Capítulo 15
— Huh?
Karoline se expressou, recuando o rosto levemente corado e escondendo o corpo com os braços. Seu desconforto e confusão eram evidentes: os cenhos levemente franzidos, os olhos estreitos e a boca levemente aberta.
— O que…? Não! Não é o que você está pensando! — Tyx respondeu desconcertado, abanando as duas mãos em direção à jovem. — O que você acha que eu sou, garota!?
— Eu não sei! — Karoline se expressou ainda com olhar desconfiado. — Você está fazendo propostas indecentes!
Tyx negou levemente com a cabeça, colocando uma mão sobre o rosto.
— Quando eu disse “Dama”, quis dizer como a peça do xadrez… foi apenas uma analogia…
Karoline abriu completamente os olhos, em seguida colocando ambas as mãos sobre o rosto.
— Ah…
— Eu a vi crescer garota, como acha que eu sequer sugerir algo assim? — Tyx questionou negando a cabeça e ajustando o chapéu.
— Eu… eu não sei! — a jovem desviou o olhar, corando o rosto e alisando o cabelo com uma mão. — Foi você quem falou de um jeito estranho!
— Eu falei normalmente! — Tyx respondeu, cruzando os braços.
— Talvez você fale de um jeito estranho… ah, esquece! Foi um mal-entendido; vamos esquecer isso! — Karoline respondeu, acenando com as mãos enquanto retomava sua postura.
— Você é praticamente família para mim; eu jamais faria tal coisa. — Tyx disse enquanto se ajeitava na cadeira. — E eu falo de um jeito estranho…? Enfim, vamos seguir em frente.
Quando ouviu a primeira fala de Tyx, a jovem deixou escapar um leve sorriso contido, mas ela abaixou rapidamente a cabeça, respirando fundo e retomando a seriedade em sua feição.
— Então, o que você quer dizer com ser sua Dama? — Karoline questionou após limpar a garganta.
Tyx se ajustou, cruzando ambas as mãos sobre a mesa enquanto encarava a jovem.
— Quer dizer que você vai desempenhar um papel crucial em eventos vindouros.
— Mas por que você mencionou peças de xadrez? Para você, tudo isso não passa de um jogo?
Tyx soltou uma risada suave, inclinando levemente a cabeça enquanto retirava uma chave intrincada de seu sobretudo. O objeto era feito de um metal prateado com padrões geométricos únicos. Ele inseriu a chave em uma gaveta específica; ela girou por conta própria e então abriu com um clique suave.
— Não me entenda mal, eu também não passo de uma peça neste tabuleiro. — Tyx disse ao abrir a gaveta e tirar algumas pastas de coloração preta. — Porém, o outro lado começou primeiro e temos que formular nossa estratégia caso queiramos obter a vitória.
— Vitória contra quem?
— Essa é a pergunta que vale um milhão de dólares.
Karoline observou as pastas que Tyx manipulava com um olhar curioso. Ele sorriu e entregou uma pasta para ela, que lentamente a pegou com as duas mãos.
— O que é isso?
— Veja por si mesma.
A jovem abriu a pasta e encontrou o logo da Divisão Zero, juntamente com um carimbo de confidencialidade.
— Isso é… da Divisão Zero? Como você conseguiu isso? — a jovem arregalou os olhos ao encarar Tyx.
— Não importa; atente-se ao conteúdo.
Karoline hesitou por um momento, mas logo começou a acessar o conteúdo da pasta. Ela viu diversos dados relacionados ao ocorrido no hospital Santa Cláudia.
— Então é a Divisão Zero que está lidando com o caso dos Divergentes em Liberdade do Vale…
— Quando falhamos, eles assumem a situação.
— Droga… é tudo minha culpa… — Karoline disse, negando levemente com a cabeça. — Se eu tivesse seguido o protocolo…
— Não adianta chorar pelo leite derramado; você agora tem que focar no futuro, e ele está na pasta à sua frente.
A jovem assentiu e continuou a leitura do documento, que continha apenas algumas páginas. Tyx organizava outras pastas sobre a mesa. Após alguns minutos, Karoline fechou a pasta e encarou Tyx.
— Não entendo; acredito que já tínhamos conhecimento de tudo que está aqui sobre aqueles Divergentes. — ela disse ao colocar a pasta sobre a mesa. — O que você queria me mostrar? Que a Divisão Zero está tão perdida quanto nós?
— Na verdade, você não se atentou aos detalhes corretos. — Tyx acendeu o último cigarro de sua carteira, estalando a língua ao perceber. — Os Divergentes não são o que importa neste caso.
— O que quer dizer? — a jovem cruzou os braços e se inclinou para trás.
— Jonathan Williams… — Tyx respondeu ao tragar seu cigarro e dispersar a fumaça para seu lado direito. — Ele é o ponto principal desta investigação.
Karoline encarou o chão por um momento.
— Os Divergentes estavam com ele… — ela disse agarrando suas mãos nos joelhos. — Alguém já o interrogou? Ele sabia de alguma coisa?
— Infelizmente, não.
— Se ele está sob a guarda da Divisão Zero, podemos abrir um requerimento para…
— Ele faleceu.
Karoline rapidamente se calou, fechando a boca lentamente enquanto abaixava a cabeça.
— Mas eu o salvei… eu me lembro… — ela sussurrou para si ao encarar as próprias mãos.
— Você fez tudo o que estava ao seu alcance, mas ele parece ter sido envenenado. Isso é uma informação dos documentos da Divisão Zero. — Tyx falou balançando levemente o cigarro entre os dedos. — O laudo público diz que ele morreu por perda de sangue e trauma.
— Estão abafando a morte dele…? — a jovem disse, com um olhar incrédulo.
— Sim, porque isso agora é uma investigação confidencial da Divisão Zero, então eles precisavam “despistar” o público e a impressa. — Tyx respondeu desfazendo-se das cinzas no cinzeiro. — Mas existem pessoas que não confiam completamente na Divisão Zero, e é por isso que eu tenho essas informações.
Karoline estava com um olhar perdido, umedecendo os lábios enquanto fechava os punhos.
— Você conhece um delator na Divisão Zero, não é? — as palavras saíram da boca de Karoline com desconfiança.
Tyx não respondeu, apenas tragou seu cigarro lentamente.
— Então por que você não mostrou isso para meu pai!? — Karoline questionou de maneira exaltada, levantando-se de sua cadeira com os punhos cerrados. — Por que sequer estamos tendo esta conversa!?
Tyx parou por um momento, respirando fundo e deixando o cigarro descansar em sua mão.
— Poderia se sentar?
Karoline não respondeu, apenas encarou Tyx com um olhar raivoso. Então ele também se levantou, retirando uma moeda de seu bolso, arremessando-a para cima e agarrando-a enquanto se aproximava das estantes de livros.
— Me diga: por que você acha que a Divisão Zero não tornou público o verdadeiro motivo da morte de um funcionário prestigiado da Omni Tech Enterprise?
— Não sei. — Karoline seguiu Tyx com os olhos. — Talvez porque eles acreditem que a OTE esteja envolvida?
Tyx caminhou até escorar as costas na divisória de madeira da estante de livros, jogando a moeda bem alto. Através do visor, foi possível notar um brilho vermelho cintilante nos olhos de Tyx. Ele estendeu o dedo indicador, como a ponta de uma arma; a moeda caiu de pé, equilibrada na ponta do seu dedo.
— Como chegou a essa conclusão? — Tyx levantou lentamente o dedo, e a moeda começou a rolar lentamente para o centro de sua mão.
— Os documentos que você me mostrou não bastam!? — Karoline apontou para os documentos sobre a mesa. — Temos que mostrar isso para o meu pai!
— Talvez, mas você não sabe a procedência desta informação, e se ela foi obtida de forma ilegal? Ou se foi forjada? — Tyx fez um arco com seu polegar e indicador, a moeda subiu o arco e desceu, porém, cada vez mais se aproximando de um ponto onde iria cair. — Você já pensou quais seriam as consequências?
Karoline engoliu em seco, desviando o olhar com os cenhos franzidos, demonstrando levemente os dentes cerrados.
— Eu sabia… — seu olhar firme encarou Tyx. — Você obteve isso de forma ilegal e nem sequer sabe se é de verdade.
— Situações incomuns, requerem medidas incomuns. E sim, as fontes são confiáveis. — o brilho lentamente desaparecia em seu visor e a moeda começava a se desequilibrar. — Mas quero que você seja capaz de perceber o panorama da situação, o que faria a divisão Zero? Como isso afetaria a relação pública? Eu preciso que você seja capaz de ver tudo isso.
Karoline se encontrou cabisbaixa, encarando as pastas com uma expressão hesitante.
— Eu entendo a sua vontade de agir, mas a situação é delicada e estamos jogando contra um adversário que já atua há muito tempo. — Tyx disse. — E isso não é um jogo comum; é um xadrez 4D.
— O que quer dizer?
— Quer dizer que eu não sei qual é a estratégia do nosso adversário, já não parece fazer sentido. — o brilho sumiu e a moeda caiu, mas Tyx a agarrou fechando a mão. — Logo cada decisão tem que ser tomada com bastante cuidado, afinal não sabemos das consequências.
Karoline se sentou novamente na poltrona, suspirando e colocando ambas as mãos sobre as bochechas.
— E a família de Williams? — a voz de Karoline parecia cansada, e ela mantinha os olhos fechados.
— Segundo a Divisão Zero, a sua mulher chamada Kate sofreu um ataque naquele mesmo dia.
Karoline abriu rapidamente os olhos e encarou Tyx, inicialmente pronta para falar, mas apenas suspirando.
— Meu Deus… — a voz triste da jovem veio acompanhada das mãos que esconderam sua boca.
— A filha, Katherine, disse que um “fantasma invisível de olhos vermelhos” a trancou em um armário e disse para ela não sair de lá.
— O Divergente de estigma ALPHA… — Karoline disse quase sussurrando, então abaixando as mãos e encarando Tyx. — Deve ter sido o mesmo que me atacou! Você acha que eles foram atrás da família de Williams?
Tyx encarou Karoline enquanto tragava seu cigarro, concordando levemente com a cabeça.
— Se eles atacaram a família de Williams, então já o conheciam… — Karoline respondeu pensativa.
— Sim, parece que aconteceu algum tipo de retaliação. — Tyx pegou seu celular, acessando o dispositivo e reproduzindo um áudio.
‘Amor, saia da casa da sua irmã com Katherine e pegue aquele dinheiro. Vá para a casa dos seus pais e me espere lá… Eu te amo… Amo vocês duas…’
Karoline encarou o celular que reproduzia a voz cansada de Williams até que o áudio terminou. Ela voltou sua atenção para Tyx com um olhar sério.
— Então Williams já planejava fugir…
Tyx concordou com a cabeça ao ouvir as palavras de Karoline, aproximando-se da mesa e se sentando nela. Ele abriu a pasta que estava folheando anteriormente e colocou-a em uma página específica; ela mostrava diversos dados de uma empresa.
Karoline encarou a folha com olhos curiosos, em seguida encarando Tyx que apontava para um nome: Omni Tech Enterprise.
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