Índice de Capítulo

    Indo até a planície, Kevyn e Gabriel se sentaram debaixo daquela nostálgica colina, e, mesmo que ela estivesse partida no meio, era gratificante.

    — Você não tem conseguido usar seus poderes, não é? Eu consigo ver os cortes no seu pulso.

    — …? Como?

    Franzindo sua testa, o garoto encarou-o com certa frieza.

    — Não importa se você está usando uma blusa minimamente justa ou não, eu sou seu irmão. Eles foram feitos por você? — juntou os braços.

    — Não… Eu tentei usar minha manipulação de fogo e… Falhei. — Encarou o chão cabisbaixo.

    O homem suspirou e então criou chamas de sua mão. — Quando você manipula o fogo, cortes aparecem em seu corpo? Por acaso esse foi algum presente do nosso pai?

    — Sim.

    Gabriel absorveu as chamas e suspirou mais uma vez. 

    — Entendi, isso deve dar um gatilho em você… Mas se você se bloquear, como vai proteger ela?

    — Eu… Consigo usar o sangue e o metal… Mas tem razão… Mesmo que eu não tenha totalmente controle sobre isso…

    O lorde se ergueu com a elegância de alguém que sabia exatamente o poder que carregava. As pétalas rubras caíram ao seu redor como uma chuva silenciosa, dançando ao sabor do vento que penteava seus cabelos, fazendo-o ondular conforme as sombras.

    Olhar firme, ele levou a mão à altura do peito, gesto solene. Entre os dedos que se curvaram em preces, a escuridão começou a se formar. Uma energia silenciosa e opressora cresceu em sua palma, moldando-se ao seu domínio.

     — Consegue ver? … É a escuridão, e mesmo odiando ele… Ainda assim eu a uso, então se culpe menos e veja o que te restou, se você não proteger ela, você acha que será capaz de continuar?

    Com um leve arregalar de olhos, Kevyn suspirou e também se levantou. 

    — Tudo bem, farei assim…

    Leve manipulação, no mesmo instante a grama envolta ficou seca e nas mãos de Gabriel uma grande porção de água tomou a escuridão.

    — Satisfeito? — perguntou Kevyn.

    — Oh! Isso é interessante… Mas só? 

    — Não me entenda errado, eu não quero me machucar mais.

    Ele fechou seus olhos por um momento, se lembrando de algo. 

    — Vamos lutar! 

    — Hm?! 

    Surpreso, o lorde se levantou e deu um passo atrás enquanto a água em suas mãos foi absorvida.

    Naquele mesmo instante, como se tivesse rasgado o espaço, o garoto já estava de pé, surgindo do nada, os olhos faiscando com um brilho carregado. Sua presença era súbita, assim como de alguém que carregava o desejo de guerra.

    As folhas então foram fatiadas pela sua presença, todas cortadas em espiral com o cenário se definhando. A árvore que gerava sombra para suas cabeças murchou como se séculos tivessem passado em um piscar de olhos. 

    O verde da grama cedeu lugar ao amarelado ressequido da morte. Era como se a própria vida arrancasse uma parte de si, ou a morte matasse para suas mãos. Força vital retirada de forma invisível e impiedosa, mas no instante seguinte…

    Inversão? Não.

    Tudo retornou, mas não como antes. Havia algo diferente, quase etéreo, mas de um modo mais belo em como o mundo se recompôs, o mundo não. O aether vindo dos céus como um suspiro gélido e silencioso, espalhando a delicadeza de seu toque sem peso.

    Sem pressa. A sensação de que algo sagrado tocou a terra. A grama voltou a crescer como se despertasse de um sonho profundo, e as folhas, antes fatiadas, ergueram-se em meio a brisa.

    A árvore retornou ao seu estado mais natural, recomposta para respirar. Aquela sensação não foi levada a nenhum dos dois, mas somente ao mundo, que gostou e apreciou.

    — Vamos! — gritou Kevyn com sua voz rompendo o silêncio como um trovão inesperado.

    Sua mana respondeu imediatamente, vibrando sua alma de forma não natural. O ar só seu redor oscilou, distorcido, como se o espaço não suportasse a súbita aceleração que formava. 

    Em um movimento, desapareceu. Não correndo, ele deslizou entre os instantes onde o tempo hesita e o olho humano não alcança. 

    Em meio a isso, usando o azul para acelerar, desencadeando uma nova reação inesperada, uma nova técnica. 

    Carregado, um estalo, o espaço entre os corpos foi apagado de propósito e recomposto da mesma maneira.

    Kevyn emergiu do nada que era tudo, usando seus poderes com precisão cirúrgica. 

    Assim, como quem domina o próprio Kháos, o mundo pareceu encolher ao redor de sua intenção assassina. Cada fibra de Gabriel gritou morte. 

    Havia uma fúria controlada nos olhos de seu irmão mais novo, uma determinação carregada, pura para ferir o ar, e palpável para sentir o quão perigoso era aquilo.

    O ápice de sua força naquele momento cansado, mesmo com poucas energias, uma voz carregada de ódio emergiu do príncipe, que gritou:

    ▇▇▇▓▒░ DELIBERATE「✦」BLACK!!!!!!! ░▒▓▇▇▇

    Um brilho vermelho rompeu o horizonte como um sol violento, inundando o ambiente com sua fria e assassina determinação. Luz carmesim em combustão. E então, veio o impacto, não um simples golpe, mas uma onda de choque quase passiva, mas aniquiladora, rasgando todo o ambiente em um espaço não transitivo pela retração infinita do ar.

    O soco atingiu Gabriel com uma força que beirava a quebra de sua defesa, sobrehumana. Ele firmou seus pés com tudo que tinha, com seu antebraço defendeu, seus músculos tensionados ao máximo para resistir. Mas era como tentar conter as próprias leis universais com as mãos nuas. O impacto foi absolutamente estrondoso, causando um som estremecedor capaz de ensurdecer os humanos próximos.

    Ao longe, do prédio mais alto, até Notherite pôde ver o brilho daquele ataque.

    Mas, num instante, o osso de seu antebraço se partiu, um estalo grotesco que nunca ouviu, seguido de uma explosão de energia que rasgou tudo além do espaço, destruindo-o como se não houvesse barreiras.

    O ar se partiu, o mundo ao redor tremeu, o chão se partiu sob seus pés.

    O corpo de Gabriel foi lançado como um caça desgovernado, atravessando o ar com uma tamanha velocidade que o som veio depois. Ele cruzou a planície como um cometa, até colidir com uma colina próxima, e então, tudo foi expurgado com a chegada do lorde. Terra, pedra, restou apenas a poeira que se ergueu aos céus, transformando o impacto em um colapso sonoro colossal, como se tudo protestasse contra tamanha brutalidade.

    — Coof! Coof! O que foi isso? Hehe… Doeu…

    Dos destroços, o lorde se ergueu.

    ( Tic ) A poeira ainda dançava no ar, suspenso por segundos como se o tempo hesitasse a prosseguir. Cada passo dele era lento, pesado. Imponente, como se mesmo ferido, ainda fosse o eixo do qual aquela luta, ele era o desafiado.

    Quanta ignorância.

    ( Tac ) Seu cachecol voava atrás de si em descontrole, o ar junto a poeira estava descontrolado, mesmo no tempo parado? Ele ergueu o braço parcialmente carbonizado à altura do peito, observando o estrago com o mesmo olhar que se daria a um detalhe fora do lugar. Seus ossos estavam fora do lugar, invertidos. 

    ( Tic ) Ele então franziu a testa. Não por dor, mas por surpresa. Um gesto tranquilo, quase calculado pelo rei do combate corpo a corpo.

    ( Tac ) Com leves suspirar e um sorriso em sua face, ele abaixou seu braço e continuou enquanto ria baixinho. 

    Mas… O mundo não lhe deu mais tempo.

    Como uma ruptura celestial, Kevyn veio em meio a poeira. O príncipe dragão rasgou o espaço com seu punho erguido, ultrapassou tantos os limites que nem o som ousou atrapalhar seu ataque.

    Desespero. Desespero!

    Não vindo dele, mas deixando um rastro de calamidade. A técnica que moldava não era apenas aprendida, mas escrita em sangue. Aprimorada em sua natureza, esse é o verdadeiro poder de um Calamith.

    Branco ativou.

    O mundo pareceu se dissolver como se nada pudesse o atingir.

    A cor deixou o cenário.

    O som morreu.

    E tudo que existia era movimento, absoluto, resoluto e inevitável.

    Kevyn golpeou o peito de Gabriel com uma precisão tão limpa, mas não houve acerto… Apenas sensação de que o lorde havia sido tocado, mas era a barreira. Em decadência, o homem não pareceu reagir, o medo estampou em sua face.

    Memórias, reflexos, nada funcionava. Ele não entendeu o golpe. Nem mesmo o sentiu. Estavam distantes demais para isso.

    Enquanto isso, Kevyn, preso em uma fatia onde o espaço não funcionava, sentiu vibrar em proporções diferentes. As cordas se arrebentando. Até enfim se alinharem completamente.

    “Cansaço? O que é isso?”, pensou, sorrindo de maneira sofrida. Tão leve, sentiu a mana coagulando como sangue, uma sensação estonteante que carregou seu senso de cuidado. Retomando e cerrando seus dentes gritou com toda sua alma: 

    ▇▇▇▓▒░ DELIBERATE「」BLACK!!!!!!! ░▒▓▇▇▇

    Chamas azuis irromperam em torno de seu punho como uma aurora transcendental. Cortes, sangue e calamidade. Elas não crepitavam, não queimavam-no, mas cantavam.

    Guitarras rasgando junto a voz, esse era o som que poderia-se descrever.

    O branco se dissolveu. Em meio tudo aquilo, o Buel

    atingiu seu nocivo caráter destrutivo, e as chamas usaram seu simulacro para roubar para si, levando em devaneio todo senso normativo do roxo formado pelo sangue e chamas, roubando isso para si também. As chamas decretaram sentença divina. O golpe que veio a seguir foi um hino de destruição.

    O impacto atravessou a defesa de Gabriel, como se ele não fosse nada, apenas mais uma coisa em seu caminho, obstáculo fútil. Seu braço implodiu, os ossos sumiram num estalo surdo, a carne recuou em espiral, a onda do golpe atravessou tudo como uma maré invertida, o corpo do lorde seria deliberadamente desintegrado junto ao resto que para o garoto, não era nada além de migalhas ao vento.

    Hesitação? Não. A guitarra dominou o ar mostrando misericórdia, um solo divino que faria qualquer um chorar, algo além do mundo, uma rachadura no tecido da realidade.

    Kevyn respirou fundo e forçando algo desconhecido para si, antes mesmo do golpe arrastar tudo consigo… Os ossos colidiram como um mundo oco. Sinos distantes que quebravam a matriz do senso normativo, aflorando seu desespero, esperança, medo em incalculável.

    Tudo… voltou.

    As pedras tomaram seus lugares. A poeira sequer existiu. A colina, como se lamentasse o que aconteceu, começou a se reconstruir lentamente, mas não pelo mundo se regenerar, ela estava obedecendo às ordens que o garoto obrigou. Memória por memória.

    Estático, Kevyn olhou para o vazio enquanto seu braço pingava sangue. “Aquilo seria o suficiente para matá-lo? Não… Ele poderia parar o tempo, não é?”.

    Mas Gabriel… Não respondeu. Apenas ergueu o rosto entre os estalos interdimensionais. Suas escleras agora negras, como um abismo. E de dentro de suas pupilas, caveiras que tremiam de medo pelo o que acabara de acontecer.

    No outro momento, o homem ergueu seu braço numa velocidade que nem o jovem pode prever e, com um soco, ele atingiu o peito de Kevyn…

    Mas… Nada.

    Além de algo especial ter se ativado, o garoto estava usando a decadência, e assim explicou:

    — Querido irmão, não sou seu inimigo.

    Ofegante e com seus olhos amedrontados, Gabriel suspirou e se ajoelhou. — Sinto… Muito, você me assustou, sabia? Huhuhu…

    Kevyn pegou-o pelo braço e arrastou para fora da colina se restaurando, assim, não sabia como iria ter energia para aquilo…

    — Eh… Acho que vou morrer…

    Tirando-o dos destroços, sem mais energia, Kevyn caiu no chão sem mais como aguentar.

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