Capítulo 28: Sacrifício
Com o peito perfurado pela mão do demônio, Lilith sente sua força vital esvaindo-se. A dor é insuportável, uma pressão esmagadora que quase a impede de respirar. Sua visão começa a turvar, o mundo ao redor se desfazendo em sombras e ecos. Ela mal consegue manter-se consciente, e então, tudo escurece.
No silêncio e na escuridão de sua mente, uma memória distante emerge, uma que ela havia esquecido. Um lampejo de luz, um fragmento de seu passado há muito perdido.
Lilith se vê em uma sala de aula, pequena e simples. As paredes são brancas. Alunos estão sentados em suas carteiras, e no centro da sala, há um homem, seu professor. Ele é um homem idoso, de cabelos grisalhos e olhos cheios de conhecimento, que parecem irradiar uma calma sabedoria. Sua voz é firme, mas gentil, enquanto ele explica um conceito complexo sobre ciência, algo que Lilith, naquele momento, ainda não entendia totalmente.
“Matéria e energia”, ele começa, traçando uma fórmula no quadro, “são essencialmente duas faces da mesma moeda. Todos os objetos que vemos ao nosso redor são constituídos de matéria, mas essa matéria pode ser convertida em energia sob certas condições.”
Lilith, sentada no meio da sala, está atenta, seus olhos fixos no professor enquanto ela tenta compreender o que ele diz. Ela sabe que o tema é avançado, mas algo na explicação dela a fascina.
O professor continua a traçar símbolos e equações na lousa. Ele fala sobre a famosa equação de Einstein, E=mc², explicando que a energia contida em um objeto é igual à sua massa multiplicada pelo quadrado da velocidade da luz.
“Em outras palavras”, ele diz, virando-se para os alunos com um leve sorriso, “cada grama de matéria que existe contém uma quantidade absurda de energia. Se conseguíssemos liberar toda essa energia, seria como liberar a força de uma explosão massiva.”
Os alunos murmuram, espantados com a ideia. Lilith, no entanto, levanta a mão.
“Professor”, sua voz é curiosa, mas também determinada, “e se nós quiséssemos transformar o corpo humano em energia? O que aconteceria?”
O professor a olha, surpreso pela profundidade da pergunta, mas também impressionado. Ele ajeita seus óculos, ponderando sua resposta por um momento.
“Bem, senhora @#$%, transformar um corpo humano ou qualquer matéria completamente em energia pura seria… catastrófico. Não só o corpo inteiro seria desintegrado, mas a energia liberada seria imensa, devastadora até. Imagine, por exemplo, o equivalente à explosão de uma bomba atômica”, ele faz uma pausa, observando o impacto de suas palavras, “no entanto, nem toda a energia seria ‘útil’. Haveria uma grande perda em formas de luz, calor, e uma enorme onda de choque. Também haveria radiação liberada e outras formas de dispersão de energia.”
Lilith absorve cada palavra, processando a informação. Mas ainda há algo que ela não entende completamente.
“Mas por que nem toda a energia seria aproveitada? Por que haveria perdas?”, ela pergunta, seus olhos refletindo uma curiosidade intensa.
O professor sorri, percebendo o quão inquisitiva ela era, uma qualidade rara entre seus alunos.
“Bom, a eficiência de uma conversão perfeita de matéria em energia não existe”, ele explica, caminhando até a sua mesa, “a natureza tem suas leis, e uma delas é que nenhum processo é completamente eficiente. Há sempre perdas para o ambiente, seja em forma de luz, som, calor, ou até movimento. Um corpo, ao ser desintegrado em energia, iria liberar uma parte dessa energia na forma de ondas de choque e calor intensos, em vez de direcionar tudo para um único fim.
Ele faz uma pausa, e então acrescenta.
“Além disso, nossos corpos, por serem feitos em sua maior parte de água, são ainda menos eficientes nesse processo. Água, por exemplo, pode absorver uma quantidade enorme de energia sem se vaporizar, e essa energia se dispersa de maneiras diferentes.”
Lilith continua absorvendo a informação. A ideia de que o próprio corpo pode conter uma energia tão avassaladora a intriga e a assusta ao mesmo tempo. Seu olhar se fixa na lousa, onde o professor continua a escrever equações e diagramas sobre como a energia se comporta em diferentes circunstâncias. O conceito de transformação de matéria em energia se aprofunda em sua mente, e ela começa a pensar nas aplicações desse conhecimento em uma escala maior, em como isso poderia ser usado.
Ela se lembra do professor continuar explicando que, embora seja uma ideia fascinante, transformar toda a matéria em energia não era algo viável, muito menos controlável, e que as consequências seriam catastróficas. Ele mencionou que cientistas na Terra haviam estudado isso durante séculos, mas que os avanços eram lentos e sempre limitados pelas leis naturais que governam o universo.
“A energia”, ele conclui, “é uma coisa maravilhosa, mas também perigosa. A manipulação dela requer não só poder, mas sabedoria. Qualquer um pode causar destruição, mas criar algo com energia… isso é uma verdadeira habilidade.”
Essa última frase ecoa na mente de Lilith, profundamente, enquanto ela sente a memória desvanecendo-se. As palavras do professor, sobre a sabedoria necessária para lidar com o poder, ficam gravadas em sua consciência. Ela se lembra do quanto aquele conhecimento a impactou, do quanto ela havia desejado, naquele tempo, entender mais sobre o funcionamento do universo e de si mesma. Contudo, agora, ela está em um lugar muito diferente.
O mundo da lembrança começa a se desfazer, e Lilith sente que está sendo puxada de volta à realidade, para o presente. Mas antes que a memória desapareça por completo, ela vê um último vislumbre de seu professor, olhando diretamente para ela, como se soubesse que essa memória um dia seria crucial.
“Lembre-se, Lilith”, ele diz, sua voz ecoando como um sussurro no fundo de sua mente, “Saber quando e como usar o poder é o que separa a sabedoria da destruição.”
E com isso, a lembrança desaparece.
Lilith, de repente, desperta de seu breve desmaio, o peso da dor e da realidade voltando com toda a força. Com o peito perfurado pelo punho do demônio, sente sua vida se esvaindo rapidamente. A dor é insuportável, seus pulmões se contraem enquanto ela tenta respirar, e o desespero toma conta de seus pensamentos. Em um último ato de desespero, seu olhar se fixa em Alaric, o espírito do mago. Sabendo que seu tempo está acabando, ela grita com todas as forças que lhe restam:
“Félix, proteja-o! Destruição iminente… agora!”
O demônio, que ainda mantinha seu punho cravado no peito de Lilith, olha ao redor com confusão, incapaz de ver Félix.
“Quem é esse ser?”, ele rosna, perplexo pela súbita mudança de atitude de Lilith.
Nesse momento, Félix, que até então mantinha sua forma etérea, mudou completamente. Seu corpo translúcido, antes pequeno e discreto, se expande até cobrir Alaric por completo, criando uma barreira densa e opaca ao redor do espírito do mago. A energia de Félix vibra intensamente, protegendo o espírito de qualquer dano iminente. Alaric, que observava em choque e confusão, começa a perceber o verdadeiro poder que aquela entidade misteriosa possuía. Félix não era apenas um companheiro, mas uma força muito mais profunda do que ele jamais poderia imaginar.
Enquanto isso, Lilith agarra a mão do demônio cravada em seu peito com força. Seus olhos brilham com uma intensidade feroz, e seu corpo começa a brilhar em um tom avermelhado. O vapor começa a sair de sua pele, suas veias inflam com uma energia descomunal. A pressão ao redor de seu corpo aumenta exponencialmente, e o demônio, percebendo que algo fora do comum está acontecendo, tenta retirar sua mão, mas é tarde demais.
“Mas que porr…”, ele tenta falar, mas é interrompido por uma explosão súbita e devastadora.
Uma onda de calor e energia emana do corpo de Lilith, e uma explosão massiva irrompe. O impacto é tão violento que a escuridão da noite é transformada em uma luz cegante, uma claridade que corta a escuridão por quilômetros. A terra abaixo se parte em fissuras, árvores são arrancadas das raízes, e as pedras da torre são pulverizadas. O som ensurdecedor da explosão ecoa por toda a região, sacudindo o solo e criando uma onda de choque tão forte que reverbera até as montanhas distantes.
A cidade de Novograd, a muitos quilômetros de distância, é banhada por uma luz intensa no horizonte, como se um segundo sol tivesse surgido na noite. As pessoas nas ruas param abruptamente, suas conversas cortadas pelo tremor que sacode o chão sob seus pés. Guardas e cidadãos olham para o horizonte com horror enquanto a onda de choque os alcança, fazendo janelas tremerem e edifícios balançarem. Alguns caem ao chão, tentando entender o que poderia ter causado tal destruição.
Na guilda, o mestre está em sua sala, quando o clarão de luz corta o céu. Ele se levanta de sua cadeira, caminhando até a janela e olhando para a devastação ao longe. A terra ainda treme sob seus pés, e um nome escapa de seus lábios, cheio de preocupação e respeito.
“Lilith…”
A explosão não foi de uma escala inimaginável, mas suficiente para devastar tudo em um raio de cinco quilômetros. O epicentro, onde a torre do mago antes se erguia, agora é um abismo de destruição. Nada restou além de ruínas e fumaça espessa. A cratera é profunda, com fogo e cinzas preenchendo o ar.
No entanto, apesar da explosão titânica, Lilith não sente alívio ou paz. Em meio à escuridão da devastação, ela é tragada para um vazio profundo. Não há luz, não há som, apenas o silêncio absoluto e a vastidão infinita. Ela está suspensa neste limbo, consciente, mas desprovida de qualquer conexão com o mundo físico.
De repente, uma presença surge no meio da escuridão. É o sistema, uma entidade que Lilith conhece bem, mas que agora se apresenta de maneira diferente. Uma voz fria e mecânica ecoa em sua mente.
▷Habilidade: Imortalidade — A morte é negada, independente da situação
As palavras reverberam na escuridão, e Lilith, agora apenas uma consciência, sente a gravidade da situação. Ela tentou liberar toda a sua energia, transformando-se em uma bomba viva, e embora tenha causado a destruição que desejava, o preço foi terrível. Seu corpo físico foi destruído, pulverizado pela imensa força que ela havia liberado. Ela está à beira do abismo, prestes a desaparecer completamente.
▷Notificação: Deuses estão observando. Analisando…
▷Notificação: Não será necessário levar ao plano dos deuses.
Antes que possa processá-las totalmente, algo muda. Uma força interna, alimentada pelo próprio sistema, começa a pulsar em sua essência. Ela não é levada ao plano dos deuses, como talvez fosse esperado após uma morte tão violenta. Ao invés disso, o sistema ativa um modo de preservação autônomo, uma contingência que ela não sabia que existia.
Embora seu corpo esteja destruído, sua alma e consciência são mantidas em uma espécie de limbo, como uma chama que ainda resiste, mesmo quando tudo ao seu redor foi consumido.
Lilith está suspensa nessa escuridão, sem corpo, mas não completamente destruída. E enquanto a escuridão ao seu redor permanece, ela sente que algo está mudando, que um novo caminho se abre diante dela, mas ainda fora de seu alcance. A destruição não foi o fim, mas um novo começo sombrio, um prelúdio para algo muito maior.
▷Notificação: deus Kaelram está indisponível… Deus intervirá na habilidade imortalidade.
▷Habilidade: Imortalidade — A morte é negada, independente da situação
▷Notificação: Iniciando Body Reset. Achando local seguro… lugar achado: céu.
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