Capítulo 28
‘Mais um mês sem resposta… será que estraguei tudo?’
Demian escrevia em seu celular, olhando através da janela para o sol brilhando intensamente. À medida que se afastava da Aurora Oriental, o cenário mudava lentamente — os prédios residenciais coloridos desapareciam como uma lembrança distante, dando espaço a edifícios altos e modernos, imponentes e frios, que substituíram as pequenas lojas familiares por grandes corporações. Anúncios gigantes refletiam promessas de um futuro vibrante, enquanto o barulho da cidade pulsava ao seu redor.
‘Não que seja algo incomum… acho que eu o decepcionei de alguma forma. Mas ele não desistiria assim não é? Ele sequer pode desistir?’
Seus olhos pareciam cansar, e ele aumentou o volume da música para não ouvir o mundo ao seu redor enquanto o ônibus seguia em direção ao coração da cidade.
‘Por que é sempre assim? Eu nunca consigo fazer nada direito. Imagino se o mundo seria um lugar melhor sem mim…’
Ele desembarcou do ônibus e seguiu para um grande centro. Alguns minutos depois, Demian se encontrava escorado em uma passarela, bebendo um milkshake; uma visão panorâmica da cidade se desenrolava diante dele: veículos em movimento constante, anúncios holográficos flutuando no ar e o metrô cruzando trilhos que serpenteavam por toda a metrópole. No entanto, sua atenção estava voltada para as pessoas que passavam pela enorme passarela.
Havia uma diversidade impressionante de indivíduos: garotas e garotos com roupas coloridas e ousadas, homens e mulheres de terno falando em celulares como se estivessem em reuniões importantes. A maioria dos rostos estava fixada nas telas brilhantes dos celulares à sua frente. Mas ainda havia sorrisos e companheirismo, principalmente entre os mais jovens, que pareciam formar um laço invisível unindo todos ali.
Ele, por outro lado, permanecia sozinho, de costas para a cidade, sentindo-se deslocado naquele mundo vibrante.
‘Imagino como deve ser a vida deles, rodeados de amigos e garotas. É como se, mesmo estando no mesmo ambiente, o mundo girasse de maneira diferente para cada um de nós.’
Ele escreveu em seu celular enquanto observava um grupo de jovens bem-apessoados, vestidos com casacos de times e cercados por garotas que sorriam com entusiasmo. Fechando os olhos e apenas escutando, ele quase conseguia sentir como se estivesse no meio daquele grupo, participando e escutando a conversa animada deles.
Eles trocavam risadas e gestos entusiasmados entre si. Entre eles, um jovem negro e alto se destacava, abraçando uma bela garota enquanto passava a mão na cintura dela.
‘Eu gostaria tanto de poder ser como ele… se eu fosse, talvez as coisas pudessem ter sido diferentes…’
Ele escreveu, em seguida, seus olhos se fixaram naquele casal em particular; encarou a saia da garota e depois desviou o olhar para o chão.
‘Mas, no fundo, eu sei que não mereço nada disso…’
Seus olhos cansados observavam cada caractere digitado na tela do celular quando ele sentiu a gola de sua camisa ser puxada com força. Assustado, ele notou que dois dos rapazes daquele grupo estavam à sua frente. Ambos tinham porte de atletas: um era loiro e o outro, moreno.
— O que cê tá fazendo? Tirando fotinhas escondidas, é? — o rapaz moreno o confrontou.
Demian se projetou para trás, tentando escapar, mas logo outro rapaz se pôs ao seu lado, impedindo que ele se afastasse. Com olhos assustados, ele olhou ao redor. No entanto, a maioria das pessoas ao redor ignoravam completamente a situação, com os olhos fixos em seus aparelhos celulares. Os que percebiam, logo ignoravam e seguiam com suas vidas.
— Eu… não… — Demian tentava se afastar, desviando o olhar entre os dois, sentindo sua garganta fechar. — Foi apenas… um ma… mal-entendido.
— É? E por que tu tava encarando a Carly? Em esquisitão? — o rapaz loiro inquiriu, tomando o celular da mão de Demian.
Este tentou pegar de volta, mas o rapaz moreno o empurrou pelo pescoço, fazendo-o congelar e quase deixando cair sua bebida.
— Ele tirou alguma foto dela? — o rapaz moreno olhou em direção do loiro, que observava a tela seriamente, mas rapidamente deixou escapar um sorriso.
Ele começou a gargalhar e fez um gesto para que o rapaz moreno se aproximasse. Este obedeceu, enquanto Demian colocou uma mão sobre o pescoço, tentando acalmar a respiração.
— Que nada! Esse fresco deve estar escrevendo poesia ou alguma merda assim. — o rapaz loiro riu enquanto apontava para o celular.
O outro olhou para a tela e começou a rir também. — Que merda é essa!
— Hey… me devolve! — Demian exigiu, tentando se mover.
Mas o rapaz moreno colocou a mão em seu ombro, apertando-a com um leve sorriso no rosto. — Relaxa aí cabeludo. Tá com pressa, é?
Demian abaixou a cabeça, contraindo os lábios e encarando o chão enquanto sua mão amassava lentamente o copo da bebida.
— Que merda é essa? “Eu queria ser como ele”. — o rapaz moreno tentou imitar a voz de Demian de forma debochada. — O que tu escreve é coisa de fracassado, vira homem moleque.
— Você nunca deve ter visto um peitinho na sua vida, né? — disse o rapaz loiro, sorrindo. — Deve ser um baita de um cabaço!
Demian fechou os olhos, tremendo a mão ao escutar as risadas e sentir os tapas na cabeça, que começaram leves, mas eventualmente ficaram mais fortes.
— Aí! Para com essa porra!
A ordem veio acompanhada de um tapa na cabeça do rapaz moreno, que olhou para trás com uma expressão de descontentamento. O rapaz loiro apenas se afastou.
Demian abriu os olhos e viu aquele rapaz negro agarrando o celular da mão do loiro e oferecendo-o em sua direção.
— Toma, pega aí. — ele disse com uma expressão neutra, olhando em direção de Demian, que estava levemente acuado. — Foi mal aí.
Ele agarrou lentamente o celular e acenou com a cabeça positivamente, olhando para o rapaz negro, que colocou os outros dois embaixo de seus braços, forçando-os a se afastar. Seu olhar acompanhou a figura do rapaz negro com certa admiração enquanto este se afastava.
Demian virou as costas na direção oposta, olhando por cima dos ombros a figura dos rapazes que lentamente se afastaram, mas com um leve olhar de admiração por aquele que estava no centro.
— Se for zoar um retardado, pelo menos faz isso em um lugar mais discreto…
Demian conseguiu ouvir a última fala do rapaz negro, que agora estava sorrindo com os outros dois. Ele amassou o copo e seu leve sorriso se transformou em um lábio retorcido.
Então seu celular vibrou com uma notificação.
Os três rapazes começaram a rir de maneira contida quando um copo de milkshake os atingiu pelas costas, sujando boa parte de suas roupas.
— Que porra…!? — gritou o rapaz negro, virando-se lentamente. — É essa!
Os outros dois se viraram e também olharam para Demian, que estava em pose de arremesso, com o celular na mão e um sorriso torto no rosto.
— Vão à merda… eu pensei que seria diferente… — Demian murmurou, enquanto olhava para o chão. — Mas nunca vai ser diferente, e sinceramente, acho que prefiro assim…
— Do que você tá falando, porra!? — disse o rapaz loiro, verificando o quanto sua roupa estava suja.
— Não estou falando com vocês… — respondeu Demian, abrindo um sorriso e mostrando o dedo do meio. — Para vocês: espero que gostem de morango, e vão todos se foder!
— Filho da puta… Você tá fodido! — disse o rapaz negro, empurrando os outros dois, que começaram a correr em direção ao jovem. — Peguem ele!
Demian rapidamente correu pela passarela em direção ao elevado que levava ao embarque do metrô. No caminho da subida, ele pulou uma barra de ferro prateada, se impulsionando com a mão com bastante agilidade.
— Vou te pegar!
O rapaz moreno correu quase tão rápido quanto ele, mas quando tentou pular pela barra de ferro, ela cedeu, quebrando como se estivesse enferrujada há anos, e ele caiu rolando no chão.
— Minha avó deve correr mais rápido que vocês! Babacas! — Demian gritou enquanto subia o elevado e olhava para trás, passando por entre pessoas que pareciam nem se importar com o que estava acontecendo.
O rapaz loiro ficou para trás ajudando o que havia caído. No entanto, o rapaz negro continuou a subir, seguindo Demian e abrindo caminho entre as pessoas com dificuldade devido ao seu tamanho.
Quando finalmente chegou à plataforma do metrô, esbarrando em algumas pessoas, o rapaz negro viu Demian já dentro de um vagão. Ao avançar para tentar alcançá-lo, as portas se fecharam.
Demian fez uma leve expressão de choro com a mão e uma cara triste antes de abrir um sorriso novamente e mostrar o dedo do meio. O transporte começou a se mover, então ele respirou fundo, com um sorriso no rosto.
— Finalmente…
As palavras saíram de sua boca quase como um alívio. Ele se encostou na porta, olhando para seu celular, que continha uma mensagem de um número desconhecido: ‘Demian, preciso que venha até o edifício Iovem. Temos assuntos a tratar. Tyx.’
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