“Tyx…” Black encarava o caminhar do homem de sobretudo à sua frente. “Eu tenho que tomar cuidado com esse cara, até a Divisão Zero não se opõe a ele… ainda por cima se diz ser um Defensor… 

    Tyx o guiou pelo caminho da direita, subindo mais vinte andares em outro elevador. Ambos estavam agora em um trajeto distinto. Era um único corredor com paredes em formato de arco, sem portas, apenas uma parede branca e lisa. Ao final, que estava a uma boa distância, nada podia ser visto, apenas escuridão.

    “Isso não é nada bom.” Cada passo ecoava no corredor silencioso, cada vez mais próximo da escuridão inevitável.

    — Você já comeu alguma coisa? — Tyx perguntou olhando de canto para Black.

    — Quê?

    — Perguntei se você comeu algo. Sabe que o café da manhã é uma refeição importante? Pelo menos é o que dizem.

    “Do que diabos esse cara está falando?” Black deu de ombros, estranhando o tipo de pergunta.

    — É… eu acho, se é que dá pra chamar aquilo de comida… — Black respondeu com um olhar desconfiado, então parando em meio ao corredor. — Espera, quem é você de verdade? Você é mesmo um Defensor? 

    Tyx parou, virando-se para encarar Black enquanto coçava a extremidade do queixo e fungava.

    — Acha que estou mentindo? 

    — Sim. — Black respondeu instantaneamente, cruzando os braços enquanto bufava. — Agora pouco você praticamente mandou naquele maldito e agora pergunta se eu tomei café da manhã?

    — Acho que você está querendo me chamar de um bom anfitrião, não? — Tyx respondeu em tom leve.

    — O quê!? Não! Quem é você? Certamente não é um militar. — Black negou com a cabeça com uma expressão claramente confusa, mas ainda irritada. — E pelo que eu sei dos Defensores, é que eles jamais aceitariam alguém como você.

    Tyx coçou o couro cabeludo da lateral de sua cabeça, mantendo um sorriso despretensioso e abaixando a cabeça.

    — Ufa, ainda bem que não foi você que analisou meu curriculum, mas tenho certeza de que a moça do RH vai adorar você. — Tyx respondeu com um tom leve. — Mas o que quer dizer exatamente com “alguém como eu”?

    — Cheio de piadinhas, comentários sem sentido e tem algum problema nas pernas; eu vi como anda. — Black disse, apontando com o queixo para as pernas do homem à sua frente. — Defensores jamais aceitariam um deficiente.

    Ao ouvir as palavras do jovem, Tyx manteve o silêncio por um momento, em seguida gargalhou de maneira genuína, abaixando a cabeça e escondendo o rosto com o chapéu.

    — Qual é a graça? — Black olhou para os lados e para trás de si, sem entender a situação.

    — Sua sinceridade; afinal, ninguém falaria assim com um dos cinco. — respondeu Tyx, mostrando um sorriso que revelou seus dentes levemente amarelados.  

    “Um dos cinco? Esse cara não pode ser realmente um Defensor não é?” Black o fitou com um olhar de incredulidade. “Não… isso não pode estar certo.”

    — Mas tenho que admitir que você tem olhos afiados. — Tyx respondeu levantando a barra da calça direita e revelando uma prótese metálica. 

    Mas não era uma prótese comum; era tão grossa quanto uma perna de verdade e parecia ter diversas junções que permitiam movimentos complexos.

    — Nunca vai substituir uma perna de verdade, mas só o fato de eu poder comprar meu próprio café já é uma vitória. — Tyx respondeu, focado em sua prótese e, em seguida, olhando para Black com um sorriso exagerado. — Sempre me compravam cafezinho com creme, urgh… e eu sou mais fã de um cafezinho puro, sabe, de onde eu venho…

    “Isso não pode ser verdade…” Black encarava Tyx falando sobre coisas triviais, mas de alguma forma aquilo removia um pouco da tensão de seu peito. E isso não era algo bom, ele já estava cansado demais para ouvir piadas de um carcereiro. 

    — Então, para onde estamos indo? — Black interrompeu Tyx, olhando em direção ao fim do corredor.

    — Ah, claro. — Tyx limpou a garganta. — Para um local muito especial.

    Ambos seguiram em direção à escuridão, quando se aproximavam, diversos focos de luz foram acesos, revelando uma enorme porta dupla que parecia contar uma história através de seus encravamentos.

    À esquerda, havia uma cena de conflito — uma guerra. Vários soldados estavam representados, alguns caídos e outros se levantando, em especial um, retratado com os olhos brilhando enquanto levantava a bandeira dos Estados Unidos sobre diversos escombros.

    À direita, havia uma fileira de rostos de homens e mulheres virados de lado, encarando uma enorme estrela que era formada por 50 partes menores à sua frente. Abaixo da estrela, duas mãos se apertavam.

    No centro da porta, que ocupava a maioria da superfície, estava a figura imponente de um homem e uma mulher vestidos com roupas simples. Ambos tinham brilhos nos olhos e olhavam um para o outro. Atrás de cada um deles, estavam os símbolos da lua e do sol. Eles seguravam a extremidade da gravura como se a sustentassem; no centro, havia uma estátua segurando livros com a mão esquerda e uma espada flamejante com a direita. Atrás dela, uma enorme cidade se erguia, cujos edifícios alcançavam as nuvens.

    — O que é isso? — questionou Black, olhando para a imensa porta à sua frente.

    — Na guerra: dever. Na paz: abnegação. — Tyx olhou primeiramente para a esquerda, em seguida para a direita e, por fim, para o centro. — E na vida: sacrifício…

    “Uau.” Black encarou as gravuras na enorme porta; era como uma obra de arte que tomava vida. Ele voltou sua atenção para Tyx, que parecia focado, mas não exatamente na porta, e sim em algo mais.

    — Tudo certo aí? — Black perguntou.

    Tyx limpou rapidamente a garganta e demonstrou um sorriso.

    — Claro… isso é o que diz no guia do prédio, caso você não saiba. Vamos, tenho que lhe apresentar algumas pessoas. — Tyx disse virando-se de costas para a porta, que fez um barulho e começou a abrir.

    “O que foi isso agora?” Black encarou Tyx, mas tornou sua atenção para a porta; esperando que um brilho ofuscante a atravessasse. Na realidade, a luz era quase escassa; ele apenas conseguia ver uma enorme figura, como um gigante. 

    Por um momento, ele engoliu em seco, mas em segundos a porta se abriu totalmente, revelando um grande salão oval; as paredes eram aparentemente feitas de vidro que cobria todo seu extenso espaço, mas estavam cobertas.

    Agora ele conseguia ver por completo a figura gigante que era uma imensa estátua — ela tinha a aparência de um homem musculoso aparentemente nu — ele estava ajoelhado, porém, um dos joelhos ocultava suas intimidades. Em suas mãos, ele erguia um enorme globo e, em suas costas, existia uma capa formada por diversas pequenas mãos emaranhadas que partiam do chão até os seus ombros.

    — O que é isso? — Black perguntou, atordoado ao olhar para a estátua.

    — Esta é a figura de Júpiter, sua representação. — Tyx respondeu seriamente, também encarando a enorme estátua. — Aquilo em seu peito é seu símbolo, mas acredito que você já tenha conhecimento, afinal quem não tem…

    O símbolo era formado por um triângulo invertido no centro de uma espiral branca que se estendia horizontalmente.

    “Então foi esse cara que me tirou da Divisão Zero?” Black continuou a encarar a estátua com um certo fascínio, em seguida, olhando para o restante da sala. 

    No centro, havia uma grande mesa que parecia simular a borda inferior da sombra da grande esfera erguida pela estátua, formando a metade de um círculo que encaixava perfeitamente na sombra projetada pela luz do local. Ao redor da mesa, havia cinco cadeiras, das quais quatro estavam ocupadas.

    Não era possível ver os indivíduos que estavam sentados, pois a luz que partia da parte de trás os ocultava perfeitamente.

    No centro da sombra formada pela esfera, havia uma cadeira reforçada e uma mesa de madeira bem polida, solitária em meio ao grande salão. Tyx indicou para Black se dirigir à cadeira central com um gesto da mão. 

    Todas as luzes da sala se acenderam, então Black seguiu em direção à mesa, observando os quatro que estavam sentados.

    Ele começou pela esquerda — o primeiro era um homem de pele levemente amarelada e de estatura mediana, vestido formalmente e usando óculos. Sua cabeça era levemente avantajada, com o cabelo bem acima de sua testa, seus olhos puxados eram pretos, seu cabelo de mesma cor; curto e bem penteado. Ele estava sentado com postura reta, manipulando um computador rapidamente.

    “Esse cara também é um Defensor?.” Black o encarou brevemente antes de olhar para o próximo.

    A segunda era uma mulher negra, também de estatura mediana, com músculos visíveis. Seu rosto era sério, e seus olhos e cabelo eram marrons — o cabelo cacheado emoldurava seu rosto, enquanto seus lábios carnudos estavam pintados de vermelho. Vestia uma jaqueta cinza, blusa preta e calças jeans. Com os braços sobre a mesa e os dedos entrelaçados, ela era a única com um sorriso acolhedor.

    “Que mulher… bonita.” Black encarou com admiração, mas se conteve. “Não posso esquecer que não estou aqui por conta própria.”

    O terceiro, no centro, era um homem enorme, beirando os três metros de altura. Sua pele era branca e seu corpo musculoso — os olhos negros e o rosto triangular o deixavam com uma aparência imponente, lembrando uma figura draconiana. A barba longa e o cabelo preto em rabo de cavalo complementavam sua aparência. Ele estava vestido com uma roupa formal sob medida e tinha as mãos entrelaçadas sobre a mesa, cobrindo parcialmente a boca. 

    “Esse cara é… enorme…” Black encarou o homem com olhos afiados. Ao trocarem olhares, o homem franziu o cenho. “Será que ele me conhece? Não, isso seria impossível.”

    O quarto homem não parecia tão grande quanto o terceiro, mas devia ter mais de dois metros e era musculoso, lembrando um fisiculturista. Sua pele era branca e seu rosto tinha um formato quadrado e bem definido. O cavanhaque e os cabelos loiros eram bem aparados, com um corte militar. Seus olhos amarelos eram semelhantes aos de Black, mas com uma coloração vívida. Ele usava uma camisa social, calças largas e confortáveis, além de tênis. Estava sentado com os braços cruzados e as pernas abertas, apoiando-se para trás na cadeira.

    “Os olhos dele… são como os meus…” Black cruzou o olhar com o indivíduo e seus olhos arregalaram suavemente. “Ele é igual a mim…?”

    Black permaneceu parado em frente à mesa, sentando-se silenciosamente e alternando o olhar entre os indivíduos.

    — Black, seja bem-vindo à Ordem dos Defensores. — Tyx proclamou.

    Por fim, o último assento à direita foi ocupado por Tyx. Após se sentar, ele olhou para os outros membros, que acenaram positivamente antes de voltar a atenção para Black, que mantinha o semblante sério e os punhos apoiados nos joelhos sob a mesa.

    “Defensores é…? O que exatamente eles querem comigo?” Black tentava manter a respiração calma, mas seu coração batia rapidamente. “De qualquer forma, estou prestes a descobrir…”

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