Capítulo 17 - Criaturas
*Essa é uma prévia da reescrita! Ainda está crua, sem o polimento final, mas logo ganha forma. Se notar algo fora do lugar, toda ajuda é bem-vinda!
O mundo inteiro pareceu encolher. Cada som, cada movimento, cada partícula ao seu redor se dissolveu em um vazio sufocante, como se a própria realidade tivesse decidido segurar a respiração. Tudo foi substituído por um zumbido abafado, pulsante, uma onda de ruído surdo que pressionava seus ouvidos como se o mundo estivesse submerso.
Ana sentiu o peso do momento antes de compreendê-lo. Como o crepúsculo que se instala devagar, tingindo o céu de tons irreversíveis, a realidade da cena à sua frente começou a tomar forma.
Mas… de onde veio o sangue?
Seu olhar varreu o espaço ao redor, olhos atentos, mente afiada, sentidos em alerta máximo. A adrenalina queimava em suas veias como um incêndio incontrolável.
E então, viu.
A cerca de dez metros de distância, o irmão mais novo estava no chão. Ou pelo menos o que restava dele. A poça escura se alastrava sob seu corpo como uma sombra viva, pulsando conforme o líquido quente escapava sem pressa, sem piedade. O vermelho encharcava a terra. E onde deveria estar seu braço direito…
Nada.
Não houve tempo para sua mente processar a imagem. Não houve negação, nem recusa. Só aceitação brutal. O garoto que, há poucos segundos, sorria para ela, agora estava reduzido a carne mutilada, pele pálida, olhos vazios. A própria vida parecia ter sido arrancada com uma pressa impaciente, um descaso casual.
As expressões ao redor eram um espelho de horror.
A pequena jovem loira, que antes lhe ofereceu um sorriso gentil, estava branca como a lua, os lábios entreabertos em um desespero mudo. Seus dedos tremeram, como se quisesse puxá-lo de volta para dentro da vida, como se pudesse reverter aquilo com um mero desejo.
A ruiva segurava o martelo com força, os nós dos dedos brancos de tanta pressão, mas seus olhos estavam cravados em Ana.
E o irmão mais velho?
O irmão mais velho não piscava. Só olhava para ela.
Havia algo naqueles olhares — algo frio, duro, acusador.
Ana sentiu a onda de adrenalina se transformar em algo elétrico dentro do peito. Seu olhar voltou para o garoto caído, e então de volta para o grupo.
— O que estão olhando? — A voz saiu baixa, mas firme, tão firme quanto o aperto que dava em sua faca. Sentiu a irritação crescer, um espinho de frustração rasgando o torpor inicial. — Não fui eu que fiz isso.
Antes que a respondessem… ela sentiu. Estava perto demais.
Uma respiração fria tocou seu ombro, roçando contra sua pele como um aviso sem som. Gelada, seca, suave. O tipo de presença que arranca o ar dos pulmões antes mesmo que o instinto possa reagir.
Saltou para longe de imediato. Virou-se lentamente. Não porque hesitava, mas porque cada célula de seu corpo gritava para que não o fizesse. E… bem, Ana já viu muitas coisas. Muita coisa mesmo. Mas isso? Isso foi realmente inesperado.
A primeira coisa que notou foram as pernas. Longas demais para serem normais, esguias de um jeito quase doentio, mas tensas de um jeito que só algo selvagem poderia ser. Seus músculos pareciam cordas esticadas prestes a disparar.
“Um lobo-guará?”
Fazia anos desde que viu o último, mas os conhecia bem. Reconheceu muitas de suas características naquele estranho animal, uma estrutura quase familiar — quase.
Onde deveria haver a graça característica da espécie, havia algo errado. O pelo estava eriçado em ângulos disformes, era ralo e manchado de um laranja desbotado, como folhas de outono apodrecendo. E os olhos… parecia que brasas queimavam neles. Um olhar que trazia fome, sim, mas uma fome calculada, cruel em sua paciência.
E na boca, um troféu.
O braço do jovem caçador pendia frouxo entre os dentes, os dedos abertos como se ainda tentassem agarrar algo. Por um instante, ninguém respirou. Mas não demorou para a jovem ruiva, que antes parecia relaxada, explodir em gritos.
— Monstro de rank D! Corram!
Os instintos tomaram conta. Os caçadores, antes petrificados, se desfizeram em caos. O irmão mais velho hesitou por um segundo a mais do que os outros, os olhos fixos no corpo caído do garoto que era seu sangue. Mas a ruiva puxou seu braço, e ele foi forçado a se mover.
E foi aí que o pior aconteceu.
Do meio das árvores, um segundo pesadelo rastejou para a luz da fogueira.
O mundo pareceu se dobrar para dar espaço à coisa que agora avançava.
Apesar de também ser um lobo, diferia do primeiro. Este era uma verdadeira mutação ambulante — os ossos saltavam sob a pele fina como couro velho, suas articulações pareciam se mover em direções erradas, dobrando-se com uma fluidez pouco natural que causava arrepios em seus observadores. Mas o pior?
O sorriso.
Um esticar de lábios mortos, mas ainda assim cheios de prazer, como se a besta estivesse se deliciando com o medo ao redor dela.
Ana sabia quando algo brincava com sua presa. E aquilo estava se divertindo.
— Droga! — A ruiva xingou, as mãos tremendo em volta do cabo do martelo. — Se espalhem! Alguém tem que sobreviver!
Houve uma faísca de coragem — uma pequena, frágil tentativa de enfrentar o inevitável. Mas desde o primeiro passo da garota, Ana já sabia.
Se continuassem assim, iam morrer. Cada um deles.
Lutando? Fugindo? Não importava. Aquele não era um combate, era um massacre anunciado. Não estavam prontos para enfrentar tal adversário.
Seu instinto, aquele que permaneceu enterrado sob o peso de séculos, rugiu. Seu coração não acelerou. Não houve pânico. Apenas um pensamento seco, calculado, ocupando o espaço onde deveria haver medo.
— Vamos lá, Ana. — O sussurro foi apenas para si, um acionar de engrenagens antigas. Sua mente, treinada e afiada, tomou o controle. Seus olhos captaram tudo.
Pequenos movimentos. Excitadas respirações.
Cada mísero deslocamento de músculo nas criaturas.
O segundo lobo-guará mutante — com seu esqueleto retorcido — saltava em torno dos caçadores de propósito, brincando. Enquanto eles tentavam escapar, ele os forçava a mudar de direção, empurrando-os para uma zona cada vez mais limitada. Um jogo sádico, repleto de deboche.
Aquela coisa pensava.
Não como um animal acuado. Não como uma criatura movida por instintos primitivos. Havia um brilho nos olhos vermelhos do monstro, algo cruel e premeditado, um ardil que ia além da simples fome. Aquilo sabia exatamente o que estava fazendo.
Ana girou a faca entre os dedos, sentindo o peso da lâmina. Pequena, simples. Não era uma espada, não era uma lança. Era um equipamento inapropriado para lutar contra aberrações que desafiavam a lógica natural. Mas não importava.
Conhecia seu corpo, seu equilíbrio, seus limites. Era um novo desafio, mas ela treinou à toa? É claro que não.
“Não vai acabar assim.”
Ela era Ana.
E se esses merdinhas achavam que podiam acabar com ela, que podiam arrancar sua vida depois de tudo que sobreviveu, estavam prestes a aprender uma lição amarga. Iam aprender o que significava enfrentar alguém que já tinha visto tudo.
Respirando fundo, avançou. Se interpôs entre os jovens caçadores e a criatura mais próxima, a postura firme, os olhos frios. Não era um ato de heroísmo ou algum tipo de instinto protetor. Ela não era tão nobre assim, tinha motivos claros.
Sobrevivência.
Não tinha ideia do que um monstro de rank D representava. O pensamento de ‘não saber’ a fez rir, mesmo enquanto a besta rosnava, a mandíbula suja de sangue se abrindo em um sorriso grotesco.
Era hora de descobrir.
— Vocês aí. — Sua voz cortou o caos. — Não parece que vai ser tão simples fugir. Juntem-se.
Não era um pedido. Era uma ordem.
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