Karoline estava com um gorro rosa, e seu cabelo avermelhado estava solto, cobrindo completamente seus ombros. Seus olhos estavam ocultos por óculos escuros, e ela usava uma máscara de tecido branco que cobria a parte inferior de seu rosto. Vestia um casaco cinza, uma blusa branca, uma saia jeans, meia-calça e botas pretas.

    Ela estava sentada em um vagão de trem, onde anúncios holográficos flutuavam na parte superior e LEDs pulsavam em um brilho acelerado. O espaço estava lotado com uma diversidade de pessoas, predominantemente jovens uniformizados e adultos bem-vestidos. Muitos estavam organizados em grupos animados, enquanto alguns poucos permaneciam isolados, imersos em seus próprios pensamentos. No entanto, algo que todos tinham em comum era o celular diante de seus rostos.

    A jovem mantinha as pernas juntas, usando-as como apoio para suas mãos que mexiam em um smartphone; na tela, havia equações matemáticas, principalmente focadas em limites.

    –  Cara, cê já conseguiu o dinheiro para me pagar? –  disse um rapaz jovem uniformizado que usava óculos, com uma voz desinteressada enquanto encarava seu aparelho celular.

    –  Que nada… Meu chefe do meio período disse que o pagamento vai atrasar um pouco. – respondeu o outro jovem com cabelo bagunçado ao seu lado, também uniformizado e olhando para a tela de seu celular.

    –  Processa ele ué, – a resposta veio seguida de um estalar de língua e um tom de insatisfação. – se eu soubesse que você não iria devolver, eu não tinha emprestado.

    –  Quem dera eu pudesse… incidente com divergente, sabe como é, né…

    O rapaz de óculos suspirou, negando levemente com a cabeça.

    –  Ah… que merda. Tudo atrasa na nossa vida porque um desgraçado com poderes decide fazer alguma coisa estúpida.

    – Soube que, acho que foi mês passado, a Chama Escarlate derrubou um prédio?

    Ao ouvir a fala do garoto com cabelo bagunçado, Karoline instantaneamente parou, mantendo os olhos fixos na tela de seu celular.

    – Fui eu quem te mostrou o vídeo, seu doidão… Tenho certeza de que se ela não fosse a filha do Dragão Vermelho, já estaria em uma cela na Acrópole.

    – Eu acho que não… ela é bonita demais para ficar presa lá embaixo da terra.

    Os dois começaram a rir contidamente até que Karoline se levantou e encarou ambos, que recuaram com certa surpresa. Ela fez menção de dizer algo, mas apenas fez um gesto abaixando a cabeça levemente.

    – Com licença…

    Ambos apenas assentiram e abriram caminho para ela, que passou entre eles, seguindo pelo vagão lotado em direção à porta de saída, observando a cidade passar em alta velocidade diante de seus olhos.

    Ela olhou novamente para seu celular, cabisbaixa, e abriu um aplicativo de mensagens. Havia diversas conversas, mas ela selecionou uma em específico, a de uma garota com cabelos brancos que não havia sido respondida há meses.

    ‘Espero que você não se arrependa desta escolha, mas tenho certeza de que irá.’

    Ela encarou a mensagem por um momento antes de bloquear a tela do celular. Respirou fundo e levantou a cabeça para olhar novamente para a cidade à sua frente, que logo foi ocultada quando o vagão adentrou um túnel.

    Ao sair do trem, ela se viu em uma vasta estação de metrô central, onde plataformas amplas e iluminadas por painéis de LED pulsavam com a energia de uma multidão diversa. Escadas rolantes de vidro transparente e rampas automatizadas levavam ao andar superior, enquanto hologramas flutuantes exibiam informações em tempo real sobre horários e direções.

    A arquitetura era uma fusão de design ergonômico e elementos naturais, com jardins verticais que traziam vida ao ambiente. O aroma de café fresco e comidas exóticas emanava de quiosques diversos.

    Ela caminhou em meio à multidão, com a cabeça abaixada em direção às escadas, tentando ajustar seus óculos e sua máscara quando esbarrou em alguém e derrubou seus óculos.

    –  Olha por onde anda, droga! – exclamou um homem de terno, desviando do café que havia derramado no chão.

    –  Me desculpe, foi sem querer… – disse Karoline ao se abaixar para pegar seu item caído. – Eu posso pagar um novo para você…

    O homem fez uma expressão confusa ao olhar para ela, levantando levemente uma sobrancelha.

    – Pera aí… Eu te conheço… 

    – Eu acho que não… você deve ter se confundido… – respondeu Karoline, retirando uma pequena bolsa de pelúcia de seu casaco. 

    Ela abriu a bolsa e retirou uma nota de cinco dólares, oferecendo-a ao homem enquanto colocava os óculos novamente.

    – Não, eu tenho certeza… Você é a Chama Escarlate, não é!? Eu reconheci pela voz, já ouvi você na TV. Minha filha tem deis anos e adora você!

    O homem rapidamente puxou seu celular, abriu a galeria e mostrou fotos da filha fantasiada com um traje que imitava um uniforme heroico nas cores vermelho e branco.

    – Ah, que fofo… Mas hoje eu sou apenas Karoline…

    – Você tem que tirar uma foto comigo! Ela vai adorar! Por favor, Chama Escarlate!

    O homem disse enquanto acionava a câmera do celular e apontava-a para si mesmo, colocando-se ao lado da jovem. Ela lentamente recuou até esbarrar em outra pessoa que estava caminhando.

    – Presta atenção! –  disse um homem vestido com roupas comuns.

    – Me desculpe…

    Karoline estava prestes a se desculpar quando o homem de terno tomou sua frente, empurrando levemente o sujeito que esbarrou nela.

    – Presta atenção você, cara! Sabe com quem está falando!? Ela é a Chama Escarlate!

    Diversas pessoas começaram a parar para ver o que estava acontecendo, e um grande número puxou os celulares para gravar.

    – Então foi você que derrubou o Santa Claudia!? –  questionou um sujeito em meio à multidão.

    – Claro que não! Ela estava enfrentando Divergentes; foram eles que derrubaram! –  exclamou outra pessoa na multidão.

    Karoline olhou ao redor e percebeu que uma grande comoção estava se formando. Pessoas a questionavam enquanto ela apenas tentava se afastar.

    – Chama Escarlate! Faça algum truque com fogo para nós!

    – O que você está fazendo aqui!? Não deveria estar em patrulha!?

    – Chama Escarlate! Eu te amo!

    – É assim que você desperdiça o dinheiro de nossos impostos!?

    A multidão se aproximava cada vez mais dela, ao ponto de ela nem sequer entender mais o que as pessoas diziam. Sentiu pessoas a empurrando levemente, flashes de fotos ao seu redor e abraços que vinham em sua direção.

    Ela tentava se afastar das pessoas, mas elas a rodeavam cada vez mais, até que um som estridente ecoou e uma luz avermelhada cercou todos no recinto.

    – Afastem-se todos! Aqui é a Divisão Zero! Circulando!

    A voz robótica vinha de um drone que sobrevoava todos, seguido por um som agonizante. As pessoas se afastaram rapidamente do raio da demarcação avermelhada, mas quando Karoline tentou atravessá-lo, outro drone parou bem em sua frente.

    – Você não. Siga o caminho indicado em azul, por gentileza.

    O drone demarcou uma área abaixo de si com uma linha azul, indicando um caminho ao seu redor, cercado por uma luz avermelhada. Uma pequena sirene começou a girar em cima dele enquanto ele começava a se mover.

    Karoline apenas seguiu; as pessoas tiravam fotos e filmavam, mas não se aproximavam do drone e abriam espaço por onde ele passava.

    O drone seguiu até a parte superior da estação de metrô, guiando a jovem para um lote que continha o símbolo da Divisão Zero e dois agentes em cada canto. Ao alcançar uma porta automática, ele desligou as luzes e a porta se abriu.

    – Por gentileza, entre e siga até a sala no corredor à direita.

    Karoline apenas assentiu positivamente com a cabeça enquanto o drone voava para longe. Ela adentrou o local, onde havia uma recepção com um balcão e algumas cadeiras encostadas nas paredes.

    Havia uma mulher sentada que olhava para um computador; ela apenas olhou para Karoline e indicou com a cabeça para a esquerda, revirando os olhos ao dizer: – Última sala no final do corredor.

    Karoline acenou positivamente com a cabeça e seguiu até o final do corredor branco, cujas paredes tinham listras vermelhas e amarelas.

    Ao adentrar na sala, Karoline se deparou com um homem sentado, digitando no computador. À sua frente havia uma mesa de MDF e, em frente a ela, duas cadeiras de escritório. Ele era um homem de idade, com poucos cabelos na cabeça, um pouco acima do peso e com rugas nos cantos dos olhos.

    – Sente-se, por favor, e retire a máscara e os óculos.

    Karoline se dirigiu até a cadeira da direita e se sentou, acatando as ordens do homem.

    – Pode me chamar de Marcus. –  disse ele, colocando as duas mãos sobre a mesa. –  E então? Pode me explicar por que a filha de um Defensor está causando comoção na estação central?

    – Foi apenas um mal-entendido. Eu não estou atuando como heroína, porém…

    –  É de conhecimento público que você tem transporte particular. Por que está aqui? –  questionou Marcus, cruzando os braços.

    Karoline abriu um leve sorriso, respirando fundo ao desviar o olhar e enrolar um dedo em uma mecha de seu cabelo.

    – Sinto muito, é que eu precisava ir para o edifício Iovem e o carro quebrou. Eu estava com pressa, sabe…

    Marcus olhou para ela com as pálpebras caídas e, em seguida, voltou a olhar para seu computador.

    – Eu deveria advertir a Convergência sobre o que aconteceu aqui.

    Karoline engoliu em seco, não conseguindo levantar o olhar que estava fixo em suas mãos apertadas sobre os joelhos.

    – Mas vou deixar passar, apenas desta vez já que não ocorreu nada grave… – Marcus disse com um tom sério. –  Mas você deveria saber que não pode ficar andando assim entre as pessoas normais; sempre há a possibilidade de algum desastre acontecer.

    – Não vai acontecer de novo…

    Marcus concordou levemente com a cabeça ao ouvir a voz da jovem, dando dois leves toques com os dedos sobre a mesa.

    – Vou ordenar que um agente a escolte para fora da estação. De lá, você pode continuar para o edifício Iovem. – disse ele, digitando novamente em seu computador. – E me faça um favor, Chama Escarlate…

    – Não se preocupe, eu não vou mais causar problemas. – respondeu Karoline com um olhar sério.

    – O que…? Não, não é nada disso. – disse Marcus, pegando seu celular, virando a cadeira e olhando para ela de costas. – Eu posso tirar uma selfie com você…? Sabe, eu sou um grande fã do seu pai, mas como tenho certeza de que ele nunca vai passar por aqui…

    Marcus continuou a falar enquanto Karoline o observava com as pálpebras caídas. Em seguida, ela suspirou e abriu um sorriso forçado ao fazer o sinal da paz com os dedos.

    – Claro… vá em frente…

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