Capítulo 2 - Chegada no Engenho
Ainda de madrugada Carlos estava desacordado com uma ferida na cabeça, o capitão do mato conhecido como Joãozinho estava o levando junto de seu cavalo. Já a mulher chamada Tassi que foi capturada junto com Carlos estava andando a pé, com os braços amarrados por uma espécie de cipó, sendo seguida de Sebastião que estava montado a cavalo.
Ao longe ao pé de uma árvore podia-se ver uma fogueira e um grupo de pessoas deitadas em volta da fogueira, junto com uns capitães do mato que estavam vigiando essas pessoas.
Vendo tal cena Tassi não pode deixar de ficar desapontada “Não pode ser, achei que eles tinham escapado…”
Sebastião não conseguia ver o rosto de Tassi mas conseguia imaginar a reação dela e isso o deixava feliz.
— Achô que esses neguinho ia fugir, hein? Hahaha! Até que é esperta pra uma preta… mandô todo mundo pro lado contrário! Claro que a gente ia atrás de você, vale mais que tudo essa ruma de negro junto! Mas achô mesmo que eu ia mandá tropa toda? Só eu e o piá aqui já bastô pra te pegar!
Tassi apesar da sua fúria e tristeza interna, manteve um rosto sério e apenas olhou para trás e observou a ferida na sobrancelha de Sebastião, ele tentou limpar o rosto e a ferida, mas dava para ver até um pouco de branco do osso dele, foi uma corte feio que deixaria cicatriz. Também havia outra ferida em sua bochecha que ainda estava sangrando, foi causada pelos ataques de Carlos. Além disso, as mãos dele estavam roxas devido aos chutes, e a barriga também deveria estar assim também. Nem precisou dizer nada, apenas o olhar já dizia tudo.
Sebastião ficou ficou furioso com o olhar dela mas não fez nada, apenas ficou quieto, pois não havia o que falar. A captura de dela foi mesmo mais difícil do que o esperado. Desde a perseguição para fora do engenho em que ela coordenava o grupo e atacava eles com pedras, até a separação dela do grupo e o encontro com o escravo de roupas estranhas.
Logo foram levados junto com os outros escravos. Todos estavam com as mãos amarradas para não escaparem. Também havia mais três capitães do mato, cuidado para que os escravos não fugissem.
Ao verem o estado em que Sebastião estava, os capitães do mato até pensaram em perguntar o que houve, mas nenhum deles queria despertar a ira do chefe deles. O que importava é que todos os escravos foram capturados e eles poderiam pegar a recompensa deles de manhã. Como todos estavam ali, eles poderiam dormir e trocar turnos para ficar de vigia.
Joãozinho desceu de seu cavalo e com a ajuda de outro capitão do mato, deitou Carlos no chão. Já Sebastião vendo que os capitães do mato estavam confusos com a sua aparência e o escravo a mais capturado, resolveu falar:
— Esse corno aqui ajudô essa puta a me bater. Mas prendi os dois e dei uma pedrada na caveca dele pra vê se aprende. Se morrer, ótimo! Se não, a gente vende pro sinhô do engenho e o dinheiro também vai me deixar felizão!”
Tassi olhou para Carlos e não pode deixar de pensar “Que idiota, você poderia ter fugido sozinho, apenas te salvei porque te coloquei nessa enrascada, mas você não precisava fazer o mesmo por mim. Tomara que você não morra…”
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Na manhã seguinte Carlos acabou acordando mais cedo que todo mundo
“Ai, minha cabeça.”
Por conta da dor tentou pôr a mão em sua cabeça, mas como estava amarrado por videiras, acabou não conseguindo.
“Não acredito…. Então tudo que aconteceu ontem foi real mesmo? Eu achei que tinha sido um pesadelo!”
Olhava aflito para os lados, e tudo que via era mais pessoas como ele, amarradas, só que com cordas em vez de videiras, dormindo. Pelas roupas que usavam, ou pela falta delas, que no caso eram apenas algumas calças largas feitas de algodão cru e alguns usavam camisas rasgadas, podia se dizer que pareciam ser escravos.
“Não pode ser, isso não pode ser real! Queria voltar no tempo pra refazer minha faculdade, não voltar no tempo para virar escravo… Não, eu preciso manter a calma, talvez não seja isso… Não, pelo tratamento que tive até agora… Eles não me trataram como humano, nem a mim, nem aquela mulher. Aliás, como ela está?”
Aflito, procurou pela mulher, e logo a encontrou, o que não foi muito difícil já que era a única mulher do grupo. Ao ver que estava bem, suspirou aliviado.
“Que bom, está bem, digo bem, bem não está, mas ainda está viva, apesar de que o olho dela está roxo, mas é de se esperar, depois do soco que aquele verme deu.”
Com dificuldade conseguiu se sentar e ver que havia alguns homens com chapéu de vaqueiro comendo ao redor.
— Não é que você tá vivo mesmo? Que pena… Mas pelo menos vou ganhar uns trocados pra comprá uma cachaça boa. Não tá tão ruim, não!
Olhou lentamente para trás, apenas para ver quem menos queria ver, o verme que atacou a mulher. Ao ver o rosto deste homem desprezível ficou muito irritado e acabou demonstrando isso com seu olhar.
— Se ficá me encarando desse jeito, te dou logo um sumiço em vez de comprar cachaça.
Carlos não pode deixar de sumir com o olhar de raiva, para ter um olhar de desesperança “O que será que vai acontecer comigo? Vou ser um escravo mesmo…”
Sebastião, ficou feliz com esta reação. — É isto que gosto de vê, tô até animado pra pegar logo o pagamento por você. — Ao dizer isso se levantou, se espreguiçou um pouco antes de gritar:
— Acorda, seus negos fujões! Hora de voltá pro tronco e levá couro! Até pensei em deixá vocês dormindo enquanto eu comia meu angu, mas melhor logo se livrá de vocês. Tô com vontade de comer puta e beber cachaça na cidade!
Aos berros os escravos foram levantando, eram quatorze no total contando com Carlos que devido às condições em que dormiu, sentia-se como se não tivesse descansado, tinha até umas olheiras.
Apesar de abatido, Carlos tentou pensar em sua situação atual.
“Será que voltei pro período do Brasil colonial ou imperial? Afinal eles falam português… Espera, deveriam falar um português mais arcaico, porém entendo eles perfeitamente… Claro, estão falando como caipiras, mas ainda dá pra entender tudo. E tem a magia, acho, pelo menos não consigo pensar em nenhuma outra explicação além de magia para aquele arco e essa videira que me capturou.”
“Acho que vim parar em outro mundo mesmo, mas não parece que vou ser o herói que vou matar o rei demônio tendo o poder mais fraco que na realidade é o mais apelão enquanto tenho uma companheira elfa com uns peitão pra me ajudar. Fui parar em outro mundo, mas acabou sendo um mundo pior do que meu…”
Enquanto se perdia em seus pensamentos, todos os escravos ficaram de pé e já começaram a caminhar para o engenho. Devido ao olhar de Sebastião deixou esses pensamentos de lado, se levantou com dificuldade e começou a caminhar também.
Tassi foi uma das últimas a se levantar e quando viu o homem de roupas estranhas ficou feliz, por não ter morrido ao tentar salvá-la “Que bom que está bem, mas o fato dele ter sido capturado é culpa minha, espero poder ajudá-lo de alguma forma no futuro.”
O grupo começou a andar, os cinco capitães do mato que estavam montados a cavalo ficavam cada um em um canto para que nenhum escravo escapasse e Sebastião ficava na frente liderando. Os escravos estavam todos quietos, não só por medo dos capitães do mato, como também por estarem abatidos por terem sido capturados de novo, ainda mais porque sabiam que uma punição os esperava quando chegassem no engenho.
Carlos começou a observar melhor aqueles que seriam seus companheiros “Todos eles estão bem magros, parecem que não estão comendo bem, mas é claro, afinal são escravos. Só tem uma mulher, foi ela que me avisou pra correr, se tivesse ouvido e começado a correr de uma vez… Talvez poderia ter escapado, ela até foi capturada por minha causa, tenho que pedir desculpas depois. Apesar de que desculpas não devem ser o suficiente, tenho que ajudá-la de alguma forma.”
De relança seu olhar foi para o homem montado a cavalo liderando o grupo.
“Aquele homem desprezível falou que estamos indo a um engenho, relembrando o que eu estudei na escola, engenho era onde faziam açúcar no Brasil colonial através da mão de obra escrava. Plantavam a cana de açúcar e faziam açúcar com ela no engenho, quem manda em tudo é o senhor de engenho, e ele era dono de escravos mas havia também homens livres trabalhando pra ele… Por enquanto é isso tudo que eu lembro, até que é bastante, considerando que faz anos que não estudo isso. Por sorte sempre gostei de história, apenas segui exatas porque achei que ganharia mais e trabalharia menos. O que não aconteceu, apesar de que se fosse pra humanas só poderia trabalhar como professor, ganhando pouco e trabalhando muito, acabou que no fim daria na mesma.”
Depois de uma hora caminhando chegaram ao engenho, assim que um trabalhador livre viu o grupo chegando, foi correndo avisar o senhor do engenho. Os capitães do mato foram descansar em uma árvore.
Depois de alguns minutos o senhor do engenho apareceu. Era um homem branco, tinha uns 40 anos, com uma barba grande e faltava um dente em sua boca. Junto dele havia vários homens mais jovens e fortes com chicotes em suas mãos.
Vendo que o senhor do engenho chegou, Sebastião e seu grupo desceram de seus cavalos.
— Bom dia, Seu Jorge! Trouxe os treze ratos que fugiram, como o sinhô pediu.”.
Falava isso enquanto mostrava com as mãos os escravos, também apontou para a única escrava que estava ali.
— Pegamo a cabra que botô ideia na cabeça dos outros. Tá toda inteirinha, igual no dia que o sinhô comprou.
O senhor do engenho parou, olhou para todos os escravos com ódio e desdém, principalmente para a mulher. Depois voltou seu olhar para o capitão do mato, e logo seu olhar suavizou.
— Você é mesmo tão bom quanto dizem, como combinamos vou te pagar 30 mil réis por escravo, e 240 mil réis pela escrava.
O senhor do engenho fez sinal para um peão dele trazer o dinheiro, quando o senhor olha para Carlos e nota que não era um escravo dele.
— Espera um pouco, tem um escravo a mais aqui no meio.
Ouvindo isso até teve esperança de soltarem ele. Mas essa esperança não durou muito.
— Ah, ia me esquecendo, achamo mais um zé-ninguém perdido no mato. Tá meio acabado, mas ainda rende uns anos de serviço!
— Que bom, realmente tô precisando de um escravo a mais mesmo, mas, não vou ter dinheiro para pagar, mas posso pagar em açúcar ou cachaça se o senhor quiser.
— Tá bão, pode ser cachaça memo!
Após ouvir isso, um dos homens que acompanhava o senhor do engenho se aproximou do Sebastião e entregou um saco de moedas pra ele, que logo abriu e começou a contar. Enquanto contava, outro peão foi pegar cachaças que seriam dadas como pagamento.
Depois de um tempo, o peão chegou com uma carroça cheia de cachaças. Quando a carroça chegou, já havia terminado de contar as moedas eram 240 moedas de prata no total onde cada uma valia 2.500 réis dando um total de 600.000 mil réis. Isto era o dobro do salário que um homem livre ganhava durante um ano inteiro. Depois de confirmar as cachaças, deu um aperto de mãos com o senhor do engenho e começou a falar:
— Foi bão demais esse negócio! Se precisá, é só chamá. Mas se fosse o sinhô, eu acabava com essa vadia logo, ela só vai dá problema e fazê os outros fugi!
— Obrigado pela preocupação, até queria fazer isso, mas ela é capaz de usar gemas da grama e da terra, com isso dá para deixar o solo ficar mais fértil o que faz as canas de açúcar renderem mais ainda. Por isso consigo ser o mais rico da região, mesmo tendo menos escravos que meus vizinhos, tenho até contatos com o governador da capitania. Sabe como uma escrava que pode usar gemas de terra e grama é cara? Uma dessas custa mais de 3 milhão de réis, pra minha sorte essa daí conseguiu esconder o que sabia fazer do vendedor de escravos. Mas eu sempre testo se algum dos meus escravos sabem usar alguma gema mágica. As ferramentas para testar a aptidão de gemas mágicas são caras, mas valeu a pena, já que consegui descobrir as aptidões dessa escrava. Só é uma pena que seja muito rebelde, por isso tenho que ensinar a se comportar. Mas só vou ter que aguentar isso por mais alguns anos, ela já pariu o substituto dela, porém ainda é muito novo e com pouca mana em seu corpo.
“Agora entendi porque pagô uma fortuna nela! Se soubesse que valia tudo isso, tinha cobrado o dobro!”
— Que bom que a aposta do senhor deu certo. Boa sorte pro sinhô! Agora vou vazá, já tá na hora do meu gole!
Os capitães do mato montaram em seus cavalos e seguiram o seu rumo para a cidade.
Após eles saírem, o senhor do engenho mandou todos os escravos irem para o pelourinho que ficava na frente da senzala, inclusive os que não participaram da fuga. Além disso, pediu para um dos seus peões trazerem algumas ferramentas, chicotes, uma máscara e um ferro que logo foi colocado num fogo que foi feito ali perto.
“Não preciso saber muito de história para saber o que vai acontecer conosco… Queria poder dizer que consigo enfrentar isso de cabeça erguida, mas não consigo, nem imagino qual seja a dor de levar uma chibatada.”
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