções religiosas aqui eram praticamente inimigas naturais dos espíritos malignos.

“Bem, parece que as suspeitas dela ainda não desapareceram completamente.”

Missha passou um ou dois dias lendo livros sobre espíritos malignos e dizendo coisas peculiares para mim, mas tudo isso parou pouco tempo depois. No início, pensei que estava apenas exagerando e que ela havia concluído que eu não podia realmente ser um espírito maligno.

“Em momentos como esses, é provavelmente melhor não pressionar e deixá-la sozinha.”

E assim, continuei a conversa casualmente.

— Estou pensando em perguntar se há sacerdotes disponíveis.

— …Sacerdotes disponíveis? V-Você está pensando em d-deixarrr o time?

— Do que você está falando?

— Mas mesmo que haja um sacerdote disponível, já somos cinco… Nyah! Você está pensando em expulsar um de nós…?

Honestamente, o que ela estava dizendo? Eu suspirei e a interrompi.

— Eu não vou deixar o time, nem ninguém mais vai sair do time.

— Nyan? Então por que um sacerdote…? — Missha hesitou, aparentemente ainda confusa.

Eu contei a ela meus planos futuros.

— Porque agora temos que nos preparar para subir ao sexto andar.

— Eh, o sexto andar? Ah, entendi. Mas o que isso tem a ver com isso?

— Vou formar um clã.

Era hora de nosso grupo de cinco pessoas se formar. Mesmo que fosse pequeno, qualquer grupo com mais de cinco pessoas era classificado como um clã. Isso porque ele teria que ser dividido em duas ou mais equipes ao entrar no labirinto.

— Clã? Então, de agora em diante, trabalharemos com dez pessoas?

Bem, parecia que seria assim eventualmente, mas não agora.

“Como Erwen pode servir como batedora, por enquanto só precisamos de um único sacerdote.”

A partir do sexto andar, também precisávamos de outro aventureiro para preencher uma posição especial. Isso fazia um total de oito por agora.

“No nosso nível, não teremos problemas para chegar ao quinto andar, mesmo se nos dividirmos em dois grupos de quatro.”

Bem, na verdade, eu não estava preocupado com essa parte. Se isso não funcionasse, encontrar-se no segundo andar e depois viajar juntos era uma estratégia viável. Claro, dependendo da nossa localização inicial, levaria tempo para nos encontrarmos, e também seríamos desacelerados no quarto andar devido à penalidade de membros máximos.

“Mas não somos um grande clã.”

A menos que nosso objetivo fosse controlar os terrenos de caça, uma diferença de um ou dois dias não era significativa para um clã pequeno. Em vez disso, o problema estava em outro lugar.

“Quando o labirinto voltará ao normal?”

Se não houvesse indício de que voltaria ao normal em breve, eu planejava esperar mais alguns meses. Usaria esse tempo para eu terminar de me preparar para subir ao sexto andar de qualquer maneira.

— Chegamos. — Enquanto eu organizava meus pensamentos, a carruagem parou em frente ao Grande Templo. A maioria dos cavaleiros esperou junto à carruagem. Eu entrei com apenas três guardas pessoais e a Missha.

— O Capitão Krovitz está fora a negócios. — Outro paladino me cumprimentou em vez de Paal Krovitz, com quem eu estava familiarizado. Seu nome era Sven Parav², e ele era o vice-comandante da Segunda Ordem dos Paladinos de Reatlas. — É uma honra conhecê-lo, Baronete Yandel. A que negócios você visita nossa igreja?

Eu lhe dei um breve resumo dos meus planos para o futuro, que planejava formar um clã e, se possível, gostaria de levar um sacerdote comigo. Para ser franco, fui rejeitado na hora.

— Hmm, mesmo para um baronete, isso será difícil.

Minha recém-adquirida reputação como Gigante e meu status nobre de baronete não tinham peso na igreja. Esses eram o mínimo necessário. Para recrutar um sacerdote, certas realizações eram necessárias.

“Droga, por que eles são tão inflexíveis quanto no jogo?”

Como eu sabia que isso era provável, perguntei sobre as maneiras de aumentar minhas realizações e obtive uma resposta detalhada.

“Exceto por algumas coisas, tudo é como no jogo.”

No final, a resposta estava no trabalho. Bem, deveria ter feito isso com antecedência.

— Parav, certo? Obrigado por hoje. Voltarei em breve.

— Sim, estamos sempre esperando uma visita de um herói.

Depois de encerrar meus negócios aqui, me despedi de Parav e me virei. No momento em que estava prestes a sair da câmara, a última proteção que me impedia de um encontro infeliz com o Matador de Dragões se desfez.

“Maldição.”

Os problemas só continuavam a se acumular.

1. MrRody: Ai ai, meu coração não aguenta esse capítulo. Já li no passado e sou amaldiçoado com a praga do conhecimento.[↩]
2. SMCarvalho: Já consigo prever a próxima informação que vai surgir na próxima reunião.[↩]
3. 1º uso cap 147; 2º uso cap 205.[↩]