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    Estava preso dentro da névoa. O pânico apertou meu peito como uma mão invisível, e meu coração batia com tanta força que parecia ecoar ao meu redor. Tentei dar um passo atrás, voltar por onde vim, mas foi inútil.

    A densidade cinzenta engolia tudo à minha volta, e cada movimento parecia apenas me afundar mais naquele vazio sufocante.

    Minha respiração ficou rápida e superficial. Senti o suor escorrer pelas costas, grudando a camisa no corpo, e uma sensação de vertigem ameaçou me derrubar. Inspirei profundamente, tentando controlar o pânico crescente. Não conseguia pensar, minha mente girava em círculos, presa ao medo irracional que me paralisava.

    Abaixei-me devagar, apertando as mãos contra as coxas para manter o equilíbrio, enquanto tentava respirar fundo e de forma controlada. Mesmo assim, cada inspiração parecia insuficiente, e meus pulmões queimavam. O silêncio ao redor era absoluto, mas, ao mesmo tempo, parecia que eu podia ouvir cada batida descompassada do meu coração e o som da minha própria respiração ofegante.

    “Calma, Ganimedes. Não entre em pânico. Respire.”
    Repeti as palavras mentalmente, como um mantra. Meus olhos vasculhavam a névoa, buscando algum ponto de referência, qualquer coisa que provasse que eu ainda estava no mundo real. Mas a névoa se movia como uma criatura viva, ondulando e formando padrões indistintos, rostos que desapareciam assim que eu piscava.

    “E se alguma coisa me ouvir?”

    A ideia de atrair algo para aquele vazio aumentou meu terror. Sabia que a névoa abrigava coisas que ninguém queria encontrar, mas ninguém sabia ao certo o quê. Senti-me pequeno, insignificante, perdido em meio a um oceano fantasmagórico.

    — Droga… — murmurei, mais para preencher o vazio do que por qualquer outra razão. — Quem mandou bancar o herói?

    Tentei lembrar do que os livros da infância diziam. As histórias contavam sobre desbravadores que entravam na névoa com coragem inabalável e feitiços de navegação. Diziam que aqueles homens e mulheres confiavam mais no instinto do que na lógica, pois, dentro da névoa, conceitos como direita, esquerda ou distância eram irrelevantes. Um único passo poderia transportar alguém a milhares de quilômetros, enquanto um dia inteiro caminhando poderia levá-lo apenas um metro adiante.

    De certa forma, pensar nos antigos me acalmou. Havia algo inspirador na ideia de pessoas tão destemidas desafiando aquele véu traiçoeiro. Talvez eu pudesse fazer o mesmo.

    “Magia.”

    A palavra escapou dos meus lábios como uma centelha de esperança. Os antigos usavam magia para navegar. Eu não podia usar magia, mas podia sentir a mana.

    Tentei relaxar o máximo possível e me concentrei. Estendi meus sentidos em busca de mana, esperando que houvesse ao menos um traço dela naquele vazio. Havia um consenso de que a névoa não tinha mana, que era um vazio espiritual e mágico. Mas, ao forçar minha percepção além do pavor, percebi algo diferente.

    Havia pequenos pontos de mana espalhados, quase como um sussurro ao vento. Iam e vinham, como folhas levadas pela correnteza, rápidos e intangíveis.

    O alívio me atingiu com força, quase me fazendo rir. Ainda assim, a inquietação permaneceu. Aqueles traços de mana… O que eram? Viajantes? Pessoas como eu, usando Pedras de Ancoragem? Ou seriam criaturas da névoa, movendo-se ao meu redor, apenas esperando o momento certo para atacar?

    Respirei fundo, tentando me acalmar.

    Os rastros de mana continuavam se movendo, rápidos demais para que eu os seguisse. Mas ao menos me davam alguma direção. Podiam ser perigosos, sim, mas também podiam ser a chave para sair dali.

    Comecei a caminhar devagar. A cada passo, a névoa ao meu redor parecia mudar de textura e tom. Às vezes, parecia mais densa, quase sólida; em outras, tão fina que eu podia enxergar vultos ao longe, como sombras indistintas.

    Sons começavam a quebrar o silêncio, passos ecoando, ou talvez fosse apenas minha imaginação. Vozes sussurradas, risadas distantes, e um roçar suave, como folhas secas arrastadas pelo vento.

    — Tem alguém aí? — Minha voz saiu hesitante, e o eco foi engolido pela névoa antes que eu pudesse esperar uma resposta.

    O som cessou por completo, como se o próprio ambiente segurasse a respiração. Meu estômago se revirou. Cada vez mais, eu sentia que a névoa me observava, testava minha resistência.

    Continuei a andar, tentando não pensar no medo esmagador. Cada passo parecia me puxar para mais fundo no desconhecido, mas eu me recusava a parar.

    “Os antigos conseguiram. Eu também consigo.”
    Tentei manter esse pensamento firme na mente, mesmo quando uma luz fraca e difusa surgiu à frente, oscilando como uma lamparina à mercê do vento. Hesitei, mas algo em mim sabia que não tinha escolha.

    Se quisesse sair dali, precisava enfrentar o que quer que estivesse naquela luz.

    Mas, quando finalmente reuni coragem para seguir na direção da luminosidade, ela desapareceu, tão misteriosa quanto havia surgido. Senti um vazio se abrir no meu peito, uma mistura de frustração e desespero. A névoa zombava de mim, criando ilusões para me atrair, como uma fera que brinca com sua presa antes de atacar.

    Engoli em seco e segui em frente. O cansaço começava a pesar nos ombros. Achei que fazia um caminho em linha reta, mas sabia que isso era puro otimismo. Dentro da névoa, não havia garantias de que meu rumo fazia algum sentido.

    O frio começou a se tornar mais intenso, como se a névoa se alimentasse do calor do meu corpo. Minhas mãos estavam dormentes, e meus pés doíam a cada passo. Senti os músculos começarem a ceder, e o cansaço ameaçava me derrubar. Me manter em movimento era uma forma de preservar o calor, mas até quando eu suportaria?

    Além da fome que começava a corroer meu estômago, a sede e o sono também pesavam na mente. Os olhos ardiam, e o corpo implorava por descanso. Mas eu sabia que, se deitasse naquele chão frio, talvez nunca mais acordasse.

    — Só mais alguns passos… — murmurei, me enganando para continuar.

    Por fim, as pernas cederam, e eu caí de joelhos no chão. Não consegui segurar o soluço que escapou da garganta, e as lágrimas vieram sem aviso, quentes e silenciosas. O desespero me consumiu de novo, um ciclo cruel de esperança e medo.

    — Por que eu? — sussurrei, a voz falhando. — Por que eu tinha que entrar nessa maldita névoa? Nem sei se Cass está bem…

    Baixei a cabeça, sentindo as gotas salgadas escorrerem pelas bochechas. Tentei engolir o choro, mas a sensação de impotência me sufocava. Quando pensei que a esperança estivesse abandonando meu corpo de vez, algo inesperado aconteceu.

    Um puxão.

    Não físico, mas quase como se uma mão invisível segurasse minha alma e me arrastasse para frente. Uma energia diferente passou por mim, forte e intensa. Não era mana, eu sabia reconhecer mana, e aquilo era outra coisa.

    A curiosidade rompeu a camada espessa de medo e cansaço. Limpei as lágrimas com as costas da mão e me levantei, vacilante. Aquela força pulsava, chamando-me para uma direção específica. Era como uma âncora espiritual, uma presença que me fazia querer segui-la sem questionar.

    Com passos incertos, segui a sensação, cada vez mais ciente de que a névoa começava a enfraquecer ao meu redor. A densidade dela parecia diminuir, e a luz natural se filtrava através das frestas que surgiam. O chão, antes indistinto, agora revelava uma textura de terra batida e folhas mortas. Era como se a névoa e a energia misteriosa trabalhassem juntas para me levar ali.

    O coração disparou de novo, mas dessa vez com esperança genuína. Lágrimas voltaram aos meus olhos, desta vez de alívio. Com um último passo, senti a névoa se desprendendo de mim, como um manto pesado que finalmente caía dos meus ombros.

    À minha frente, uma nova paisagem se revelou. Um campo amplo, margeado por árvores robustas e uma estrada de pedras desgastadas pelo tempo. A luz do sol aquecia meu rosto, dissipando o frio que havia se entranhado nos ossos.

    Caí de joelhos novamente, mas agora com um sorriso trêmulo nos lábios.

    — Eu consegui… — murmurei, sem acreditar totalmente.

    Por um tempo, apenas me permiti deitar no chão, sentindo a vida voltar ao meu corpo aos poucos. O calor da terra era quase reconfortante. Fiquei ali, imóvel, saboreando a liberdade, como se cada sopro de ar puro lavasse os resquícios de desespero que a névoa havia deixado.

    Levantei-me devagar, observando os arredores com mais cuidado. A sensação permanecia ali, como uma presença sufocante ao fundo da consciência. Pior ainda, à medida que eu me afastava da névoa e entrava mais na ilha, ela parecia crescer, se tornando mais forte e intensa.

    Uma sensação de calafrio percorreu minha espinha, e um gosto amargo se formou na boca. Era como se algo escuro e oleoso estivesse se espalhando pelo ambiente, era uma energia pesada e densa, que parecia impregnar o ar e grudar na pele. Não me passava uma boa impressão.

    Meu instinto gritava que aquilo não era natural. A mesma sensação de perigo que tive dentro da névoa agora se manifestava de outra forma, como se a própria ilha estivesse viva e atenta à minha presença.

    Olhei para a névoa, ponderando por um instante. Que chances eu teria se voltasse para lá? Por mais que a energia misteriosa e opressora da ilha me incomodasse, ainda parecia uma escolha mais segura do que encarar aquele labirinto sombrio novamente.

    O cansaço ainda pesava nos ossos, mas a urgência de entender o que estava acontecendo me empurrou a seguir em frente. Observei a estrada de pedras antigas e maltratadas que se estendia adiante, parcialmente coberta por musgo e folhas secas. Talvez houvesse algum tipo de abrigo ou sinal de civilização mais adiante.

    Mas aquela presença… Aquela sensação maligna não deixava de me atormentar, como se eu tivesse saído de um pesadelo apenas para acordar em outro. Inspirei profundamente e segui em frente, tentando afastar o medo que ainda latejava no fundo da mente.

    “Mais mistérios…”

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