Capítulo 1
Enormes árvores obscuras o rodeavam enquanto ele corria. Estava ofegante e mal conseguindo formar uma imagem completa do que observava, pois a escuridão ao seu derredor obscurecia quase tudo. O chão de terra da floresta estava repleto de mato e galhos que serviam como obstáculo enquanto ele fugia.
Ele parou por um segundo, retomando seu fôlego enquanto olhava para trás; havia duas figuras que o seguiam e, atrás delas, ele conseguia ouvir apitos, gritos e o som de passos acompanhados de enormes focos de luz rasgavam a escuridão. À medida que os focos de luz passavam, eles revelavam manchas de sangue espalhados pelas árvores e pelo chão.
— Vamos! — a voz cansada de Black saía de sua boca enquanto ele estendia a mão para a figura mais próxima dele. — Não podemos parar agora!
A figura alcançou sua mão, e ele a puxou para perto de si. O zumbido em seus ouvidos estava presente, mas ele sentia que conseguia manter o controle completo de seu corpo. Da escuridão, a figura se aproximou; seus traços faciais e a maioria do corpo estava oculto pela pouca iluminação. No entanto, ele conseguia ver os cabelos cacheados, a pele negra, os lábios carnudos e partes do corpo feminino nu.
A figura segurou sua mão direita com carinho, entrelaçando os dedos dela entre os seus e aproximando calmamente o seu rosto em direção ao rosto dela. Sua respiração se acalmou, como se naquele momento nada mais existisse ao redor. A figura guiou sua mão até tocar seu rosto, e ele conseguiu sentir a pele macia enquanto seus dedos eram lentamente guiados por ela. Ele relaxou; então a figura conduziu sua mão, passando por seus lábios e descendo lentamente.
— Nós vamos conseguir… e depois estaremos para sempre juntos… — a figura feminina disse com uma voz suave e calma.
Ele engoliu em seco; o toque o excitava. Sentia as protuberâncias das cicatrizes, principalmente quando a figura guiava sua mão por sua clavícula até descer ao centro de seus seios. Ele se acalmou ao sentir o coração da figura batendo lentamente; naquele momento, eles estavam conectados.
Mas o zumbido o retirou desse momento, e ele notou que as luzes se aproximavam cada vez mais.
— Precisamos ir! — ele tentou puxar a figura, mas ela não se moveu e agarrou seu braço com ambas as mãos, mantendo a mão dele em seu peito, onde ele sentiu o coração dela acelerar cada vez mais.
— Promete que não vai esquecer de mim? — questionou a figura feminina com um tom doce. — Que nós vamos conseguir sair daqui juntos?
— Eu prometo! — Ele respondeu quase instantaneamente. — Eu nunca vou abandonar você!
As luzes os alcançaram e o mundo ao seu redor começou a sangrar. Sua visão começou a ficar trêmula; o zumbido tornava-se cada vez mais ensurdecedor e ele conseguia ver cada vez menos da figura à sua frente, até que a luz ofuscou completamente sua imagem, revelando levemente um brilho alaranjado que cintilava onde deveria ser seu olho esquerdo.
Então a luz o alcançou, e seus olhos amarelos despertaram abruptamente. Ofegante, ele estava com as mãos trêmulas agarradas na cama, ele olhou ao seu redor, mas o que notava era apenas o que já havia visto dia após dia: sua cama de metal com um colchão fino, porém confortável; um lençol branco; o teto metálico com as luzes apagadas; e um relógio no centro da parede metálica, marcando cinco e cinquenta da manhã.
Ele se ergueu lentamente, colocando a mão sobre seu rosto suado. O ar preenchia seus pulmões rapidamente enquanto encarava sua própria mão trêmula.
“O que foi isso…?”
Sua mão se abria e fechava. Ele fechou os olhos na tentativa de se concentrar em seu sonho. Porém, sentiu como se uma agulha cutucasse seu cérebro. Por conta disso, cerrou os dentes firmemente, colocando instintivamente as mãos sobre os olhos.
“Quem é ela…?”
O alarme melodioso tocou, fazendo as luzes do local se acenderem instantaneamente, revelando as outras camas vazias iguais às dele.
Ele lentamente sentou-se na cama, abaixando a cabeça e logo olhando para um objeto oval de cor preta que se encontrava no canto da sala que em seu interior brilhava uma luz vermelha.
Ele respirou fundo e se levantou, dirigindo-se para a saída do quarto, que era uma porta na extremidade direita da sala. Ao sair, encontrou um corredor metálico iluminado por LEDs nas laterais e resfriado pela ventilação das frestas, com o cheiro de pinho. Olhou para os dois lados e notou outro objeto oval no canto do corredor.
Black fechou os olhos, respirou fundo e os abriu novamente, seguindo em direção aos chuveiros.
Ao chegar lá, tirou suas roupas, que eram compostas por uma blusa completamente branca, uma calça folgada da mesma cor e um calçado confortável. Os chuveiros eram divididos em boxes individuais e havia um imenso espelho único com um balcão e diversas pias. Ele agarrou uma das toalhas brancas empilhadas em uma cesta de ferro ao lado da pia e se dirigiu a um dos boxes.
“É a primeira vez que lembrei algo…”
A água quente do banho escorria por seu rosto e cabelo enquanto seus olhos permaneciam fechados. Ele abria e fechava a mão enquanto a água escorria por seu corpo.
“Quem é ela?”
Seus olhos se abriram e ele olhou para sua mão aberta.
“É dela a voz que eu escuto em meus sonhos…? Mas por quê?”
Ele bateu levemente sua testa na parede algumas vezes, com os lábios arqueados e os cenhos levemente franzidos.
“Eu preciso descobrir, mas não vou conseguir nada se ficar apenas aqui… Mas não posso fazer nada estúpido; se não, eles vão me entregar novamente para a Divisão Zero…”
— Acho que no final estou fodido de qualquer forma… — ele sussurrou para si com um sorriso triste.
Seus punhos se fecharam até o ponto em que sua mão já estava tremendo e as veias em sua pele apareciam. Entretanto, logo suspirou e desligou o chuveiro, agarrando a toalha pendurada em um suporte.
Black se enxugou e voltou seu olhar para o grande espelho que estava na parte externa dos boxes de banho. Observava o reflexo distorcido de sua própria imagem, ocultada pelo vapor quente do banho — apenas uma figura escura com os olhos amarelos se destacavam.
Ele encarou, mas não tardou a se vestir novamente com uma muda de roupas limpas que estavam empilhadas e se retirar do local.
“Um convidado não é?”
Ele encarou as roupas empilhadas como uniformes idênticos. Seu estômago roncou, ele coçou a parte de trás da cabeça e saiu do banheiro em direção ao corredor, seguindo a linha verde que indicava o caminho para o refeitório.
Ao chegar lá, deparou-se com um refeitório enorme, repleto de telas que simulavam uma luz fraca como a do sol. Havia uma música ambiente que tocava ao fundo, o chão era feito de um material que lembrava lajotas brancas e nas laterais havia frestas para a circulação do ar. Havia diversas mesas de metal com bancos adjacentes alinhados, porém vazios.
Black pegou uma bandeja grande e alguns talheres e foi rapidamente servido por funcionários que estavam trabalhando vestidos com aventais e máscaras; alguns apenas olhavam para ele enquanto outros o cumprimentavam com um aceno de cabeça. Ele passou por cada um calado, pegando uma grande quantidade de comida, apenas acenando a cabeça para cada um deles e agradecendo.
Em seguida, sentou-se em um dos bancos ao lado das mesas e pegou uma das várias colheres de plástico que trouxera consigo, quebrando-a facilmente ao manipulá-la. Isso o fez estalar a língua. Suspirando, pegou outra colher com mais delicadeza.
“Droga de colher de plástico! Por que eles não dão algo mais resistente?”
Ele observava os funcionários, alguns cochichavam entre si, olhando em sua direção. Havia telas acima deles, mostrando as refeições e informando a quantidade calórica de cada uma, além de um calendário que descrevia o que haveria em cada dia.
Antes de começar a comer, ele juntou as mãos e fechou brevemente os olhos.
— Ngiyabonga ngokudla.
Ele começou a comer rapidamente. Na bandeja estavam: ovos, batatas fritas, bacon, panquecas, cereais, frutas e leite.
“Eu preciso encontrar uma forma de descobrir quem é aquela mulher…”
Ele parou por um momento, encarando o refeitório vazio, mas notou os objetos ovais no canto superior da sala. Seus lábios se retraíram e seus olhos encaravam a comida. Então ele voltou a comer, colocando o máximo que conseguia em sua boca.
“Mas eu não posso levantar suspeitas. Tenho que seguir o que eles mandam e agir como querem.”
Enquanto comia, as portas do refeitório se abriram, revelando a figura de uma mulher. Sua pele era clara, seu rosto fino, com olhos azuis e cabelo loiro curto, com mechas caindo sobre o rosto. Ela vestia uma blusa social branca justa, calças jeans e tênis pretos.
Seus olhos sondaram o local e, quando encontraram Black, ela se pôs na ponta dos pés, levantou o braço e acenou para ele com um sorriso simpático. Em seguida, cumprimentou os serventes e se dirigiu na direção do jovem.
“Emma? O que ela faz aqui?”
Black a encarou surpreso, limpando as mãos com os guardanapos que estavam em um compartimento da bandeja enquanto a mulher se aproximava de onde ele estava.
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